A caixa preta do vôo 3054 da TAM que em julho do ano passado bateu num prédio da TAM Express, explodiu e matou 199 pessoas em Congonhas, pode não ser a principal peça do quebra-cabeça que os peritos tentam montar para apontar as causas da tragédia. O mecanismo dos manetes, apontado como uma das possíveis vilões do acidente, foi preservado após o incêndio que se seguiu à colisão. Mesmo com temperaturas próximas de 1000 graus, os manetes de aço e os mecanismos de aceleração do avião resistiram ao calor e já foram submetidos a quase 2 mil tomografias e radiografias para que seja remontada a seqüência de comandos da aeronave.
- Eles resistiram à alta temperatura sem sofrer agressão severa - afirma um dos envolvidos na investigação das causas do acidente.
As análises feitas até agora praticamente inocentam o primeiro acusado pela tragédia, o piloto Kleyber Aguiar Lima, que comandava o avião ao lado de Henrique Stephanini Di Sacco.
- O acidente não foi causado por uma decisão errada do piloto. Sozinho, ele não teria causado a tragédia. A pista contribuiu, mas a hipótese de falha no projeto do Airbus e em sua rotina de operação não está descartada. Os procedimentos recomendados à tripulação podem também ter induzido ao erro - diz a fonte.
Segundo o especialista, a suposta posição errada do manete em condição de aceleração não poderia ser vista a olho nu pelos pilotos. A primeira informação após o acidente foi de que um estava em aceleração e outro na posição reverso. O correto seria os dois na posição reverso, como recomendado pelo Airbus, ou na posição adotada pelo último piloto que comandou a aeronave antes da tragédia. No último pouso de sucesso do avião em Congonhas, por causa da pista molhada e escorregadia, o piloto havia optado por deixar um manete em ponto morto, outro na posição reverso. Esta informação foi repassada ao comandante Kleyber Lima.
- Sem nenhuma dúvida, se houve erro do piloto ele foi induzido pela condição da pista do aeroporto. Já temos indicativo claro de que Congonhas não tinha condições de operar com a pista molhada, como ocorreu naquele dia. O sistema de concretagem usado também não foi o mais adequado - diz Sarrubbo.
Numa simulação de pouso do avião, feita por pilotos da TAM e acompanhadas por peritos, feita em janeiro passado, ficou demonstrado que se a pista de Congonhas não fosse tão curta a tripulação teria tido tempo de reagir e fazer as correções necessárias.
- Ele tentou usar o freio manual, o pedal, e conseguiu desacelerar um pouco. Em qualquer outra pista, ele teria tido tempo de tomar outra providência, como acionar o freio aerodinâmico. Ainda que varasse a pista, se tivesse área de escape e não um prédio à frente, poderia ter tido sucesso - diz Sarrubo.
O inquérito da polícia paulista que investiga o acidente já tem 10.000 páginas e 34 volumes. Uma nova simulação será feita ainda este mês para avaliar apenas a influência que a falta do grooving teve neste acidente. A pista de Congonhas havia sido reaberta em 29 de junho, sem o grooving, que são as ranhuras para escoar água e contribuir para a frenagem das aeronaves. O dia da tragédia foi o segundo consecutivo de chuva em São Paulo.
A TAM informou que não vai se pronunciar até que seja concluída as investigações da Aeronáutica . Na investigação do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) o objetivo é detectar a causa do acidente para evitar que novas tragédias ocorram. Na Investigação da polícia paulista, o objetivo é determinar os culpados pelo acidente e responsabilizá-los.
Faltam ainda análises do cálculo de peso da aeronave. Há suspeita que o avião estivesse acima do peso e não dentro de seu limite máximo. Outra análise ainda em curso é sobre o concreto betuminoso resinado a quente usado para recapear a pista do aeroporto. Há desconfiança de que o material usado não seja o contratado e de que, por pressa, a pista tenha sido liberada antes da secagem total.
Envolvidos na apuração do acidente dizem que há desejo das autoridades de encerrar os trabalhos antes de 17 de julho, data em que o acidente completa um ano. Há casos, porém, que para determinar com exatidão as causas a investigação dura entre 2 a 5 anos. Se terminar antes da hora, a apuração corre o risco de não dar as respostas que as famílias dos 199 mortos na tragédia esperam receber. Há ainda o risco oposto, de demorar o suficiente para que o assunto caia no esquecimento.
- Estamos acompanhando para tudo não termina em pizza - diz Dario Scott, presidente da Associação de Familiares das Vítimas, que perdeu a filha de 14 anos no acidente. Para ele, houve mais de uma causa e mais de um responsável pelo acidente.
Fonte: O Globo Online
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