Tempestades de poeira vêm atingindo o interior de São Paulo há mais de uma semana e devem se estender até o final do ano. Sua ocorrência pode afetar os aviões e os voos, e deve ser alvo de atenção de pilotos, empresas e demais operadores do ramo.
Embora seja um fenômeno raro, é preciso observar bem quando e como elas ocorrem para garantir a segurança da aviação. Isso, principalmente, pelo fato de que algumas das cidades paulistas afetadas possuem os principais aeroportos das suas regiões.
Em casos mais graves, as nuvens de poeira e areia podem tirar a visibilidade dos pilotos na hora do pouso e da decolagem, dificultando a operação. Em outra frente, podem até mesmo causar a corrosão de partes do motor ou entupir sensores e os chamados tubos de pitot. Eles são uma espécie de cano com um furo na ponta situado do lado de fora do avião, que fornece informações para medir a velocidade da aeronave, entre outros indicadores. Mas o risco de tudo isso acontecer no Brasil é baixo.
Problema no Oriente Médio, risco baixo no Brasil
Avião C-130 da Força Aérea dos EUA se prepara para voar durante uma tempestade de areia no Iraque (Imagem: Sgt. Erik Gudmundson/Força Aérea dos Estados Unidos) |
Mesmo sendo fator de preocupação, essas nuvens, da maneira como existem no Brasil, não oferecem risco alto à aviação, segundo James Waterhouse, professor do Departamento de Engenharia Aeronáutica da USP (Universidade de São Paulo).
Isso porque as nuvens de areia e poeira no Brasil são pequenas e facilmente detectáveis, o que diminui os perigos aos quais os aviões estariam expostos.
"O risco é muito baixo, extremamente remoto e plenamente evitável no Brasil, diferentemente do Oriente Médio, onde são um problema crônico, já que essas tempestades duram mais e as nuvens de areia são mais extensas. No Brasil, é algo muito localizado.", disse James Waterhouse, professor da USP.
Ao observar a tempestade, o piloto pode optar por desviar e pousar em outro aeroporto ou aguardar o melhor momento para o pouso. Se optar por passar pela nuvem, ele deve ficar pouco tempo dentro dela, o que não costuma causar danos aos motores nem obstruir o tubo de pitot ou outros sensores.
"Os aviões passam por ensaios nos quais são testados para voar em condições de poeira e areia, por exemplo. [...] Se for realmente necessário pousar em meio a esse tipo de nuvem, o piloto pode fazê-lo tranquilamente, pois o avião é feito para aguentar esse fenômeno até um certo limite.", completou James Waterhouse, professor da USP.
Quando as aeronaves atravessam essas tempestades, os motores, sensores e demais pontos dos aviões são checados após o pouso. Em alguns casos, pode ser necessário realizar uma lavagem do motor para evitar danos ou, ainda, uma limpeza externa.
Planejamento e manutenção
Avião C-130 Hercules tem de ser limpo após passar por uma tempestade de areia, no Iraque (Imagem: Sgt. Erik Gudmundson/Força Aérea dos EUA) |
Sempre que o avião passa por uma situação como essa, ele é inspecionado pelas equipes de manutenção para definir se há algum risco à operação. Isso acontece periodicamente, antes e após os voos, e não apenas nesse tipo de ocorrência.
Segundo Eric Cônsoli, diretor técnico da Voepass Linhas Aéreas, o uso de proteções quando o avião está no chão também visa evitar a entrada de materiais indevidos na aeronave, diminuindo a necessidade de manutenção.
"Quando uma aeronave está parada em solo, também existe toda uma preparação para mantê-la protegida, principalmente com o uso de capas em superfícies ou dispositivos que devem ser protegidos da presença de objetos estranhos, como poeira, areia ou até mesmo pequenos animais.", disse Eric Cônsoli, diretor técnico da Voepass Linhas Aéreas.
Junto a isso, Cônsoli diz que todo o procedimento de voo envolve o cumprimento de uma preparação para antever diversas situações, na qual são recebidas diversas informações sobre os aeroportos de partida, chegada, além das condições de voo na rota do avião.
"Com estas informações meteorológicas, a tripulação consegue verificar onde há a presença ou possibilidade de chuva, seja ela leve ou intensa, condição de vento, tempestade, névoa e trovoadas, entre muitas outras, para que assim, possa fazer os desvios que vierem a ser necessários para cumprir a programação do voo", afirma.
"Brownout"
Helicóptero do Corpo de Bombeiros caiu próximo a uma unidade de saúde em Vicente Pires (DF) em 2020 (Imagem: Reprodução/Twitter/Rai Lima) |
As nuvens de areia e poeira também podem afetar a visibilidade do voo, tanto no pouso quanto na decolagem, dificultando que o piloto enxergue a pista e se mantenha alinhado a ela.
Esse fenômeno é conhecido como "brownout", um apagão que tira a visão do entorno do avião devido à nuvem formada em decorrência da operação da aeronave. É observado com mais frequência em helicópteros que pousam em locais sem pavimentação.
Em julho de 2020, um helicóptero do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal sofreu um acidente causado por "brownout". Durante a aproximação para o pouso, ao lado de uma faculdade, o deslocamento de ar criou uma nuvem de poeira e areia, que tirou a visibilidade do piloto, levando à colisão com um prédio. Um passageiro sofreu lesões leves e os outros dois ocupantes saíram ilesos do acidente.
Por Alexandre Saconi (UOL)
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