Trinta e cinco segundos de queda livre a 10 mil pés ou 3 mil metros de altura, quando o corpo atinge a velocidade de 100km/h. Quem vive essa sensação não esquece jamais, independentemente da idade, mas, quando se tem quase um século de existência, a experiência pode ser ainda mais radical. Na fase da vida na qual, em tese, busca-se sossego, Carlos Eustáquio da Rocha, que completa 84 anos no próximo domingo, não quis saber de ficar em casa de roupão. Muito pelo contrário: com convicção não encontrada em muitos jovens, decidiu fazer o seu primeiro salto de paraquedas.
O que moveu Carlos foi um sonho de infância, de quando se mudou com os pais, em 1932, para o Bairro Jaraguá, ao lado do Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte. Mestre de obras, o pai, José Augusto da Rocha, foi trabalhar na construção da pista de pousos e decolagens. De tanto ver aviões, Carlos criou gosto pelo ar. No aeroporto, começou como servente, mas aprendeu o ofício de mecânico de aeronaves. Também trabalhou no Aeroclube de Minas Gerais. Entre 1944 e 1947, serviu na Aeronáutica como artífice e, nesse meio tempo, aprendeu a voar.
Mesmo com a proximidade com os aviões, há cerca de dois meses, ao acompanhar o primeiro salto da neta Luíza Rocha, de 18, ganhou coragem e decidiu pular. Para mostrar que todas as etapas da vida são igualmente um começo, ele falou da decisão aos quatro filhos, nove netos e uma bisneta. Iria saltar de paraquedas e entrar para a história como o homem mais velho a fazê-lo no Brasil, conforme informações do instrutor André Funghi, do clube de paraquedismo Avis Rara, que o acompanhou no salto duplo.
O local escolhido para a introdução ao universo do skydive ou paraquedismo foi uma belo planalto na região da Serra do Cipó, cercada de montanhas e um céu de brigadeiro, para deixar com inveja até mesmo Brasília, cidade famosa pelo seu firmamento. De estatura mediana, Carlos estava alinhado para o evento, com camisa e calça de linho. Para completar o visual, o cabelo bem posto para trás. Em nenhum momento se ouviu dele qualquer palavra de hesitação. “Você educa a mente para não ter medo, porque senão a aventura pode se tornar um suplício”, aconselha.
A preparação foi acompanhada por filhos, netos e a bisneta, que visivelmente se orgulhavam da coragem de Carlos. O macacão foi escolhido pelas netas. O instrutor deu as orientações de segurança. Dias antes de iniciar a aventura, como de rotina, Carlos fez um check-up.
Por volta das 13h desse sábado, o monomotor decolou e, depois de 15 minutos, tempo necessário para atingir altitude para o salto, a família pôde ver no céu alguns pontinhos pretos, bem pequenos que, de repente, se transformam em coloridos paraquedas. A descida foi acompanhada por uma torcida animada, com direito a palmas e muita vibração.
Ao pousar, Carlos estava visivelmente diferente. Já não era mais o mesmo de quando decolou. “Sou um pássaro livre. Senti-me realizado. A parte mais difícil é a saída. Depois que o paraquedas abriu, pude apreciar a paisagem”, disse ele, ainda sobre o efeito da adrenalina. A recepção não poderia ser mais calorosa. Filhos e netos o esperavam com uma faixa: “Viver a vida é voar bem alto e ter a certeza de que a cada dia é um novo momento para recomeçar. Parabéns ao vovô mais radical de Minas Gerais”.
Fonte: Márcia Maria Cruz (Estado de Minas) via Portal UAI
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