domingo, 7 de março de 2010

O plano de voo de Constantino

Apesar de a Gol não ser líder no transporte aéreo de passageiros no país, Constantino de Oliveira Junior, presidente da companhia, está satisfeito, porque lidera em rentabilidade:

– Temos o menor custo do setor de aviação – diz.

Com um avião ou decolando ou pousando a cada minuto, a empresa – que inclui a marca Varig – tem um plano de voo robusto para os próximos anos. Renovação da frota, aumento de serviços para passageiros – no solo e a bordo – e ampliação do uso do programa de milhagem Smiles estão entre alguns dos rumos. O avanço se dará para consolidar, explica Constantino, a forma de atuação da empresa, que nasceu em janeiro de 2001 inovando com tarifas baixas e uso da internet para a venda de passagens.

– Como o setor é volátil em razão das variáveis (câmbio e petróleo) envolvidas, é preciso ter um balanço forte – explica.

Em entrevista concedida na tarde sexta-feira em Porto Alegre, o comandante da Gol diz que os bilhetes aéreos com preços atrativos vão continuar, como forma de conquistar mais passageiros:

– Quem utiliza o modal aéreo certamente voltará a utilizar novamente.

Confira os principais trechos da entrevista.

10 anos e novos serviços

Teremos um serviço de bordo mais flexível, que é parte de um projeto de venda a bordo. Vamos oferecer opções de bebidas quentes e frias, alcóolicas ou não, chocolates, enfim, uma série de opções que visam a atender à necessidade do cliente. Para nós, isso pode significar uma receita adicional e uma melhoria no resultado da companhia. Também vamos oferecer um sistema para que o passageiro possa usar seus smartphone ou notebook a bordo.

Portal ampliado

Temos outras iniciativas como transformar o site de vendas da empresa em um portal de viagens, dando ao cliente a possibilidade de fechar em um negócio todas as etapas da viagem, como aluguel de carro, hotel e tíquetes de eventos culturais. Também pretendemos intensificar o uso do celular na interação entre o cliente e a companhia, principalmente no check-in, reduzindo tempo de filas. O ano 10 é o de reafirmação e consolidação desse modelo de negócio.

Sem aumento de tarifas

Quando a Gol iniciou as operações, a nossa diferença de custo e de preço com as principais companhias chegava a 60%. De lá para cá, o preço das passagens caiu substancialmente. Atribuo isso ao “efeito Gol”. Ainda temos o menor custo da indústria e tarifas competitivas com passagens de ônibus, em todo o mercado doméstico. Se tivéssemos tarifas crescentes, a indústria não teria crescido três vezes e meio o PIB, como ocorre desde 2003. Nos últimos sete ou oito meses, a Gol cresceu mais de 30% em todos os meses. Não enxergamos, agora, guerra de preços, mas tarifas baixas. Nossas expectativas de resultados para 2010 não contemplam aumento de tarifa.

Receitas e custos

Receitas adicionais, que eram de 4% a 6% há dois anos do faturamento total, representam hoje entre 12% e 14%. Isso é, venda de milhas a parceiros, vendas a bordo, vendas com parcerias com locadoras de automóveis, redes de hotéis, publicidade a bordo, parcelamento de passagens e assim por diante. Pretendemos elevá-las a 20% em dois anos, o que vai melhorar nossa margem operacional.

Programa Smiles

Estamos implantando uma nova plataforma que permitirá uma interação entre a empresa e o cliente por outros meios que não o call center e a internet. Será principalmente pelo celular. O sistema também permitirá criar uma moeda Smiles para negociarmos com parceiros, para a milha não ser utilizada só no tíquete aéreo. A adesão ao Smiles vem crescendo barbaramente, de 80 mil a 100 mil novos clientes por mês. É uma marca muito forte.

Marca Varig

Preservamos a marca Varig como uma marca de serviços, como é vista no Brasil e lá fora. Estamos explorando essa marca nos voos de médio curso, como Caracas e Bogotá, onde o serviço é fundamental, com refeições quentes e bebidas alcóolicas. E a Varig é muito bem reconhecida nesse tipo de serviço. Se usarmos o nome Gol em Caracas, ninguém conhece. Mas a Varig é um ícone, o que facilita muito a entrada nesses mercados. A gente preserva a marca para, quando for o caso, identificar um serviço diferenciado.

A Varig se pagou?

Depende da óptica. O desembolso de US$ 320 milhões contemplou recursos e ações. Só a assinatura do branding (uso da marca Smiles em cartões bancários) como Banco do Brasil e Bradesco gerou uma entrada de recursos de R$ 250 milhões em junho passado. Não sei se a operação (compra da Varig) se pagou, mas tenho plena convicção de que fizemos o negócio adequado, o negócio certo.

Futuro da Varig

Durante o período em que o Cade analisava o nosso caso (unir as operações das companhias), usamos a marca Varig no mercado doméstico oferecendo tudo o que simboliza a companhia, como poltronas com mais espaço, serviço de bordo mais robusto, programa de milhagem mais agressivo. Isso gera custo, e é preciso cobrar mais pelo bilhete. Aí nós percebemos que existe, sim, uma vontade, um desejo muito grande dos clientes de ter um serviço como o da Varig, mas eles não estão dispostos a pagar por isso. O retorno não era compatível com a iniciativa.

Longa distância

Um passo para trás é sempre muito complicado, passava por deixar aviões no chão, admitir um prejuízo. Esses aviões ainda custam, cada um, US$ 500 mil por mês e ficaram um ano e meio parados (antes de começarem a ser utilizados em voos fretados). Dar um passo para trás passa pela dificuldade de manter a autoconfiança dos colaboradores e manter a motivação em alta. A Gol nunca havia dado um passo para trás, nem sequer cancelado voo. Foram decisões duras, difíceis, mas feitas com muita consciência.

Voos intercontinentais

Nosso planejamento estratégico (até 2015) define que a Gol vai operar somente com aviões Boeing 737 de nova geração (modelos 700 e 800). E esse planejamento limita o nosso alcance geográfico. Não pretendemos voar com uma frota duplicada (outros modelos). Mas temos buscado parcerias para atender à demanda do cliente Smiles que busca o voo de longo curso. Essas parcerias já estão em curso com as principais companhias do Hemisfério Norte.

Liderança

Trabalhamos para tornar a Gol a companhia preferida dos clientes e isso, naturalmente, pode levá-la à liderança. Mas não colocamos a liderança à frente da qualidade nos serviços, da segurança, da rentabilidade, de um balanço forte. Não vamos buscar a liderança a qualquer custo. É lógico que, se ela vier, vou ficar muito feliz. Me deixa muito mais satisfeito perceber que a Gol é líder em rentabilidade, em solidez, em pontualidade e qualidade no atendimento.

Mercado doméstico

Em São Paulo, Congonhas está saturado. Em Guarulhos, já existem restrições de crescimento. Vamos imaginar que continue esse gargalo. O crescimento da empresa se dará no que chamamos de operações “upper-hub”. Hoje, um cliente que sai de Porto Alegre e quer ir a Recife faz a conexão em Guarulhos, e ocupa um assento de Guarulhos a Recife que poderia ser de um paulista. O que faremos? Vamos transferir as conexões para outros hubs (aeroportos de conexão), como Rio, Brasília ou Belo Horizonte. Abrimos espaço para a demanda específica e criamos novos voos. Assim surgem condições de crescimento.

Mercado internacional

Temos crescido muito nos voos para o Caribe. São voos semanais para oito destinos partindo de Guarulhos, Brasília, Caracas e Bogotá. Os que passam por Caracas e Bogotá têm pintura Varig e duas classes de serviço. Temos planos para Barbados, Isla Margarida e Havana.

Operação de aeroportos

O nosso negócio é transporte de passageiros. Se tivermos de assumir a operação de um aeroporto para executar o nosso serviço adequadamente, temos disposição para isso e o faremos. Mas, se você me perguntar se eu teria interesse de participar isoladamente de um processo de privatização ou concessão, diria que é cedo para avaliar qualquer possibilidade, porque não vi nada de concreto ainda. O fato é que chegamos até aqui com a Infraero gerindo e construindo os principais aeroportos. Existem gargalos? Existem. Mas não será, necessariamente, a privatização ou concessão que irá resolver esses gargalos.

Acidente e indenizações

Independentemente de dolo ou não, a responsabilidade do contrato de transporte é da Gol e nós temos essa responsabilidade perante todos os familiares e clientes. O esforço da companhia, no primeiro momento, foi prestar toda a assistência às famílias. Depois, fomos buscar aquilo que a Justiça preconiza em termos de remuneração num caso como esse. A questão é que um acordo passa pelos dois lados. Em muitas situações, não está bem definido quem tem direito à indenização. O nosso esforço tem sido por fechar os acordos dentro daquilo que é prática na Justiça. Já fechamos um número enorme de acordos. Mas alguns não temos como fechar ainda.

Pequenos concorrentes

Vou pegar o caso da Gol. Nós viemos para quebrar paradigmas e conseguimos. E quando se observa o atual momento, não se vê ninguém trazendo novidade. Não vejo hoje na Azul e na Webjet nenhum novo atributo. Não quer dizer que não sejam competidores profissionais e competentes. É que não acharam ainda uma forma de criar um novo paradigma. Agora, estão fazendo um excelente trabalho, nos deixam cada vez mais motivados, nos levam a aprimorar. É bom para a indústria. A base de clientes cresce, porque essas companhias também oferecem preços acessíveis, atingem maior número de pessoas. E uma vez que o cliente utiliza o modal aéreo, dificilmente trocará. E, se voou pela primeira vez por um concorrente, tenho certeza de que na próxima viagem vai considerar a Gol como uma opção. ‘‘

Em vídeo, veja outros trechos da entrevista.

Saiba mais sobre a GOL (em .pdf)

Datas marcantes para a empresa (em .pdf)

Fonte: Alexandre de Santi, Marcelo Flach e Maria Isabel Hammes (Zero Hora)

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