18 de setembro de 1974, data daquele que até hoje é considerado o maior
acidente aéreo da aviação sul-mato-grossense - Foto: Roberto Higa
Quando o céu choveu estrelas, um Búfalo da FAB (Força Aérea Brasileira) caiu em Ponta Porã, matando 19 militares. A aeronave C-115 levantou voo na Base Aérea de Campo Grande. Devido ao rigor com o horário do coronel José Hélio Macedo Carvalho, à época comandante da Base e o piloto do Búfalo, muita gente perdeu o embarque. Apesar do flerte com a morte, não era a hora deles. Da explosão, apenas um militar sobreviveu. Um sargento que, para ajudar no pouso, estava de pé e foi arremessado.
Dia 18 de setembro de 1974, data daquele que até hoje é considerado o maior acidente aéreo da aviação sul-mato-grossense. As imagens voltaram à cena 40 anos depois, pela publicação das fotos de Roberto Higa e nos veio à cabeça que relatar o passado pode ser uma das faces do presente e do jornalismo de hoje.
A notícia que estampou jornais e ganhou repercussão nacional hoje volta à capa do Lado B, como forma de reviver o que um dia foi manchete, pela tristeza da tragédia que matou protagonistas do alto escalão militar de todo País e pela ironia. Do acidente, os 19 caixões foram velados no Círculo Militar, clube onde, dias antes, os mesmos senhores dançavam em baile.
Entre os que deveriam estar no avião, mas o destino mudou as regras, o próprio Roberto Higa. As lentes dele que capturaram o que restou da explosão do avião em Ponta Porã. O olhar devia ser muito mais emotivo, porque era ele quem podia estar entre os escombros.
Velório dos 19 corpos foram no Círculo Militar
“Nós tínhamos recebido o convite para ir naquela viagem. Era o encerramento da manobra feita no Estado. Antigamente era treinamento dos militares, que separavam grupos e caçava um ao outro. O motorista que nos levaria acabou que não passou e não embarcamos. Depois ficamos sabendo que o avião tinha caído, pegamos o carro do jornal, uma Brasília e fomos. Foi uma comoção muito grande”, relembra Higa. Além dele e do jornalista Luca Maribondo, mais gente da imprensa havia sido convidada. Ninguém foi.
Aos 11 anos, Germano Barros de Souza Filho ouvia o som das sirenes da chegada dos corpos ao Hospital Geral assim como a corneta tocada por um cabo do Exército que só conseguia chorar. Filho do médico militar diretor do HG e quem reconheceu os corpos, Germaninho era só um menino que do muro de casa acompanhava toda movimentação. Os protagonistas da tragédia eram todos conhecidos da sua família e esta foi a primeira vez que o garoto viu a morte tão de perto. Isso porque seu pai, Germano Barros de Souza também perdeu aquele avião.
“O avião ia fazer escala em Bela Vista, meu pai saiu num jipe atrás, o avião sobrevoou Nioaque e não tinha como descer. Ele então voltou para Campo Grande. Ficamos sabendo que o avião tinha caído na hora do almoço. Foi terrível”, lembra.
No avião estava praticamente todo o comando militar de Campo Grande. Os corpos vieram para a Base em uma locomotiva que viajava sem fazer escala. “Onde era o HG, ao lado tinha uma unidade do exército que era depósito de combustível, o trem entrava lá dentro, aí vinha a ambulância e levava os caixões”, descreve.
O pai do menino foi quem reconheceu os militares através da identificação do uniforme, patente e aliança. “No velório, estavam soldados fardados de gala e o caixão coberto com a bandeira do Brasil. Dois, três dias antes, eles, ironicamente dançavam baile onde horas depois seriam velados. Eu não sei o que aconteceu, o Macedo era um excelente piloto”, conta Germano, hoje com 51 anos.
Na sala histórica da Base Aérea, uma caixa de madeira
guarda os fragmentos do Búfalo - Foto: Paula Maciulevicius
Na sala histórica da Base Aérea, um capa de jornal conta a história do trágico acidente. Bem próximo, uma caixa de madeira guarda os fragmentos do Búfalo. O acidente matou 19 militares, incluindo o então comandante da Base, Coronel José Hélio Macedo Carvalho e o comandante da 9 região militar, general de divisão Alberto Carlos de Mendonça Lima.
O único sobrevivente da tragédia foi o mecânico da aeronáutica, sargento Shiro Ashiushi, que passou mais de um ano no hospital e perdeu as duas pernas. Quando os militares de Campo Grande souberam do acidente, os relatos denominam como “fato macabro”. A notícia chegou trazendo o escurecer do céu. Mesmo sendo por volta de 8h30 da manhã, o céu de brigadeiro se pôs e virou noite na Capital.
Naquela manhã do dia 18 de setembro, a ponta da asa da aeronave bateu num poste e explodiu. Segundo o sub oficial da Aeronáutica e historiador da Base, Carlos Alberto de Carvalho, o avião havia sido reabastecido há pouco tempo, o combustível levou à explosão.
A comitiva do Exército estava, naquele voo, fazendo uma visita de reconhecimento às unidades do interior. Na rota estavam Nioaque e Bela Vista, como o tempo não estava bom, resolveram seguir para Ponta Porã, onde tinha base de apoio.
“O coronel Israel Cavalcante Silva comenta que foi comunicado ao rádio que o avião C-115 iria fazer uma aproximação para pousar. Entretanto, senão fosse possível a aterrissagem, o piloto faria uma arremetida rumo a Campo Grande. A comunicação foi cortada depois disso e o avião acabou caindo entre o aeroporto e a cidade”, conta uma das páginas do jornal.
O único sobrevivente, Shiro Ashiushi, mora, segundo a Base Aérea de Campo Grande, em Taubaté, interior de São Paulo.
Quando o avião caiu, o Brasil ainda passava pelo período de repressão. Na apresentação de uma peça em São Paulo, o compositor e humorista Juca Chaves disse que “havia chovido estrelas no céu de Mato Grosso”, se referindo às patentes dos militares mortos. O episódio entrou para a história e Juca foi repreendido.
Campo Grande em peso esteve na despedida. A imprensa foi impedida de entrar.
Fonte: Paula Maciulevicius (campograndenews.com.br)
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