quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Organizações repudiam controle racial em aeroportos dos EUA

Organizações defensoras dos direitos humanos acreditam que a decisão do governo dos Estados Unidos de reforçar os controles dos viajantes procedentes de 14 países, em sua maioria islâmicos, não será eficaz e causará discriminação. O governo de Barack Obama anunciou que submeterá os cidadãos dessas 14 nacionalidades que voarem para os Estados Unidos a maiores controles nos aeroportos, incluindo a revista exaustiva e o uso de scanners corporais.

Todos os cidadãos de Afeganistão, Arábia Saudita, Argélia, Líbano, Líbia, Iraque, Nigéria, Paquistão, Somália e Iêmen deverão se submeter a essas medidas e a uma revisão adicional de sua bagagem de mão antes de entrar em um avião destinado aos Estados Unidos, anunciaram as autoridades. Os cidadãos de Cuba, Irã, Sudão e Síria, catalogados por Washington como “Estados patrocinadores do terrorismo”, também devem passar pelos mesmos controles.

A Administração de Segurança no Transporte (TSA), vinculada ao Departamento de Segurança Interna, informou que a maioria dos viajantes internacionais será submetida a inspeções aleatórias similares, mesmo não sendo cidadãos de algum desses países.

Mas o órgão nega que as novas disposições impliquem a realização de perfis raciais, a prática policial e de inteligência que consiste em elaborar “perfis criminosos”, ou na vigilância seletiva de determinadas pessoas tomando por base em sua origem racial ou religiosa.

“A TSA não faz perfis. Como sempre, suas medidas de segurança se baseiam nas ameaças, não nos antecedentes étnicos ou religiosos”, disse a porta-voz do organismo, Kristin Lee. “Apenas somos tão fortes como nosso ponto mais fraco”, disse Cindy Farkus, encarregada de programas de segurança internacional da TSA.

“Sempre procuramos nos adiantar às ameaças”, completou. Mas, representantes da organização Conselho Muçulmano de Assuntos Políticos disseram à IPS que as novas disposições da TSA “são uma solução política para um problema de segurança”.

A diretora de comunicações do Conselho, Edina Lekovic, pediu a adoção de inspeções baseadas na conduta e não nos perfis raciais, e descreveu as disposições da TSA como uma “solução de preguiçosos, que possivelmente faça nos sentirmos bem, mas que, de fato, apenas cria lacunas que aumentam a insegurança”

Lekovic acrescentou que “os extremistas violentos poderão identificar e aproveitar estas lacunas. Além disso, a nova política afeta profundamente o compromisso declarado de Obama com os direitos civis. A Igualdade perante a lei e a necessidade de recompor as relações entre os Estados Unidos e o mundo islâmico”.

Lekovic também revelou que integrantes de sua comunidade lhe disseram que os funcionários da TSA no aeroporto de Dulles, em Washington, têm instruções para fazer revistas adicionais nas mulheres com lenços na cabeça. A versão não pôde ser confirmada com a TSA.

Segundo a União Norte-Americana pelas Liberdades Civis (Aclu), o governo “deve adotar os padrões de suspeita individualizada e cumprir medidas de segurança que representem a menor ameaça para as liberdades civis e cuja eficácia esteja comprovada. Os perfis raciais e a revista corporal sem objetivo específico não atendem esses critérios”.

Michael German, assessor de segurança nacional da Aclu em Washington e ex-agente do FBI (Escritório de Investigação Federal), disse que “devemos nos concentrar em investigações baseadas na evidência, com objetivos definidos e fundamentadas na suspeita individualizada, o que seria mais coerente com nossos valores e mais eficaz do que desviar os recursos para um sistema de suspeita coletiva”.

“As políticas muito gerais, como os perfis raciais e a revista corporal invasiva de todos os viajantes além de violarem nossos direitos e valores também desperdiça recursos valiosos e desviam a atenção das ameaças reais”, alertou German.

Para a Aclu, o plano do governo de submeter cidadãos de alguns países a uma revista discriminatória mais rigorosa é uma estratégia ruim porque não há forma de prever a origem nacional de um terrorista e porque muitos terroristas surgiram de países que não estão na lista.

A organização mencionou o caso do “terrorista do sapato”, Richard Reid, cidadão britânico que em 2001 tentou explodir com explosivos escondidos no sapato um avião que fazia a rota Paris Miami. Também eram britânicos os quatro responsáveis pelos atentados com bomba no metrô de Londres que mataram 56 pessoas em 2005.

“Separar os viajantes de uns poucos países específicos para submetê-los a uma revista mais rígida é essencialmente um pretexto para o perfil racial, que é ineficaz, inconstitucional e viola os valores norte-americanos”, disse a Aclu.

“Os estudos empíricos de terroristas mostram que não existe um perfil do terrorista, e utilizar um perfil que não reflete essa realidade apenas desvia os recursos ao fazer com que os agentes se concentrem em pessoas inocentes”, disse German.

“O perfil racial também pode ser contraproducente ao prejudicar o apoio da comunidade às gestões antiterroristas dos Estados e gerar uma injustiça que os terroristas poderão aproveitar para justificar mais atos de terrorismo”, acrescentou.

Nihad Awad, diretor-executivo da organização Conselho das Relações Americano-Islâmicas, disse em uma declaração pública que “com estas decisões, quase todo norte-americano muçulmano que viajar para visitar parente ou amigos ou estiver em peregrinação à Meca automaticamente ficará marcado para ser submetido a inspeções especiais de segurança. Isso é realizar perfis raciais”.

“Embora individualizar os viajantes segundo sua religião ou origem nacional consiga que alguns sintam maior segurança, serve apenas para alienar e estigmatizar os muçulmanos e nada faz para melhorar a segurança nos aviões”, acrescentou Awad.

“Todos apoiamos as medidas de segurança eficazes que protejam os passageiros de um atentado como o do dia de natal. Mas, as políticas adotadas como atos condicionados não resolverão este grave desafio para a segurança pública”, afirmou.

Elo deste Conselho junto ao governo, Alejandro Beutel disse que “as novas diretrizes da TSA representam uma vitória propagandística para a rede radical islâmica Al Qaeda e outros grupos extremistas violentos, já que privam certos grupos de pessoas de suas liberdades civis com base em sua origem étnica e seu país de origem. Chamem como quiserem, mas isto é perfil religioso e étnico da pior espécie”, disse Beutel. Vários juristas também criticaram as novas medidas.

“O perigo com os perfis baseados na nacionalidade é que incluem grande quantidade de pessoas inocentes, podem alienar aqueles que precisamos ter do nosso lado se queremos reduzir o recrutamento da Al Qaeda”, disse David Cole, professor de Direito na Universidade de Georgetown, em Washington.

Este tipo de estratégia também “nos tira a atenção daqueles, como Richard Reid e Zacarias Moussaoui, que são cidadãos de outros países que não encaixam no perfil”, acrescentou. Moussaoui é um cidadão francês, processado por conspiração para assassinar cidadãos norte-americanos, como parte dos atentados terroristas realizados em 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington.

O ex-secretário de Segurança Interna, Michael Chertoff, disse que “este caso ilustra o perigo e a bobagem que implicam os perfis”, em resposta aos numerosos políticos que exigiram a realização de perfis raciais. “Creio que não são apenas problemáticos do ponto de vista dos direitos civis, mas, francamente, no final não são muito eficazes”, afirmou.

Um informe do Departamento de Justiça de 2003 conclui que “os perfis radicais na aplicação da lei não são apenas um erro, mas também são ineficazes”. As suposições baseadas na raça “perpetuam os estereótipos raciais, que são prejudiciais para nossa rica e diversa democracia e empanam materialmente nossos esforços para manter uma sociedade justa”, diz o informe.

Várias autoridades da área de segurança no transporte recomendaram que os Estados Unidos adotem as práticas de revista utilizada nos aeroportos e nas empresas de aviação de Israel. A companhia El Al, uma das mais seguras do mundo, dedicou anos no desenvolvimento de métodos de inspeção baseados na conduta dos passageiros, e não em seu aspecto, país de origem ou em suas roupas.

Fontes: Envolverde/IPS/Vermelho/Blog Notícias sobre Aviação

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