sexta-feira, 21 de março de 2008

A amarga volta aos negócios

Bruno Caltabiano havia deixado o comando de sua empresa há sete anos e feito os dois filhos seus sucessores. Isso até uma tragédia obrigá-lo a retornar ao trabalho

Até 17 de julho do ano passado, o empresário Bruno Caltabiano, de 64 anos, poderia ser considerado um homem realizado. Fundador de um dos principais grupos de revenda de automóveis do país, Bruno já havia feito o que muitos donos de impérios familiares jamais conseguiram: um processo tranqüilo de sucessão. Desde 2000, o grupo era dirigido por seus dois filhos, João e Pedro, de 37 e 40 anos, respectivamente.

Na mesma época, a Caltabiano passou a contar também com um novo parceiro estratégico, o grupo de revenda de automóveis americano MacLarthy, um dos maiores dos Estados Unidos, que comprou 51% de participação na empresa.

Nas mãos dos herdeiros e com o apoio dos americanos, a companhia ficou seis vezes maior e se preparava para abrir o capital na bolsa de valores. A Bruno cabia o papel de consultor informal da empresa, como ele mesmo gosta de definir.

Isso até a família e o grupo Caltabiano serem colhidos por uma tragédia de proporções inimagináveis.

João e Pedro estavam a bordo do Airbus A320 que fazia o vôo TAM 3054, de Porto Alegre a São Paulo, e se espatifou em um prédio da companhia aérea ao lado da pista do Aeroporto de Congonhas.

Os dois haviam viajado para a capital gaúcha para fechar a compra de uma revenda Volkswagen. Bruno ficou sabendo do acidente por meio de um telefonema da agência de viagens que vendera as passagens aos filhos. "Eu estava assistindo a um filme e um homem no telefone me pediu para sintonizar em um canal de notícias. Logo que vi um avião em chamas, o homem me disse que João e Pedro estavam naquele vôo." Sua reação, relembra, foi jogar o telefone longe. Em seguida, abraçou sua mulher, Susana, e disse: "Os meninos morreram".

Bruno Caltabiano tem ainda na memória cada segundo daquela noite terrível. Quase por obrigação, mas sem muita esperança, tentou ligar para os celulares dos filhos - só ouvia a voz deles na mensagem da caixa postal. Passou então a buscar freneticamente informações, ao mesmo tempo que recebia ligações de apoio dos amigos mais próximos. Não demorou muito para chegar a confirmação de que não havia nenhuma possibilidade de sobreviventes entre os passageiros do avião. Bruno recorda que, naquela noite, os piores pensamentos passaram por sua cabeça. "Há dez anos, um amigo perdeu um filho e eu disse para mim mesmo que se isso acontecesse comigo me suicidaria. Mas não podia fazer isso", afirma.

Por volta das 9 horas da manhã do dia 18 de julho, tomou a decisão que ele diz ter sido uma das mais acertadas de sua vida. "Peguei minha malinha e fui para o escritório continuar o trabalho que eles estavam fazendo", disse em um emocionado depoimento a Exame. "Meu papel agora é continuar o trabalho deles, cuidar dos meus netos, da minha filha, da minha mulher e das minhas noras."

Não tem sido uma tarefa fácil. "Desde o acidente, me sinto como alguém que usa uma máscara. É como se eu estivesse em carne viva, ao mesmo tempo que tento parecer bem para os que estão ao meu redor."

Fonte: Portal Exame

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