quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

História: Como nasceu e fracassou a invasão da Baía dos Porcos em Cuba há 62 anos


Johnny López de la Cruz sente que está sufocado. Trancado em um caminhão com mais de 100 prisioneiros, ele mal consegue respirar.

Dentro do contêiner, os presos se desesperam. Começam a suar. Vários desmaiam.

Alguns arrancam as fivelas do cinto militar para perfurar o teto e deixar entrar um pouco de ar.

Eles ganham tempo, mas a maioria acha que eles vão ser fuzilados assim que chegarem a Havana.

A viagem termina sete horas depois. Os militares castristas abrem as portas. Vários corpos inertes caem no asfalto. Nove prisioneiros morreram no trajeto.

Quando chega a vez de Johnny sair, ele mal consegue saltar do caminhão.

No "caminhão da morte", eles não são os únicos prisioneiros. No total, distribuídos por diversos veículos, há cerca de 1,1 mil capturados.

São os sobreviventes da Brigada 2506, um exército de 1,4 mil jovens que poucas horas antes fracassou na tentativa de invadir Cuba, derrotados na Praia Girón pelas tropas de Fidel Castro.

Exaustos, sem munição e encurralados na praia. Assim terminou a Brigada 2506
Exaustos, sem munição e encurralados na praia. Assim terminou a Brigada 2506, 72 horas após o desembarque na ilha

A maioria são cubanos exilados que, após o triunfo da revolução, foram recrutados e treinados pela CIA para derrubar o governo revolucionário na ilha.

Fidel Castro havia chegado ao poder dois anos antes, ao vencer em 1º de janeiro de 1959 o governo golpista de Fulgêncio Batista, a quem acusavam de autoritário e corrupto.

Mas, apesar do grande apoio popular, muitos outros cubanos não compartilhavam das ideias revolucionárias de Castro e se exilaram.

O ataque à Baía dos Porcos de 1961, no entanto, estava condenado ao fracasso antes mesmo do primeiro disparo. E a Brigada ainda responsabiliza Washington.

Da Casa Branca, o então presidente John Fitzgerald Kennedy cancelou na última hora os ataques aéreos que iriam neutralizar as aeronaves castristas.

Isso aconteceu porque os Estados Unidos não podiam figurar como a força motriz por trás da invasão. Não só prejudicava sua imagem internacional, como também dava uma desculpa à União Soviética, que se consolidava como aliada-chave de Castro, para retaliar e provocar um conflito nuclear sem precedentes.

Assim, os jovens determinados, mas também inexperientes, que sonhavam em "libertar Cuba do castrismo", resistiram menos de 72 horas.

Muitas das feridas deixadas pela invasão da Baía dos Porcos permanecem abertas e
definem posições políticas tanto em Cuba quanto nos Estados Unidos
Eles desembarcaram na madrugada de 17 de abril de 1961. Na tarde de 19 de abril, já haviam sido derrotados.

Os sobreviventes da Brigada 2506 foram libertados após intensas negociações no Natal de 1962, um ano e meio depois.

Os brigadistas que ainda estão vivos seguem aguardando no exílio a queda do governo socialista cubano.

Enquanto isso, Cuba comemora todo dia 19 de abril como uma pequena nação derrotou um exército de "mercenários" financiados pelo país mais poderoso do mundo.

Já passaram mais de 60 anos


Esta é a história de como a invasão foi concebida, por que fracassou e o quanto marcou seus protagonistas.

Por que deixei de apoiar Fidel e me juntei à invasão


Retrato de Johnny López de la Cruz quando jovem
Johnny López de la Cruz, hoje com 80 anos, é o atual presidente da Associação de Veteranos da Brigada 2506. Ele fez parte do batalhão de paraquedistas da invasão da Baía dos Porcos. Ele conta como se exilou e se juntou à Brigada:

Abri meus olhos em relação a Castro no dia em que mataram o sargento Benítez.

O sargento Benítez era da polícia de Batista, um bom amigo da família que nunca saiu de Cuba por considerar que não havia feito nada de errado.

Eu apoiava Castro no início. Ele nunca disse ser comunista. Do contrário, ninguém em Cuba teria aceitado.

Mas logo começaram a fuzilar as pessoas, confiscar propriedades, estatizar e tirar terras.

Um dia, dois homens de Castro apareceram e levaram Benítez para ser julgado. Eu estava lá para apoiá-lo.

Durou menos de meia hora. Não o deixaram nem depor. Ele e outros quatro réus foram considerados culpados e levados para um cemitério abandonado fora da cidade.

Foram fuzilados e jogados em uma cova.

Acordei. Não entendia como era possível fuzilar alguém sem defesa. Aquilo era abuso de autoridade.

Comecei então a participar de atividades contrarrevolucionárias. Distribuíamos manifestos e escrevíamos 'Abaixo Fidel' nas paredes.

Mas eles prenderam dois do meu grupo. E pessoas próximas disseram que eu era o próximo.

Foi assim que três companheiros e eu fomos para Havana e voamos para Miami com documentos falsos.

Quando cheguei aos Estados Unidos em 1960, já sabia que outros exilados estavam sendo treinados pela CIA na Guatemala para invadir Cuba. Fui para lá alguns dias depois.

Exército de 1,4 mil exilados

Entre 1959 e 1960, milhares de jovens anticastristas, como López de la Cruz, chegaram à conclusão que a única saída era o exílio ou o pegar em armas.

A maioria foi para os Estados Unidos, um país disposto a financiar a queda de Castro.

As estatizações de indústrias e negócios americanos e o fortalecimento dos laços comerciais e militares com a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) logo colocaram Cuba na posição de desafeto dos Estados Unidos.

Fidel Castro, cercado pelo Movimento Revolucionário 26 de julho, falando sobre a
Revolução Cubana em 4 de janeiro de 1959
Castro havia se tornado uma ameaça real à influência regional do país mais poderoso do mundo.

A CIA, agência de inteligência americana, o Pentágono e a Casa Branca, sob o governo de Dwight Eisenhower, se propuseram a acabar com o líder revolucionário.

E encontraram em um grupo de cubanos exilados o exército perfeito para executar o plano.

No total, foram recrutados cerca de 1,4 mil homens.

Cuba, enquanto isso, se preparava diante das suspeitas de uma invasão iminente.

"Herói da Pátria"


Retrato de Jorge Ortega Delgado quando jovem
Jorge Ortega Delgado lutou do lado fidelista durante a invasão. E quando se lembra disso, um brilho ofusca seus olhos. Sentado no terraço de sua casa em Havana, aos 77 anos, ele contou à BBC como se juntou às milícias:

Venho de uma família operária muito humilde. Quando a revolução triunfou, eu tinha 15 anos e me juntei imediatamente às atividades revolucionárias.

Os Estados Unidos começaram a intervir e a tentar atacar Cuba e, em outubro de 1959, foram fundadas as milícias nacionais revolucionárias.

Me alistei e participei de todos os treinamentos durante 1959 e 1960.

No fim de outubro de 1960, Fidel Castro, o comandante-chefe, apareceu no treinamento.

Fidel pediu para reunir todos os milicianos. Éramos quase 1,5 mil.

E, naquela ocasião, pediu aos jovens com menos de 20 anos que se juntassem à artilharia antiaérea.

Naquela tarde, pedi permissão aos meus pais para poder me apresentar. Eles concordaram.

Entramos para a bateria 30. Foi quando nosso treinamento em artilharia antiaérea começou.

O plano


O plano original da CIA e do governo Eisenhower era que os exilados partissem de Puerto Cabezas, na Nicarágua, e desembarcassem perto da cidade de Trinidad, no sul de Cuba.

O objetivo principal era ocupar a região e resistir por tempo suficiente para estabelecer um governo de oposição de líderes no exílio que logo seria apoiado pelos Estados Unidos.

Trinidad fica perto das montanhas do Escambray , onde já havia membros da resistência anticastrista que se juntariam às tropas invasoras e organizariam, se necessário, uma guerra de guerrilhas semelhante à que Fidel Castro saiu vitorioso na Sierra Maestra poucos anos antes.

Para facilitar o desembarque,16 aviões bombardeariam previamente os principais aeródromos de Castro , inutilizando sua força aérea e ganhando assim vantagem no céu cubano.

Mas o roteiro mudou radicalmente quando Kennedy se tornou presidente em janeiro de 1961.

Kennedy modificou o plano original de invasão logo após chegar à Casa Branca em 1961
Ele concordou em continuar com o plano, mas não sob essas condições. Invadir Trinidad em plena luz do dia parecia estrondoso demais.

"Kennedy queria negar qualquer envolvimento na invasão. Tinha que ser encoberta. Desembarcar em Trinidad durante o dia demonstrava muito poderio, que os EUA estavam por trás", explica à BBC News Mundo Peter Kornbluh, diretor do Projeto de Documentação de Cuba do Arquivo de Segurança Nacional dos Estados Unidos.

"A operação tinha que ser o mais secreta possível, e Kennedy deu à CIA três dias para refazer um plano que havia sido tramado durante um ano inteiro", acrescenta o especialista, que conseguiu divulgar o relatório do fracasso que se manteve em sigilo por 37 anos.


Kennedy reduziu os aviões de 16 para oito e instou a CIA a mudar o local e o horário de desembarque.

O lugar escolhido se revelou mais tarde um dos piores possíveis: a Baía dos Porcos, uma enseada de difícil acesso também no sul da ilha.

Nesta área, a costa é hostil.

É uma área pantanosa, com muitos manguezais intransponíveis e "dentes de cachorro", como são conhecidas as concentrações de recifes em Cuba, afiados.

Um cenário difícil para desembarcar em sigilo e com fluidez.

Perto da Baía dos Porcos havia um aeroporto, essencial para que os aviões invasores pudessem reabastecer.

15 de abril - O bombardeio 


Jorge Ortega Delgado completa seu primeiro treinamento em canhões antiaéreos e aguarda ansioso em 15 de abril para dar uma volta. São vários meses de formação militar.

Mas naquela mesma manhã o alarme de combate toca. Aviões invasores bombardearam dois aeroportos em Havana e outro em Santiago de Cuba.

"Saímos imediatamente, nos mandaram pegar os canhões e nos colocaram numa praia. Quando chegamos, nos contaram que, ao amanhecer de 15 de abril, aviões mercenários atacaram nossos aeroportos e mataram sete do nosso lado", lembra Ortega.

Jorge Ortega era integrante da bateria 30 da artilharia castrista e diz ter sentido
total repúdio ao saber da invasão de Cuba
"Todos os jovens sentiram um repúdio completo. Não podíamos acreditar. Estávamos dispostos a fazer o que fosse necessário para defender a pátria", acrescenta o ex-combatente, ainda com fervor na voz.

O bombardeio de 15 de abril de 1961 era o primeiro dos que Kennedy havia autorizado para inutilizar os aviões de Castro antes do desembarque, previsto para 17 de abril.

Os oito aviões decolaram na madrugada de 15 de abril da base de Puerto Cabezas, na Nicarágua, e lançaram granadas sobre os aeródromos de Santiago de Cuba, no leste do país, e Ciudad Libertad e San Antonio de los Baños, ambos em Havana.


Apesar de ter deixado sete mortos, apenas poucas aeronaves cubanas foram danificadas, algumas já imprestáveis.

A força aérea castrista ficou praticamente intacta e, além disso, conseguiu abater um dos aviões invasores.

Após o bombardeio, um avião se passando por cubano pousou em Key West, na Flórida. O piloto alegou ser um desertor das forças armadas de Castro.

O bombardeio de 15 de abril mal danificou ​​as aeronaves da frota castrista,
   que conseguiu continuar a se defender e conter todos os outros ataques
Na verdade, era parte do plano da CIA para não envolver os Estados Unidos no ataque.

Dessa forma, pareceria que havia eclodido uma rebelião interna anticastrista em Cuba, em vez de uma ação promovida pelo alto comando dos Estados Unidos.

"Mas a história do desertor durou apenas algumas horas. Embora os Estados Unidos negassem, todo mundo ficou sabendo que os aviões eram americanos e que pretendiam fingir que o ataque fora perpetrado por desertores cubanos", explica Kornbluh.

Com a suspeita de envolvimento dos Estados Unidos, Kennedy cancelou o restante dos ataques. Um golpe decisivo contra as aspirações da Brigada 2506, que não teria apoio aéreo suficiente.

"Sempre digo que a guerra estava perdida antes de começar", lamenta López de la Cruz.

Mas, naquele momento, nenhum dos invasores sabia.

17 de abril - O desembarque 


1h da manhã. As lanchas com invasores se aproximam da Praia Larga, no final da estreita Baía dos Porcos.

Eles não querem fazer barulho. Surpreender é parte essencial do plano.

Mas Castro pressente há meses um ataque. Ele sabe que uma guerra contra os Estados Unidos é como uma batalha de Davi contra Golias — e se preparou bem.

"Ele tinha milícias patrulhando praticamente todas as praias da ilha", explica Kornbluh.

Uma dessas patrulhas escuta ruídos. E abre fogo.

Os invasores respondem. Conseguem capturar alguns dos patrulheiros, que haviam tido tempo de dar o alerta. O elemento surpresa havia ido por água abaixo.

As tropas de Castro já estão se mobilizando para conter a invasão, e ainda faltam muitos para desembarcar.


"Barcos de papel"


Retrato de Humberto López Saldaña quando jovem
Humberto López Saldaña tem 83 anos. Em 1960, deixou Cuba e se exilou com a família em Miami, onde logo se juntou à Brigada. Ele estava em um dessas lanchas invasoras e contou à BBC News Mundo como foi o desembarque:

Tivemos muitas dificuldades. Começamos a combater cedo demais. Isso atrasou o desembarque.

Além disso, nossas lanchas eram muito pequenas. Cada vez que se chocavam contra os recifes, ficavam praticamente destruídas. Muitas afundaram.

O desembarque durou até as primeiras horas da manhã. Esperamos a maré baixar para ter uma visão melhor e evitar os recifes. Da costa, nos jogaram uma corda para chegar à terra firme.

Por volta das 6h da manhã apareceu a força aérea castrista. As bombas caíam do lado. Nossos barcos cambaleavam como se fossem de papel.

Os barcos invasores foram avariados ao colidir contra recifes na área de desembarque
Pouco depois, um foguete atingiu meu barco, o Houston.

O pânico se instalou. Vários companheiros morreram. O capitão jogou o Houston contra os recifes para facilitar o acesso dos demais à terra.

Além de inutilizar o Houston, os aviões de Castro também afundaram o Rio Escondido. Nessas embarcações tínhamos muita munição e toneladas de gasolina de aviação. Perdemos tudo.

"Quando você começa a disparar, se exalta e perde o medo"

Jorge Ortega e sua bateria chegaram à província de Matanzas, onde fica a Baía dos Porcos, no dia 17 de abril por volta das 5h da tarde.

Lá soube que lutaria contra os 1,2 mil homens que haviam conseguido desembarcar, além do batalhão de paraquedistas que foi lançado em outras áreas próximas.


Ortega se lembra de ouvir os milicianos, a explosão de tanques e morteiros.

"No dia 16 de abril, ouvimos com atenção o discurso de Fidel em homenagem aos nossos sete compatriotas que morreram nos bombardeios. No caminho para Havana, o povo saía com bandeiras às ruas nos pedindo para derrotar o inimigo", recorda Ortega sobre as horas antes de se posicionar atrás do canhão.

Foi nesse discurso que Castro declarou pela primeira vez o caráter socialista da revolução e exortou o povo a expulsar os mercenários.

Foi assim que a televisão cubana transmitiu parte do discurso de Fidel Castro em 16 de abril de 1961

Na manhã de 18 de abril, Ortega avistou aviões inimigos. Foi a primeira vez que ele disparou um canhão.

"Você se sente inibido. Todos nós sentimos medo. Quem diz que não, está mentindo. Mas você olha para o lado e vê o resto firme e determinado. Quando você começa a disparar, se exalta e perde o medo", conta Ortega.

Nesse mesmo dia, sua bateria entrou com mais tropas nas imediações de Praia Larga, já cercando grande parte do exército de exilados.

"Ao amanhecer de 19 de abril, vimos cair no mar um dos aviões que derrubou nossa bateria. Outro avião caiu em um canavial. O copiloto morreu carbonizado, mas o piloto saltou de paraquedas e tentou fugir. Morreu lutando cercado por nossas tropas", relata o ex-combatente.

Com os ataques prévios ao desembarque cancelados, os aviões B-26 que acompanharam a invasão foram presas fáceis diante da frota praticamente intacta de Castro.

Os barcos que transportavam o combustível foram perdidos, e os aviões invasores não podiam usar o aeroporto próximo à Praia Girón como pretendiam.

Para reabastecer, eram necessárias quatro horas de voo de ida e volta até a base da Nicarágua. Cada vez que voltavam a Cuba, tinham menos de uma hora para bombardear.

As metralhadoras traseiras foram removidas para deixá-los mais leves — e isso os tornou mais vulneráveis.

Mal haviam se passado 24 horas desde o desembarque na madrugada de 17 de abril, e os invasores já haviam perdido dois dos seis barcos e metade da frota aérea.

Sem o apoio aéreo dos EUA, os bombardeiros B-26 estavam mais vulneráveis
O restante das embarcações partiu para alto mar para evitar maiores danos diante da reação de Castro.

Em 19 de abril, quatro instrutores de voo americanos que aguardavam na Nicarágua foram acudir os brigadistas que combatiam sozinhos, mas as forças fidelistas os derrubaram.

"Não era a hora deles morrerem, mas sentiram que deveriam nos apoiar. Foi um grande gesto", lamenta López de la Cruz.

19 de abril - Fracasso consumado


Castro conhece as dificuldades do inimigo. Por isso se apressa e avança com tudo para encurralá-los na costa e impedir que escapem.

Suas tropas chegam em ondas: caminhões com mais homens, tanques blindados, morteiros, aviões.

Castro conhecia as dificuldades do inimigo e aproveitou para encurralar os invasores na Praia Girón
No terceiro dia, os invasores não têm mais munição, tampouco aviões ou rota de fuga. Eles se rendem por volta das 17h30 da tarde de 19 de abril.

É complicado fornecer dados exatos sobre o número de mortos do lado invasor.

"Havia o pessoal da marinha nos barcos que afundaram e ali perdemos a contabilidade exata", explica De la Cruz.

O presidente da Associação de Veteranos estima que houve 103 mortos e outros 100 feridos.

Ele considera que as baixas foram mínimas levando em conta que não pararam de lutar durante três dias.

Do lado cubano, um dos comandantes que liderou a resistência, José Ramón Fernández, estimou o saldo em 176 mortos, 300 feridos e 50 incapacitados em um livro sobre a invasão que escreveu com Fidel Castro.

Milícia cubana com um corpo. É difícil saber o número exato de mortes do lado invasor

"Um ato de arrogância"


"A invasão da Baía dos Porcos foi um erro de cálculo tremendamente arrogante por parte da CIA", avalia Kornbluh.

O alto comando estava convencido de que a revolução de Castro era impopular e que bastava uma invasão militar de opositores para que o povo se voltasse contra ele.

"Mas a verdade é que Castro era muito popular nessa região. Havia levado eletricidade e apoio agrícola. A CIA confiou em suposições falsas e pobres para armar a invasão."

"Também não era difícil imaginar que dezenas de milhares de militares cubanos derrotariam rapidamente 1,4 mil invasores", diz Kornbluh.

Prisioneiros rendidos caminhando um após o outro. Cerca de 1,1 mil homens da Brigada 2506 foram capturados e levados para prisões em Havana

A prisão


Humberto López Saldaña conta à BBC News Mundo o que aconteceu após ser capturado:

Antes de sermos transferidos para a prisão, Che Guevara chegou. Nos perguntou o que fazíamos antes de deixar Cuba. Parecia muito calmo, mas sempre pensei que a qualquer momento poderia levar um tiro.

Nos transportaram em vários caminhões. Um estava muito cheio. Fechado hermeticamente. Nesse, morreram nove companheiros.

O meu foi com as portas abertas. Enquanto estávamos sendo transferidos, as pessoas gritavam na rua: "Mercenários, traidores da pátria, vamos fuzilar vocês!"

Depois, em Havana, nos trancaram na prisão de Castillo del Príncipe. Lá o tratamento não foi bom.

Algumas celas estavam superlotadas e você tinha que dormir no chão.

Se nossos familiares nos mandavam algo, os guardas jogavam no chão. As pessoas brigavam para pegar. Tínhamos que nos organizar e repartir as coisas.

Conseguir charutos era muito difícil. Alguns prisioneiros fumavam até casca de laranja.

Quando saíamos para caminhar no pátio, um guarda nos cutucava com baionetas se não andássemos rápido.

Uma coisa bem tétrica é que éramos cerca de 150 por galeria e só havia um banheiro.

Nos ofereciam um café com leite que, na verdade, era água suja — e, muitas vezes, cuspiam nele antes de entregar. O pão que nos davam era duro como pedra. Jogavam no chão e não acontecia nada com ele. Você tinha que molhar para poder comer. A comida era muito escassa.

A troca


López de la Cruz passou mais de três meses em uma cela solitária porque tentou escapar e passou a integrar a categoria de presos perigosos.

Por isso, foi colocado no último avião que mandou os prisioneiros livres de volta a Miami.

Era Natal de 1962.

Kennedy havia enviado um famoso advogado para negociar com Castro.

Era James B. Donovan, que em fevereiro de 1962 havia conduzido uma troca de prisioneiros entre os Estados Unidos e a União Soviética.

Familiares dos prisioneiros e o procurador-geral do Estado contrataram o
famoso advogado James B. Donovan para conduzir as negociações
Ele viajou pela primeira vez a Havana em 30 de agosto de 1962 e, no dia seguinte, se reuniu por quatro horas com Fidel Castro.

Nos meses seguintes, Donovan se encontrou várias vezes com o líder cubano.

As negociações foram tratadas como um processo de "indenização", mais do que uma troca humanitária, "algo que Castro exigiu desde o início porque queria que Cuba fosse compensada pelos custos da invasão", explica Kornbluh.

Meses antes da libertação, os prisioneiros haviam sido julgados publicamente por traição à pátria.

Julgamento dos prisioneiros, Havana, 1962: Os prisioneiros testemunharam em um julgamento público televisionado, em que relataram o envolvimento da CIA na operação
Muitos acreditavam que acabariam sendo fuzilados, mas foram condenados a 30 anos de prisão e impuseram uma fiança no valor total de US$ 62 milhões.

No fim de dezembro de 1962, Donovan acordou com Castro que os presos seriam libertados em troca de US$ 53 milhões em remédios e alimentos que seriam distribuídos ao povo cubano.

Quando os primeiros carregamentos de mantimentos chegaram em 23 de dezembro, os aviões da Pan American Airlines estavam transferindo os prisioneiros para Miami, onde uma recepção com 10 mil pessoas os aguardava no agora extinto auditório Dinner Key.

Os prisioneiros foram recebidos com comoção por familiares e amigos em Miami na véspera e no dia de Natal de 1962
Enquanto isso, em Cuba, era celebrada a "segunda vitória de Girón", por terem vencido "a batalha pela indenização".

No último avião da Pan Am, López de la Cruz lembra de olhar pela janela e pensar que seria muito difícil voltar ao seu país.

"As pessoas dizem que nos trocaram por latas de compota, mas não nos sentimos humilhados. Pela nossa libertação, Cuba recebeu muitas roupas, alimentos e remédios que o governo distribuiu à sua maneira", diz López Saldaña.

Nenhum dos dois exilados voltou a pisar em Cuba.

Jorge Ortega: "Sempre serão nossos inimigos"


Se um dia eu poderia sentar com um deles e tomar um rum? Para mim, parece muito difícil depois dos companheiros que morreram ou acabaram mutilados.

Conversar, sim, Cuba está sempre disposta a dialogar. Mas precisa haver igualdade de condições. Enquanto houver um embargo, não é possível.

Retrato atual de Jorge Ortega
Sessenta anos após a invasão, Jorge Ortega conversou com a BBC. Até hoje, ele acha difícil ter um relacionamento amigável com integrantes da Brigada 2506

Os integrantes da Brigada são mercenários porque se venderam a um país que os contratou.

Eles sempre serão nossos inimigos. Nunca deixaram de ser e, de Miami, continuam influenciando e apoiando este bloqueio contra nosso país.

É verdade que Obama esteve recentemente em Cuba e pediu a retomada do diálogo.

Mas ele também pediu para esquecer a história. A história não se esquece. Sempre a temos presente.

Heróis em Miami


A invasão da Baía dos Porcos é vista em Cuba como um ataque de traidores da pátria vendidos aos Estados Unidos.

Todo dia 19 de abril, é comemorado com marchas e paradas militares o que o governo cubano considera a "primeira grande derrota do imperialismo na América Latina".

Todo mês de abril, os cubanos que vivem na ilha celebram a vitória de Praia Girón,
 ‘o triunfo sobre um exército de mercenários e traidores'
A 145 quilômetros, no entanto, o sentimento é muito diferente.

Pelas ruas de Miami, ecoa a nostalgia do que poderia ter sido. Monumentos, museus e parques homenageiam os heróis da Brigada 2506.

Os sobreviventes não gostam de falar hoje, 60 anos depois, sobre quantos cubanos do outro lado mataram durante a invasão.

"A verdade é que prefiro não dizer. Sabíamos que íamos para a guerra, mas ninguém jamais vai dizer que gostamos de matar pessoas. No fundo, éramos todos irmãos ", diz López de la Cruz.

"Alguém vai matar ou ser morto. Hoje parece diferente, é verdade que éramos todos cubanos. Mas naquela época estávamos simplesmente pensando em libertar Cuba de todo o horror que estava acontecendo", reflete López Saldaña.

Os veteranos da Brigada ainda sonham em testemunhar em vida a queda do governo cubano.

Há dois presidentes americanos na história que eles têm dificuldade em perdoar: Kennedy e Obama.

"Kennedy não estava à altura. Foi uma estupidez porque, embora ele quisesse proteger os Estados Unidos, estava claro que eles estavam envolvidos. Com o passar dos anos, entendi sua decisão, mas é verdade que muita gente se sente traída e decepcionada com o que ele fez", diz López de la Cruz à BBC News Mundo.

‘A verdade é que prefiro não dizer. Nós sabíamos que íamos para a guerra, mas ninguém jamais
dirá que gostamos de matar pessoas. No fundo, éramos todos irmão' , diz López de la Cruz
Os veteranos são ainda mais críticos em relação a Obama.

"Ele quis cair nas graças do regime de Castro e negociar, mas foi ingênuo. Cuba abriu as portas para eles sem mudar nada. Foi uma política desastrosa ", diz López Saldaña.

Grande parte da comunidade cubana exilada na Flórida continua a apoiar uma política linha dura contra a ilha e venera ex-brigadistas como heróis no exílio.

"Temos uma satisfação tremenda. Cumprimos nosso dever, embora não tenhamos alcançado o objetivo. Aqui em Miami somos muito respeitados. O próprio Donald Trump se encontrou conosco várias vezes. Em setembro de 2020, na verdade, ele nos convidou para ir à Casa Branca. Estamos muito orgulhosos", reafirma López Saldaña.

Via BBC - Créditos: Pesquisa e reportagem: José Carlos Cueto / Edição: Daniel Garcia Marco e Liliet Heredero / Design e ilustração: Cecilia Tombesi / Programação: Catherine Hooper / Com a colaboração de Will Grant, Adam Allen e Sally Morales / Projeto liderado por Liliet Heredero e Carol Olona

Vídeo: Mario Name Tunô em Sorocaba, longarina trincada

Em 1996 na Aero Sport na cidade de Sorocaba, um susto...

Via Canal Porta de Hangar de Ricardo Beccari

Avião ultrapassa a pista do aeroporto de Ubatuba (SP), vai parar na praia e explode; piloto morreu

Piloto morreu e outras sete pessoas foram socorridas. Segundo a operadora do aeroporto, as condições meteorológicas no momento do acidente "eram degradadas, com chuva e pista molhada".


Uma pessoa morreu após o avião Cessna 525 CitationJet CJ1+, prefixo PR-GFS, ultrapassar a pista do aeroporto de Ubatuba, no Litoral de São Paulo, e explodir na Praia do Cruzeiro na manhã desta quinta-feira (9). Um vídeo mostra a aeronave saindo do aeródromo, passando a pista que margeia a praia e chegando à faixa de areia em chamas.


Inicialmente, a Prefeitura de Ubatuba havia informado que duas pessoas haviam morrido no acidente. Às 11h23, a administração municipal corrigiu a informação para apenas a morte do piloto.

O jato passando reto ao final da pista, em cena do vídeo apresentado abaixo
Cinco pessoas estavam na aeronave: o piloto morreu, segundo a Prefeitura de Ubatuba, e dois adultos e duas crianças foram resgatados com vida. Não há informações até o momento sobre o estado de saúde delas.

Três pessoas que estavam numa pista de skate que fica perto do local também foram socorridas. A Defesa Civil informou que cinco viaturas e 12 bombeiros atuam no local.


Segundo o Grupamento de Bombeiros Marítimo (GBMar), a aeronave passou por uma excursão de pista, que é caracterizada quando o avião sai da pista no momento de pouso ou de decolagem.


A Rede Voa, que administra o aeroporto, informou que o avião havia saído do Aeroporto Municipal de Mineiros, em Goiás, e tentou pousar em Ubatuba. Segundo a concessionária, "as condições meteorológicas eram degradadas, com chuva e pista molhada".

(Imagem: RadarBox)
A aeronave, com matrícula PR-GFS, modelo 525, foi fabricado em 2008 pela empresa Cessna Aircraft. Ela tem capacidade para sete passageiros, além de dois pilotos.

Segundo o sistema da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a aeronave estava com operação negada para táxi aéreo, mas com situação de aeronavegabilidade 'normal'.


Em nota, a Força Aérea Brasileira (FAB) disse que o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) foi acionado para a ocorrência e que, na ação inicial, são utilizadas técnicas específicas para realização de coleta e confirmação de dados, preservação dos elementos, verificação inicial de danos na aeronave, entre outras informações.

(Foto: João Mota/TV Vanguarda)
Com informações do g1, UOL, Aeroin e ASN

Aconteceu em 9 de janeiro de 2021: A queda do voo Sriwijaya Air 182 - Segurança dentro do orçamento


Em 9 de janeiro de 2021, um velho Boeing 737 voando para uma companhia aérea de baixo custo da Indonésia desapareceu do radar minutos após a decolagem de Jacarta. Dados de rastreamento de voo revelaram que o voo aparentemente normal chegou a um fim surpreendentemente repentino, virando e mergulhando direto no mar de 10.000 pés em menos de 30 segundos. 

Quando as equipes de resgate chegaram ao local nas águas próximas às Mil Ilhas, os únicos sinais do avião eram pedaços de detritos pulverizados flutuando na superfície do mar de Java – nenhuma das 62 pessoas a bordo havia sobrevivido.

Depois de uma busca meticulosa pelas caixas-pretas, um mergulho profundo nos aviônicos do avião e uma análise especulativa frustrante de algumas das ações mais desconcertantes dos pilotos, os investigadores indonésios divulgaram seu relatório final em novembro de 2022, finalmente revelando ao mundo como Sriwijaya 

O voo aéreo 182 terminou em desastre. A história não deve inspirar confiança na indústria aeronáutica do estado da Indonésia, já considerada uma das mais perigosas do mundo. É uma história de convergência de falhas em todos os níveis, da companhia aérea aos pilotos e ao próprio avião, o que nunca deveria ter acontecido em 2021, apresentando uma denúncia sombria da capacidade da Indonésia de aplicar as lições de inúmeros acidentes anteriores. .

Um cronograma de 2009 para Sriwijaya Air parece ter sido um exercício de colocar
tantas fontes diferentes em um pôster quanto possível
Em 2003, no alvorecer do boom da aviação na Indonésia, um grupo de empresários adquiriu um velho Boeing 737-200 e prometeu abrir uma companhia aérea de baixo custo. Eles batizaram sua empresa de Sriwijaya Air, um nome que transmitia as grandiosas ambições de seus fundadores, invocando o reino medieval de Srivijaya, que já governou grande parte do que hoje é a Indonésia e a Malásia. 

Como o reino, a companhia aérea começou pequena, usando seu único 737 para transportar passageiros entre Jacarta e Pangkal Pinang, cidade natal dos cofundadores Chandra e Hendry Lie. 

Em meados dos anos 2000, era quase impossível perder dinheiro operando uma companhia aérea na Indonésia, então a Sriwijaya Air começou a crescer rapidamente, levando um serviço de balsa concorrente à falência em alguns meses, à medida que expandia sua frota e sua programação. 

Na verdade, cresceu tão rapidamente que em 2011, oito anos após sua fundação, era a terceira maior companhia aérea da Indonésia e estava dando uma corrida pelo seu dinheiro à transportadora de bandeira Garuda. Tudo isso foi conseguido com base nos preços dos ingressos, que geralmente ficavam bem abaixo de 20 dólares.

Nos bastidores, no entanto, nem tudo estava bem. As finanças da Sriwijaya Air eram consideradas opacas, em grande parte porque a empresa ainda era propriedade de seus fundadores e rejeitou repetidamente os rumores de um IPO pendente. 

Em 2017, a companhia aérea estava perdendo dinheiro em grande escala, um fato que só se tornou aparente em novembro de 2018, quando Garuda anunciou uma aquisição por atacado das finanças e operações da Sriwijaya Air. Isso foi mais um resgate do que uma aquisição - o plano parecia ser reformar a empresa até que ela pudesse se tornar lucrativa e depois deixá-la ir. 

Mas a Sriwijaya Air não era um assunto fácil para a reforma, já que seus gerentes parecem ter concordado com o acordo apenas com relutância, e não estava claro quem pagaria uma dívida de $ 175 milhões que a companhia aérea havia acumulado em taxas não pagas para a estatal aeroportos, companhias de petróleo e a própria Garuda.

PK-CLC, o avião envolvido no acidente, visto aqui em 2019 (Foto: Leony Eka Prakasa)
A parceria entre Garuda e Sriwijaya Air era instável desde o início e, em setembro de 2019, parecia estar à beira do colapso. Em 25 de setembro, a Sriwijaya Air ameaçou desistir do negócio depois de demitir vários diretores da Garuda que alegou terem sido nomeados sem aprovação prévia. 

A Garuda respondeu na mesma moeda, removendo seus logotipos dos aviões da Sriwijaya Air, enquanto a empreiteira de manutenção da Sriwijaya Air, com sede em Cingapura, encerrou seus serviços por causa de dívidas não pagas. Os dois lados conseguiram se reconciliar brevemente, mas o negócio se desfez novamente em novembro de 2019, desta vez para sempre. Os detalhes são obscuros, mas foi alegado que a Sriwijaya Air não pagou sua dívida e ocultou isso de Garuda.

A Sriwijaya Air, de fato, saiu da parceria Garuda como uma casca de si mesma, sem gerenciamento sênior, empreiteiros de manutenção, engenheiros qualificados, instalações de manutenção, um manual de manutenção, peças sobressalentes, prestadores de serviços de assistência em terra e catering e muito mais, além de receitas insuficientes e grandes dívidas pendentes. 

Uma análise de risco interna concluiu que todos esses problemas precisavam ser corrigidos antes que a companhia aérea pudesse operar um único voo com segurança. A empresa parece ter se esforçado para preencher essas lacunas com velocidade notável, pois parece que seus serviços nunca foram completamente suspensos. A Diretoria Geral de Aviação Civil da Indonésia, ou DGCA, anunciou inspeções de emergência da companhia aérea após seu divórcio de Garuda, mas não está claro o que eles encontraram, já que nenhum relatório público surgiu.

De qualquer forma, quando 2019 passou para 2020, a Sriwijaya Air provavelmente estava em más condições, tanto financeira quanto operacionalmente. E então, do nada, veio a pandemia de Covid-19, fazendo com que as viagens aéreas despencassem em todo o mundo. Considerando essa confluência de eventos, é notável que a Sriwijaya Air tenha sobrevivido para ver o ano de 2021.

Os seis tripulantes do voo 182. Embora as fotos não estejam identificadas, o capitão Afwan e
o primeiro oficial Mamahit parecem ser o primeiro e o segundo da esquerda, respectivamente
Em dezembro de 2020, as viagens aéreas estavam começando a aumentar novamente, e a Sriwijaya Air, como as companhias aéreas de todo o mundo, estava chamando de volta a aeronave que havia sido aterrada durante a pandemia. 

Um desses aviões era o PK-CLC, um Boeing 737-524 (WL) de 26 anos construído em 1994 e transferido para a Sriwijaya Air em 2012. O PK-CLC ficou parado de 23 de março a 20 de dezembro de 2020, provavelmente devido ao coronavírus - o relatório oficial diz que estava em manutenção, mas a duração e o tempo do aterramento sugerem o contrário.

O PK-CLC estava de volta ao serviço há apenas três semanas quando voltou do portão em Jacarta na tarde de 9 de janeiro de 2021. O 737, com destino à cidade de Pontianak, estava com menos da metade, com apenas 56 passageiros a bordo, incluindo seis funcionários de Sriwijaya. Teriam sido 57, mas um passageiro teria sido recusado porque testou positivo para Covid-19.

Além dos 56 passageiros, o voo contava com seis tripulantes, incluindo quatro comissários de bordo e dois pilotos. No comando estavam o capitão Afwan, de 54 anos (que, como muitos indonésios, usa apenas um nome) e o primeiro oficial Diego Mamahit, de 34 anos. Ambos eram altamente experientes no Boeing 737, com quase 14.000 horas combinadas no tipo, de um total de 22.000 horas.

A rota do voo 182 da Sriwijaya Air
Às 14h36, horário local, o voo 182 decolou de Jacarta e começou a subir para 29.000 pés, conforme autorizado pelo Controle de Tráfego Aéreo. O tempo estava nublado com algumas trovoadas esparsas, mas fora isso normal. Assim como os eventos a bordo do avião, pois os pilotos realizavam checklists de rotina e monitoravam os sistemas de voo automático.

De acordo com os procedimentos padrão, os pilotos voaram com o piloto automático e o acelerador automático acionados logo após a decolagem. Em vez de manipular diretamente os controles, eles enviaram comandos para o piloto automático (que por sua vez se comunicava com o acelerador automático) usando o Painel de Controle de Modo, ou MCP. Usando o MCP, eles podiam inserir rumos, altitudes, velocidades e taxas de subida, e o piloto automático e o acelerador automático trabalhavam juntos automaticamente para atingir e manter esses valores-alvo.

Dois minutos após a decolagem, enquanto o voo 182 subia 5.400 pés, os pilotos usaram o Painel de Controle de Modo para alterar o modo vertical do piloto automático para “velocidade vertical” a fim de reduzir sua taxa de subida para a transição entre as fases de subida inicial e intermediária . Usando o botão de velocidade vertical no MCP, eles definiram uma taxa de subida de aproximadamente 2.000 pés por minuto.

Momentos depois, os pilotos avistaram uma tempestade à distância, e o primeiro oficial Mamahit perguntou ao capitão Afwan se eles deveriam virar à direita na direção nordeste de 070 graus para contorná-la. O gravador de voz da cabine não capturou a maioria das declarações do capitão Afwan, mas ele deve ter sugerido uma ligeira modificação do plano, já que Mamahit finalmente pediu ao controle de tráfego aéreo um desvio para 075 graus. O pedido foi concedido imediatamente. Com o modo lateral do piloto automático definido como “seleção de rumo”, o capitão Afwan usou o botão de rumo para inserir um valor alvo de 075˚ e o piloto automático começou a virar o avião para a direita.

Um exemplo de como seriam as alavancas de empuxo em um Boeing 737-500 durante uma condição de empuxo assimétrico. Observe que na foto o motor esquerdo está em alta potência, não o direito
Enquanto isso, a redução na taxa de subida comandada significava que menos potência do motor era necessária para manter a mesma velocidade no ar. Como resultado, o autothrottle começou a reduzir a potência do motor para evitar que a velocidade do avião aumentasse.

O acelerador automático do Boeing 737 controla automaticamente o empuxo do motor, acionando fisicamente as alavancas de empuxo no cockpit. Não há sistema de controle de motor separado - o sistema automático move as alavancas como um piloto faria, e a saída de empuxo é determinada pela posição das alavancas de empuxo, exatamente como no voo manual.

Quando o autothrottle comandava uma diminuição na potência do motor, um motor acionava para acionar as alavancas de empuxo para trás da posição de subida máxima. Normalmente as alavancas devem se mover juntas, mas desta vez, algo inesperado aconteceu: a alavanca de empuxo esquerda começou a rolar para trás, mas a manete de empuxo direita não se moveu. Como resultado, a configuração de potência do motor direito, medida em termos de velocidade de rotação do ventilador, ou N1, permaneceu em 91,8%, enquanto N1 no motor esquerdo começou a diminuir continuamente.

A princípio, ninguém notou. Enquanto isso ocorria, o controlador contatou o voo e instruiu os pilotos a nivelar a 11.000 pés para abrir espaço para o tráfego cruzado. Em resposta, o capitão Afwan redefiniu a altitude alvo no MCP para 11.000 pés. Trinta segundos depois, um toque soou para informar à tripulação que eles estavam a 1.000 pés de sua altitude alvo, e o primeiro oficial Mamahit anunciou que eles estavam se aproximando de 11.000.

O tempo todo, o avião permaneceu em uma curva para a direita, passando pelo norte em seu caminho para um rumo de 075. Mas com o motor direito ainda na subida máxima e o motor esquerdo ainda rolando para trás, a assimetria de empuxo tentou cada vez mais empurrar o avião para o outro lado, para a esquerda. Para neutralizar essa tendência, o piloto automático tinha que girar as rodas de controle dos pilotos cada vez mais para a direita.

A trajetória do voo 182, com suas principais mudanças de direção destacadas
Aproximadamente 40 segundos depois que as posições da alavanca de empuxo começaram a divergir, a velocidade N1 do motor esquerdo era de 62,7% e estava diminuindo, enquanto a velocidade N1 do motor direito ainda era de 91,8%. Nesse ponto, a assimetria tornou-se tão grande que o piloto automático teve que usar toda a sua autoridade de rolagem para manter o avião virando à direita. 

As colunas de controle dos pilotos atingiram 19 graus de deflexão para a direita e então pararam - embora os próprios pilotos pudessem ter virado muito mais longe, 19 graus de deflexão da roda de controle era o máximo que o piloto automático poderia comandar. Ainda assim, o tamanho da assimetria de empuxo continuou aumentando, até dominar o piloto automático. O avião atingiu uma proa de 046 graus, nivelou e começou a virar para a esquerda, mesmo com o piloto automático continuando seus esforços inúteis para virar para a direita.

Ainda aparentemente alheio ao problema, o primeiro oficial Mamahit gritou “definir padrão”, mudando a configuração da pressão barométrica da leitura local para o valor padrão. O avião estava rolando para a esquerda a uma taxa de cerca de um grau por segundo e aumentando, enquanto a alavanca de empuxo esquerda ainda estava rolando para trás, mas ninguém percebeu.

Naquele momento, o ATC instruiu o voo 182 a subir para 13.000 pés, e Mamahit leu a instrução. Esta seria a última comunicação do voo - na verdade, o desastre já estava a apenas alguns segundos de distância.

Capturado em meio ao ruído de fundo no microfone do primeiro oficial, o capitão Afwan podia ser ouvido dizendo: “Um três zero”.

“Um três zero”, Mamahit repetiu. O ângulo de inclinação ainda aumentava, passando 30 graus para a esquerda. A direção do avião passou de volta para o norte e começou a seguir na direção noroeste.

De repente, às 14h40 e três segundos, uma voz automática começou a gritar: “BANK ANGLE! BANK ANGLE!”

"Eh!?" exclamou o capitão Afwan.

"Ei, desculpe!" disse o primeiro oficial Mamahit.

“BANK ANGLE!” o alerta soou novamente.

“Bank angle!” Mamahit gritou.

O avião já estava inclinado 37 graus para a esquerda, além do ângulo máximo de rolagem normalmente usado em voo, quando soou o alerta de ângulo de inclinação. O alerta imediatamente capturou a atenção dos pilotos, e o capitão Afwan alcançou sua coluna de controle, desconectando o piloto automático com um alto alarme de carga de cavalaria. E então, aparentemente sem pensar, ele tentou se recuperar - virando ainda mais para a esquerda!

Este diagrama produzido com base na transmissão de dados ADS-B do voo mostra a
rapidez com que ele mergulhou no mar (Imagem via AFP e Flightradar24)
Afwan segurou o volante para a esquerda por apenas quatro segundos, mas quando percebeu seu erro e virou para o outro lado, o estrago já havia sido feito. Inclinando-se noventa graus para a esquerda, as asas perderam sustentação e o avião começou a descer. Quando eles viraram para um mergulho invertido, o primeiro oficial Mamahit gritou freneticamente: “Capitão, capitão! Chateado, chateado!”

Por um momento, 62 vidas estavam em jogo - e então o capitão Afwan selou seu destino. Desesperado para impedir o mergulho do avião, ele puxou o nariz para cima bruscamente, apenas para descobrir que puxar para cima enquanto invertido envia o avião direto para o solo. 

Em um piscar de olhos, o 737 mergulhou em espiral invertida, mergulhando em direção ao oceano apenas alguns milhares de pés abaixo. O rápido e arrepiante 'clackclackclack' do aviso de excesso de velocidade ganhou vida repentinamente ao exceder a velocidade máxima do 737. 

"Capitão! Capitão!", o primeiro oficial Mamahit gritou, enquanto o avião girava 360 graus, de cabeça para baixo e de volta para o lado direito. 

Segundos depois, o capitão Afwan conseguiu nivelar as asas e puxou o nariz quase nivelado, mas já era tarde demais. Com um rugido poderoso, o voo 182 da Sriwijaya Air mergulhou de barriga nas águas rasas do mar de Java a uma velocidade imensa, destruindo instantaneamente o avião e matando todos os 62 passageiros e tripulantes. Apenas 25 segundos se passaram desde o primeiro aviso de ângulo de inclinação.

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Na ilha vizinha de Lancang, o enorme impacto sacudiu as janelas com um som semelhante ao de um trovão. Na água, os pescadores se abaixaram para se proteger quando o acidente enviou estilhaços de metal e compósitos voando sobre suas cabeças, deixando o mar azul brilhante coberto com os restos retorcidos do 737. 

Alguns estavam tão perto que avistaram vermelho e vermelho. - detritos amarelos voando pela água diretamente abaixo deles. Essas e outras testemunhas correram para o local em seus barcos, esperando desesperadamente por sobreviventes, mas mal conseguiram encontrar algo maior que um metro quadrado. Era óbvio que ninguém havia sobrevivido.

Equipes de resgate retiram pedaços do 737 do mar de Java (Foto via New York Times)
Quando os serviços de resgate chegaram ao local, o resgate já era uma recuperação. Poucos, se é que algum corpo foi encontrado intacto. A destruição foi tão extensa que algumas vítimas nunca foram identificadas e os testes toxicológicos dos tecidos dos pilotos se mostraram impossíveis.

A investigação da causa do acidente coube ao Comitê Nacional de Segurança nos Transportes, conhecido pela sigla indonésia KNKT. Infelizmente, o cenário era muito familiar: esta era a terceira vez em pouco mais de seis anos que eles eram enviados para investigar a queda de um avião no mar de Java.

A primeira prioridade em qualquer investigação é encontrar as caixas-pretas, e neste caso não foi diferente. O gravador de dados de voo foi encontrado em poucos dias, mas quando os mergulhadores alcançaram o farol localizador do gravador de voz da cabine, descobriram que o gravador havia se desintegrado e o cartão de memória não estava à vista. 

Os investigadores do KNKT examinam um pedaço não identificado dos destroços (Foto: Reuters)
A única solução era vasculhar metodicamente o fundo do mar nas proximidades do local do acidente até que o cartão de memória fosse encontrado, não importa quanto tempo levasse - e até então, os investigadores teriam que aprender o que pudessem com o FDR.

Os dados revelaram que os primeiros três minutos de voo foram normais, até que o autothrottle tentou reduzir o empuxo para atingir a razão de subida mais baixa selecionada pela tripulação. Quando isso aconteceu, algo deu errado: o manete de potência direito não se moveu, enquanto o manete de potência esquerdo continuou girando até atingir a posição de marcha lenta de voo. 

O autothrottle parecia ter diminuído o empuxo no motor esquerdo para um nível bem abaixo do valor normal para aquela fase de voo, a fim de compensar o fato de que o motor direito ainda estava na potência máxima de subida. Mas isso não deveria ter acontecido - o autothrottle deveria ter se desconectado automaticamente bem antes disso, assim que uma grande diferença entre as posições da manete de potência fosse detectada. Isso deixou o KNKT com duas questões mecânicas: por que a alavanca de empuxo direita não se moveu quando foi comandada para fazê-lo e por que o autothrottle não desligou imediatamente?

Entre os escombros dispostos no cais, é possível ver uma peça com parte da
matrícula do avião, PK-CLC (Foto: ABC News)
Responder à segunda pergunta exigia que os investigadores mergulhassem na história e no projeto de um obscuro sistema de segurança chamado Cruise Thrust Split Monitor, ou CTSM. O Boeing 737–500 não saiu de fábrica com o CTSM instalado, mas a Boeing introduziu o sistema após uma série de incidentes envolvendo empuxo assimétrico com o autothrottle ativado, e sua instalação foi tornada obrigatória por uma diretriz de aeronavegabilidade da FAA em 2000. O avião do acidente estava entre os equipados com o sistema.

O CTSM foi projetado para desconectar o autothrottle se o autothrottle não puder corrigir uma assimetria de empuxo. Ele seria ativado apenas quando três critérios fossem satisfeitos. Primeiro, os sensores de posição do manete de empuxo tinham que detectar uma diferença significativa entre as posições dos dois manetes de empuxo, com o tamanho exato da diferença necessária dependendo de vários fatores, incluindo ajuste de flap e velocidade no ar. 

Em segundo lugar, o autothrottle não pode estar no modo dar a volta. E terceiro, como forma de redundância, os spoilers de voo – que são ativados para auxiliar os ailerons quando o piloto inclina o avião – precisavam ser desviados em mais de 2,5 graus. O movimento dos spoilers de voo indicaria que o piloto ou o piloto automático estava tentando compensar a assimetria de empuxo rolando contra ele, confirmando assim que a assimetria era, antes de tudo, real; e segundo, indesejável.

O tamanho médio das peças dos destroços fornece alguma indicação quanto à força do impacto (Foto: Reuters)
Se o sistema tivesse operado de acordo com suas especificações de projeto, deveria ter causado a desconexão do autothrottle dentro de alguns segundos após a diferença nas posições da alavanca de empuxo começar a se desenvolver por volta das 14h39:00. Em vez disso, o autothrottle permaneceu engatado, continuando a rolar para trás a alavanca de potência esquerda, tornando a assimetria progressivamente pior, até que finalmente desligou às 14h40:10. 

O fato de que acabou desativando sugeria que o sistema estava funcionando, embora com um atraso, e o tempo preciso forneceu uma pista do porquê. Na verdade, o acelerador automático foi desativado assim que o capitão Afwan girou o manche além dos 19 graus comandados pelo piloto automático. Isso sugeriu que o problema era que o sensor de posição do spoiler estava fornecendo ao CTSM um valor muito baixo. 

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Embora os spoilers tenham desviado mais de 2,5 graus quando o piloto automático girou o manche 19 graus para a direita, o valor enviado ao CTSM foi inferior a 2,5 graus, portanto o sistema não foi ativado. Quando o capitão Afwan moveu o manche ainda mais, a deflexão do spoiler aumentou, o valor transmitido ultrapassou 2,5 graus e o autothrottle foi desconectado. Mas a essa altura o motor esquerdo já estava em marcha lenta e o avião já estava fora de controle.

No final, os componentes relevantes da aeronave nunca foram encontrados, então o KNKT não conseguiu determinar por que os valores de deflexão do spoiler transmitidos ao CTSM eram muito baixos. A explicação mais provável, no entanto, era que o sensor havia sido manipulado incorretamente na última vez em que foi reparado. 

A Sriwijaya Air disse que nunca tocou no sensor de posição do spoiler, portanto, se esse fosse o caso, o problema provavelmente havia sido introduzido antes de 2012, quando o avião ainda estava em serviço nos Estados Unidos. A falta de qualquer exigência para inspecionar o sensor teria impedido a descoberta do problema até que ele se tornasse aparente durante o voo do acidente.

Algumas peças escolhidas foram apresentadas aos jornalistas em uma coletiva de imprensa
A segunda questão mecânica que os investigadores enfrentaram foi por que a alavanca de empuxo direita não se moveu da posição de subida máxima.

Como se viu, os investigadores do KNKT não foram os primeiros a perguntar. De fato, o histórico de manutenção do PK-CLC mostrou que, desde o primeiro relatório desse tipo em novembro de 2013, os pilotos registraram 65 falhas no autothrottle no registro técnico do avião e houve 61 relatos de empuxo assimétrico em voo, começando mais ou menos na mesma época. Esses relatórios continuaram periodicamente pelos próximos sete anos, até o acidente em 2021, embora os engenheiros realizassem ações corretivas todas as vezes.

Como os componentes do sistema de autothrottle foram quebrados em inúmeros pedaços no fundo do mar, a melhor maneira para os investigadores do KNKT reduzirem a causa das recorrentes dificuldades do autothrottle era examinando o que não poderiaser a causa, com base nas ações tomadas pelos engenheiros. 

Os investigadores observaram que a maioria das “ações corretivas” tomadas em resposta aos problemas do autothrottle consistiam em limpar os conectores no computador do autothrottle, reinstalar o computador e testar a integridade do software e hardware do computador usando seu teste integrado equipamento (BITE). Em cada caso, os testes BITE foram aprovados e o sistema voltou a funcionar. 

Obviamente, o fato de que o mau funcionamento continuou a ocorrer sugere fortemente que os conectores sujos não eram o problema. E, no entanto, os engenheiros continuaram a executar essas correções rápidas básicas repetidas vezes, aparentemente sem saber que esse era um problema crônico e que tudo o que estavam fazendo já havia sido tentado. 

Em seu relatório, o KNKT especulou abertamente que os engenheiros optaram por limpar os conectores e executar os testes BITE porque era fácil, não porque achavam que provavelmente resolveria o problema.

Um núcleo de motor muito danificado estava entre as maiores peças recuperadas (Foto: Tempo.co)
De acordo com os livros de registro, esses problemas ressurgiram quase imediatamente depois que o avião foi retirado do armazenamento pandêmico em dezembro de 2020. Em resposta, o computador do autothrottle foi substituído em 30 de dezembro. 

Portanto, o fato de o problema ter ocorrido novamente no voo do acidente provou que as repetidas avarias não eram resultado de um problema de computador. O servo autothrottle — motor que movimenta as alavancas de potência — também foi descartado, pois foi recuperado após o acidente e não foi encontrado nenhum defeito. O problema também não poderia estar no motor certo, já que foi substituído várias vezes entre 2013 e 2021.

Havia, no entanto, mais um grande suspeito: as ligações entre o servomotor e as próprias alavancas de empuxo. Embora essas articulações não tenham sido recuperadas, o atrito excessivo na articulação da alavanca de empuxo direita explicaria a recorrente assimetria de empuxo.

O motivo estava em um dispositivo chamado interruptor de torque do acelerador automático. O objetivo do interruptor de torque é permitir que o piloto anule o autothrottle aplicando força à alavanca de empuxo. 

Se o autothrottle encontrar mais de 2 libras de resistência ao tentar mover a alavanca de empuxo, a chave de torque irá desarmar, desconectando o servo motor da alavanca de empuxo afetada para que o piloto possa mover a alavanca sem lutar contra o motor. 

No entanto, se houver fricção excessiva na articulação, o interruptor de torque pode ser acionado mesmo quando o piloto não estiver cancelando o autothrottle, fazendo com que a alavanca de empuxo afetada pare inesperadamente de se mover durante a operação normal do autothrottle. Se apenas a articulação da alavanca de empuxo direita fosse afetada, a alavanca de empuxo esquerda teria continuado a se mover, criando a assimetria de empuxo.

Imagens subaquáticas mostram destroços de aviões misturados com objetos pessoais,
como uma mochila infantil da Marvel
Como se viu, havia um procedimento de solução de problemas no manual que acabaria levando os engenheiros de manutenção à origem do problema, mas durante todo o período de sete anos desde o início do mau funcionamento, ninguém jamais se referiu a ele. Esse tipo de falha não era inesperado; de fato, foi antecipado e contabilizado na árvore de solução de problemas produzida pelo fabricante. 

Mas, em vez de sentar e levar um dia para passar por todas as etapas, os engenheiros continuaram limpando os conectores, executando os testes BITE e chamando o problema de resolvido. Os registros indicaram que menos de 50% dos engenheiros sequer consultaram o manual de manutenção durante a solução de problemas do autothrottle e, quando o fizeram, referiram-se apenas às seções relacionadas aos testes BITE. Claro, os testes BITE no computador sempre passaram, porque o computador não era o problema.

A falha em realizar uma solução de problemas mais intensiva ocorreu porque o pessoal de manutenção da Sriwijaya Air não sabia que estava lidando com uma falha crônica e recorrente. Se tivessem, seria óbvio que suas ações foram inadequadas. Isso pode ter ocorrido devido ao mau estado dos serviços de manutenção da Sriwijaya Air após seu divórcio sangrento da Garuda, mas mesmo que tudo tivesse sido feito de acordo com as regras, a definição da companhia aérea de um “defeito recorrente” poderia ter obscurecido o problema. 

De acordo com a política da empresa, um defeito recorrente sujeito a medidas aprimoradas de solução de problemas foi aquele que ocorreu pelo menos três vezes durante um período de 15 voos ou menos. Como os aviões da Sriwijaya Air operavam voos frequentes de curta distância, esse limite era excessivamente restritivo, uma vez que 15 voos não somaram horas de voo suficientes para que a maioria dos defeitos ocorresse três vezes. O problema do autothrottle, que só foi relatado uma vez a cada poucas semanas, certamente não se qualificou.

Na superfície desse pedaço surrado de pele da fuselagem, cada sulco conta uma história (Foto: Reuters)
Dito isto, descobriu-se que os incidentes de assimetria de impulso no PK-CLC eram muito mais comuns do que os investigadores inicialmente foram levados a acreditar.

A Sriwijaya Air tinha um programa de monitoramento de dados de voo que procurava excedências nos dados baixados do Quick Access Recorder de cada avião, um gravador de dados de voo alternativo que não é protegido contra colisões e destina-se a fins de monitoramento e diagnóstico. 

A companhia aérea baixava regularmente os dados QAR do PK-CLC, mas não foi possível analisá-los porque não possuía os quadros de dados necessários para convertê-los em um formato legível. O KNKT o fez, no entanto, e quando leram os dados, ficaram surpresos ao descobrir que eventos de assimetria de empuxo ocorreram várias vezes em março de 2020, dezembro de 2020 e janeiro de 2021, todos sem serem relatados.

O padrão geral da maioria desses incidentes foi o mesmo: devido a uma mudança na fase de voo, o autothrottle tentaria reduzir o empuxo, mas o manete de empuxo direito travaria enquanto o manete de empuxo esquerdo continuava em movimento. 

Em alguns desses incidentes, o autothrottle se desconectava, mas na maioria das vezes não, provavelmente devido ao sensor de posição do spoiler com defeito. Os períodos resultantes de assimetria de empuxo duraram de 30 segundos a sete minutos antes que as alavancas de empuxo finalmente voltassem à sincronia. 

O KNKT entrevistou as tripulações que estavam voando PK-CLC durante sete desses incidentes e descobriu que cinco das sete tripulações não se lembravam de ter notado a assimetria de empuxo, nem nenhuma das tripulações registrou o evento no registro técnico do avião ou o relatou. para a companhia aérea.

Investigadores do KNKT examinam peças de um motor (Foto via New York Times)
Um desses casos em particular merece ser explorado com mais detalhes. O incidente ocorreu em 15 de março de 2020, oito dias antes da suspensão do PK-CLC devido à pandemia de Covid-19. 

Durante a subida inicial, o autothrottle tentou reduzir o empuxo, mas o manete de empuxo direito travou enquanto o manete de empuxo esquerdo continuou em movimento. A assimetria cresceu até que o piloto automático atingiu seu limite de autoridade, desviando o manche 19 graus para a direita; no entanto, isso foi insuficiente e o avião começou a inclinar para a esquerda. 

O comandante ordenou ao copiloto que virasse à direita, mas ao entrar na nova proa para o MCP, o avião não virou. Momentos depois, o ângulo de inclinação atingiu 41 graus para a esquerda, bem fora do envelope operacional normal, acionando avisos automáticos de “BANK ANGLE”. 

O capitão então assumiu o controle manual do avião, desativando o piloto automático e o acelerador automático, mas ele corrigiu demais, inclinando 28 graus para a direita antes de retornar ao nível das asas. Só agora o capitão percebeu o empuxo assimétrico e ajustou as alavancas de empuxo. Incrivelmente, nenhum dos pilotos relatou o grave incidente à companhia aérea ou o registrou no registro técnico.

A história acima foi relatada ao KNKT por meio dos dados do QAR e durante uma entrevista com o primeiro oficial. O capitão daquele voo, no entanto, não pôde ser entrevistado – porque era o mesmo capitão Afwan que morreu na queda do voo 182.

A polícia carrega um pedaço de destroços para o cais em Jacarta (Foto: ABC News)
Desnecessário dizer que este incidente e todos os outros levantaram sérias questões sobre as habilidades de pilotagem dos pilotos da Sriwijaya Air. Várias tripulações não perceberam o empuxo assimétrico do motor que persistiu por vários minutos, e alguns até permitiram que aumentasse a ponto de o piloto automático não conseguir controlar o avião. 

E, denunciando a cultura de segurança da empresa, a maioria desses pilotos não relatou os eventos, mesmo que percebessem, contribuindo para que a companhia aérea não identificasse a tendência. Embora as tripulações tenham relatado problemas de assimetria de propulsão 61 vezes entre 2013 e 2021, o número real de incidentes deve ter sido uma ordem de magnitude maior.

Claro, uma assimetria de impulso não é uma emergência. A solução é simplesmente desconectar o autothrottle, equalizar as alavancas de empuxo e continuar o voo. O fato de que existe uma assimetria deve tornar-se aparente para o piloto não voador durante a varredura normal dos instrumentos, seja observando a posição das próprias alavancas, detectando uma diferença nos parâmetros do motor ou captando o piloto automático movendo a roda de controle para compensar. 

O fato de que muitos pilotos nunca notaram ou notaram apenas quando os avisos de ângulo de inclinação soaram foi uma enorme bandeira vermelha sugerindo que os pilotos da Sriwijaya Air não estavam realizando suas varreduras normais de instrumentos nem perto do grau que seria esperado.

Um pedaço de destroços é transportado a bordo de um navio de recuperação (Foto: AFP)
Para saber mais sobre o que exatamente os pilotos do voo 182 estavam fazendo durante os 63 segundos entre o surgimento da assimetria e o primeiro aviso de ângulo de inclinação, o KNKT precisava encontrar o cartão de memória do gravador de voz da cabine que faltava. 

Por algum tempo após o acidente, houve dúvidas de que algum dia seria encontrado - mas no final, seus esforços valeram a pena. Em 30 de março de 2021, quase três meses após o acidente, os mergulhadores localizaram o cartão de memória perto da borda do campo de destroços e ele foi levado às pressas para uma instalação da KNKT para análise.

Infelizmente, se os investigadores esperavam uma descoberta da gravação do CVR, eles não conseguiram. O microfone do capitão Afwan sofreu um defeito não identificado que deixou seu canal no CVR em branco. A voz de Afwan só podia ser ouvida quando ele fazia chamadas de rádio ou quando falava alto o suficiente para ser captado pelo microfone do primeiro oficial. Na maior parte, a transcrição do CVR consistia em declarações desconexas do primeiro oficial Mamahit, com as respostas presumidas do capitão Afwan visivelmente ausentes.

O que a gravação deixou claro, no entanto, foi que nenhum dos pilotos estava ocupado com tarefas óbvias durante o período em que o avião rolou pelo nível das asas e começou a virar para a esquerda. Quando o primeiro oficial Mamahit gritou “aproximando-se de 11.000”, o avião ainda estava inclinado para a direita e, quando ele gritou “definir padrão” 17 segundos depois, ele estava inclinado para a esquerda. Durante esses 17 segundos, ele deveria ter tido tempo de sobra para olhar para sua exibição de voo principal e observar que o avião estava virando na direção errada. Por alguma razão, no entanto, ele não o fez - e provavelmente nunca saberemos exatamente o porquê.

As equipes de resgate transportam a bordo o que parece ser parte de uma roda de trem de pouso (Foto: Bloomberg)
De qualquer forma, a primeira vez que um dos pilotos notou que algo estava errado foi quando a margem esquerda ultrapassou 35 graus, acionando os avisos automáticos de “BANK ANGLE”. Nenhuma tripulação competente deveria ter permitido que o avião se desviasse tanto de seu caminho pretendido, mas o KNKT, no entanto, identificou vários fatores que poderiam ter contribuído para a falha em perceber o problema antes. 

Em primeiro lugar, o avião voava entre nuvens - não haveria um horizonte visível, cujo movimento em sua visão periférica poderia, de outra forma, alertá-los para o fato de que o avião estava girando. O fato de o avião estar se inclinando para a esquerda deve ter sido percebido observando-se os indicadores de atitude. 

No entanto, havia algumas pistas conflitantes, ou seja, que suas rodas de controle teriam sido desviadas para a direita quando o piloto automático tentou parar a curva à esquerda. Como eles esperavam que o avião estivesse virando à direita, as rodas de controle pareciam estar exatamente onde deveriam estar, e o viés de confirmação poderia ter levado os pilotos a subconscientemente ponderar essa indicação sobre outras indicações de que eles estavam realmente virando à esquerda.

Os investigadores do KNKT examinam um estágio de ventilador do motor (Foto: Bloomberg)
Mesmo quando o alarme de ângulo de inclinação soou, eles ainda não estavam em uma situação de emergência. O problema poderia ter sido facilmente corrigido rolando para a direita, desconectando o autothrottle e restaurando as alavancas de empuxo para suas posições corretas. 

Foi isso que o capitão Afwan fez no incidente de 15 de março. Mas desta vez, algo o pegou desprevenido, e ele imediatamente reagiu virando para o lado errado por quatro segundos, fazendo o avião rolar invertido. Agora eles realmente estavam em uma emergência.

O mesmo viés de confirmação que fez com que os pilotos não percebessem o aumento da margem esquerda provavelmente contribuiu para esse erro crítico. Se ele acreditasse que eles estavam se inclinando para a direita, como ele havia instruído a aeronave a fazer, então, quando os avisos de ângulo de inclinação soassem, o instinto do capitão Afwan teria lhe dito que o avião provavelmente estava se inclinando muito para a direita, não muito para a esquerda. 

Assustado com os avisos, sua resposta de luta ou fuga foi ativada e ele reagiu ao perigo percebido sem parar para avaliar se suas entradas eram razoáveis. Quando percebeu o erro e parou de virar à esquerda, o avião já estava de cabeça para baixo.

Nesse ponto, os dados do FDR mostraram que Afwan começou a voltar para a direita. Se isso fosse tudo o que ele tivesse feito, o controle provavelmente teria sido recuperado e este artigo teria sido escrito sobre algum outro acidente. Mas, em vez disso, Afwan cometeu um dos erros mais comuns - e mortais - ao se recuperar de atitudes incomuns: ele tentou puxar o nariz para cima enquanto o avião ainda estava de cabeça para baixo.

Um slide de uma apresentação promocional sobre UPRT no final dos anos 90 ou início dos anos 2000
A situação em que o capitão Afwan se encontrava era um cenário clássico do campo de Treinamento de Prevenção e Recuperação de Transtornos, ou UPRT. Pioneiro na década de 1990 e agora obrigatório em grande parte do mundo, incluindo a Indonésia, o UPRT foi projetado para apresentar aos pilotos atitudes perigosas de aeronaves, como combinações de pitch alto ou baixo, ângulos de inclinação altos e velocidade baixa ou alta, e fornece estratégias para ajudá-los a voar para fora.

Uma das lições que um piloto deve aprender no primeiro dia de treinamento de recuperação é que, quando o ângulo de inclinação é maior que 60 graus, o nivelamento das asas deve vir primeiro, não importa o que mais o avião esteja fazendo. Mesmo que o avião esteja perdendo altitude rapidamente, o piloto não pode levantar o nariz até que as asas estejam niveladas. 

Se for feita uma tentativa de puxar para cima quando o avião estiver inclinado entre 60 e 90 graus, o avião experimentará um estol acelerado, um evento terrível que não precisa ser descrito aqui em detalhes, mas você pode usar sua imaginação. E se o ângulo de inclinação for maior que 90 graus - isto é, se o avião estiver invertido - puxar para cima irá, logicamente, enviar o avião para o mergulho direto em direção ao solo.

Em vez de seguir esse conselho, no entanto, o capitão Afwan puxou o nariz bruscamente para cima enquanto invertido, fazendo com que o avião entrasse em um mergulho em espiral. O avião deu uma volta completa, seu ângulo de inclinação passando por 180 graus e saindo do outro lado, antes de rolar com o nariz apontado mais ou menos para baixo, mergulhando como um dardo em direção ao mar com uma taxa de descida máxima de -45.000 pés. por minuto. Nesse ponto, o voo estava condenado; embora o capitão Afwan tenha tentado se recuperar, simplesmente não havia espaço suficiente.

Outra visão de pedaços de destroços dispostos no cais (Foto via New York Times)
O KNKT achou preocupante que Afwan cometesse um erro tão básico, embora seus registros indicassem que ele havia passado por um treinamento de recuperação de transtornos, que era obrigatório na Indonésia desde 2018. 

Embora comentários em seu histórico de treinamento sugerissem que Afwan era um piloto abaixo da média - ele mal havia passado por vários exames com a nota de aprovação mais baixa possível - provavelmente ainda havia mais na história. 

Essa suposição foi confirmada quando os investigadores do KNKT observaram uma sessão UPRT no Sriwijaya Air. Quando eles se sentaram em um cenário de “recuperação de nariz baixo”, uma das primeiras coisas que notaram foi que a Sriwijaya Air havia feito modificações questionáveis ​​nas chamadas obrigatórias. 

Os procedimentos do fabricante para lidar com um problema de nariz baixo — definido como um ângulo de arfagem de -10 graus ou menos — exigia que o piloto não voador anunciasse “nariz baixo” e sugerisse ações corretivas. 

Por razões pouco claras, a Sriwijaya Air renomeou o nariz baixo para “Upset Brown”, presumivelmente referindo-se à cor da tela principal do voo durante tal perturbação, e bizarramente pediu que o piloto não voador fizesse uma chamada de socorro ao controle de tráfego aéreo antes de ajudar na recuperação.

Durante a sessão de treinamento real, mais problemas foram observados. O briefing do instrutor não explicou por que certos passos eram necessários e não mencionou que o ângulo de inclinação deve ser inferior a 60 graus antes de tentar recuperar o pitch. Erros comuns da tripulação e estratégias para evitá-los não foram discutidos. E nunca foi exibido um vídeo sobre a recuperação de transtornos descrito no programa.

Depois que a simulação começou, o desempenho dos 'traines' foi ruim. Durante um cenário de nariz baixo e alto ângulo de inclinação, o piloto estagiário tentou nivelar o nariz antes de nivelar as asas, resultando em um estol acelerado. A recuperação do estol acelerado só foi realizada por insistência do instrutor. 

E durante uma segunda execução do mesmo cenário, o piloto em treinamento permitiu que a aeronave entrasse em uma condição de excesso de velocidade, que novamente exigiu a intervenção do instrutor antes que pudesse ser corrigida. A conclusão geral foi que nem os instrutores nem os alunos entenderam para que servia o UPRT, por que era importante ou como realizar as manobras de recuperação corretamente. 

Não é de admirar, então, que o capitão Afwan não tenha conseguido se recuperar do transtorno a bordo do voo 182 - aplicar os cenários de treinamento incoerentes a um piloto já abaixo da média foi simplesmente uma receita para o desastre.

Trabalhadores de recuperação transportam um corpo de um dos navios de salvamento (Foto: Reuters)
No final, o KNKT apontou o dedo diretamente para a companhia aérea pelas falhas mecânicas e humanas que levaram ao acidente. As práticas inadequadas de manutenção da empresa, a falta de ênfase em relatórios de incidentes e os engenheiros mal treinados permitiram que um problema recorrente persistisse por sete anos, e seu treinamento de pilotos de má qualidade deixou muitas tripulações despreparadas para lidar até mesmo com os menores transtornos durante o voo. Na verdade, foi um milagre que a companhia aérea tivesse operado por tanto tempo sem um acidente grave.

Vale a pena parar para observar que o voo 182 da Sriwijaya Air foi o único acidente fatal de um jato de passageiros em qualquer lugar do mundo em 2021. A maior parte do mundo conseguiu acumular recordes de segurança impressionantes nos últimos anos, mas a Indonésia continua a experimentar um grande perda de um jato de passageiros aproximadamente a cada dois anos, dos quais o voo 182 da Sriwijaya Air é apenas o último. 

Para piorar a situação, muitos desses acidentes são bastante semelhantes: ocorre um problema mecânico administrável ou mesmo trivial, os pilotos permitem que ele se agrave até se encontrarem em uma situação complicada, e então entram em pânico e jogam seu avião no mar. Todas as vezes, o KNKT conduz uma investigação bastante decente, recomendações são emitidas e a DGCA promete reformas - mas nada realmente muda. Então, por que devemos acreditar que desta vez é diferente? A única resposta real é que não deveríamos.

Outro corpo é retirado do local (Foto: Republika)
A reação inicial da DGCA à queda do voo 182 foi a mesma de sempre - fazer um show para o público, ordenando inspeções arbitrárias de um conjunto arbitrário de aviões sem saber por que o avião caiu e sem dizer aos inspetores para olhar para qualquer coisa em particular. Essas inspeções são um flagrante teatro de segurança e são realizadas apenas porque a DGCA não quer ou não pode tomar ações mais substanciais. 

No papel, pelo menos, algumas mudanças foram feitas - uma força-tarefa da DGCA foi estabelecida para garantir que as companhias aéreas implementassem adequadamente seus programas de treinamento de recuperação de problemas, e a Sriwijaya Air fez uma série de reformas, desde a revisão de seu programa UPRT até a melhoria do treinamento de solução de problemas para engenheiros.

A Boeing também anunciou um boletim de serviço pendente, que deve ser apoiado por uma diretiva vinculativa de aeronavegabilidade, o que exigiria inspeções recorrentes dos sensores de posição do spoiler nos aviões da série Boeing 737 Classic. Mas, no final, os sinais de uma revisão sistêmica do sistema regulatório na Indonésia permanecem praticamente ausentes.

Parentes das vítimas espalharam flores no local do acidente em Thousand Islands (Foto: AP)
Como dito em artigos anteriores, o problema na Indonésia não é realmente a falta de regras - no papel, suas normas de segurança não são muito diferentes das de qualquer outro país. A questão é uma falta generalizada de fiscalização e um sentimento de impunidade entre os executivos das companhias aéreas, que muitas vezes desfrutam de amplas conexões políticas. 

Depois de tantos acidentes causados ​​pelo mesmo conjunto de fatores em uma companhia aérea disfuncional após outra, fica-se com a sensação de que ninguém, dos executivos aos pilotos e aos inspetores da DGCA, realmente sabe o que está fazendo, e aqueles que sabem provavelmente estão sendo subornados para fingir que não. O resultado é a Sriwijaya Air, uma companhia aérea que, em qualquer país em funcionamento, teria sido suspensa quando se separou de Garuda, mas que, por estar na Indonésia, ainda voa hoje,

Embora este artigo gaste muito tempo mergulhando nos detalhes do que os sistemas automatizados estavam fazendo e o que os pilotos poderiam estar pensando, é impossível escapar do fato de que este foi um acidente que nunca deveria ter acontecido em 2021. 

Sabemos como evitar acidentes como este, e sabemos disso há décadas. Sabemos treinar pilotos que não perdem o controle de aviões perfeitamente controláveis ​​por falta de atenção. Sabemos como detectar defeitos mecânicos recorrentes e como corrigi-los. Sriwijaya Air simplesmente não se preocupou em aprender. 

E se a DGCA não puder aprender por eles, então em algum momento no próximo ano ou dois outro avião cairá na Indonésia, e outros artigos como este estarão sendo escritos novamente. Se não forem, considere isso uma vitória. Enquanto isso, no entanto, um aviso será suficiente: "se você tiver que voar em uma companhia aérea de baixo custo na Indonésia, cuidado - você pode apenas obter o que você paga".

Edição de texto e imagens por Jorge Tadeu (Site Desastres Aéreos)

Com informações de Admiral Cloudberg, ASN e Agências de Notícias.