terça-feira, 28 de maio de 2024

Por que os pilotos anunciam 'tripulação, 10 mil pés' durante os voos?

Cabine do Bombardier CS100, modelo de avião exibido no Farnborough Airshow, evento
de exposição de aeronaves na Inglaterra (Imagem: Daniel Leal-Olivas/AFP Photo)
Quem costuma voar já deve ter ouvido o aviso "tripulação, 10 mil pés" no sistema de som do avião. Essa mensagem, geralmente, é ouvida quando a aeronave passa por essa marca, de cerca de 3.050 metros de altura, e é fundamental para a segurança do voo.

Conversas ficam proibidas


Esse anúncio, como quase tudo na aviação, tem a ver com segurança. Se for durante a aproximação para o pouso, ele significa que, a partir daquele momento, os tripulantes não devem acionar os pilotos a não ser que seja uma situação realmente necessária, e eles não devem se concentrar em mais nada além da operação do avião.

A regra é chamada de "cabine estéril", porque busca tirar qualquer distração que possa interferir com a operação da aeronave. É, em resumo, uma regra que proíbe qualquer tipo de conversa ou ação que não esteja relacionada com aquela etapa de voo.

Ao mesmo tempo, após a decolagem, é acima dessa marca que o sinal de afivelar os cintos é apagado caso não haja risco de turbulência. Também, os comissários costumam servir as refeições apenas após passaram dos 10 mil pés, já que, abaixo disso, é considerado um momento crítico da operação.

Fase crítica dos voos


A Administração Federal de Aviação dos EUA (FAA), órgão similar à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), estabelece que, em fases críticas dos voos, pilotos não podem ficar de conversa entre si ou com os comissários. Não é o caso de troca de informações relacionadas à operação do voo, mas conversas não essenciais.

As fases críticas, ou seja, as que requerem maior concentração dos pilotos, são justamente aquelas nas quais a aeronave está abaixo de 10 mil pés, ou seja, cerca de 3.050 metros de altitude. É o caso do táxi no solo, decolagem, pouso e a aproximação para o destino.

Nessas etapas, também é proibido comer, ler (exceto manuais ou outros materiais relacionados ao voo), além de realizar qualquer atividade que distraia os pilotos da adequada execução de suas tarefas. Essas regras não se aplicam se o avião está em voo de cruzeiro, que, geralmente, é realizado acima dessa altitude de 10 mil pés.

Há, inclusive, uma lista que deve ser seguida quando se passa essa marca, seja na decolagem, seja no pouso. Uma série de itens da aeronave devem ser checados nesse momento, como se as luzes indicando aos passageiros para afivelarem os cintos está acesa ou apagada (dependendo da necessidade), se as luzes de pouso estão ligadas.

De onde vem?


A regra foi criada nos EUA em 1981. À época, dados de sistemas de reporte de segurança mostraram que parte dos acidentes e incidentes envolvendo aviões estavam relacionados a distrações em fases críticas dos voos.

Com isso, se estabeleceu que, desde o acionamento dos motores até se cruzar os 10 mil pés, e, dessa mesma marca até o desligamento dos motores após o pouso, apenas comunicações relacionadas aos voos deveriam ocorrer nas cabines de comando. Essas regras foram batizadas de regra da cabine estéril.

É óbvio que conversar entre si não é algo proibido aos pilotos. É até interessante que haja uma comunicação para se entrosarem, já que estarão atuando juntos nos aviões por algumas horas, geralmente, mas a regra estabelece os momentos em que isso deve ser evitado.

Comissários também têm autorização para quebrar essa "regra do silêncio" em situações específicas. Em caso de fumaça a bordo ou uma porta com problema, por exemplo, podem ser comunicadas o quanto antes para que os pilotos adotem as medidas que acharem mais adequadas para a segurança do voo.

Acidente foi grande motivador


O acidente que pode ser considerado o grande motivador da adoção da regra da cabine estéril foi a queda do voo 212 da Eastern Air Lines. O acidente ocorreu em 1974 nos EUA.

A aeronave se aproximava para pouso, quando colidiu com o solo a mais de 5 km de distância do aeroporto. Ao todo, 72 das 82 pessoas a bordo morreram.

A meteorologia era desfavorável naquele dia. Havia intensa névoa, o que dificultava a visualização da pista.

Na aproximação, faltando 2min30s para o impacto, os pilotos começaram a conversar sobre coisas não essenciais para o voo. Os temas oscilavam entre política e carros usados, e ambos demonstravam irritação com alguns tópicos discutidos, o que demonstra a falta de atenção no que era fundamental para a segurança.

De acordo com a investigação, ficou comprovado que os pilotos não tinham a real consciência de onde estavam naqueles momentos finais. O avião colidiu com algumas árvores e, depois, caiu em uma plantação logo à frente, mas distante do aeroporto.

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