terça-feira, 17 de julho de 2012

Para sindicato, Congonhas segue 'crítico' 5 anos após acidente da TAM


Cinco anos após o acidente com o voo JJ3054 da TAM, que matou 199 pessoas, o aeroporto de Congonhas, em São Paulo, segue operando "nos seus limites" e "continua sendo um aeroporto crítico" na opinião do diretor de segurança de voo do Sindicato Nacional dos Aeronautas Carlos Camacho. Para ele, as mudanças aplicadas pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) foram insuficientes para eliminar a possibilidade de uma nova tragédia, embora reconheça que houve melhora na pista e que as medidas foram acertadas. Camacho critica, por exemplo, que as operações sigam ocorrendo em dias de chuva: "choveu, deveria parar".

Uma das 33 recomendações do relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) sobre o acidente, das quais a Anac afirma ter acatado 30, foi justamente "restringir, de imediato, a operação da pista principal à condição de 'pista seca'". A Agência diz que ela foi cumprida com a instalação do grooving (ranhuras para facilitar o escoamento), que impede a formação de lâminas d'água na pista. Hoje, o aeroporto só fecha sob chuva forte que provoque acúmulo de água e prejudique a visibilidade.

A pista escorregadia e o excesso de voos foram apontados pelo relatório do Cenipa como fatores que colaboraram - junto com o fato de uma das manetes que controlam as turbinas estar na posição para acelerar, o que provocou falta de freios - para que o Airbus A320 cruzasse a pista principal e colidisse com o prédio de um depósito de cargas da própria TAM no dia 17 de julho de 2007.

Além do grooving nas duas pistas, operacionalmente, o terminal reduziu o número de autorizações para pousos e decolagens de 38 para 30 por hora. O engenheiro aeronáutico Jorge Eduardo Medeiros, professor de aeroportos e transportes aéreos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), avalia como positivas as alterações. "O acidente da TAM seria evitado se, antes, fossem adotados em Congonhas os mesmos procedimentos do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro", argumenta. No terminal carioca, é proibido o pouso de aeronaves com o motor pinado (sem o reversor, item de segurança adicional que gera desaceleração e ajuda na frenagem), como aconteceu com o Airbus A320 da TAM. Essa proibição só foi adotada em Congonhas após o acidente.

De acordo com a Anac, as mudanças aplicadas seguem até hoje, como, por exemplo, a proibição de pousos e decolagens de aeronaves com o motor pinado e com os spoilers (equipamento instalado sobre as asas e que ajuda na frenagem) inoperantes. "Spoilers nada!", disse, segundos antes do choque, o copiloto do voo da TAM, conforme revelaram os áudios das caixas-pretas.

Dados disponibilizados pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) mostram que o aeroporto de Congonhas recebeu, em 2003, mais de 220 mil aeronaves e passaram por seus corredores 12 milhões de passageiros. Em 2007, ano do acidente da TAM, foram 205 mil aviões e 15 milhões de usuários. Com a redução do número de autorizações para pousos e decolagens adotada pela Anac após a tragédia, em 2008, o número de aeronaves caiu para 186 mil e o de passageiros, para 12 milhões. Nos anos seguintes, os números voltaram a crescer e, em 2011, Congonhas recebeu mais aeronaves (209 mil) e mais passageiros (16 milhões) do que no ano do acidente. Até maio deste ano, no entanto, os volumes são menores do que o registrado no mesmo período de 2007.

Através da assessoria, a Anac informou que a movimentação no aeroporto não é aferida pelo número de passageiros transportados, "pois isso pode mudar com o aumento da taxa de ocupação das aeronaves ou pela troca por aviões com mais assentos", nem pelo número voos. De acordo com a Agência, a movimentação é monitorada pela quantidade de autorizações para pousos e decolagens, reduzidas após o acidente. "Em dezembro de 2007, eram 1.953 frequências semanais no aeroporto de Congonhas. Hoje temos 1.624", informou a Anac.

Mudanças na pista

Cercado pela cidade, o aeroporto de Congonhas não tem mais para onde crescer. A pista principal termina a poucos metros da avenida Washington Luís, o que impossibilita a criação de uma área de escape maior. Para o diretor de segurança de voo do Sindicato Nacional dos Aeronautas, "se o acidente tivesse ocorrido em Guarulhos, por exemplo, o avião teria sido danificado, mas provavelmente não haveria mortes". Camacho defende a colocação de um concreto poroso nas extremidades e nas laterais, o que criaria maior resistência se a aeronave saísse da pista.

A Anac diz que o aeroporto está "em conformidade com o Regulamento Brasileiro de Aviação Civil" quanto à área de escape e que "esse incremento de segurança foi criado por meio do recuo das distâncias declaradas". Segundo o engenheiro aeronáutico Jorge Eduardo Medeiros, "a diminuição do comprimento declarado da pista aumentou a área de escape" e, com isso, houve um ganho na segurança.

O acidente com o voo JJ3054 ocorreu em julho, antes do final das obras de recuperação das pistas do aeroporto de Congonhas, finalizadas em setembro de 2007. De acordo com a Infraero, nos últimos cinco anos não foram necessárias novas modificações. A Infraero afirma que acatou as 13 recomendações do relatório do Cenipa, entre elas, a de executar uma vez por semana a verificação das condições de desgaste da pista.

Outros incidentes

No dia que antecedeu a tragédia com o voo da TAM, foram feitos 10 reportes de que a pista do aeroporto de Congonhas apresentava hidroplanagem e estava escorregadia, segundo o relatório elaborado pelo Cenipa. No mesmo dia, um avião da companhia aérea Pantanal derrapou e saiu da pista imediatamente após o toque do trem de pouso dianteiro no solo. Um ano antes, uma aeronave da BRA teve problema parecido. "Foi um aviso, naquele momento deveriam ter sido tomadas providências", defender o comandante Carlos Camacho.

Apesar de todas as medidas logo após a destruição do Airbus A320, pequenos incidentes continuaram sendo registrados. No dia 24 de junho, uma semana depois do acidente, dois aviões se chocaram enquanto manobravam na pista. Em setembro de 2008, um bimotor derrapou e por pouco não caiu na avenida Washington Luíz, quase no mesmo local onde o avião da TAM saiu da pista. Em fevereiro deste ano, um pneu de um avião da Gol estourou durante o pouso.

Procurada, a Infraero informou que ocorrências como essas são informadas pelo piloto à torre de controle e inseridas em um relatório entregue à companhia aérea, que encaminha para o Cenipa. Um levantamento oficial de incidentes ocorridos após o dia 17 de julho de 2007 foi solicitado ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, em Brasília, mas até o final da tarde desta segunda-feira não havia sido divulgado.

"Congonhas, nunca mais"

Para alguns familiares das 199 vítimas, parece não importar quantas mudanças sejam feitas no aeroporto. O trauma de perder uma filha de 14 anos fez o gaúcho Dário Scott, que preside a associação criada pelos parentes das vítimas do voo JJ3054 para acompanhar as investigações, abdicar do conforto de desembarcar em um aeroporto bem localizado nas frequentes viagens que faz a São Paulo. "Eu só vou lá para manifestações. Nunca mais desci nem decolei daquele aeroporto", desabafa. "Congonhas, nunca mais!".


Fonte: Terra - Fotos: Renato S. Cerqueira/Futura Press

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