terça-feira, 16 de setembro de 2014

Assentos de avião não se adequam à anatomia humana, diz estudo

Segundo a pesquisa, 1 em cada 20 pessoas tem razão em reclamar do extremo desconforto nas poltronas da classe econômica.


Reclinar ou não reclinar? Eis a questão debatida calorosamente entre passageiros de três voos que foram forçados a pousar quando alguns deles começaram a brigar por causa de assentos reclinados. 

Mas será que as pessoas são realmente o problema? Talvez a verdadeira questão seja a de que maioria dos assentos de avião não é projetada para acomodar totalmente o corpo humano em suas várias formas e tamanhos.

"Estamos nos digladiando, mas os bancos não foram projetados corretamente", disse Kathleen M. Robinette, professora e chefe do departamento de Design, Habitação e Merchandising da Universidade Estadual de Oklahoma. "Os assentos não servem para a gente".

Ela entende do assunto, pois é autora da pesquisa antropométrica realizada pela Força Aérea, com um consórcio de 35 organizações, publicada em 2002 que é amplamente utilizada por fabricantes de assento e outros projetistas.

A pesquisa, chamada de Projeto Civil Americano e Europeu sobre Recursos Antropométricos de Superfície, mediu os corpos de 4.431 pessoas na América do Norte, na Holanda e na Itália. Uma enorme quantidade de dados sobre os indivíduos foi coletada, indo de altura e peso até tamanho do sapato e do sutiã. Robinette e seus colegas reproduziram imagens em 3D dos indivíduos, permitindo medições detalhadas nas posições em pé e sentado.

Para projetistas de assentos, os dados mais relevantes vieram de medições das pessoas sentadas, incluindo a distância das nádegas até o joelho, a largura dos quadris e a altura dos joelhos.

Os dados deram uma visão precisa das variações da forma humana, Kathleen disse, mas as medidas não foram utilizadas corretamente.

Os projetistas muitas vezes acham que quase todos ficarão confortáveis se o assento for projetado para o homem que se encaixa em 95% das medições, ou seja, são maiores que quase todos (excetuando-se 5%) – e, teoricamente, que todas as mulheres. Mas, mesmo nesse grupo, existem grandes diferenças.

Tomemos a medida entre as nádegas e o joelho dos maiores homens no estudo: no grupo norte-americano, a média era de 67 centímetros, mas os holandeses eram maiores, com 70 centímetros. Leva-se em conta também o fato de que ninguém em um avião se senta com as costas retas e joelhos dobrados a 90 graus, além de variações no comprimento da panturrilha e da coxa.

O resultado é que as medições realmente não representam formas diferentes do corpo e variações no modo em que as pessoas se sentam.

Além disso, escolher o 95% dos homens significa que os outros 5%, cerca de 1 em cada 20 homens, estarão usando assentos pequenos demais. "Isso corresponde a 10 pessoas em cada avião que ficarão desconfortáveis, bem como as que estão ao lado delas", disse Kathleen.

Uma grande falha no design de assentos, no entanto, é que o homem usado como modelo não é necessariamente maior que uma mulher, particularmente nas partes do corpo em contato com o assento.

Em termos de largura de quadril, mulheres são maiores que homens. No estudo, 95 por cento das mulheres norte-americanas tinham uma largura de quadril de 50 cm em comparação com 43,5 cm dos homens.

De acordo com o SeatGuru.com, site que coleta dados sobre tamanhos de assento de dezenas de companhias aéreas, a largura adotada pela classe econômica típica varia entre 43 e 45,7 centímetros. Isto significa que os assentos serão confortáveis para muitos, mas, para cerca de 1 em 4 mulheres, ele será muito pequeno nos quadris, fazendo com que 'invadam' o assento adjacente.

Na verdade, a parte mais larga do corpo são os ombros, motivo pelo qual acabamos por bater cotovelos e ombros com passageiros ao nosso lado, ou nos inclinando na direção da janela ou do corredor para evitar o contato com o vizinho de assento.

A questão vai além do conforto. Kathleen observa que os passageiros espremidos e que se tocam continuamente estão mais propensos a espalhar vírus ou outras doenças. As pessoas confinadas em lugares apertados e que não podem se mover confortavelmente também se arriscam a desenvolver "hot spots" – princípio das escaras que ocorrem em pacientes acamados que não são movidos com frequência.

A preocupação maior é o risco de coágulos sanguíneos, incluindo uma condição que pode ser fatal chamada trombose venosa profunda.

"Quando sentamos de um modo em que não podemos nos mover, surgem pontos de compressão após meia hora, mais ou menos. A dor e o desconforto são seu corpo dizendo que algo está errado, e no avião, há o risco de coágulos de sangue. Esse é um problema grave que estamos subestimando", explica Kathleen.

Quando se trata do assento reclinável, a medida de conforto mais importante é a distância entre eles, medida de qualquer ponto em um assento até o mesmo ponto do da frente ou atrás dele.

De acordo com o SeatGuru, a distância entre os assentos é a somatória do espaço para sentar e esticar as pernas. A medida nos voos de curta duração é de cerca de 79 centímetros na maioria dos aviões, variando de apertados 71 centímetros em algumas companhias aéreas a espaçosos 97 em outras. 

"Essa distância é o que mais preocupa os passageiros", disse Jami Counter, diretor do SeatGuru e do TripAdvisor. "Quando falamos em um padrão de 78 centímetros, isso é bem apertado; 71 é terrivelmente apertado. Os aviões parecem realmente apertados e lotados".

Os funcionários da Recaro Aircraft Seating, empresa alemã fabricante de assentos, disseram que o projeto precisa levar em conta os requisitos de segurança, peso, conforto dos passageiros e necessidades de espaço do avião, e precisa ser suficientemente flexível para poder ser usado em vários layouts das aeronaves.

Novo modelo com encosto fino pode ser o fim do problema


A Recaro introduziu um novo assento com encosto mais fino, o que dá mais espaço para as pernas do passageiro de trás. Os projetistas também moveram o bolso do assento para cima da mesinha.

A Recaro recebeu encomendas de mais de 200 mil assentos desde que introduziu esse modelo no final de 2010.

"Claro, é possível instalar assentos em uma aeronave a uma distância mais confortável um do outro, para que todo mundo tenha espaço suficiente para as pernas", disse Rene Dankwerth, vice-presidente de pesquisa e desenvolvimento da Recaro, em resposta por escrito. "No entanto, o preço da passagem certamente aumentaria".

Com quase dois metros de altura, o professor associado de Ciência Comportamental na Booth School of Business da Universidade de Chicago Devin Pope sabe o risco de se sentar atrás de alguém que gosta de reclinar o assento.

E comparou o fato ao clássico experimento de economia chamado o Jogo do Ditador, em que uma pessoa recebe US$10 e pode ficar com tudo ou dividi-lo com alguém. Surpreendentemente, o 'ditador' muitas vezes opta por dividir o dinheiro.

"Às vezes, as pessoas realmente se importam umas com as outras", disse. "Acho que isso mostra por que muita gente não reclina o encosto da cadeira".

Fonte: The New York Times via iG

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