sábado, 10 de setembro de 2022

Entenda até que ponto o piloto automático do avião é automático mesmo

Equipamento desenvolvido há mais de 100 anos é fundamental para a segurança dos voos e a navegação das aeronaves.

Controles do sistema de piloto automático de um Airbus A340 (Foto: Kiko Alario Salom)
Nos primórdios da aviação, um piloto precisava manter atenção constante nos comandos e instrumentos do avião para voar com segurança e no caminho certo. À medida que o alcance e a velocidade das aeronaves aumentavam, permitindo voos de muitas horas, a concentração contínua levava os pilotos à exaustão.

Era uma dificuldade que comprometia o propósito dos aviões, que prometiam percorrer grandes distâncias, mas acabavam limitados pelo vigor físico dos pilotos.

As soluções para esse problema da aviação começaram a ser desenvolvidas menos de uma década após o voo pioneiro de Alberto Santos Dumont com o 14-Bis. O primeiro piloto automático para aviões foi criado em 1912 pela Sperry Corporation, empresa dos Estados Unidos que mais adiante inventou uma série de importantes dispositivos mecânicos e eletrônicos para aviões.

O sistema de piloto automático da Sperry contava com um giroscópio e um indicador de altitude conectados por dispositivos hidráulicos aos lemes de controle lateral e vertical do avião. Isso permitia que a aeronave voasse em linha reta e nivelada sem a atenção do piloto, além de realizar correções automáticas (nos eixos lateral e vertical).

Para demonstrar que o equipamento funcionava, a empresa fazia exibições aéreas em baixa altitude com os pilotos mostrando as mãos para cima, fora dos controles do avião.

“O piloto automático é um dispositivo que aumenta a segurança do voo e diminui muito a carga de trabalho manual dos pilotos, que podem focar no gerenciamento do voo. O sistema usa dados do GPS, sensores e comunicação por rádio para orientação, e dispositivos servomecânicos e atuadores elétricos controlam automaticamente as superfícies de controle do avião”, diz Danilo Andrade, diretor de segurança operacional da Gol Linhas Aéreas, em entrevista ao CNN Brasil Business.

“É um equipamento muito importante para a navegação em voos longos ou em condições de baixa visibilidade”, afirma.

Na maior parte do mundo, o piloto automático é um item obrigatório para aviões com mais de 20 assentos. Em jatos comerciais, como nos Boeing 737 MAX da Gol, utiliza-se o piloto automático de três eixos de controle (lateral, vertical e longitudinal) com autothrottle (acelerador automático). Ou seja, é um sistema capaz de movimentar a aeronave em qualquer direção.

Boeing 737 MAX da Gol (Foto: Divulgação)
“E o 737 usa dois sistemas de piloto automático em conjunto. Aviões maiores, como o 777 e o 787, usam até três pilotos automáticos”, diz o especialista.

O piloto automático de três eixos com autothrottle (ou autothrust, em aviões da Airbus) é o sistema mais comum usado em jatos e turboélices comerciais modernos.

Aeronaves de pequeno porte também podem ser equipadas com piloto automático de eixo único, que controla somente o ângulo de inclinação ou o sistema de dois eixos, que comanda a inclinação e o movimento lateral.

Pilotos programam orientações


“Antes de decolar, os pilotos de aviões comerciais programam o voo na interface do piloto automático. É como abrir um arquivo no computador que contém os dados da rota de voo com as instruções para o piloto automático”, diz o especialista.

“Depois, os pilotos inserem os dados variáveis, como o peso do avião, condições climáticas do momento e os pontos de saída e chegada [a direção do pouso na pista], que variam de acordo com o vento. Normalmente, o piloto automático é acoplado depois decolagem, durante a fase de subida, e segue as orientações do voo previamente programadas”, afirma Andrade.

Até que ponto o piloto automático é automático?


Já existem sistemas de piloto automático capazes de automatizar quase todas as fases de voo. A Airbus, por exemplo, testou recentemente um jato A350 capaz de executar decolagens automáticas.

Por outro lado, o sistema “sabe” pousar sozinho. O primeiro avião comercial com essa tecnologia foi o Douglas DC-10, lançado de 1960. “É comum aviões executarem pousos com auxílio do piloto automático, principalmente em condições de baixa visibilidade. A única coisa que o sistema ainda não faz é taxiar e decolar o avião”, diz o diretor da Gol.

O procedimento de pouso automático, no entanto, só é possível em aeroportos equipados com o ILS (sigla em inglês para Sistema de Pouso por Instrumentos). “O avião se ‘conecta’ ao aeroporto com ILS e eles vão trocando informações. O sistema ILS tem diferentes níveis. Os mais avançados permitem realizar pousos em condições de zero visibilidade”, afirma Andrade.

“O piloto automático avisa quando ele está ‘armado’ para proceder com o pouso automático. Isso quer dizer que todos os sensores e controles de superfícies estão funcionando. Se ele não ‘armar’, o piloto pode continuar com o pouso manual ou arremeter.”

Os pilotos desligam o sistema automático logo após o pouso. “Se ficar ligado, o piloto automático pode parar o avião sozinho da pista”, disse o especialista da Gol, acrescentando que o sistema não é capaz de liberar ou recolher o trem de pouso ou acionar os reversores dos motores no pouso.

Mas não pense que os pilotos ficam apenas observando o trabalho de seus “colegas” automáticos. “A atuação do piloto durante o voo não é passiva, mesmo com o piloto automático acionado. Todos os movimentos previstos no plano de voo são ‘cantados’ pelo piloto antes de serem executados pelo sistema automático. É um procedimento padrão na aviação. Indica que o piloto verificou a ação que será realizada pelo comando automático”, diz Andrade.

E se o piloto automático parar de funcionar?


“O 737, por exemplo, tem dois sistemas de piloto-automático. Aviões maiores têm três. O nível de redundância na aviação é sempre muito alto, justamente para evitar problemas durante o voo. É muito raro de acontecer, mas se o piloto automático parar de funcionar, os pilotos podem continuar o voo em modo manual”, afirma o diretor de segurança operacional.

Não fosse pelo sistema de piloto automático, os aviões seriam veículos de baixo alcance ou então precisariam de mais tripulantes para revezar os comandos. O sistema a bordo de aviões comerciais ainda não é capaz de tomar decisões, mas essa tecnologia já existe e vem sendo testada por diversas fabricantes nos eVTOLs (veículos elétricos de pouso e decolagem vertical).

“O próximo passo tecnológico do piloto automático e ele se tornar autônomo. Essa tecnologia um dia vai chegar na aviação comercial”, conclui Andrade, que também é comandante da Gol.

Por Thiago Vinholes (CNN Brasil Business)

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