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No ano de 1967, a Vasp adquiriu seis Nihon YS-11 e batizou-os de “Samurais”, nome-fantasia que homenageava o Japão, país de origem do avião. A Cruzeiro do Sul já vinha operando com sucesso onze desses turboélices desde 1966. Equipado com duas turbinas Rolls-Royce Dart de 3.060 HP, o “Samurai” transportava sessenta passageiros nas rotas da Vasp de médio curso e grande densidade de tráfego.
Na quarta-feira, 12 de abril de 1972, o NAMC YS-11A-211 “Samurai”, prefixo PP-SMI, da VASP, decolou do Aeroporto de Congonhas às 20h30min com destino ao Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro.
Transportava 19 passageiros e seis tripulantes sob a responsabilidade do comandante Zenóbio Torres, de 29 anos, há seis anos na Vasp, empresa na qual acumulava 6.517 horas de voo. O copiloto Carlos Alberto de Abreu Valença, de 28 anos, com 3.462 horas de voo, recentemente concluíra o curso de adaptação ao YS-11.
Também integravam a tripulação do PP-SMI os comissários Edite Martins, de 24 anos, e Josemar Jacome da Costa, de 19 anos. Viajavam como tripulantes extras o comandante Pedro Bartolo, de 41 anos, instrutor de rota do equipamento YS-11, e o comandante de Viscount Leonel de Mattos Rocha, de 36 anos.
Alguns dos ocupantes do avião (Imagem: Jornal do Brasil)
Entre os passageiros encontravam-se o Brigadeiro Mario Calmon Eppinghaus, comandante da Escola de Oficiais Especialistas e de Infantaria de Guarda (EOEIG) da Aeronáutica, e Aarão Knijnik, diretor-executivo da Shell do Brasil, sobrevivente do incêndio que destruíra o Edifício Andrauss, em São Paulo, alguns anos antes.
O tempo bom fazia prever um voo de rotina. O PP-SMI subiu para 10 mil pés de altitude e prosseguiu pela aerovia Âmbar Meia (A-6), mão única no sentido de São Paulo ao Rio de Janeiro, na época balizada pelos radiofaróis (NDB) de Mogi Guaçu, Santa Cruz, Afonsos e Quebec, este último situado na Ilha dos Ferros. O tempo estimado de voo era de uma hora, e a chegada ao Rio estava prevista para as 21h30min.
Às 21h15min, o PP-SMI chamou o controle de aproximação (APP) do Rio, informando que passava a posição “Cará”, fixo de entrada do terminal (TMA) do Rio – área circular de cem quilômetros de raio com centro nas proximidades do Aeroporto do Galeão.
Naquele momento, o Samurai voava a dez mil pés (3.300 metros) de altitude. A partir daí, o APP orientou o PP-SMI a descer para 7 mil pés na proa do NDB de Santa Cruz, devendo informar no bloqueio daquele radiofarol. Minutos mais tarde, o PP-SMI acusou no bloqueio de Santa Cruz, sendo autorizado a prosseguir descendo para cinco mil pés na proa do NDB de Afonsos.
Às 21h24min, o Samurai da Vasp informou o bloqueio do NDB de Afonsos a cinco mil pés, sendo liberado para três mil pés na proa do NDB Q (Quebec), devendo reportar o bloqueio daquele auxílio. Esta foi a última transmissão do Samurai.
Jornal do Brasil, 14.04.1972
Na tarde do dia seguinte, seus destroços foram localizados em Muriqui, distrito de Secretário, município de Petrópolis, a 46 km do Campo dos Afonsos e a 64 km do Aeroporto Santos Dumont.
Com exceção de algumas poucas nuvens esparsas, as condições meteorológicas na TMA RJ eram excelentes. O teto e a visibilidade eram praticamente ilimitados, e todos os auxílios à navegação e aproximação funcionavam normalmente.
A cauda e o leme estavam quase intactos, mas toda a fuselagem, exceto a cabine do piloto, pegou fogo com o impacto
Os corpos dentro de sacos aguardando serem içados pelos helicópteros de resgate
Os dois minutos transcorridos entre a última mensagem transmitida pelo piloto do Samurai, informando o bloqueio de Afonsos, e o momento do impacto com a Serra Maria Comprida evidenciaram que o avião jamais chegou realmente a bloquear o radiofarol do Campo dos Afonsos, posição possivelmente informada com base apenas em navegação estimada.
Uma linha reta unindo o Aeroporto de Congonhas ao local do acidente formava um ângulo de oito graus com a rota que o PP-SMI deveria ter percorrido. O vento em altitude, que soprava no quadrante sul, poderia ter concorrido para o desvio, porém os pilotos contavam com vários auxílios eletrônicos de navegação para corrigi-lo.
Na TMA RJ estavam disponíveis os VORs de Piraí, Caxias, Itaipu Açu, além dos radiofaróis de Santa Cruz, Nova Iguaçu, Afonsos, Galeão, Santos Dumont, Ilha dos Ferros (Quebec) e Ilha Rasa. Os investigadores teriam que procurar as respostas para suas dúvidas na cabine de comando do Samurai.
A Serra Maria Comprida, em Petrópolis, o local do acidente (Foto: Trilhas de Petropolis)
Há muito se sabe que o nível de alerta dos pilotos varia em razão direta ao grau de dificuldade do voo.
Naquela noite, o céu era ‘de brigadeiro’, e o voo até o Rio tão fácil quanto voltar para casa dirigindo o próprio carro após um dia de trabalho. O Samurai estava com 30 por cento de sua capacidade e havia dois comandantes voando como ‘extras’. É possível que ao menos um deles estivesse na cabine de comando, o que pode ter ensejado uma conversação descontraída entre colegas de profissão.
Após o través de Ubatuba, o próximo ‘fixo compulsório’ (posição a ser informada ao órgão de controle de tráfego aéreo) da A-6 era ‘Cará’, entrada da TMA RJ, posição virtual estabelecida pela marcação magnética 092 graus do radiofarol de Santa Cruz e por determinada radial do VOR de Barra do Piraí.
É provável que o primeiro elo da cadeia de eventos que conduziu ao acidente tenha sido gerado quando o VOR de Piraí foi sintonizado para determinar a posição ‘Cará’. Possivelmente por alguma falha de operação (o copiloto talvez ainda não estivesse bem familiarizado com todas as peculiaridades do Samurai), o VOR de Piraí tenha sido inadvertidamente selecionado como ‘fixo ativo de navegação’, fazendo com que o piloto automático tomasse a proa de Piraí em vez da proa de Santa Cruz, manobra discreta que pode ter passado despercebida aos pilotos.
Provavelmente o Samurai passou à esquerda de Santa Cruz e ainda mais à esquerda do Campo dos Afonsos, tendo o bloqueio desses dois NDB sido equivocadamente informado com base apenas em navegação estimada.
Provavelmente, os pilotos não perceberam que o avião tomara a proa de Piraí. Talvez distraídos pela conversa com os ‘extras’, imaginavam que o Samurai continuava no rumo do Rio. Na hipótese de terem observado que os ponteiros dos ADF indicavam Santa Cruz e Afonsos ligeiramente à direita, podem ter acreditado tratar-se de pequeno desvio, que não inspirava maiores cuidados.
A percepção de que havia algo de muito errado com o voo deve ter-lhes assaltado ao sintonizarem o NDB Q (Quebec), auxílio básico de procedimento de descida que deveriam executar. Em vez do ponteiro ADF indicar a proa, apontou a lateral direita, levando Torres e Valença a desconfiarem da correção dos sinais recebidos daquele radiofarol. Há indícios de que tentaram sintonizar um dos VORs do Rio quando o avião se chocou contra a encosta da serra.
Folha de S.Paulo, 14.04.1972
Somente alguns anos após o acidente os VORs instalados no Brasil passaram a ser equipados com DME (equipamento medidor de distância), que informa a distância em milhas náuticas a que o avião se encontra do auxílio sintonizado. Como, na época, o APP RJ não dispunha de radar, o controlador não “enxergava” o avião e, portanto, não tinha como detectar eventuais erros de posição geográfica dos pilotos.
A investigação concluiu que a causa provável do acidente foi a baixa qualidade da navegação que vinha sendo realizada pelos pilotos e o procedimento inadequado dos mesmos com relação ao voo por instrumentos.
O acidente foi atribuído a erro de pilotagem pela falta de correção da deriva e pelo fato de os pilotos terem determinado o bloqueio fixo da aerovia, à noite, valendo-se apenas da navegação estimada.
A segurança de voo se fundamenta em elevado nível de alerta. Não é por outra razão que a maioria dos acidentes ocorre em casa, lugar onde as pessoas sentem-se seguras, imunes aos perigos do mundo exterior. Por sentirem-se assim, tendem a se expor a perigos inusitados que, na melhor das hipóteses, redundam em ossos quebrados e temporadas em hospitais.
Por paradoxal que possa parecer, a facilidade do voo talvez tenha concorrido para o acidente. Uma conversa informal na cabine de comando com os tripulantes extras pode ter distraído os pilotos.
É possível que a pouca familiarização de Valença com algumas das peculiaridades do sistema diretor de voo do Samurai tenha originado o erro operacional que levou o bimotor na direção das montanhas que circundam Piraí.
A partir da década de 1970, o sistema de controle de tráfego aéreo brasileiro foi sendo progressivamente dotado de radares.
Atualmente, todos os aviões que percorrem nosso espaço aéreo são permanentemente vigiados e controlados. Tudo isso, somado à introdução de sistemas independentes de navegação inercial e por satélite, reduziu drasticamente o risco de voltarem a acontecer acidentes causados por erro de posição geográfica dos pilotos, como o que destruiu o Samurai PP-SMI da Vasp naquela noite de outono.
Na ocasião do acidente, chegou a ser desprezada a versão oficial que apontava falha de navegação. Eram muitos os pontos contraditórios: pilotos muito experientes que faziam ao menos quatro voos diários pela ponte-aérea; a noite estava clara com luar e sem nuvens; e a torre do aeroporto Santos Dumont não registrou nenhuma indicação de anomalia no nesse voo.
Um único ponto pode se apontar como negativo: naquela época, os passageiros não eram vistoriados nos embarques, como acontece hoje em qualquer lugar do mundo. Isso possibilitava a um passageiro embarcar armado se assim o desejasse.
Com todos esses ingredientes, a imprensa da época passou a especular a possibilidade de que poderia ter havido um tumulto a bordo, causando o misterioso acidente.
Claro que ninguém sobreviveu para contar o motivo que levou a aeronave de fabricação japonesa, o YS-11 (Samurai) a se chocar com a serra, assim como o Rio de Janeiro – por ser uma cidade de grandes proporções – não pode ser confundida, muito menos por uma tripulação experiente, que a cruzou sem se dar conta disso.
Na verdade o YS-11, nunca foi visto com bons olhos pelos passageiros que costumavam usar com certa regularidade a Ponte Aérea RJ/SP, que viam com certa apreensão quando esse equipamento estava designado para o horário, causando um desconforto geral.
A partir desse acidente, o Electra II passou a ser o avião exclusivo da ponte-aérea.
Sem caixa-preta para “contar a história”, a causa real desse acidente tornou-se um mistério insolúvel.
Relato de Ângelo Teixeira de Branco, um passageiro que não pôde embarcar no voo que se acidentou
"Estava de mudança do Rio e, no dia 12/04/1972, estava em São Paulo providenciando a compra de um imóvel.
Porém, faltava um documento para conseguir o financiamento na CEF - Caixa Econômica Federal. Teria que ir com urgência ao Rio para buscá-lo. Precisava chegar ao Rio, ir até a Tijuca, pegar a chave do apto da Muda, pegar o documento na Muda, voltar a Tijuca para deixar a chave do apartamento da Muda, dar um beijo na esposa e filho, ir até a rodoviária pegar ônibus para São Paulo e... chegar na CEF às 10 horas da manhã seguinte.
Nesse dia 12, cheguei em Congonhas por volta das 19:30h. Fui ao guichê comprar passagem e havia uma pessoa na minha frente comprando a sua. Tocou o telefone, a moça do caixa conversou com alguém, desligou e acabou de atender o comprador.
Chegou a minha vez. Iria pegar o voo da ponte aérea, o próximo voo com destino ao Rio de Janeiro.
- Uma passagem para o próximo voo.
- Próximo voo apenas às 20:30h. – disse a moça.
- Mas você acabou de vender uma passagem para as 20 hs! Os passageiros estão ali esperando para embarcar – disse eu apontando para a área de embarque.
- Infelizmente já informei o número de passageiros e não posso mais vender passagem para esse voo. Agora só para as 20,30h.
- Tudo bem, fazer o quê?
Embarquei às 20:30 hs. Voo tranquilo. Devido a minha pressa, desci do avião e, correndo para pegar um Táxi, fui o primeiro a chegar ao saguão do aeroporto.
Havia pessoas esperando no desembarque, homens, meninos, mulheres (esposas?), etc... Antigamente as pessoas da família iam buscar os entes queridos nos aeroportos.
Fui praticamente barrado no saguão:
- Esse voo é o das 20 hs? – perguntaram as pessoas que estavam na espera.
- Não. Esse é o das 20:30 hs – disse e continuei andando, homens e mulheres atrás de mim insistindo:
- O Senhor tem certeza?
Para cessar o assédio, quase no ponto de Táxi, mostrei minha passagem.
O avião YS-11 da VASP, o Samurai, havia caído sem deixar sobreviventes. Acho que foi o último Samurai.
É uma sensação horrível você se dar conta que aquele avião que saiu antes não chegou, olhar a expressão no rosto daquelas pessoas... a reação é uma coisa indescritível.
Toda vez que tenho notícia de queda de avião começa na minha mente aquele filme do saguão do aeroporto. É muito triste..."
No aeroporto, as lágrimas depois de quinze horas de esperanças impossíveis
Ficha técnica
Data: 12.04.1972
Hora: 21h26min
Aeronave: NAMC YS-11A-211 “Samurai”
Operadora: VASP - Viação Aérea São Paulo
Prefixo: PP-SMI
Número de Série: 2059
Primeiro voo: 1968
Tripulantes: 6
Passageiros: 19
Partida: Aeroporto de Congonhas (CGH/SBSP), São Paulo, SP
Destino: Aeroporto Santos Dumont (SDU/SBRJ), Rio de Janeiro, RJ
Local da ocorrência: Petrópolis, RJ
Fatalidades: os 25 ocupantes: 6 tripulantes e 19 passageiros
O 'Samurai'
Dois 'Samurai's': um da Vasp e outro da Cruzeiro do Sul (Foto: wetwing.com)
O NAMC YS-11 é um avião turbo-hélice construído por um consórcio japonês, o Nippon Aircraft Manufacturing Corporation. O programa foi iniciado em 1954 pelo MITI - Ministry of International Trade and Industry (Ministério de Comércio Internacional e Indústria).
Seu primeiro voo foi em 1962, e sua produção terminou em 1974. As variantes YS-11A-211 e YS-11A-212, com incremento na capacidade de peso, foram adquiridas pela Vasp.
(Com informações do livro “O Rastro da Bruxa”, de Carlos Ari César Germano da Silva e do Blog Hideo in japan - Fotos do local do acidente: Revista Veja, edição 189, de 19 de abril de 1972)
Por décadas, as instalações da Força Aérea da Área 51 de Nevada representaram o olho de um furacão conspiratório que gira em torno de "evidências" de que alienígenas (e sua tecnologia) existem e estão se escondendo atrás de suas paredes. Livros, programas de TV e até mesmo "incursões" on-line em massa tentaram vislumbrar além de seus sinais nítidos de advertência contra invasores.
Enquanto os alienígenas não estão fixando residência no complexo, o que está acontecendo lá é tão interessante.
No meio do deserto de Nevada estéril, há uma estrada não marcado empoeirada que leva ao portão da frente da Área 51. Ele é protegido por pouco mais de uma cerca de arame, um portão de crescimento, e intimidante sinais invasão. Alguém poderia pensar que a muito mitificada base militar ultrassecreta dos Estados Unidos estaria sob guarda mais próxima, mas não se engane. Eles estão assistindo.
Além do portão, as câmeras veem todos os ângulos. No topo de uma colina distante, há uma caminhonete branca com um para-brisa escurecido olhando para baixo em tudo. Os moradores locais dizem que a base conhece todas as tartarugas e lebres do deserto que pulam a cerca. Outros afirmam que há sensores embutidos na estrada que se aproxima.
O que exatamente acontece dentro da Área 51 levou a décadas de especulação selvagem. Existem, é claro, as conspirações alienígenas de que os visitantes da galáxia estão escondidos em algum lugar lá dentro. Um dos rumores mais interessantes insiste que o infame acidente de Roswell em 1947 foi na verdade uma aeronave soviética pilotada por anões mutantes e os destroços permanecem no terreno da Área 51. Alguns até acreditam que o governo dos EUA filmou o pouso na lua de 1969 em um dos hangares da base.
Apesar de todos os mitos e lendas, a verdade é que a Área 51 é muito real - e ainda muito ativa. Pode não haver alienígenas ou um filme de pouso na lua ambientado dentro dessas cercas, mas algo está acontecendo e apenas alguns poucos estão a par do que está acontecendo mais adiante naquela estrada de Nevada varrida pelo vento e monitorada de perto.
"O aspecto proibido da Área 51 é o que faz as pessoas quererem saber o que está lá", diz o historiador aeroespacial e autor Peter Merlin, que pesquisa a Área 51 há mais de três décadas. "E com certeza ainda há muita coisa acontecendo lá."
Aeronave de reconhecimento de alta altitude U-2, no final dos anos 1950
As origens de um mistério
O início da Área 51 está diretamente relacionado ao desenvolvimento da aeronave de reconhecimento U-2 . Após a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética baixou a Cortina de Ferro em torno de si e do resto do bloco oriental, criando um quase apagão de inteligência para o resto do mundo. Quando os soviéticos apoiaram a invasão da Coréia do Sul pela Coréia do Norte em junho de 1950 , ficou cada vez mais claro que o Kremlin expandiria agressivamente sua influência. Os Estados Unidos se preocuparam com a tecnologia, as intenções e a capacidade da URSS de lançar um ataque surpresa - apenas uma década depois do ataque japonês a Pearl Harbor.
No início dos anos 1950, a Marinha e a Força Aérea dos Estados Unidos enviaram aeronaves de vôo baixo em missões de reconhecimento sobre a URSS, mas corriam o risco constante de serem abatidas. Em novembro de 1954, o presidente Eisenhower aprovou o desenvolvimento secreto de uma aeronave de reconhecimento de alta altitude chamada de programa U-2 . Uma das primeiras ordens do negócio foi rastrear um local remoto e secreto para treinamento e testes. Eles o encontraram no sul do deserto de Nevada, perto de uma planície salgada conhecida como Groom Lake, que já foi um campo de tiro aéreo da Segunda Guerra Mundial para os pilotos do Army Air Corps.
Conhecido por sua designação de mapa como Área 51, este local no meio do nada tornou-se uma nova base militar ultrassecreta. Para convencer os trabalhadores a virem, Kelly Johnson, um dos principais engenheiros do projeto U-2, deu-lhe um nome mais atraente: Paradise Ranch.
Criando um mito
Os testes do U-2 começaram em julho de 1955 e, imediatamente, surgiram relatórios sobre avistamentos de objetos voadores não identificados. Se você ler os detalhes em um relatório da CIA de 1992 que foi desclassificado com redações em 1998 (e posteriormente divulgado quase na íntegra em 2013), é fácil ver por quê.
Muitos desses avistamentos foram observados por pilotos de linhas aéreas comerciais que nunca tinham visto uma aeronave voar em altitudes tão elevadas como o U-2. Enquanto os aviões de passageiros de hoje podem voar até 45.000 pés de altura , em meados da década de 1950 as companhias aéreas voavam em altitudes entre 10.000 e 20.000 pés. Aeronaves militares conhecidas podem chegar a 40.000 pés, e alguns acreditavam que o vôo tripulado não poderia ir mais alto do que isso. O U-2, voando em altitudes superiores a 60.000 pés, teria parecido completamente estranho.
Na foto ao lado, Kelly Johnson, à esquerda, e Francis Gary Powers com um avião U-2 atrás. Powers acabou sendo derrubado na URSS em 1960.
Naturalmente, os oficiais da Força Aérea sabiam que a maioria desses avistamentos inexplicáveis eram testes do U-2, mas não tinham permissão para revelar esses detalhes ao público.
Assim, "fenômenos naturais" ou "pesquisa climática de alta altitude" tornaram-se explicações essenciais para avistamentos de OVNIs, inclusive em 1960, quando o U-2 de Gary Powers foi derrubado sobre a Rússia .
O que também é interessante sobre o relatório de 2013 mais recente é que ele confirma a existência da Área 51. Embora a versão de 1998 tenha redações significativas ao fazer referência ao nome e localização do local de teste U-2, a versão quase não redigida de 2013 revela muito mais, incluindo várias referências à Área 51, Lago Groom e até mesmo um mapa do área.
"Esta é a tecnologia da Terra"
As operações do U-2 foram interrompidas no final dos anos 1950, mas outras aeronaves militares ultrassecretas continuaram os testes na Área 51. Ao longo dos anos, o A-12 e várias aeronaves stealth como Bird of Prey, F-117A e TACIT BLUE foram desenvolvidos e testado no deserto de Nevada. Mais documentos desclassificados revelam o papel da Área 51 no "Projeto Tem Donut", uma tentativa dos anos 1970 de estudar MiGs soviéticos obtidos secretamente.
"Eles voaram com eles [sobre a Área 51].. e colocaram nossos próprios caças contra eles para desenvolver táticas", diz Merlin, "Eles aprenderam que você não pode vencê-lo, mas pode fugir dele. E ainda está acontecendo hoje... Agora, em vez de ver MiG-17s e 21s, há MiG-29s e SU-27s."
Os voos estão em andamento. Em setembro de 2017, um tenente-coronel da Força Aérea foi morto em circunstâncias misteriosas quando seu avião caiu em Nevada e o Pentágono não identificou imediatamente a aeronave. Parece que provavelmente ele estava voando em um jato estrangeiro obtido pelos Estados Unidos.
Mesmo assim, as conspirações alienígenas ganharam terreno em 1989, quando Bob Lazar afirmou em uma entrevista no noticiário local de Las Vegas que tinha visto alienígenas e ajudado a fazer a engenharia reversa de naves alienígenas enquanto trabalhava na base. Muitos desconsideraram isso como ficção e até se ofenderam com a ideia, incluindo Merlin, que passou anos conversando com ex-engenheiros e funcionários da Área 51, irritados com todo o alarido sobre o ET
"Alguns estão até loucos porque trabalharam nessas coisas e construíram esses aviões incríveis", diz Merlin. "Isso é tecnologia da Terra. Algumas pessoas afirmam que é extraterrestre quando se trata do bom e velho know-how americano."
Vista aérea da Área 51, em 20 de julho de 2016
A verdade está lá fora
Hoje, a Área 51 ainda está muito em uso. De acordo com o Google Earth , novas construções e expansões acontecem continuamente. Na maioria das manhãs, os visitantes com olhos de águia podem ver luzes estranhas no céu se movendo para cima e para baixo. Não, não é um OVNI. Na verdade, é a companhia aérea semissecreta que usa o indicativo "Janet", que transporta os trabalhadores do Aeroporto McCarran de Las Vegas para a base.
Quanto ao que está acontecendo atualmente na base militar mais secreta da América, poucos sabem com certeza. Merlin tem algumas suposições bem fundamentadas, incluindo tecnologia furtiva aprimorada, armas avançadas, sistemas de guerra eletrônica e, em particular, veículos aéreos não tripulados. Chris Pocock, notável historiador do U-2 e autor de vários livros sobre o assunto, disse à Popular Mechanics que acredita que aeronaves classificadas, formas mais exóticas de comunicação de rádio, armas de energia direcionada e lasers estão atualmente em desenvolvimento na base.
Embora a tradição em torno da Área 51 possa não ser nada mais do que ficção imaginativa, isso não impedirá as pessoas de ficarem boquiabertas além das cercas de arame. "No nível mais básico, sempre que você tem algo secreto ou proibido, é da natureza humana", diz Merlin. "Você quer descobrir o que é."
Como explorar a Área 51
Fato ou ficção, os alienígenas são uma grande atração turística. Em 1996, o estado de Nevada renomeou a Rota 375 como "Rodovia Extraterrestre" e destinos como o Alien Research Center e o Little A'Le'Inn (na cidade de Rachel com uma população de cerca de 54) pontilham a estrada.
A oeste da Área 51, há o Alien Cathouse, que é anunciado como o único bordel com tema alienígena do mundo. Geocaching também atrai visitantes aqui, já que a rodovia é considerada um "mega-ensaio", com mais de 2.000 geocaches escondidos na área.
Depois, há a base real. Embora entrar não esteja nas cartas para a maioria, os civis curiosos podem dirigir até os portões da frente e de trás. Os locais irão direcioná-lo, e o site Dreamland Resort é um grande recurso cheio de mapas, instruções de direção e relatos em primeira mão.
No entanto, deve-se ter cuidado ao planejar uma jornada para a Área 51. Afinal, é o deserto, então traga bastante água, lanches e tenha equipamento adequado para clima - para os dias quentes e as noites frias. Provavelmente, o serviço de telefone e o GPS não funcionarão, portanto, faça impressões e mapas reais. Postos de gasolina são poucos e distantes entre si, então carregue combustível sobressalente e pneus.
Além disso, lembre-se de que o governo realmente não quer que você investigue a Área 51. Merlin e Pocock confirmaram que foram observados de perto ou até mesmo intimidados por guardas e seguranças (incluindo um F-16 sobrevoando). Você não pecar em qualquer circunstância ou detenções e multas pesadas esperam por você.
Esta história foi publicada originalmente em 14 de setembro de 2017 na Popular Mechanics.
Foi um desastre que abalou o mundo: no dia 10 de abril de 2010, o presidente polonês Lech Kaczyński foi morto, junto com outros 95, quando o avião presidencial da Polônia caiu em uma floresta na Rússia, sem deixar sobreviventes. O governo da Polônia foi lançado em tumulto, abalado pelas mortes repentinas de vários altos funcionários, comandantes militares e membros do parlamento. Enquanto a nação inteira lutava para compreender a escala da tragédia, tanto a Polônia quanto o mundo queriam saber: a queda do avião presidencial de Kaczyński foi um acidente ou um ato de guerra?
Não importa a causa, ficou imediatamente claro que nenhuma resposta satisfaria a todos. De fato, doze anos depois, o debate continua em todos os níveis da sociedade polonesa, tendo o acidente sido incorporado à caixa de ferramentas retórica da elite política e mitificado pela população em geral. Grande parte desse debate não tem nada a ver com segurança da aviação e tudo a ver com política, já que as linhas de argumentação são avançadas com mais frequência do que não por pessoas com pouco conhecimento de aviões. O que se segue é uma tentativa de cortar essa névoa de incerteza, voltar aos fatos e reconstruir o que realmente aconteceu nos dias, horas e minutos críticos que levaram ao acidente do voo 101 da Força Aérea Polonesa.
Lech Kaczyński, à esquerda, e seu irmão Jarosław, à direita (Jacek Turczyk)
Em dezembro de 2005, Lech Kaczyński foi empossado como presidente da Polônia, tendo conquistado 54% dos votos em uma disputa acirrada contra o candidato rival Donald Tusk. Esta foi a primeira grande eleição para o recém-criado partido populista conservador de Kaczyński, "Lei e Justiça", que ele fundou em 2003 ao lado de seu irmão gêmeo idêntico Jarosław, mas os dois dificilmente eram novatos políticos. A carreira política de Kaczyński remonta ao movimento Solidariedade no final dos anos 1980, quando ele participou das greves que levaram ao colapso do governo alinhado aos soviéticos da Polônia.
Durante a década de 1990 e o início dos anos 2000, ele oscilou entre várias posições, incluindo o parlamento, onde atuou tanto no Senado quanto no Sejm (a câmara baixa), bem como no governo do presidente Lech Wałęsa, onde ocupou o cargo de Ministro da Segurança antes de ser demitido em 1992, e mais tarde como Ministro da Justiça e Procurador-Geral do Primeiro-Ministro Jerzy Buzek, um cargo do qual foi novamente demitido após menos de dois anos.
Autoridades soviéticas observam a escavação de uma vala comum na Floresta de Katyn em 1943 (Warsaw Institute Review)
No entanto, sua retórica anticorrupção franca o tornou popular com o público, e quando ele e seu irmão se separaram do movimento Solidariedade para fundar a Lei e Justiça em 2003, ele estava bem posicionado para se tornar uma grande força política. Não foi nenhuma grande surpresa, então, que ele tenha vencido a eleição para a Presidência em 2005. E seis meses depois disso, ele nomeou seu irmão para o cargo de Primeiro-Ministro, finalmente consolidando o controle dos gêmeos Kaczyński sobre a política polonesa.
No cargo, Kaczyński se concentrou em educar os poloneses e o mundo sobre os crimes cometidos contra a Polônia pela Alemanha nazista e pela União Soviética. Um dos mais significativos deles foi o Massacre de Katyn, uma atrocidade horrível realizada sob as ordens de Lavrentiy Beria, o chefe da polícia secreta de Stalin (ou NKVD), após a invasão da Polônia em 1939.
Foto do Massacre de Katyn
Buscando eliminar uma geração inteira de especialistas militares poloneses, a NKVD executou sistematicamente cerca de 22.000 oficiais e intelectuais poloneses ao longo de abril de 1940, muitos dos quais foram posteriormente enterrados em uma vala comum na Floresta de Katyn, fora da cidade de Smolensk, no oeste da Rússia.
As autoridades soviéticas não admitiriam seu envolvimento no massacre até 1989, quando o Secretário-Geral Mikhail Gorbachev reconheceu que Beria e Stalin haviam ordenado os assassinatos e expressaram "profundo arrependimento" por suas ações.
Em 2010, ainda havia muito atrito entre a Polônia e a Rússia sobre até que ponto as feridas infligidas pelo massacre tinham sido, ou deveriam ser, reconciliadas.
Uma placa na entrada do memorial do massacre de Katyn, perto de Smolensk, enfatiza 8.000 vítimas soviéticas do terror de Stalin, que não foram mortas no massacre de Katyn e não estão enterradas em Katyn, em detrimento das vítimas polonesas, exemplificando o relacionamento complicado da Rússia com o crime (Ponars Eurasia)
Naquele ano, com o 70º aniversário do massacre se aproximando, o presidente russo Dmitry Medvedev e o primeiro-ministro Vladimir Putin fizeram várias propostas indicando que a reconciliação estava na mesa, já que um documentário sobre o massacre foi ao ar na Rússia pela primeira vez, e Putin convidou autoridades polonesas e membros da oposição para comparecer a um serviço memorial no local do massacre.
A cerimônia planejada prometia ser um grande evento na história das relações polaco-russas, e a lista de convidados logo foi preenchida com estratos inteiros da elite polonesa, incluindo o presidente Kaczyński, que agora estava se preparando para concorrer a um segundo mandato.
No entanto, devido a disputas políticas internas sobre as próximas eleições, Kaczyński e a maior parte da delegação do governo acabaram organizando seu próprio evento, fazendo planos para comparecer a uma cerimônia separada em 10 de abril, enquanto Donald Tusk e membros de seu partido centrista Plataforma Cívica prosseguiram com o evento original em 7 de abril, que foi organizado por Vladimir Putin.
A rota do voo do acidente. (Google + trabalho próprio)
Para comparecer à cerimônia, a delegação polonesa precisou viajar para a cidade de Smolensk, uma cidade de cerca de 330.000 pessoas na fronteira da Rússia com a Bielorrússia. O problema era que o sistema de transporte de Smolensk era centrado em sua ligação ferroviária para Moscou, o que para a maioria dos moradores era mais barato do que voar e não muito mais lento, deixando poucos motivos para desenvolver a infraestrutura aérea da cidade.
O único aeroporto comercial em Smolensk era pequeno demais para lidar com algo maior do que um jato regional e não tinha serviços aéreos regulares desde o início dos anos 2000. Este aeroporto não podia acomodar o Tupolev Tu-154 de três motores e médio alcance que a Força Aérea Polonesa usava como aeronave presidencial. Isso significava que o presidente Kaczyński e sua delegação tinham apenas duas opções: voar para Moscou e pegar transporte terrestre para Smolensk ou pousar o avião presidencial no outro aeroporto da cidade: um antigo campo de aviação militar conhecido como Smolensk Norte.
Para a equipe do Presidente, a escolha era óbvia — que chefe de Estado tem tempo para passar tanto tempo na estrada quando há um aeroporto adequado disponível?
Smolensk Norte como era pouco antes do acidente (Google)
O problema era que o Aeroporto Smolensk Norte estava em um estado semi-abandonado com infraestrutura que variava de precária a inexistente. O aeroporto já foi o lar de uma fábrica para o extinto escritório de design de aeronaves Yakovlev, mas em 2010 a fábrica já havia fechado há muito tempo.
O aeroporto também já foi o lar do 401º Regimento de Aviação Interceptador da União Soviética, mas eles saíram em 1991, e o 103º Regimento de Transporte Aéreo Militar de Guardas saiu em 2009, deixando apenas uma pequena equipe de esqueleto para manter a base aérea.
Oficialmente, Smolensk Norte foi então transferido para uso militar-civil conjunto, mas dado que nenhum avião da Força Aérea Russa estava baseado lá e o principal clube de aviação privado de Smolensk usava o Aeroporto Smolensk Sul, é improvável que Smolensk Norte tenha visto muito tráfego, se houver, nos seis meses que antecederam abril de 2010.
A “torre de controle” de Smolensk Norte (Rádio Maria)
Qualquer um que visitasse o Aeroporto Smolensk Norte poderia dizer que ele estava em um estado lamentável de abandono. A pista estava cheia de rachaduras, os pátios de estacionamento estavam cheios de cerca de uma dúzia de transportes Ilyushin Il-76 abandonados, e não havia prédios, exceto por um barraco de um andar cercado por ervas daninhas.
O aeroporto não tinha uma verdadeira torre de controle, nenhum sistema de pouso por instrumentos e nenhum farol VOR. Seu sistema de iluminação de aproximação consistia em holofotes amarelos de fabricação duvidosa montados em cima de postes de madeira podres, alguns dos quais estavam quebrados ou escondidos dentro de arbustos crescidos. Várias árvores, tendo crescido descontroladamente desde a década de 1990, tomaram conta do terreno pouco antes do limite da pista.
Objetos abandonados aleatórios espreitavam nas margens das pistas de táxi. No geral, não era um aeroporto que inspirasse confiança e, na verdade, era mais provável que incutisse no visitante casual uma sensação de deslocamento nervoso, como se ele tivesse entrado em um pedaço da história industrial esquecida que estava a caminho de se tornar a Zona do Stalker de Tarkovsky.
A aeronave envolvida no acidente em voo (Dmitry Karpezo)
No entanto, era a maneira mais conveniente de levar a delegação polonesa ao memorial do Massacre de Katyn, e planos foram feitos tanto pelo lado polonês quanto pelo lado russo para prepará-lo para a chegada da aeronave presidencial.
A Força Aérea Russa despachou uma unidade da cidade de Tver para assumir os serviços de controle de tráfego aéreo, que operariam a partir do barraco acima mencionado usando o radar da era soviética que já estava instalado. Um observador meteorológico também foi despachado, que faria verificações periódicas de visibilidade subindo no telhado do barraco usando uma escada e espiando ao redor de um Il-76 estacionado.
Sob essa configuração ad-hoc, Donald Tusk e sua delegação chegaram e partiram do Aeroporto Norte de Smolensk no dia 7 de abril sem maiores problemas. Agora era hora do Presidente e sua delegação ainda maior seguirem o exemplo.
Voar o Presidente da Polônia era dever do 36º Regimento de Aviação Especial da Força Aérea Polonesa, que operava dois Tupolev Tu-154s e vários jatos menores Yakovlev Yak-40 para uso de altos funcionários.
O Tupolev Tu-154M, prefixo 101, da Força Aérea da Polônia (foto acima), era o avião presidencial designado, e seria esta aeronave que levaria Kaczyński para Smolensk, voando em comboio com um dos Yak-40s, que levaria jornalistas do pool de imprensa do presidente. Além do presidente, mais 87 passageiros e oito tripulantes.
No comando da Força Aérea Polonesa 101 no dia 10 de abril estavam quatro pilotos do 36º Regimento. A tripulação era composta pelo Capitão Arkadiusz Protasiuk, de 36 anos; o copiloto Major Robert Grzywna, de 36 anos; o navegador Tenente Artur Ziętek, de 32 anos; e um engenheiro de voo, de 37 anos, o Suboficial classe dois Andrzej Michalak.
Os quatro pilotos e três comissários de bordo que compunham a tripulação do voo malfadado. (Lenta.ru)
A percepção popular sustenta que os pilotos que pilotam presidentes são a nata da safra, a elite da elite, os aviadores mais bem treinados e capazes que um país pode oferecer. Em alguns lugares, esse pode ser o caso, mas na Polônia decididamente não foi. Na verdade, a tripulação do voo 101 naquele dia era, pelos padrões da companhia aérea, novata completa.
Embarcar em um turboélice de 19 passageiros operando voos de passageiros nos Estados Unidos provavelmente lhe daria uma tripulação com tanta ou mais experiência de voo. O capitão Protasiuk, que era de longe o membro mais experiente da tripulação, tinha cerca de 3.400 horas de voo no total — provavelmente não o suficiente para ser capitão de qualquer grande companhia aérea dos EUA.
O copiloto, Major Grzywna, tinha apenas 1.700 horas no total, menos de 200 das quais no Tu-154; o navegador Tenente Ziętek tinha cerca de 1.060 horas, menos de 60 delas no Tu-154; e o engenheiro de voo Michalak tinha apenas 329 horas no total.
O mapa de aproximação usado pelos pilotos para o voo para Smolensk Norte (MAK)
Mas, alguém pode perguntar, eles certamente eram mais bem treinados do que qualquer piloto civil? E a resposta, novamente, teria sido não. Na verdade, a qualidade do treinamento deles era significativamente pior do que se encontraria em qualquer companhia aérea comercial. Eles não tinham treinamento em simulador algum, já que o 36º Regimento não possuía ou alugava um simulador Tu-154.
Eles não tinham treinamento em Crew Resource Management (CRM), o princípio fundamental do trabalho em equipe e comunicação modernos na cabine. E eles estavam usando um manual de operações da tripulação de voo do Tu-154 que foi traduzido para o polonês sem o conhecimento do fabricante e não era atualizado desde 1994.
O Yak-40 que transportou a equipe de imprensa para Smolensk (Björn Strey)
Enquanto isso, em Smolensk, o clima estava piorando. Embora a previsão do tempo tivesse previsto que a neblina se dissiparia à medida que a manhã avançasse, uma inversão generalizada de temperatura havia de fato levado à formação de um denso banco de neblina que estava começando a rolar sobre o Oblast de Smolensk.
A tripulação do Yak-40 que transportava a equipe de imprensa, que deixou Varsóvia cerca de uma hora e meia antes do voo 101, começou a encontrar a neblina enquanto desciam em direção ao Aeroporto Norte de Smolensk, ouvindo enquanto os relatórios de visibilidade do observador meteorológico diminuíam rapidamente, de quatro quilômetros às 9h00 para dois quilômetros seis minutos depois.
Quando o Yak-40 estava na aproximação final, a neblina havia descido perigosamente perto das condições mínimas de visibilidade do aeroporto de 1000 metros lateralmente e 100 metros verticalmente. Procurando a pista através das nuvens que se acumulavam, a tripulação do Yak-40 emergiu sobre o limite em uma altitude muito alta, levando alguém na cabine de controle a exclamar: "Porra, dê a volta, porra, ele precisa dar a volta!"
“Dê a volta!”, o controlador disse ao Yak-40. Mas a tripulação não respondeu, em vez disso, empurrou o avião para baixo na pista. Enquanto o rugido dos motores a jato enchia o barracão, o controlador da torre soltou uma exclamação cheia de palavrões: “Vamos, [de jeito nenhum], ele vai [porra] pousar aqui, ele vai pousar bem aqui!”
“…Ele estava se aproximando bem”, disse alguém.
“Touchdown,” o controlador anunciou. E para o Yak-40, que tinha acabado de desobedecer sua ordem direta de dar a volta, ele disse, “Papa Lima zero três um, backtrack após o pouso. Bom trabalho.” Ele não fez nenhuma tentativa de esconder o fato de que achou as ações imprudentes do piloto impressionantes.
“Você viu como ele passou do limite!?” alguém acrescentou ao fundo.
Poucos minutos depois, o chefe assistente da unidade militar em Smolensk Norte disse ao seu superior por telefone: “Bem, eles se aproximaram bem. Acho que eles têm equipamento lá, em uma aeronave como essa… Falando francamente, pensei que eles dariam a volta”.
Cerca de doze minutos após o Yak-40 pousar, o voo 101 da Força Aérea Polonesa finalmente partiu de Varsóvia com o Presidente, a Primeira Dama e outros altos funcionários a bordo. O voo foi remarcado das 8h00 (horário local de Smolensk) para as 9h00, depois foi atrasado mais 27 minutos, ficando uma hora e meia atrás do cronograma original do Presidente. Se eles fossem atrasados por muito mais tempo, a cerimônia teria que ser adiada.
Às 9h27, o voo 101 decolou de Varsóvia e seguiu para o leste no voo de aproximadamente 75 minutos para Smolensk. A tripulação tinha apenas a previsão do tempo desatualizada e errônea emitida naquela manhã, e provavelmente não estavam totalmente cientes das condições que poderiam esperar encontrar. Na verdade, eles não pareciam ter nenhuma previsão precisa do tempo para o Aeroporto Norte de Smolensk.
“Posso também obter temperatura e pressão?”, perguntou o engenheiro de voo Michalak às 10h11.
“Como eu poderia saber (ininteligível)?” respondeu o navegador Ziętek.
“Não sei,” interrompeu o Capitão Protasiuk. “Bem, vou lhe dizer qual é a temperatura: fria!”
Seu comentário foi recebido com muitas risadas.
Pouco mais de dez minutos depois, já descendo de 3.900 metros, a tripulação fez o primeiro contato com a unidade militar que administrava os serviços de controle de tráfego aéreo para o Aeroporto Smolensk Norte, indicativo de chamada “Korsazh”. Os controladores militares falavam apenas russo, não inglês, então o Capitão Protasiuk — o único membro da tripulação que era fluente em russo — teve que assumir o rádio.
Ao mesmo tempo, ele não podia razoavelmente pedir ao seu primeiro oficial inexperiente para voar a difícil aproximação para este aeroporto duvidoso em condições meteorológicas marginais, então ele continuou a pilotar o avião também. Normalmente, o piloto que não estava voando operaria o rádio, mas neste caso parecia que ele não tinha escolha a não ser quebrar o protocolo.
Neste ponto, os controladores militares sabiam perfeitamente bem que a visibilidade estava muito abaixo dos 1000 metros necessários para se aproximar do aeroporto, e eles parecem ter assumido que os pilotos também sabiam disso. Na verdade, uma das primeiras perguntas que Korsazh fez foi: "Qual é seu aeródromo alternativo?"
“Vitebsk, Minsk”, respondeu o Capitão Protasiuk. Ele não parecia estar ciente, nem os planejadores de voo estavam cientes, de que o aeroporto alternativo do voo em Vitebsk, Belarus, não estava aberto nos fins de semana, e hoje era sábado.
Um mapa da rota do voo com trechos selecionados do CVR escolhidos pelo MAK (MAK)
Agora o controlador deu à tripulação sua primeira indicação real do clima. “PLF 101, há neblina em Korsazh, visibilidade de 400 metros”, ele disse.
“Temperatura e pressão, por favor”, respondeu Protasiuk.
“A temperatura está em mais dois, a pressão está em 745, 745, não temos condições de pouso”, disse o controlador.
“Obrigado, mas se possível, tentaremos uma abordagem”, disse Protasiuk. “Mas se o tempo não estiver bom o suficiente, daremos a volta.”
Simultaneamente, o piloto do Yak-40, que agora estava sentado no pátio, chamou o voo 101 e começou a falar com o copiloto, Major Grzywna. “Nós lhe damos as boas-vindas de coração”, ele disse. “Você sabe, geralmente é uma merda absoluta aqui? A visibilidade é de aproximadamente 400 metros, e pelo nosso julgamento a base da nuvem é consideravelmente menor que 50 metros.”
“E você já pousou?” Grzywna perguntou.
“Bem, tivemos sorte o suficiente para pousar no último minuto”, respondeu o piloto do Yak-40. “Mas, se eu fosse honesto, diria que você pode tentar, é claro. Se não der certo depois de duas aproximações, então sugiro que voe para Moscou ou algum lugar.”
“Bem, ok, vou passar isso para Arek. Tchau,” Grzywna disse, desligando.
Naquele momento, o Diretor de Protocolo Diplomático do Ministério das Relações Exteriores entrou na cabine. Suas palavras foram captadas apenas fracamente no fundo do gravador de voz da cabine.
“Na visão deles, a visibilidade é de cerca de 400 metros e o limite inferior é de 50 metros”, disse Grzywna a ele.
A resposta do Diretor estava confusa demais para ser transcrita.
“Não, eles conseguiram fazer isso”, disse Grzywna. “Eles também dizem que há neblina.”
Mais uma vez, o Diretor de Protocolo disse algo ininteligível.
“Sr. Diretor, a neblina apareceu”, disse o Capitão Protasiuk. “No momento, nas condições que temos, não conseguiremos pousar. Tentaremos, faremos uma aproximação, mas provavelmente não teremos sucesso. Se ficar (ininteligível), o que devemos fazer?”
“…?”
“Não temos combustível suficiente para esperar tanto tempo”, disse Protasiuk, respondendo à sugestão não ouvida do Diretor.
“Bem, então temos um problema”, disse o Diretor de Protocolo, sua voz finalmente soando alta o suficiente para ser ouvida.
“Poderíamos esperar por meia hora e depois ir para um aeroporto alternativo”, sugeriu Protasiuk.
“Qual alternativa?”
“Minsk ou Vitebsk.”
Reconhecendo a informação, o Diretor de Protocolo deixou a cabine para informar o Presidente sobre a situação.
Enquanto o voo 101 descia por 1.500 metros, um Ilyushin Il-76 russo fez duas tentativas de pouso, mas não conseguiu avistar a pista em ambas as aproximações. Testemunhas avistaram duas vezes o Il-76 mal rompendo o fundo da neblina, cada vez a menos de 100 metros acima do solo e significativamente à esquerda da linha central da pista, antes de subir de volta para as nuvens e informar os controladores que eles estavam desviando para Moscou.
Momentos depois, chamando novamente a tripulação do Yak-40, Grzywna perguntou: “E os russos já chegaram?”
“O Ilyushin deu duas voltas e agora parece que foi para outro lugar”, respondeu o piloto do Yak-40.
Enquanto isso, a tripulação começou os preparativos para a aproximação final. Até ouvir do Presidente, o plano de Protasiuk parecia ser continuar a aproximação, mas estar preparado para dar a volta no provável evento de não ter sucesso. Isso significava que eles precisariam voar a aproximação NDB para a pista 26 — um procedimento altamente desatualizado e impreciso. Para voar a aproximação, eles precisariam ajustar seus localizadores automáticos de direção (ADFs) para captar os sinais de dois beacons não direcionais (NDBs), chamados de marcador do meio e marcador externo, que ficavam ao longo da linha central estendida da pista.
Ao alinhar o avião com os dois NDBs, eles poderiam se alinhar com a pista, embora o processo exigisse voo manual intensivo para manter o avião reto, além do controle manual total da altitude do avião. Era muito mais difícil do que as aproximações do sistema de pouso por instrumentos (ILS) completo com as quais os pilotos estavam acostumados.
Ao informar o procedimento, o navegador Ziętek disse: “Infelizmente, não temos ILS. O curso de pouso 259 está estabelecido. Nossos ADFs estão prontos, 310/640 ajustados. Cinco, seis, controle automático de empuxo.” Embora ele tenha mencionado corretamente os ADFs, eles não seriam o instrumento primário que os pilotos usariam durante a aproximação: eles tinham, de fato, configurado uma série de coordenadas de GPS no sistema de gerenciamento de voo e planejavam usar o sistema para auxiliá-los no alinhamento com a pista.
Agora o controlador os liberou para 500 metros. Se a visibilidade tivesse sido boa o suficiente, eles estariam a minutos de pousar, mas o aeroporto estava completamente lotado, e um pouso seguro era impossível.
Uma testemunha tirou esta fotografia do Il-76 durante uma de suas duas aproximações malsucedidas (Comitê Estadual de Investigação de Acidentes)
Às 10h30, quando o avião se aproximava dos 500 metros, o Diretor de Protocolo retornou à cabine. “Ainda não há decisão do Presidente sobre o que fazer a seguir”, ele relatou, antes de sair rapidamente de novo.
A notícia significava que o Capitão Protasiuk permaneceria em um estado de limbo de tomada de decisão. Ele ainda não sabia se o Presidente aceitaria um desvio para um aeroporto alternativo, ou se ele insistiria em forçar um pouso que ele claramente sabia que era perigoso. E até que ele obtivesse uma resposta, ele tinha pouca escolha a não ser continuar com o plano para uma abordagem sem saída.
“Vamos nos aproximar para pousar”, disse Protasiuk, informando a tripulação sobre suas intenções. “E em caso de uma aproximação perdida, vamos dar a volta no modo automático.”
Seu plano demonstrou um baixo entendimento dos sistemas de voo automático do Tu-154. Só era possível pressionar o interruptor de arremetida e voar uma arremetida automática se o modo vertical do sistema de voo automático estivesse definido como "glide slope". Visto que o Aeroporto Norte de Smolensk não tinha equipamento de glide slope para o sistema de voo automático rastrear e, portanto, não podia entrar no modo glide slope, não era possível executar uma arremetida automática neste aeroporto.
Capitão Protasiuk na cabine de um Tu-154 (Fakt.pl)
A suposição de projeto do avião era que, ao voar uma aproximação não precisa como a de Smolensk, a tripulação estaria voando manualmente com o voo automático desligado — embora, neste caso, os pilotos pretendessem mantê-lo ligado.
Dois minutos depois, às 10h35, o Capitão Protasiuk relatou que eles tinham atingido 500 metros, e o controlador os liberou para entrar na curva base e começar sua aproximação. Quando o voo 101 embarcou na primeira de duas curvas de 90 graus que o colocariam em linha com a pista, o controlador os lembrou: "Polonês 101, estejam prontos para dar a volta a partir de 100 metros."
“Sim, senhor”, respondeu Protasiuk. Ele já sabia que 100 metros era a altitude mínima de descida (MDA) para a aproximação — a menor altitude para a qual ele poderia descer sem ver a pista. E ele também sabia, com base nas declarações do piloto do Yak-40, que a base da nuvem era consideravelmente mais baixa do que isso. Uma volta parecia quase inevitável.
Dados de voo dos últimos dois minutos do voo, começando aproximadamente no ponto atual da narrativa e continuando até o impacto (MAK)
Em algum momento por volta dessa época, o Comandante-em-Chefe da Força Aérea Polonesa, que estava viajando como passageiro, entrou na cabine. Por que ele estava lá nunca foi estabelecido conclusivamente, mas sua presença não poderia deixar de ter algum impacto no estado de espírito dos pilotos.
O piloto do Yak-40 agora voltou à frequência. “Arek, a visibilidade agora é 200”, ele disse. As condições estavam ficando ainda piores.
“101, a distância é 10 [km], entre na trajetória de planeio”, instruiu o controlador.
O capitão Protasiuk iniciou então a descida final em direção ao aeroporto. Mas quando ele fez isso, eles estavam cerca de 1,5 quilômetros além do ponto em que a descida deveria ter começado, o que colocou o avião acima do caminho de planeio ideal de 2˚40' até a pista. Às 10:39, enquanto os pilotos rapidamente percorriam as listas de verificação de aproximação e pouso, estendendo o trem de pouso e os flaps, eles passaram sobre o primeiro NDB — o marcador externo — a uma altura de 420 metros, 120 metros mais alto do que deveriam estar.
Percebendo que estavam muito altos, o Capitão Protasiuk estendeu a mão e aumentou a taxa de descida usando a "roda DESCIDA-ESCALADA" do Tu-154, que ajusta a velocidade vertical alterando o passo do avião. Esta pequena roda é usada para subir ou descer rapidamente em grandes altitudes e não deve ser usada tão perto do solo, pois não tem a precisão necessária para atingir as taxas de descida específicas necessárias para voar em uma trajetória de planeio prescrita.
Foi, portanto, lamentável, mas não surpreendente, que a entrada de Protasiuk tenha inclinado o avião para baixo o suficiente para atingir uma taxa de descida de 7,5 a 8 metros por segundo (cerca de 1.500 pés por minuto), o que era muito mais rápido do que a taxa necessária para retornar à trajetória de planeio de 2˚40'. O copiloto deveria anunciar qualquer taxa de descida mais rápida do que 5 m/s, mas ele nunca o fez.
À medida que o avião arremessava para baixo, ele começou a ganhar velocidade, e o autothrottle, que estava ajustado para manter 280 km/h, teve que rolar a potência do motor de volta para a marcha lenta para evitar que o avião acelerasse. O avião agora estava caindo em direção ao solo com muito pouca energia potencial disponível.
Visualização do envelope de advertência do TAWS (Zuopeng Wang)
Enquanto isso, os controladores monitoravam o progresso do avião em um par de telas de radar especiais que exibiam o alvo aproximado do avião contra um fundo bruto representando o curso lateral e vertical apropriado para a pista. Embora o avião estivesse muito alto, o controlador anunciou, com base nas indicações em sua tela, "Oito [km], no curso, em trajetória de planeio".
“O trem de pouso e os flaps estão abaixados, polonês 101”, respondeu o capitão Protasiuk.
“A pista está livre”, acrescentou o controlador.
De repente, o Sistema de Alerta e Conscientização de Terreno (ou TAWS — a mesma coisa que um Sistema de Alerta de Proximidade do Solo Aprimorado) do avião gritou: "TERRENO À FRENTE".
O aviso de “terreno à frente” estava errado, e a tripulação sabia disso. O Aeroporto Smolensk Norte não estava no banco de dados do TAWS, então o sistema pensou que eles estavam simplesmente voando em direção ao solo, para longe de qualquer campo de aviação. Felizmente, o navegador Ziętek sabia uma maneira de silenciá-lo: ele estendeu a mão e apertou o botão de “pressão padrão” no altímetro barométrico do capitão. Isso funcionou porque o TAWS compara constantemente a posição do avião com um banco de dados de terreno integrado e, para determinar a altura do avião acima do nível do mar, ele depende do altímetro barométrico do capitão.
Como o controlador havia declarado anteriormente, a pressão atmosférica real em Smolensk Norte era de 745 mm Hg, mas a “pressão padrão” — o valor padrão do nível do mar usado na ausência de qualquer valor local — é de 760 mm Hg. O altímetro compara a pressão externa medida com a pressão base escolhida pelos pilotos para determinar a altura do avião. Assim, ao alterar a pressão base para um valor mais alto, a altitude exibida pelo altímetro aumentou em 168 metros, convencendo o TAWS de que o avião estava mais longe do solo do que realmente estava.
A ravina pouco antes da pista 26 (Comitê Estadual de Investigação de Acidentes)
Simultaneamente, o controlador repetiu: “Quatro [km], no curso, em rampa de planeio”. Na verdade, eles ainda estavam muito altos, mas isso não o impediu de acrescentar: “Três [km], no curso, em rampa de planeio” cerca de 13 segundos depois.
“300,” o navegador gritou enquanto desciam. “250 metros…”
Tendo alterado o altímetro barométrico do capitão para um valor errôneo, ele obviamente não estava lendo daquele instrumento — em vez disso, ele estava usando o rádio altímetro, que mede a altura acima do terreno diretamente abaixo do avião. No entanto, na aproximação isso é estritamente proibido, e ele estava prestes a descobrir o porquê. Acontece que o terreno abaixo do caminho de aproximação final para a pista 26 no Aeroporto Smolensk Norte não é plano — ele desce da cabeceira da pista para uma ravina, sobe de volta quase até o nível da pista e então cai novamente cerca de três quilômetros da pista.
Conforme o avião cruzava a colina e passava sobre a ravina no lado próximo, o valor indicado pelo rádio altímetro aumentava, pois o solo havia caído para longe do avião. Isso levou a uma indicação perigosamente enganosa, pois o fundo da ravina estava cerca de 60 metros abaixo do nível da pista e, se os pilotos descessem 100 metros acima da ravina, isso os deixaria apenas 40 metros acima da pista — bem abaixo da altitude mínima de descida para a aproximação.
Neste ponto, o avião ainda estava muito alto, mas em sua rápida taxa de descida, ele alcançaria a trajetória de planeio em segundos. E ainda assim, ninguém mencionou sua velocidade vertical.
Vinte e seis segundos após a primeira ativação, o TAWS gritou novamente, “TERRENO À FRENTE!” Mas ninguém disse uma palavra sobre isso. Eles sabiam que era normal o TAWS ativar ao se aproximar de um aeroporto que não estava no banco de dados do sistema.
“200”, disse o navegador. “150.”
O voo 101 desceu pela trajetória de planeio e começou a descer abaixo dela.
No entanto, o controlador disse novamente: “Dois [km], em curso, em trajetória de planeio”.
“TERRENO À FRENTE! TERRENO À FRENTE!” os TAWS berraram.
“100 metros”, disse alguém.
“100”, afirmou o navegador.
Mas neste ponto eles estavam 91 metros acima do terreno, e apenas 39 metros acima do aeroporto. Já era bem mais que hora de nivelar, mas em vez disso, eles continuaram descendo.
Desvio vertical e lateral do voo 101 da trajetória de planeio durante seus momentos finais (Comitê Estadual de Investigação de Acidentes)
À medida que o terreno flutuava sob o avião, a altura do rádio altímetro saltou de volta para 100 metros, e o navegador novamente gritou “100”. Simultaneamente, o TAWS emitiu um aviso ainda mais terrível: “PARA CIMA! PARA CIMA! PARA CIMA! PARA CIMA!”
“Normal”, disse o copiloto Grzywna.
“90”, disse o navegador Ziętek.
“PARA CIMA!PARA CIMA!”
“80”, continuou o navegador.
O capitão disse algo que poderia ter sido: “Vamos dar uma volta”.
“Vamos dar a volta”, afirmou Grzywna. Alguém puxou ligeiramente os controles, mas não o suficiente para desconectar o piloto automático.
Um segundo depois, a uma altura de 65 metros acima do solo — 23 metros acima do nível da pista — o radioaltímetro emitiu um sinal sonoro indicando que estavam perigosamente baixos.
“60, 50”, disse o navegador.
De repente, percebendo que o avião estava muito baixo, o controlador disse apressadamente: “Nível 101!”
“40”, disse o navegador.
“PARA CIMA!PARA CIMA!"
“30.”
“Verifique a altitude, nivele!” repetiu o controlador.
Finalmente, a uma altura de 25 metros acima do solo e quase nivelado com a pista, o Capitão Protasiuk avistou árvores através da neblina, pairando bem à frente. Ele imediatamente apertou as alavancas de impulso para potência máxima e puxou o manche o mais forte que pôde, mas levou tempo para os motores saírem da marcha lenta, onde o autothrottle os havia definido.
A inércia manteve o avião em sua trajetória descendente, caindo abaixo do nível da pista e na ravina enquanto os motores rugiam para a vida em uma tentativa desesperada de arrastá-lo de volta da beira do abismo.
Mas era tarde demais. Assim que o avião começou a ganhar altitude, subindo rapidamente pelo lado mais distante da ravina a apenas alguns metros acima do solo, ele cortou o topo de uma árvore e então se chocou de cabeça contra uma grande bétula a apenas cinco metros acima de sua base. O enorme tronco da árvore cortou a asa esquerda, arrancando os 6,5 metros mais externos com o som horrível de metal se partindo. "Kurwa mać!", gritou Grzywa.
Com a perda severa da sustentação da asa esquerda, o avião começou a virar de lado. Ainda ganhando altitude, ele subiu brevemente acima das árvores, então rolou 90 graus para a esquerda, virando de cabeça para baixo enquanto mergulhava de volta para o chão. Na cabine de passageiros, qualquer um que não estivesse amarrado para o pouso era jogado violentamente para o lado em meio a gritos de terror.
“PARE! PARE!”, gritou o TAWS, seu aviso final e inútil ecoando na cacofonia dos últimos segundos do voo.
“Dê a volta!”, gritou o controlador freneticamente, sua voz ouvida pelos alto-falantes na cabine agora invertida, mas era tarde demais.
Esta animação CGI da sequência do acidente foi apresentada no episódio 10 da 12ª temporada do Mayday (Air Crash Investigation): “Death of the President”
“KURWAAAAAAA!!” alguém gritou, seu último grito arrepiante cortando o rugido dos motores e o baque das árvores contra a fuselagem, até que a gravação de voz da cabine morreu abruptamente, silenciada junto com as vozes aterrorizadas da tripulação, seus braços ainda segurando os controles, tentando desesperadamente nivelar o avião enquanto o solo subia para encontrá-los.
Foi um grito de horror abjeto, do tipo que só podemos produzir no instante em que percebemos a iminência da morte — um som que nenhum ser humano deveria fazer ou ouvir. E com seu fim veio o fim de 96 vidas, extintas em um instante, quando o voo 101 da Força Aérea Polonesa caiu de cabeça para baixo na floresta, para nunca mais se levantar.
Uma vista aérea do campo de destroços, com duas das árvores atingidas pelo avião e uma vista de perfil do terreno (MAK)
O impacto brutal, invertido, de nariz primeiro, reduziu o Tu-154 a escombros quase instantaneamente, sujeitando a fuselagem e os ocupantes a forças de desaceleração superiores a 100 G's. Em uma fração de segundo, o avião se desintegrou completamente, lançando destroços em chamas entre as bétulas nuas, cercadas por neblina rodopiante. Para os que estavam a bordo, não havia esperança — todos os 96 passageiros e tripulantes morreram instantaneamente.
Na cabine de controle, o controlador repetia freneticamente: “Dê a volta! Dê a volta!”, mas não houve resposta do avião presidencial. “Porra, onde ele está?”, ele disse, ficando frenético. “101? Dê a volta, 101! …101? …101?” Mas tudo o que veio da floresta envolta em neblina foi silêncio.
“Bem, foda-se”, disse o chefe assistente da unidade. Talvez nunca antes aquelas palavras simples tivessem tido tanto peso.
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Em minutos, os socorristas chegaram ao local, a algumas centenas de metros de distância e à esquerda do limite da pista 26. Eles encontraram a floresta coberta de pedaços despedaçados do Tupolev — e misturados entre eles estavam os restos mutilados do presidente polonês e sua comitiva. Ao redor deles, focos de incêndio queimavam, emitindo assobios e estrondos agudos enquanto objetos explodiam em meio aos destroços. Era óbvio que ninguém poderia ter sobrevivido.
As notícias do desastre chegaram rapidamente às multidões reunidas no memorial de Katyn, onde os poloneses irromperam em lágrimas e os russos caíram em um silêncio chocado e perplexo. Parecia inimaginável que o avião do presidente pudesse cair, e ainda assim, de alguma forma, aconteceu.
Retratos das vítimas do desastre (Smolenskcrash.eu)
Aqueles que conheciam a lista de passageiros teriam ficado ainda mais horrorizados do que aqueles que não conheciam. Praticamente todos os 89 passageiros eram figuras importantes na política e na sociedade polonesas. A lista de vítimas parecia um quem é quem da elite polonesa:
Lech Kaczyński, Presidente da República;
Maria Kacyznska, Primeira Dama;
Tenente-General Andrzej Błasik, Comandante da Força Aérea;
Major-General Tadeusz Buk, Comandante das Forças Terrestres;
Vice-Almirante Andrzej Karweta, Comandante da Marinha;
Major General Włodzimierz Potasiński, Comandante das Forças Especiais;
Premysław Gosiewski, membro do Sejm e vice-primeiro-ministro;
Ryszard Kaczorowski, antigo Presidente da República da Polónia no Exílio;
Grażyna Gęsicka, membro do Sejm e Ministra do Desenvolvimento Regional;
O Vice-Marechal do Senado;
Dois outros senadores em exercício;
Dois vice-marechals do Sejm, incluindo o candidato presidencial do Partido de Esquerda e Democratas;
Doze outros membros em exercício do Sejm, incluindo dois ex-vice-primeiros-ministros;
O Vice-Ministro da Defesa Nacional;
O Vice-Ministro dos Negócios Estrangeiros;
O Vice-Ministro da Cultura;
O Chefe do Gabinete de Segurança Nacional;
O Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Polonesas;
O Presidente do Banco Nacional da Polônia;
O Presidente do Conselho da Ordem dos Advogados da Polónia;
O cofundador do sindicato Solidariedade, que desencadeou a revolução de 1989;
O Comandante do Comando Operacional das Forças Armadas Polonesas;
O Comandante da Guarnição de Varsóvia;
O Provedor de Justiça dos Direitos Civis;
O Presidente do Comitê Olímpico Polonês;
O Bispo Católico Romano das Forças Armadas Polonesas;
O Ordinário Ortodoxo das Forças Armadas Polonesas;
Dois membros da Resistência Polonesa durante a Segunda Guerra Mundial;
O Presidente da Fundação Polonesa Katyn;
O Presidente da Federação das Famílias Katyn;
O Chefe do Comitê Katyn;
Outros sete membros de alto escalão de organizações culturais;
O Diretor de Protocolo Diplomático do Ministério das Relações Exteriores;
Outros sete padres proeminentes;
Sete membros da equipe presidencial;
Oito familiares das vítimas do massacre de Katyn;
Um ativista social;
Um escultor famoso;
Um ator famoso;
O médico pessoal do Presidente;
Quatro pilotos;
Seis guarda-costas;
E três comissários de bordo.
Foi, sem dúvida, o maior número de figuras públicas a morrer em um único acidente de avião. E suas mortes deixariam a Polônia cambaleando, lutando para entender como seria o futuro de seu estado sem elas. Foi um dia sombrio para a república e para a Europa. A Floresta de Katyn, aquele lugar amaldiçoado tão cheio de morte, mais uma vez atingiu o coração da Polônia.
À medida que a escala do desastre se tornou clara, o sistema de sucessão de emergência da Polônia entrou em ação. O marechal (presidente) do Sejm, Bronisław Komorowski, foi empossado como presidente interino, enquanto oficiais de segundo escalão assumiram todos os ramos das Forças Armadas, já que a força aérea, o exército, a marinha e as forças especiais foram decapitados.
Enquanto isso, dezenas de milhares de pessoas lamentaram o presidente e as outras vítimas nas ruas de Varsóvia. Durante semanas, as pessoas lutaram para absorver a escala da tragédia; na Rússia, até Vladimir Putin e Dmitry Medvedev pareceram comovidos pela perda da Polônia, declarando 12 de abril um dia nacional de luto.
O documentário Katyn foi exibido na TV russa pela segunda vez, e o governo divulgou mais documentos da era soviética relacionados ao massacre em um gesto de boa vontade. Infelizmente, no entanto, a sensação de que ambos os países buscavam reconciliação mútua logo desapareceria, à medida que o choque do desastre passava e as verdadeiras prioridades de todos os lados começavam a se tornar aparentes.
Enquanto isso, no entanto, o mundo exigiu saber o que exatamente tinha acontecido e por quê — algo que exigiria uma investigação imparcial. Inicialmente, o governo da Rússia nomeou uma “Comissão Estatal” de investigação liderada por ninguém menos que Vladimir Putin, e foi esse órgão que supervisionou os três primeiros dias de atividade no local do acidente.
O ressentimento começou a se formar entre os lados polonês e russo bem rápido, não apenas por falta de confiança em Putin, mas também porque soldados russos que ajudaram a proteger a cena foram pegos roubando os cartões de crédito e débito das vítimas, e por falta de transparência em torno da identificação dos corpos.
Somente anos depois seria descoberto que patologistas russos tinham estragado os procedimentos, resultando em várias famílias recebendo os conjuntos errados de restos mortais.
No entanto, após três dias, Putin entregou a liderança da investigação ao Comitê Interestadual de Aviação (MAK), o órgão civil internacional responsável por investigar acidentes de aeronaves em grande parte da antiga União Soviética, incluindo a Rússia. No que diz respeito à probabilidade de uma investigação imparcial, o MAK era uma aposta melhor do que a Comissão Estadual de Putin.
A presidente do MAK, Tatiana Anodina, não era amiga do governo russo — mas para a maioria dos observadores, isso só se tornaria prontamente aparente anos depois, pois seus relatórios cada vez mais críticos sobre acidentes de aeronaves levaram a uma briga aberta com os reguladores de aviação russos que culminou na fuga de Anodina e sua família do país. Se tudo isso tivesse acontecido antes do desastre em Smolensk, a confiança polonesa no MAK poderia ter sido maior, mas mesmo assim, era necessário que a Polônia conduzisse sua própria investigação paralela à russa.
Afinal, enquanto a liderança do MAK residisse na Rússia, suspeitava-se que haveria pressão sobre eles para evitar conclusões que implicassem a responsabilidade russa pela morte do presidente. Portanto, Jerzy Miller, presidente do Comitê Estatal Polonês de Investigação de Acidentes, foi nomeado para chefiar um segundo inquérito simultâneo.
Juntas, as investigações polonesa e MAK estabeleceram uma série de fatos em comum. Eles concordaram que os dados de voo registrados pelo FDR de fabricação russa e pelo Quick Access Recorder de fabricação polonesa correspondiam perfeitamente, permitindo uma reconstrução mutuamente aceitável da trajetória de voo.
Outros sistemas, como o TAWS, foram examinados nos Estados Unidos, o que também lhes deu credibilidade. Mas o lado polonês reclamou que a Rússia não estava entregando itens-chave de destroços à Polônia — algo que não é um procedimento padrão em uma investigação de acidente, mas poderia ter sido uma forma de gerar boa vontade e confiança mútua.
E conforme a investigação prosseguia, as divisões entre os dois lados se tornaram ainda maiores. Quando os dois relatórios foram finalmente divulgados, suas conclusões diferiram em vários aspectos importantes, alguns dos quais foram apresentados na resposta de 148 páginas de Miller ao relatório MAK, no qual sua equipe enumerou uma longa lista de inconsistências e erros nas descobertas russas. O que se segue é uma análise detalhada de cada parte e as maneiras importantes nas quais elas divergiram.
Os bombeiros controlam as chamas perto da cauda logo após o acidente (NBC)
Na opinião do MAK, o acidente ocorreu porque o Capitão Arkadiusz Protasiuk, sentindo pressão de seus superiores para levar o Presidente ao memorial a tempo, deliberadamente escolheu descer abaixo da altitude mínima de descida para efetuar um pouso em condições que estavam abaixo das mínimas. Esta decisão se tornou fatal porque o navegador fez chamadas de altitude usando o rádio altímetro, o que enganou a tripulação sobre sua altura em relação ao aeroporto devido à presença da ravina; e porque os pilotos foram condicionados a ignorar avisos de terreno ao se aproximar de aeroportos militares que não estavam no banco de dados do TAWS.
O MAK citou um comentário, supostamente ouvido no CVR e atribuído de várias maneiras ao navegador ou a uma pessoa desconhecida, que parecia dizer: "Ele ficará louco se (ininteligível)", o que foi interpretado como um sinal de que os pilotos não queriam arriscar a ira do Presidente ou de algum outro oficial se não pousassem em Smolensk.
Os bombeiros apagam as chamas logo após o acidente (TVP)
O MAK reconheceu que o Capitão Protasiuk provavelmente começou a aproximação com toda a intenção de dar a volta a 100 metros, mas que esse comentário, a falta de uma decisão do Presidente e a presença do Comandante da Força Aérea na cabine durante a aproximação final o convenceram a correr o risco de descer mais do que o permitido.
Sua tomada de decisão teria sido ainda mais afetada por um incidente que abalou o 36º Regimento dois anos antes. Em 12 de agosto de 2008, Protasiuk estava atuando como copiloto em um voo que levava o presidente Kaczyński para o Azerbaijão. Durante uma escala em Simferopol, Crimeia, o presidente informou ao regimento que queria fazer uma parada adicional em Tbilisi, Geórgia. Naquela época, a Guerra Russo-Georgiana de 12 dias estava a todo vapor, enquanto tanques russos atravessavam o interior da Geórgia e bombas russas caíam em Tbilisi.
Equipes de emergência trabalham em meio aos destroços (Arquivos do Bureau of Aircraft Accidents)
Pousar lá já seria perigoso, mas para piorar as coisas, a tripulação não tinha nenhuma carta de aproximação para o Aeroporto de Tbilisi. O capitão, portanto, tomou a sábia decisão de se recusar a pousar lá e levou o presidente para Ganja, Azerbaijão, como planejado originalmente, forçando Kaczyński e sua delegação a viajar para Tbilisi de carro.
Depois, de acordo com o MAK, esse capitão nunca mais foi convidado a voar para o Presidente (embora algumas fontes polonesas digam que ele voou com o Presidente mais uma vez antes de ser transferido). Ele finalmente foi a julgamento para determinar se suas ações equivaliam a insubordinação, mas foi absolvido. Tendo testemunhado pessoalmente o incidente e visto as consequências enfrentadas pelo Capitão daquele voo, Protasiuk teria sido muito relutante em tomar qualquer decisão que pudesse ser vista como inconveniente para o Presidente.
A versão do MAK da transcrição do gravador de voz da cabine também incluía o copiloto, Major Grzywna, pedindo uma volta a uma altura de cerca de 65 metros acima do terreno, seguido por uma pequena entrada de nariz para cima na coluna de controle do copiloto que foi insuficiente para desconectar o piloto automático. Neste ponto, se uma volta tivesse sido iniciada, o acidente provavelmente não teria ocorrido.
A cauda vertical do avião saiu quase inteira (MAK)
No entanto, o MAK avaliou que, embora Grzywna claramente sentisse que eles deveriam dar a volta, a falta de uma resposta do Capitão Protasiuk, sua baixa experiência e sua falta de treinamento em gerenciamento de recursos da tripulação o desincentivaram a tomar uma ação decisiva. Protasiuk, por sua vez, só percebeu que eles tinham descido em uma ravina perto do aeroporto quando avistou árvores através da neblina a uma altura de cerca de 25 metros.
Depoimentos de testemunhas confirmaram que a neblina havia se acumulado ainda mais densamente nessa área baixa, resultando em uma visibilidade local de apenas 50–100 metros lateralmente e 15–30 metros verticalmente, em oposição a 300–500 m lateralmente e 50 m verticalmente sobre a pista. Testes mostraram que na taxa de descida anormalmente rápida do voo 101 e com os motores quase em marcha lenta, aumentar o empuxo e puxar para cima só teria conseguido reverter a descida após uma perda adicional de 30 metros, o que era mais do que eles tinham disponível.
Assim, quando a tripulação viu o terreno, era tarde demais para evitar o acidente. Embora a resposta de Protasiuk tenha sido muito mais agressiva do que a exigida pelos procedimentos padrão, simulações mostraram que se o Tu-154 não tivesse batido na árvore e rolado invertido, os comandos de nariz para cima de Protasiuk teriam feito com que ele parasse e caísse no chão de qualquer maneira menos de dois segundos depois.
As duas raízes das asas com trem de pouso (MAK)
O MAK também levantou a questão de por que o controlador de tráfego aéreo disse continuamente à tripulação que eles estavam na trajetória de planeio, embora não estivessem. Foi notado que esses comentários frequentes poderiam ter levado a tripulação a acreditar que seu perfil de descida estava correto, fazendo com que negligenciassem parâmetros de monitoramento, como a taxa de descida. Na visão do MAK, isso ocorreu porque o equipamento de radar especial que exibia a localização do avião em relação ao perfil de descida foi calibrado incorretamente.
Embora a trajetória de planeio real para Smolensk estivesse centrada em 2˚40' com uma tolerância de 30' em qualquer direção, a trajetória de planeio mostrada no visor do controlador estava centrada em 3˚12'. Como resultado, o avião pareceria estar perto da trajetória de planeio, embora estivesse muito alto para a maior parte da descida. Portanto, o avião nunca deixou a tolerância de 30' acima e abaixo dessa trajetória de planeio até pouco antes do acidente, momento em que o controlador gritou "Nível, 101!" Portanto, embora os pilotos possam ou não ter sido enganados pelas declarações do controlador, o controlador estava apenas agindo com base nas informações que tinha.
Parte da fuselagem e um motor (Arquivos do Bureau of Aircraft Accidents)
Embora o relatório do MAK tenha reconhecido a falta de equipamento no aeroporto, na opinião deles, a maioria das deficiências do aeroporto não teve impacto no acidente. O avião nunca chegou perto o suficiente da pista para ter visto as luzes de aproximação, mesmo que estivessem funcionando corretamente, e a condição da pista e das instalações de solo obviamente não desempenhou nenhum papel. Embora a falta de um sistema de pouso por instrumentos (ILS) tenha sido um fator no acidente, a tripulação deveria saber como voar uma aproximação NDB com segurança, mesmo em baixa visibilidade.
O problema, tanto os investigadores poloneses quanto os russos concordaram, era com os pilotos. Para uma tripulação que estava voando em torno da pessoa mais importante da Polônia, eles eram lamentavelmente inexperientes, com tão poucas ou menos horas de voo quanto os pilotos de um avião de passageiros comum. Como mencionado anteriormente, eles não haviam passado por treinamento em várias áreas básicas que eram obrigatórias para pilotos comerciais por anos ou décadas.
Trabalhadores de emergência examinam parte da fuselagem (Arquivos do Bureau of Aircraft Accidents)
Mas talvez o mais relevante de tudo foi que o Capitão Protasiuk não estava devidamente qualificado para pousar em baixa visibilidade. Todo piloto é certificado para pousar em uma visibilidade mínima específica; para Protasiuk, esse mínimo correspondia à Categoria I da ICAO, ou 800 metros lateralmente e 60 metros verticalmente (o que, os investigadores notaram, não era bom o suficiente para pousar em Smolensk Norte naquele dia).
No entanto, sua classificação de Categoria I da ICAO expiraria a cada quatro meses, a menos que ele fosse verificado em sua capacidade de voar em baixa visibilidade, o que poderia ser feito pousando em condições reais de nuvens ou, se estas não pudessem ser encontradas, pousando com um "capuz de treinamento" que obscurecesse a visão do piloto pelas janelas até atingir o MDA.
O registro de Protasiuk mostrou que ele pousou em baixa visibilidade em Bruxelas em fevereiro de 2010, mas os dados meteorológicos desta data mostraram que as condições reais eram razoavelmente boas, com uma base de nuvens de 900 metros e visibilidade de 10 quilômetros, e o registro não indicou o uso de um capuz de treinamento. Portanto, os mínimos climáticos de Protasiuk já haviam expirado no momento do acidente.
A seção da cauda e o motor nº 1 (Arquivos do Bureau of Aircraft Accidents)
No que diz respeito à capacidade da tripulação de pousar no Aeroporto Smolensk Norte, isso era apenas a ponta do iceberg. Os registros de Protasiuk mostraram que ele havia pousado seis vezes em baixa visibilidade desde junho de 2008, mas isso sempre foi em aeroportos bem equipados. Ele havia conduzido uma aproximação NDB apenas seis vezes em toda a sua carreira, e sempre em condições claras. Isso significava que, incrivelmente, o voo do acidente foi a primeira tentativa de Protasiuk de voar uma aproximação NDB em mau tempo, e ele estava fazendo isso com o presidente a bordo.
A partir daí, as discrepâncias só continuaram a se acumular. Vários documentos estavam faltando, incluindo aqueles referentes a verificações importantes que o navegador deveria ter concluído antes de ser autorizado a navegar no Tu-154 sem supervisão. Este também foi o primeiro voo do navegador em um Tu-154 em dois meses e meio, porque seu trabalho real era como copiloto do Yak-40, e ele só foi convocado para a posição de navegador do Tu-154 devido à escassez de navegadores qualificados.
Esse tipo de troca era muito comum, pois a maioria dos pilotos do 36º Regimento eram classificados tanto no Yak-40 quanto no Tu-154, e frequentemente trocavam entre os dois aviões e entre as várias posições da tripulação dentro deles sem passar por um retreinamento, uma prática que é ilegal na aviação comercial. Eles também estavam usando um manual de operações do Tu-154 projetado para uso por uma tripulação de três pessoas, embora o 36º Regimento voasse com quatro tripulantes.
Parte da cozinha de popa está de cabeça para baixo em meio aos destroços (The Guardian)
E embora não tivesse nada a ver com o acidente, o MAK encontrou vários problemas com as qualificações dos mecânicos que faziam a manutenção do avião presidencial, e com o próprio avião, já que os investigadores russos não conseguiram localizar seu certificado de aeronavegabilidade. Dois desses certificados foram encontrados nos destroços, um dos quais estava vencido; outro era válido, mas pertencia a uma aeronave diferente. Essa discrepância bizarra nunca foi explicada.
Na área de treinamento de pilotos, a investigação polonesa entrou em detalhes ainda maiores. De acordo com Jerzy Miller e seus investigadores, os problemas começaram no nível regulatório, onde as regras aplicáveis às tripulações de voo militar na Polônia careciam de precisão e eram inconsistentes com as regras civis, embora uma ordem para harmonizá-las estivesse em vigor desde 1996.
No nível de tripulações individuais, eles expandiram muito as deficiências encontradas pelo MAK. Documentos mostraram que o capitão Protasiuk foi treinado de forma fragmentada, com grandes intervalos no treinamento que não eram limitados por exames de atualização. Vários voos de verificação foram realizados usando métodos não padronizados por pilotos que não eram instrutores qualificados. Protasiuk não realizou nenhum treinamento em cenários de emergência em quase dois anos. Os registros incluíam voos de treinamento que não poderiam ter ocorrido dentro dos prazos indicados.
A ponta da asa que foi cortada durante o acidente (MAK)
Nenhuma evidência foi encontrada para provar que o major Grzywna passou por treinamento em solo antes de voar o Tu-154. Voos com VIPs a bordo eram frequentemente registrados como "voos de treinamento", incluindo o primeiro voo do navegador no Tu-154. As qualificações do Major Grzywna para pilotar o Yak-40 e o Tu-154 haviam expirado. O navegador foi classificado para pilotar vários tipos de aproximações que ele nunca havia tentado, e recebeu sua classificação Tu-154 sem completar os exames necessários. Na verdade, no total, o único membro da tripulação que estava devidamente qualificado para pilotar o Tu-154 com o Presidente a bordo era o engenheiro de voo.
Apesar disso, no entanto, a investigação polonesa teve uma visão diferente das ações dos pilotos durante o minuto final do voo. Eles sentiram que não havia evidências de que Protasiuk estava sob pressão para pousar, observando que nenhum oficial, nem mesmo o comandante da Força Aérea que estava na cabine, havia dito algo sobre os méritos relativos de um desvio. O relatório polonês não mencionou a frase "Ele ficará louco se...", que eles aparentemente não achavam correta. Mas, embora pudesse ter havido algum nível de pressão autoinduzida, na opinião dos investigadores poloneses, Protasiuk nunca se desviou intencionalmente de seu plano original de descer para 100 metros e dar a volta se a pista não pudesse ser vista.
Os problemas de fato começaram quando o TAWS foi ativado devido à ausência do Aeroporto Norte de Smolensk em seu banco de dados. Enquanto os investigadores do MAK se recusaram a conectar explicitamente esse evento com o navegador pressionando o botão de “pressão padrão” no altímetro barométrico do capitão, os investigadores poloneses foram muito menos reticentes, escrevendo que isso certamente foi feito para silenciar o alarme. Era uma maneira perigosamente incorreta de fazer isso, mas uma que os pilotos do 36º Regimento aparentemente aprenderam informalmente.
As raízes das asas e o trem de pouso eram as maiores peças no geral (Arquivos do Bureau of Aircraft Accidents)
Foi nesse ponto que o navegador começou a chamar a altitude da aeronave usando o rádio altímetro. Isso nunca deve ser feito na aproximação final, por razões que o acidente tornou óbvias. No entanto, os pilotos dos Yakovlev Yak-40s do 36º Regimento, onde o navegador tinha a maior parte do seu tempo de voo, tinham sido ensinados a fazer chamadas de altitude usando o rádio altímetro. O MAK sentiu que essa era a explicação mais provável para suas ações, enquanto a investigação polonesa explicou que ele provavelmente usou o rádio altímetro porque não podia mais usar o altímetro barométrico do capitão.
Neste ponto da aproximação, o avião ainda estava acima da trajetória de planeio, mas descendo muito abruptamente, devido ao uso incorreto do volante “DESCENT — CLIMB” pelo capitão. Conforme a aeronave passava sobre a ravina, ela começou a descer abaixo da trajetória de planeio, mas o terreno abaixo do avião estava simultaneamente caindo, fazendo com que a leitura do rádio altímetro permanecesse em torno de 100 metros por cerca de dez segundos críticos, bem quando o TAWS começou a emitir avisos de terreno novamente.
Os repetidos chamados de “100 metros” do navegador podem ter convencido os outros membros da tripulação de que eles estavam nivelando. Não havia evidências de que alguém estivesse ciente de sua velocidade vertical, pois o copiloto era obrigado a chamá-la, mas nunca o fez, provando que ele não estava monitorando os instrumentos.
Bombeiros perto da cauda durante o processo de limpeza dos destroços (Moscow Times)
Os pilotos pareciam estar cientes da presença da ravina, pois os investigadores poloneses notaram que às 10h40 e 12 segundos o copiloto disse: “Há um mergulho Arek”, ao qual o capitão Protasiuk respondeu: “Eu sei, está chegando em breve”. Esta declaração estava ausente da versão do MAK da transcrição do gravador de voz da cabine. No entanto, o navegador nunca declarou que estava anunciando a altura do rádio e não a altura acima do campo, então era provável que os pilotos nunca tivessem percebido que estavam descendo para o "mergulho" que o Major Grzywna havia mencionado.
Quando o avião começou a descer abaixo de 100 metros por altitude de rádio, ou 40 metros acima do campo, os investigadores poloneses escreveram que o Capitão Protasiuk disse, "Indo ao redor", seguido por uma linha idêntica do copiloto. Apenas o chamado do copiloto para um arremesso foi incluído na transcrição do MAK e analisado em seu relatório final, um fato que Miller atribuiu ao obscurecimento parcial da declaração do capitão por um aviso de terreno.
A discordância sobre esta linha foi crítica para as interpretações dos dois lados sobre o que aconteceu em seguida. Se o Capitão Protasiuk realmente pediu um arremesso naquele ponto, a questão tinha que ser levantada sobre por que ele não o executou imediatamente. O relatório polonês não mencionou a pequena entrada de nariz para cima que o MAK atribuiu ao copiloto, mas levantou uma possibilidade completamente diferente.
Pedaços do Tu-154 foram recuperados e colocados no pátio em Smolensk Norte. (Rede de Segurança da Aviação)
Na opinião deles, o Capitão Protasiuk inicialmente tentou efetuar a manobra usando os interruptores de arremesso para colocar o sistema de voo automático no modo de arremesso, como ele havia dito que faria antes na aproximação. No entanto, não era possível executar uma arremetida automática se o canal vertical do sistema de voo automático não estivesse no modo “glide slope”.
Devido ao seu conhecimento inadequado da aeronave, Protasiuk pressionou o interruptor de arremetida de qualquer maneira, e ficou confuso por vários segundos quando o avião não respondeu como ele esperava. Durante esse tempo, o avião continuou a descer na ravina, e quando Protasiuk assumiu o controle manual da aeronave, era tarde demais para evitar que ela atingisse o solo.
Os investigadores poloneses também forneceram uma interpretação diferente do papel que o controlador de tráfego aéreo desempenhou no acidente. Na opinião deles, a calibração incorreta de seu visor não foi uma explicação suficiente para seus comentários "em curso, em rampa de planeio", e em particular o último.
Dez segundos antes dos pilotos pedirem uma volta, o avião estava 70 metros abaixo da rampa de planeio e fora da tolerância de 30' do visor do perfil de aproximação do controlador, e ainda assim ele disse: "Dois [km], em curso, em rampa de planeio".
Mais pedaços do Tu-154 após serem coletados do local do acidente (TASS)
Se ele tivesse lido seu visor corretamente, ele deveria ter visto que o avião estava muito baixo. Em vez disso, ele disse aos pilotos que eles estavam em curso certo em um momento crítico quando eles deveriam ter percebido que estavam abaixo da trajetória de planeio, potencialmente atrasando seu reconhecimento do perigo. Por esse motivo, o relatório polonês citou as chamadas enganosas do controlador como um fator contribuinte para o acidente.
Quanto ao motivo pelo qual ele fez essas declarações, a investigação polonesa observou que esta foi sua primeira vez trabalhando no Aeroporto Smolensk Norte; ele não tinha experiência em controle de tráfego aéreo, tendo trabalhado apenas nove turnos no ano anterior; e árvores perto do quartel de controle interferiam no sinal do radar, tornando o visor mais difícil de ler.
Embora não tenha contribuído diretamente para o acidente, os investigadores poloneses também criticaram o aeroporto de outras maneiras. Em particular, as coordenadas de GPS do aeroporto estavam a mais de 100 metros ao sul da posição real do campo, o que fez com que o voo 101 permanecesse à esquerda da linha central da pista durante sua aproximação. O Il-76 russo à frente do voo 101 também se desviou para a esquerda em ambas as aproximações.
Além disso, as autoridades russas deram à tripulação do voo 101 uma carta de aproximação desatualizada para Smolensk Norte que incluía auxílios à navegação desativados em 2009 e careciam de informações críticas, como o gradiente de descida correto. E embora a árvore que o avião atingiu não fosse uma delas, havia inúmeras outras árvores perto do limite da pista que invadiam a área de segurança sob o caminho de aproximação final e deveriam ter sido removidas.
A reconstrução completa dos destroços (MAK)
No final, enquanto o processo da investigação variou de às vezes hostil a abertamente hostil, os relatórios polonês e russo concordaram sobre o cenário básico do acidente e discordaram apenas sobre como exatamente os eventos transcorreram nos minutos finais do voo. A partir das evidências, não havia como evitar uma verdade gritante: que os pilotos que pilotaram o Presidente eram perigosamente inexperientes e, quando confrontados com uma abordagem desafiadora para um aeroporto mal equipado, eles voaram seu avião para o chão.
Mas nem todos concordam que o acidente foi um acidente. Teorias de que o avião foi destruído por uma bomba são amplamente difundidas na internet e em certos segmentos da sociedade polonesa, e com o passar do tempo estão aumentando em popularidade. Como tal, é impossível contar a história do Desastre Aéreo de Smolensk sem examinar essas teorias e as forças políticas e culturais que as impulsionam.
Considerando que a Rússia e a Polônia têm tido um relacionamento tenso por séculos, que incluiu crimes contra a humanidade como o Massacre de Katyn, a morte do presidente polonês em solo russo sempre foi certa para gerar especulações de que o acidente não foi um acidente, e de fato teria sido tolice não investigar a possibilidade de jogo sujo. A investigação de Jerzy Miller fez todas as paradas usuais para detectar sinais de sabotagem, como testes de resíduos explosivos, busca por danos por pites associados a explosões e busca por estilhaços nos corpos das vítimas. Nenhuma dessas áreas de investigação produziu qualquer evidência de que uma bomba explodiu a bordo do avião.
No entanto, o ceticismo em relação a essas descobertas era generalizado. Embora alguns políticos da oposição também estivessem no avião, a maioria das vítimas era aliada do presidente Kaczyński e muitas delas eram abertamente antirrussas. Comentaristas poloneses chamaram Jerzy Miller de "ingênuo" por cooperar com o MAK. O maior fornecedor dessas críticas foi ninguém menos que Jarosław Kaczyński, irmão gêmeo do falecido Lech Kaczyński e líder do Partido Lei e Justiça.
Menos de três meses após o acidente, a Polônia foi às urnas para eleger seu próximo presidente em uma disputa entre Jarosław Kaczyński e o presidente em exercício Bronisław Komorowski, que representava a Plataforma Cívica de Donald Tusk. Embora a simpatia por Kaczyński o tenha impulsionado nas pesquisas, onde seu partido estava ficando para trás, essa onda de apoio foi insuficiente para impulsioná-lo à vitória, e Komorowski venceu com 53% dos votos.
A destruição do avião foi total; não havia possibilidade de sobrevivência (Comitê Estadual de Investigação de Acidentes)
Foi sob Komorowski que o MAK e Jerzy Miller publicaram suas descobertas, o que levou a uma reestruturação completa do 36º Regimento, entre outras mudanças destinadas a evitar que tal desastre acontecesse novamente. Mas Jarosław Kaczyński nunca aceitou as descobertas, continuando a acreditar que seu irmão havia sido assassinado por ordens de Vladimir Putin.
Logo após a eleição, um grupo de parlamentares do Law and Justice formou um comitê especial para investigar o acidente e, em particular, as alegações, promovidas por Kaczyński, de que o avião foi derrubado por uma bomba.
Sem surpresa, essa foi precisamente a conclusão a que o comitê finalmente chegou, escrevendo que o impacto com a bétula não foi suficientemente violento para ter arrancado a ponta da asa do Tu-154, e que a asa foi destruída por duas detonações separadas por vários segundos. O relatório foi publicado apenas em março de 2015, dois meses antes da próxima eleição presidencial.
Em maio daquele ano, o candidato do Law and Justice, Andrzej Duda, obteve uma vitória inesperada, desbancando Komorowski em uma votação que se dividiu estreitamente a seu favor, 51,5% a 48,5%. Após a vitória eleitoral, outro comitê parlamentar foi estabelecido para "reinvestigar" o acidente.
Este comitê, liderado pelo vice-presidente do Partido Law and Justice, Antoni Macierewicz, produziu desde então um grande número de relatórios "preliminares" e "intermediários", espaçados a cada um ou dois anos. O último foi lançado em 2022. A premissa básica de todos os relatórios é a mesma do primeiro e, como tal, eles serão abordados coletivamente em uma base ponto a ponto.
Um dos aspectos mais populares da teoria do assassinato é baseado em um vídeo filmado por algumas das primeiras pessoas a chegarem ao local, no qual sons agudos semelhantes a tiros podem ser ouvidos. Uma crença generalizada sustenta que os sons são o resultado de soldados russos atirando nos sobreviventes do acidente para garantir a ausência de testemunhas.
No entanto, sem nem mesmo abordar a causa dos sons, essa teoria esbarra na pura improbabilidade de alguém ter sobrevivido em primeiro lugar. O avião impactou de cabeça para baixo e com um ângulo de nariz para baixo substancial, resultando na destruição quase total da fuselagem; na verdade, os maiores pedaços deixados foram as áreas da raiz da asa com o trem de pouso acoplado.
Não havia nenhum pedaço de destroço grande o suficiente para ter fornecido um espaço de sobrevivência, mesmo que os ocupantes não tivessem sido submetidos a um impacto instantaneamente fatal de 100-G. Essa teoria é popular apenas porque a maioria das pessoas não entende as forças envolvidas em um acidente de avião, ou por que alguns acidentes têm sobreviventes e outros não.
O comitê de reinvestigação alega que esta fotografia mostra que a asa foi rompida de dentro para fora. (Comitê para a Reinvestigação do Acidente Aéreo de Smolensk)
No entanto, a ideia de que sobreviventes foram baleados não é crítica para a premissa de nenhum dos relatórios Macierewicz. Mais significativas são as alegações de que explosões ocorreram a bordo do avião antes de ele cair.
Os investigadores estavam obviamente cientes de que qualquer teoria sobre bomba teria que explicar por que a ponta da asa esquerda foi a primeira peça a sair do avião. Embora muito tenha sido dito sobre o fato de que várias peças foram movidas de seus locais originais durante a resposta desorganizada à emergência, isso tem pouca relação com o fato de que qualquer bomba teria que ter sido localizada dentro da estrutura da asa, não na cabine ou no compartimento de carga.
No entanto, não há registro de qualquer avião comercial ter sido derrubado por uma bomba escondida dentro da estrutura do avião, ao contrário de áreas facilmente acessíveis a passageiros ou equipes de solo. Se ignorássemos esse fato por um momento e assumíssemos que uma bomba no compartimento de carga seria descoberta com muita facilidade, levando os perpetradores a colocá-la na asa, a evidência para tal explosão ainda seria instável, na melhor das hipóteses.
A afirmação é baseada principalmente em exames de fotos dos destroços que parecem mostrar descascamento externo da pele da asa, o que alguns especialistas acreditam indicar uma sobrepressão dentro da caixa da asa. No entanto, as fotografias dessas áreas nos relatórios Macierewicz não mostram sinais de carbonização.
O fato é que durante a quebra de um avião, o metal é torcido de todas as formas, e é quase sempre possível encontrar alguma descamação externa da pele se alguém olhar com bastante atenção. Embora alguma carbonização tenha sido encontrada em objetos localizados logo antes do local principal do acidente, isso provavelmente ocorreu devido à ignição do combustível do tanque da asa esquerda decepada após a colisão com a árvore.
A bétula atingida pelo Tu-154 (MAK)
A teoria também se baseia fortemente na noção de que a bétula não poderia ter cortado a ponta da asa em primeiro lugar, e que os detritos da asa encontrados dentro e ao redor da árvore devem ter pousado lá após uma explosão no ar, ou foram plantados após o fato. Esta afirmação é amplamente baseada em simulações de computador por um único professor em Akron, Ohio.
A história, por outro lado, tem muitos casos de asas ou partes de asas sendo arrancadas por impactos com árvores de tamanho normal, incluindo um grande número de acidentes semelhantes de "voo controlado em direção ao solo" (CFIT). (Por exemplo, alguns leitores podem se lembrar do voo 764 da Surinam Airways, que quase conseguiu dar a volta antes que a asa esquerda colidisse com uma árvore, fazendo com que o avião virasse invertido e atingisse o solo).
Além disso, o diâmetro da bétula na área onde foi atingida pela asa era de 30–40 centímetros, facilmente o suficiente para causar danos catastróficos à ponta da asa do Tu-154. A única razão pela qual há qualquer dúvida sobre a capacidade de uma árvore média de lidar com esse dano é porque o impacto da árvore não se encaixa na teoria da bomba. Caso contrário, praticamente todo acidente de CFIT em uma área florestal teria que ser reexaminado.
Ao mesmo tempo, os relatórios de Macierewicz acusam os controladores de tráfego aéreo russos de enganar deliberadamente a tripulação polonesa sobre sua localização. Deixando de lado todos os méritos da teoria, é difícil entender qual seria o objetivo de enganar a tripulação se o plano fosse explodir o avião de qualquer maneira.
Outra árvore que foi atingida pelo avião quando ele virou invertido (Comitê para a Reinvestigação do Acidente Aéreo de Smolensk)
Essa linha de argumentação parece estar buscando a noção de que o voo controlado em direção ao solo foi de alguma forma orquestrado, enquanto ignora a conclusão simultânea de que não houve CFIT, e que o avião foi destruído por uma bomba a uma altura de 30 metros. Por outro lado, se o avião fosse destruído por uma bomba a essa altura, o fato de ter atingido 30 metros acima do terreno naquela área já o colocava no caminho para cair, com bomba ou sem bomba.
Nenhuma tentativa convincente de reconciliar esses argumentos foi feita, nem houve nenhuma tentativa séria de explicar o motivo para tentar destruir o avião de duas maneiras diferentes simultaneamente.
A única explicação concebível é que o cenário CFIT foi organizado para fazer o acidente parecer um acidente. Se for assim, os russos fizeram um trabalho excepcionalmente bom, porque o peso das evidências disponíveis indica fortemente que o avião realmente voou para o terreno acidentalmente.
Uma vítima é levada para longe da cena em um caixão temporário (Reuters)
Em suma, os relatórios Macierewicz estão cheios de conclusões duvidosas, busca enfática por pistas falsas e coleções de "pegadinhas" que não se somam a uma sequência alternativa convincente de eventos. Basicamente, todas as evidências do CVR e do FDR, bem como muitos itens de evidências físicas, são desconsiderados como invenções russas. Os relatórios empregam lógica conspiratória clássica e as investigações que os produziram foram orientadas de forma transparente para apoiar a teoria do assassinato, em vez de analisar objetivamente os dados.
É claro que é compreensível, dadas as ações da Rússia nos últimos anos, que muitas pessoas discordem da noção de que a Rússia não desempenhou nenhum papel no acidente. No entanto, essa crença é baseada em uma compreensão inadequada das capacidades e do modus operandi da Rússia .
Carregadores carregam o caixão de Kaczyński em seu funeral (Carsten Koall)
Embora Vladimir Putin realize assassinatos políticos frequentes, os alvos são quase sempre cidadãos russos atuais ou antigos, e geralmente são usadas técnicas específicas que são projetadas para sinalizar o envolvimento da Rússia e enviar uma mensagem a outros dissidentes e detratores.
A derrubada espetacular de uma aeronave presidencial durante uma visita de estado altamente simbólica seria a exceção, não a norma. Putin ficou mais ousado com o tempo, mas em 2010 ele foi cuidadoso demais para ter realizado tal provocação.
Se a Rússia destruísse o avião de Kaczyński e não conseguisse executar um acobertamento perfeito, o acidente poderia ter sido visto como um ato de guerra contra um membro da OTAN, resultando potencialmente na invocação da cláusula de defesa mútua do Artigo 5 da OTAN. Isso teria sido um grande risco a ser assumido por muito pouca recompensa.
Jarosław Kaczyński e a filha de Lech Kaczyński, Marta, na chegada do caixão de Kaczynski a Varsóvia (AP)
Na verdade, embora o acidente tenha sido considerado um acidente, ele prejudicou significativamente as relações polaco-russas e reduziu a opinião dos poloneses sobre a Rússia por pelo menos uma geração. Não está claro qual benefício a Rússia teria extraído ao causar tal acidente de propósito.
Tal cenário também assume que a Rússia foi capaz de montar um acobertamento competente que convenceu vários investigadores treinados, mas se os eventos recentes nos ensinaram alguma coisa, é que a crença na competência da inteligência russa é terrivelmente equivocada.
Considerando essas evidências, todos os chamados relatórios Macierewicz fazem mais sentido quando vistos como atos conscientes de teatro político em vez de tentativas genuínas de investigar as causas do acidente. Na verdade, a publicidade em torno dos relatórios não é direcionada tanto à Rússia quanto aos rivais domésticos do Partido da Lei e Justiça, em particular Donald Tusk e a Plataforma Cívica.
Um elemento importante da teoria da conspiração é que Tusk conspirou com a Rússia para levar seu partido ao poder matando Kaczyński e outros grandes oponentes. Isso ignora o fato de que a Plataforma Civil estava a caminho de vencer a eleição de 2010 de qualquer maneira, e que o acidente na verdade aumentou o apoio ao Partido da Lei e Justiça.
No entanto, os relatórios Macierewicz aludem à suposta cumplicidade de Tusk no encobrimento. Na verdade, o último relatório, apesar de supostamente ser o produto de uma investigação de segurança, chama Donald Tusk pelo nome em menos de duas páginas, e reserva uma linguagem consideravelmente mais dura para ele do que para Vladimir Putin.
Na verdade, o Partido Lei e Justiça está usando a investigação sem fim e seus novos relatórios frequentes como uma arma política. A investigação nunca foi sobre fatos, ou mesmo sobre a Rússia, mas sobre política interna, posicionando o partido no poder como vítima de um crime hediondo para aumentar seu capital político.
Os enlutados colocam velas do lado de fora do palácio presidencial em Varsóvia (Patryk Korzeniecki)
É por isso que, apesar de 12 anos de investigação contínua, nenhum suspeito foi nomeado; ninguém foi processado ou acusado; e o Comitê não deu nenhuma indicação de que algum dia parará de "investigar" e emitir novos relatórios que repitam as descobertas de todos os relatórios anteriores. Na verdade, enquanto o acidente mantiver sua relevância com o eleitorado polonês, eles provavelmente continuarão a fazê-lo.
Em meio à luta política sem fim, é fácil perder a perspectiva sobre o Desastre Aéreo de Smolensk como, antes de tudo, um acidente de avião. Se o presidente não estivesse a bordo para politizar a tragédia, teria sido óbvio para todos que o voo naquele dia era um desastre esperando para acontecer. Uma tripulação mal treinada e não qualificada foi encarregada de transportar VIPs para um aeroporto decrépito e mal equipado em meio a uma névoa extremamente densa.
Milhares de velas foram acesas do lado de fora do palácio presidencial para homenagear as vítimas (AP)
Quase podemos imaginar algum oficial de alto escalão proferindo as palavras: "O que poderia dar errado?" De fato, a lista do que poderia ter dado errado era tão extensa que, se esse acidente tivesse envolvido um avião comercial, não haveria dúvidas públicas de que foi um acidente, e a companhia aérea teria seu certificado operacional revogado com preconceito.
A esse respeito, o Desastre Aéreo de Smolensk é um exemplo clássico do nosso desejo humano inato de buscar padrões e significados em um mundo que é, em sua essência, inescrutável. Repetidamente ao longo da história, a humanidade provou ser incapaz de aceitar o fato de que eventos extremamente consequentes podem ter e frequentemente têm causas fundamentalmente aleatórias e acidentais.
Um homem chora no local do acidente (AP)
Está em nossa natureza buscar uma razão, buscar alguém para culpar, porque é menos assustador acreditar que tragédias são o resultado de atores malignos conspirando para ganho pessoal do que reconhecer que qualquer um de nós, até mesmo um presidente, pode morrer a qualquer momento devido a um único erro inoportuno.
Repetidamente ao longo da história, a humanidade se mostrou incapaz de aceitar o fato de que eventos de grandes consequências podem ter, e muitas vezes têm, causas fundamentalmente aleatórias e acidentais.
Os poloneses prestam homenagens no aniversário do desastre (Polskie Radio 24)
Está na nossa natureza buscar uma razão, buscar alguém para culpar, porque é menos assustador acreditar que tragédias são o resultado de atores malignos conspirando para ganho pessoal do que reconhecer que qualquer um de nós, até mesmo um presidente, pode morrer a qualquer momento devido a um único erro inoportuno.
A verdadeira lição, talvez, é não tomar como certo que voos VIP são mantidos em um padrão mais alto de segurança. A cultura dentro do 36º Regimento Aéreo Especial da Polônia era de invulnerabilidade e excesso de confiança, permeada por uma sensação de que sua missão era importante demais para se preocupar com questões tão insignificantes como regulamentos de segurança e procedimentos padrão.
Na verdade, essa mesma importância exigia adesão estrita aos padrões de segurança para evitar um desastre com implicações globais. Sua falha em fazê-lo mudou o curso da história, e certamente não para melhor, uma lição que outros países devem levar a sério. Lech Kaczyński estava longe de ser o primeiro chefe de estado a morrer em um acidente de avião, mas caberá aos governos ao redor do mundo decidir se ele será o último.