Ex-diretora da Anac foi intimada a depor na 3.ª; parentes de vítimas de acidente, ocorrido há 6 meses, preparam protesto
A ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu deve comparecer, na terça-feira, à sede do 27º Distrito Policial, em São Paulo. Intimada pelo delegado Antonio Carlos Barbosa, terá de prestar depoimento sobre a pior tragédia da história da aviação brasileira: a do vôo TAM JJ3054, que há seis meses, mais exatamente no dia 17 de julho do ano passado, resultou na morte de 199 pessoas no Aeroporto de Congonhas.
A ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu deve comparecer, na terça-feira, à sede do 27º Distrito Policial, em São Paulo. Intimada pelo delegado Antonio Carlos Barbosa, terá de prestar depoimento sobre a pior tragédia da história da aviação brasileira: a do vôo TAM JJ3054, que há seis meses, mais exatamente no dia 17 de julho do ano passado, resultou na morte de 199 pessoas no Aeroporto de Congonhas.
Não se sabe se ela virá, uma vez que já fracassaram as duas tentativas anteriores do delegado. Mas, mesmo sem ter a certeza de sua presença, os familiares das vítimas já estão organizados para recepcioná-la, às 14 horas, na porta da delegacia, no bairro do Campo Belo, nas imediações de Congonhas, com uma manifestação de protesto. Para eles, Denise, que dirigia a agência na época do acidente, pode ser uma das responsáveis pela morte de filhos, netos, pessoas amadas.
Apontar e levar a julgamento os responsáveis pelo desastre - quando o Airbus A320 da TAM não conseguiu frear ao pousar, espatifou-se contra um edifício e pegou fogo - virou uma missão para muitas pessoas. Malu Gualberto, advogada de 52 anos, que atuava na área de sucessão familiar, desistiu de seu escritório de advocacia para dedicar-se à apuração das causas da morte de seu marido, Antonio Gualberto Filho, de 56 anos. Funcionário da TAM, ele trabalhava no edifício ao lado da pista, na sala que recebeu o primeiro impacto do avião.
“Não vou descansar enquanto não souber a verdade”, diz ela, na sala de seu apartamento, no bairro do Planalto Paulista, na zona sul. “Aquele avião não poderia ter pousado em Congonhas. Pousou porque puseram incapazes em postos que envolvem a segurança das pessoas."
No canto da mesa com tampo de vidro de sua sala repousa uma revista de circulação interna da TAM, que o marido pôs ali uma semana antes de morrer e ela não tem coragem de retirar.
O administrador de empresas Luiz Moyses, de 36 anos, desfez-se de tudo em Porto Alegre e mudou-se para São Paulo. Instalado num flat em Moema, também na zona sul, dedica-se a acompanhar a investigação do acidente no qual morreu Nádia, sua mulher, aos 33 anos.
“Em nome dela, não vou deixar esse inquérito morrer”, assegura. Ele e Nádia namoraram desde a adolescência e estiveram casados por sete anos. Uma das lembranças dela que Moysés ainda conserva foi a mensagem que enviou pelo celular, ao embarcar no Airbus. “Estou no avião. Ligo quando chegar. Beijos.”
Para conduzir melhor sua luta, eles criaram a Associação dos Familiares e Amigos das Vítimas do Vôo TAM JJ3054 e reúnem-se uma vez por mês em hotéis de São Paulo ou Porto Alegre. Tudo é custeado pela empresa aérea, em decorrência de um termo de compromisso assinado em setembro, na sede da Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo.
A próxima reunião está marcada para o fim de semana que vem, num hotel da zona sul de São Paulo. Ao final, deverão ir para Congonhas e realizar mais um ato de protesto na fila de check-in da TAM, reclamando da falta de esclarecimentos.
O presidente da associação é o professor de Matemática Dario Scott, de 44 anos, morador de Porto Alegre. “Nosso objetivo é descobrir o que aconteceu”, explica. “Não tem sido fácil, porque o inquérito é dificultado pela lentidão das autoridades federais na liberação dos documentos que estão em seu poder. Na transcrição que nos entregaram do material da caixa preta, com 30 minutos, faltam 23 minutos. Cobramos o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, o Cenipa, e responderam que não é relevante. Pode não ser, mas temos direito de ouvir.”
A única filha do professor, a menina Thaís, de 14 anos, tinha embarcado no Airbus com o objetivo de passar o restante das férias de julho na casa dos avós, em São Paulo. Ele e a mulher, Ana, de 48 anos, ainda choram todos os dias. “Ela era a alegria da casa”, diz Dario.
Foi só às vésperas do Natal que eles se desfizeram de roupas e brinquedos da filha, doando quase tudo para crianças pobres. “Estamos pensando em recomeçar”, conta o professor. “Estamos tentando um novo filho. Se não conseguirmos, vamos buscar a adoção.”
Thaís tinha convidado para a viagem a amiga Rebeca Haddad, também de 14 anos. Seu pai, o consultor de empresas Christophe Haddad, francês de 41 anos, 30 dos quais vividos no Brasil, também faz parte da diretoria da associação; e sua segunda mulher, Ana Behs, de 43, é voluntária na assessoria de comunicação da entidade.
Haddad, que também é pai de um garoto de 12 anos, diz estar convencido de que a tragédia não foi acidental. “Pelo que estamos vendo no inquérito policial, houve dolo, houve uma seqüência de negligências. Estamos acompanhando para evitar que acabe em pizza, como aconteceu com as duas CPIs do Apagão Aéreo.”
No dia do acidente, Haddad chegou em casa no começo da noite e ligou a TV, para ver novela. “De repente entrou aquela música de edição extraordinária da Globo. Eu fiquei assistindo. Vi, da sala da minha casa, minha filha ser cremada.”
Para vencer o dia-a-dia, o consultor está recorrendo à ajuda de um psicólogo. O filho, a ex-mulher, a madrasta e os avós de Rebeca também freqüentam terapeutas - cujos serviços são pagos pela TAM, dentro do mesmo acordo assinado em setembro.
Nas conversas com os parentes, as queixas voltam-se quase sempre contra o governo federal. A paulistana Lili Mello, de 40 anos, diz que nunca vai esquecer o gesto obsceno que Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência da República, fez quando soube que a causa do acidente poderia ter sido uma falha mecânica. “Ele riu da morte do meu marido. Deveria ter sido demitido na hora.”
O marido de Lili, o engenheiro Andrei Mello, foi uma das quatro vítimas cujos corpos, de tão destruídos, não puderam ser identificados pelo Instituto Médico-Legal (IML) de São Paulo.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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