quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Companhia aérea de Israel é criticada por discriminação às mulheres

A companhia aérea nacional de Israel, El Al, está sendo criticada por permitir que homens judeus ultra-ortodoxos perturbem seus voos pelo fato de se recusarem a sentar ao lado de mulheres. Uma petição na change.org reivindica que a empresa "acabe com o bullying, a intimidação e a discriminação contra mulheres em seus voos".

De acordo com passageiros, um voo feito na semana passada entre o aeroporto JFK, em Nova York, e o aeroporto Ben Gurion, em Tel Aviv, mergulhou no caos quando um grupo grande de haredim (judeus ultra-ortodoxos) se recusou a sentar-se ao lado de mulheres, obedecendo a seus preceitos religiosos.

Petição na internet pede que El Al proíba discriminação de
judeus ultra-ortodoxos a mulheres em voos

O episódio levou outras mulheres a denunciar casos semelhantes ocorridos em voos internacionais com destino a Tel Aviv ou partindo da cidade.

Amit Ben-Natan, passageira de um voo da El Al que partiu de Nova York na semana passada, disse que a decolagem foi atrasada por vários e repetidos pedidos de homens ultra-ortodoxos para que passageiras fossem transferidas para outros assentos.

"Algumas pessoas ficaram em pé nos corredores e se recusavam a ir para frente", ela disse ao site Ynet. "Embora todos tivessem bilhetes com assentos numerados que tinham comprado com antecedência, pediram que trocássemos de assentos com eles e chegaram a oferecer dinheiro, porque não podem sentar-se ao lado de uma mulher. Evidentemente, o avião não podia decolar enquanto houvesse pessoas em pé nos corredores."

Outra passageira no voo, identificada apenas como Galit, disse que passageiros ultra-ortodoxos sugeriram que ela e seu marido se sentassem separados para se adaptar às exigências religiosas deles. Galit se negou, mas disse: "Acabei sentada ao lado de um homem haredi que se levantou do assento assim que a decolagem terminou e ficou em pé no corredor."

Num voo diferente, Elana Sztokman, diretora executiva da Aliança Feminista Judaica Ortodoxa, recusou um pedido de mudar de assento, com isso desencadeando "negociações frenéticas" entre homens ultra-ortodoxos e funcionários da companhia aérea.

"O que me aconteceu nesse voo não foi diferente do que acontece em quase todos os voos", ela contou à rádio Voz de Israel. "Você embarca, e o avião está prestes a decolar, mas um grupo inteiro de homens ultra-ortodoxos começa a fazer confusão, andando de um lado a outro, cochichando, indo para lá e para cá para tentar encontrar assentos diferentes. Qualquer pessoa que já tenha viajado na El Al já passou por isso."

Sharon Shapiro, de Chicago, é a organizadora da petição online, que até a manhã da terça (30 de setembro) já tinha cerca de mil assinaturas. Ela disse que "não é certo que as passageiras sejam intimidadas ou molestadas. Pedir com educação é uma coisa, mas, se a pessoa diz 'não', não é certo que ela seja pressionada."

Mas ela acrescentou que o dilema que se coloca para os judeus ultra-ortodoxos é genuíno. "A maioria das pessoas não entende que não é uma questão pessoal, é literalmente a lei religiosa."

Para Shapiro, as companhias deveriam buscar uma maneira de atender às exigências religiosas dos passageiros sem infringir os direitos civis de outros. "Não sei bem por que a El Al pede que os passageiros resolvam essa questão, eles próprios. Seria melhor se as pessoas pudessem embarcar no avião sabendo que iriam sentar-se em um lugar onde ficariam à vontade. Senão, isso aumenta as tensões e os mal-entendidos entre religiosos e seculares."

A petição diz: "Se um passageiro agredisse os funcionários da companhia aérea verbal ou fisicamente, seria retirado do avião imediatamente. Se um passageiro praticasse discriminação racial ou religiosa abertamente contra outro passageiro ou contra um comissário de bordo, seria retirado do avião imediatamente. Então por que a El Al permite a discriminação de gênero contra as mulheres?"

"Por que a El Al permite que passageiras mulheres sejam assediadas e intimidadas para deixar os assentos pelos quais pagaram e que lhes foram designados pela El Al? Os direitos religiosos de uma pessoa não valem mais que os direitos civis de outra pessoa."

A petição sugere que a El Al reserve algumas fileiras de assentos segregados, que poderiam ser comprados com antecedência por um valor mais alto.

Entre os comentários postados no change.org, Judith Margolis, de Jerusalém, ponderou: "O comportamento que envolve o assédio de mulheres em nome da observância religiosa é ultrajante. É inaceitável que companhias aéreas deixem alguns passageiros perturbar os voos."

Myla Kaplan, de Haifa, comentou: "Não me sinto mais à vontade em voar pela El Al, devido ao bullying, aos atrasos e à humilhação geral de ser solicitada a vagar um assento que reservei de antemão".


Foto: David Silverman/Getty Images 

Em comunicado, a El Al disse que faz "todos os esforços possíveis para garantir a tranquilidade dos voos, o cumprimento dos horários e a chegada ao destino em segurança. A El Al se compromete a responder a cada queixa recebida, e, se constatar que há possibilidades de melhora no futuro, essas sugestões serão levadas em consideração."

Passageiras mulheres em voos de outras companhias, como British Airways e EasyJet, que chegam ou partem de Israel, já foram instadas a trocar de assento a pedido de judeus ultra-ortodoxos. Algumas companhias fecham os banheiros durante certos períodos durante os voos para que os homens possam reunir-se para orar.

A indignação quanto aos voos acontece contra um pano de fundo de iniciativas da comunidade ultra-ortodoxa israelense de impor às mulheres regras de vestimenta, restrições a onde podem sentar-se nos ônibus públicos, filas segregadas nos caixas de supermercados e a remoção das imagens de mulheres em outdoors publicitários.

Sztokman -cujo voo aconteceu depois de um giro que ela fez pelos EUA para divulgar seu novo livro, "The War on Women in Israel: A Story of Religious Radicalisation and Women Fighting for Freedom" (A guerra às mulheres em Israel: uma história de radicalização religiosa e mulheres que lutam pela liberdade)-disse que esse tipo de exigência aumentou nos últimos dez anos.

"Muito do que estamos vendo hoje tem a ver com apagar os rostos de mulheres da esfera pública, deletar seus nome de artigos de jornal, não deixar que elas falem nas rádios. É toda uma gama de práticas de exclusão e degradação de mulheres, que vem se agravando muito."

Fonte: Harriet Sherwood (The Guardian) - Tradução: Clara Allain (Folha de S.Paulo)

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