domingo, 15 de junho de 2008

Luxo e ostentação marcam decoração de jatinhos particulares

Clientes pagam milhões de dólares para personalizar os aviões que compram.

As exigências vão de assentos em forma de trono a decoração com ouro.


Aviões têm até escritório e lobby na entrada - Foto: Divulgação (Embraer)

Conforto, beleza, luxo e muita ostentação. Levar para o interior dos jatinhos particulares a decoração que você gostaria em sua casa é a tarefa de profissionais que têm sido muito procurados pelo mercado da aviação executiva. Engenheiros, arquitetos e designers decoram interiores de aviões. E o gosto do cliente vai muito de encontro ao quanto ele pode pagar pelo sonho.

Ter um jato particular ainda é privilégio de poucos no mundo. No entanto, especialistas dizem que o setor da aviação executiva está superaquecido. Só na Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer), com sede em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, a fila de espera para a compra de um jatinho que ainda nem é vendido é para 2012. É o caso dos modelos Phenom 100 e Phenom 300, que, mesmo em fase de testes, estão garantidos para 750 clientes.

Quanto mais complicado o pedido, mais caro o produto final - Foto: Carolina Iskandarian (G1)

Quem está com seu "brinquedinho" quer personalizá-lo. Não faltam histórias de consumidores (a identidade de todos é mantida em sigilo) que pintaram suas iniciais na fuselagem, coloriram asas e portas e pediram toques personalíssimos no interior de suas aeronaves. Ao encomendar um avião na Embraer, um príncipe do Oriente Médio queria que seu assento fosse diferenciado dos outros passageiros. "Ele queria que parecesse um trono", conta Fernando Ponzo, que comanda a equipe de design da empresa.

A fabricação de jatinhos para aviação executiva começou na Embraer a partir de 2000, mas, desde 1982, já havia profissionais para ajudar na decoração das aeronaves comerciais. Hoje, são 30 funcionários no setor. Rindo, Ponzo diz que um dos pedidos mais trabalhosos foi de um cliente que queria granito no piso do avião – os materiais mais usados são a madeira e o carpete.

"Tivemos de desenvolver uma tecnologia para o piso não ficar pesado e não comprometer o alcance", conta. A solução foi colocar apenas uma fina camada para dar a aparência do granito, como o comprador queria. “Gostamos de clientes exigentes porque eles nos ajudam a pesquisar mais”, revela o engenheiro. Quanto mais complicado o pedido, mais caro o produto final. Os preços dos jatinhos podem variar de US$ 3 milhões (cerca de R$ 5 milhões) a US$ 45 milhões (cerca de R$ 73 milhões), dependendo do modelo.

Por isso, todo cuidado é pouco. Nos hangares da Embraer, só pessoas autorizadas entram nos aviões particulares em fabricação. A decoração é um toque pessoal, que não pode ser visto por muitos. Quando se pode entrar, é preciso colocar touca e sapatilha. Exagero? “A pessoa que paga milhões de dólares por um avião não quer ver nenhum arranhãozinho quando recebê-lo pronto”, conta um funcionário da empresa. E completa: “A touca é para que o óleo do cabelo não encoste no teto da aeronave”.

O perfil do cliente varia. Os norte-americanos gostam mais de tons mais leves, menos chocantes. Já os compradores do Oriente Médio buscam decorar seus aviões com cores fortes, madeiras escuras e até com detalhes em ouro. “O luxo o Oriente Médio está ligado à cultura deles, ao ouro, ao esbanjamento. Na Europa, o luxo é relacionado ao prazer, ao privilégio”, diz Ponzo.

Na maior parte dos casos, a palavra final é das mulheres dos clientes - Foto: Divulgação (Embraer)

Segurança

Mas nem sempre a exigência pode ser atendida. Quando sai da fábrica, um avião deve preencher todos os requisitos de segurança junto aos órgãos da aviação e isso inclui o tipo de material usado no interior das aeronaves. Por serem inflamáveis, a madeira e os carpetes passam por tratamentos químicos para que queimem menos rápido em caso de incêndio. É uma espécie de impermeabilização. O problema é quando o comprador não entende isso. “Para as demandas esdrúxulas, a gente costuma dizer ‘não’. Mostramos o impacto de tempo, custo e peso”, conta o designer Ricardo Abelheira, que trabalha com Ponzo.

“Às vezes, o cliente quer um carpete roxo. Nesse caso, tudo bem”, completa Abelheira, rindo. Eles contam que o dono de um cassino nos Estados Unidos comprou um jatinho e pintou quatro cartas de baralho na fuselagem. Outro, quis a parte externa do avião toda na cor vinho e pintou na cauda um feto. Difícil entender? Não para esses profissionais, acostumados a pessoas com muito dinheiro. Se a segurança estiver em dia, eles realizam o sonho bancado pelo comprador.

E bota sonho nisso. Os jatinhos Lineage 1000 são o ‘top de linha’ na Embraer. Não se pensa em ter um desses sem ao menos ter US$ 45 milhões no bolso. Por ser o maior, comporta até 19 passageiros, suíte com chuveiro, escritório e lobby (na entrada). O interior dele foi inspirado em hotéis de luxo. “São 70m² de área. Tem gente que mora em apartamentos menores do que isso”, diz Ponzo.

Ele revela que são dadas várias de opções de cores, modelos e formas para pisos, assentos e mobília em geral. Muita coisa vem de trabalhos em conjunto com escritórios especializados no exterior. É só o comprador escolher o que lhe agrada e esperar pelo jatinho pronto. E, na maioria dos casos, a palavra final é das mulheres dos clientes. “Elas dão mais palpite na decoração”.

Mercado promissor

São diversos os motivos que fazem uma pessoa comprar um jato particular. Viajar demais a trabalho, fugir do caos nos aeroportos brasileiros, não se prender aos horários e atrasos das companhias aéreas ou mesmo ter uma aeronave à disposição para passear com a família nos fins de semana. A demanda por pedidos é tanta que a aviação executiva já representa 15% da receita da Embraer. E a previsão dos técnicos é que, em uma década, a frota no mundo dobre. Atualmente, são cerca de 15 mil jatinhos cortando os ares do planeta.

Apesar do crescimento no setor, Ponzo não vê com bons olhos criar a profissão específica de “decorador de interiores de aviões”. Para ele, o “barato” está em poder captar em cada profissional a experiência anterior dele. “Acho que não vale a pena fechar o funil para o design de aviões porque a gente quer buscar novidades”. Novidades que passam até pela cromoterapia.

“A gente estuda a tensão, a ansiedade e o medo. São os fatores humanos. É como a coloração do avião atenua a percepção ruim (em caso de passageiros com medo de voar). Se a sensação no pouso ou na decolagem é ruim, a gente tenta fazer um ajuste sutil na iluminação”, conta Ponzo. Mimos e sutilezas que fazem a diferença e garantem sempre uma boa viagem.

Fonte: G1

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