Misto de barco com avião, ecranoplano projetado pela Aeroriver pode chegar ao mercado em 2026.
Existem várias espécies de máquinas voadoras que vão muito além dos habituais aviões e helicópteros que estamos acostumados a ver pelos céus. Um dos tipos mais exóticos e quase desconhecido é o ecranoplano, um veículo que combina as características de barcos e aeroplanos para operar de forma única, em voo rasante à superfície.
Inventado nos anos 1950 na antiga União Soviética pelo engenheiro naval Alexeev Rostislav Evgenievich, os ecranoplanos nasceram como instrumentos militares com altíssimo poder de fogo, usados principalmente como plataformas de mísseis no Mar Cáspio. Terminada a Guerra Fria, esses veículos migraram para o setor comercial, e o conceito se espalhou pelo mundo. E o Brasil não ficou de fora.
Ecranoplano soviético media 150 metros e pesava mais de 500 toneladas (Foto: Divulgação) |
Fundada em 2021 por engenheiros da região Norte do Brasil, a startup Aeroriver quer construir e introduzir no mercado o primeiro ecranoplano do mundo destinado a operações fluviais, começando pela região da Floresta Amazônica.
“Nunca ninguém teve a ideia de utilizar esse tipo de veículo em rios, por que geralmente eles são estreitos. Mas esse não é o caso da Amazônia, que tem a maior bacia de água doce do Planeta, e os rios são muito largos e conectam praticamente todas as cidades da região”, disse Felipe Bortolete, diretor técnico e um dos fundadores da Aeroriver, em entrevista a Época Negócios.
O ecranoplano projetado pela Aeroriver é o Volitan, um “barco voador” com capacidade para 10 passageiros ou uma tonelada de carga. “Enxergamos uma brecha entre os barcos a jato e os aviões que são usados na Amazônia. Entre esses dois tipos de veículos, há um espaço muito grande onde podemos inserir o ecranoplano de forma competitiva. Projetamos um solução que pode ter um preço e custos operacionais um pouco superiores aos das lanchas, mas ainda menor do que o valor e os custos de um avião. É uma questão de ganhar tempo. Há um mercado onde as pessoas estão dispostas a pagar mais e viajar de forma mais rápida em relação aos barcos", prevê Bortolete, acrescentando que o veículo deve voar a 150 km/h e terá alcance de 450 km.
Como funciona?
O nome ecranoplano é autoexplicativo, mas em russo. O termo deriva da denominação que recebe na língua russa o fenômeno do efeito solo (“ecrani efect”, na pronúncia em russo).
Diferentemente dos aviões, que voam em razão da baixa pressão produzida sobre as asas, os ecranoplanos utilizam o efeito solo, que causa uma sobrepressão sob as asas de formato especial, criando um colchão de ar que dá sustentação à aeronave em voo rasante, normalmente sob uma superfície aquática – embora ele também funcione em terra firme.
“Quando o veículo opera utilizando o efeito solo, o consumo de combustível é reduzido drasticamente. Quanto mais baixo ele voa, menos combustível é consumido. Então, quanto mais próximo o ecranoplano estiver da superfície do rio, mas econômico ele será”, explicou o diretor técnico da Aeroriver, que por ora fica baseada em São José dos Campos (SP), na incubadora de startups do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
No entanto, para operar na Amazônia, o Volitan precisa ser mais versátil, incluindo capacidades dignas de um avião. “O nosso veículo aproveita o efeito solo, mas ele também é projetado para voar sobre a copa das árvores em alguns trechos onde é rio é muito sinuoso, sempre respeitando o limite de 150 metros de altitute. Em trechos assim, o veículo atuará como um avião”, contou Bortoleto. “Já temos um protótipo em escala 1/6 que usamos para identificar os parâmetros de voo. Também estamos desenvolvendo um sistema de controle em que a altura do veículo em relação a superfície não será controlada pelo piloto. A altitude será 'setada' e o veículo manterá o nível determinado automaticamente.”
Outro desafio para operar na região amazônica é a falta de infraestruturas avançadas, como explicou o fundador da Aeroriver: “Nossa intenção é criar um veículo que exija o mínimo de infraestrutura. Portanto, é um veículo que precisa ser simples mecanicamente, de preferência com características mais próximas às de um barco. Por isso, em vez de turbinas alimentadas por querosene e que utilizam componentes complexos, pretendemos utilizar motores de combustão interna a diesel ou gasolina, que são combustíveis que você encontra facilmente na Amazônia.”
Da Amazônia para o mundo
Num primeiro momento, a Aeroriver aposta na introdução do barco voador na região Norte do Brasil, onde a empresa acredita haver demanda para a aplicação de 150 veículos desse tipo para o transporte de passageiros e cargas. Consolidada a atuação na Amazônia, a startup planeja oferecer o ecranoplano em outras localidades e para diferentes funções.
“Existem outros mercados relevantes onde o ecranoplano pode ser aplicado. Por exemplo, o transporte de funcionários para plataformas de petróleo, que hoje é feito em helicópteros. Nesse nicho, podemos entregar uma solução eficiente e mais barata que os helicópteros. Outro setor é o de ferry-boats, em travessias de alta velocidade”, disse Bortolete. “Aqui na América do Sul, a rota marítima entre Buenos Aires e Montevídeo movimenta mais de 3 milhões de passageiros por ano. Outros exemplos são os trechos Helsinque-Oslo e Boston-Nova York. É um mercado de nicho, mas quando você mensura de forma global, se torna algo relevante, com potencial para milhares de veículos.”
Para o ecranoplano brasileiro se tornar realidade, o diretor técnico da Aeroriver estima que será necessário um investimento inicial de R$ 45 milhões. “Esse valor cobre o custo de desenvolvimento e montagem do protótipo em tamanho real, o processo de certificação e a construção de uma linha de montagem inicial, de preferência em Manaus. Já conseguimos uma fração desse investimento, por meio de fomentos do FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).”
Pelo cronograma da startup, o protótipo do Volitan deve realizar seu primeiro voo sob o efeito solo em 2025, e a certificação do veículo, cujas normas ainda precisam ser definidas por órgãos reguladores no Brasil, é programada para 2026, ano em que o ecranoplano pode estrear no mercado.
Via Thiago Vinholes (Época Negócios)
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