sábado, 8 de maio de 2010

Filho aviador deixa paranaense com o coração nas nuvens

Desde os 11 anos, Gil Eduardo queria ser aviador. Hoje, ele atua como piloto da Esquadrilha da Fumaça e seu trabalho consiste em fazer milhares de acrobacias arriscadas no céu.



Você que é mãe, já imaginou ter um filho seu dentro de um dos aviões da Esquadrilha da Fumaça? Há 58 anos, eles fazem acrobacias no céu. Esses pilotos estão entre os melhores do mundo. E não é para menos. Lá em cima, não existe espaço para o erro, um risco calculado dia a dia nas orações da aposentada Maria Olinda Lima e Silva. Ela é uma das sete mães brasileiras que vivem com o coração na mão, ou melhor, no ar.

“Tem horas em que você fica rezando, pedindo a Deus. O risco maior é do tempo, das condições atmosféricas. Então, se tiver um tempo bonito, tem tudo para dar certo. Agora, quando começa a tempestade, vem a preocupação”, conta Maria Olinda.

“Eu sempre falei para ela: ‘é o que eu gosto, eu amo a aviação. Os pilotos amam o que fazem’”, diz o capitão-aviador Gil Eduardo de Lima e Silva.

Para a mãe, o capitão Lima e Silva é apenas Gil, o menino que aos 11 anos já queria ser aviador. Na adolescência, o desejo virou projeto de vida, após um voo de ultraleve. Ele foi de carona no primeiro voo. Nada parecido com as peripécias que faz hoje. Mas a experiência seria marcante. Foi quando ele decidiu que não ia mais parar de voar.

“Aquele voo foi muito bom, e eu saí maravilhado. Nunca tinha visto o mundo de cima. No voo de ultraleve, você tem contato com o vento, com toda a natureza. E foi uma experiência fantástica para mim”, comenta Gil.

Na Esquadrilha, distância entre aviões chega a 1,5 metro

Em 1994, aos 17 anos, Gil entrou para a Academia da Força Aérea, um voo sem volta. Desde então, está fora de casa. “Eu acho que os pais não acreditam muito quando a gente fala que quer ser piloto”, afirma Capitão Lima e Silva.

A saudade não diminui, mas Dona Maria Olinda já aprendeu muito sobre voos e decolagens. Ela já reformulou os velhos conselhos, que o filho acha graça só de lembrar.

“As mães de todos os pilotos falam: ‘voe bem devagar e bem baixinho que não vai dar problema’. E é justamente o contrario. O mais perigoso que tem para um piloto é voar baixo e devagar”, diz o Capitão Lima e Silva. “E ele falava assim: ‘mãe, você está querendo que eu caia?’ E eu: ‘claro que não”, lembra Maria Olinda.

“Eu já tive várias colisões com pássaros. É muito comum no Brasil. O maior índice de acidentes aéreos é colisão com urubu especificamente. Já tive quatro, já tive quase colisões, apagamento de motor, mas são coisas que para quem voa muito acontecem com maior frequência”, revela Gil.

Os treinamentos da Esquadrilha da Fumaça acontecem sempre a 60 quilômetros de Pirassununga (SP), em uma área extensa sobre um canavial. Longe dos olhos do público, eles testam todos os limites em busca da perfeição. E é simplesmente inacreditável o que eles fazem lá no alto.

A distância entre os aviões chega a ser de apenas 1,5 metro. É necessário ter precisão absoluta. Às vezes, temos a impressão de que eles estão em rota de colisão.

Na manobra chamada de bomba, um avião segue em direção à esquadrilha, como se fosse provocar uma explosão. Ela é mais uma das 54 incríveis manobras da Esquadrilha da Fumaça que é dona de um recorde mundial: o voo de dorso, mais conhecido como voo de cabeça para baixo, que virou uma especialidade dos brasileiros.

Em 2006, eles entraram para o Livro dos Recordes, com 12 aviões voando de forma invertida, ao mesmo tempo.

“Essa atividade envolveria um risco maior se a gente não estivesse bem preparado para ela. Então, o piloto sabe que ele tem um pacote de instrução muito bem montado e ele é treinado por pilotos mais experientes, para que ele possa, ao final de dois ou três meses, estar em condições de executar essa manobra”, explica o tenente-coronel-aviador José Agnaldo de Moura.

De cabeça para baixo, girando, mergulhando, com cruzamentos simultâneos até manobras a velocidade zero, quando parece que o avião está em queda livre: os pilotos da Esquadrilha da Fumaça voam em uma situação-limite e, por mais rigorosos que sejam os treinamentos, por maiores que sejam os cuidados, às vezes o pior acontece.

Por coincidência, quase na mesma hora em que Dona Maria Olinda conversava com a equipe do Globo Repórter sobre as atividades do filho, outra mãe de um piloto da Esquadrilha da Fumaça recebia a pior de todas as noticias.

Muita gente assistia à exibição. Ao fazer uma manobra de "mergulho", o piloto não conseguiu subir novamente. O que teria pensado Dona Maria Olinda ao ver a imagem do avião explodindo ao colidir com o solo.

“Eu lembro que eu liguei para ela no mesmo dia. Eu acho que ela não entendeu muito bem. No dia seguinte, vendo as reportagens e conversando com as outras mães, ela entendeu e chorou bastante”, lembra o Capitão Lima e Silva.

A preocupação e o sofrimento fazem parte da rotina das mães que têm filhos exercendo atividades perigosas. Mas a professora de psicologia Elisa Maria Parahyba Campos, da Universidade de São Paulo (USP), diz que é possível diminuir a aflição e os sentimentos negativos.

“É fundamental que a mãe saiba exatamente o que o filho faz, como é a profissão desse filho. Senão ela sofre por desconhecimento. Ela não sabendo o que é a atividade desse filho implica, ela acaba sofrendo de graça. Por isso, é importantíssimo que os filhos contem exatamente para as mães como é que se desenrola a atividade deles”, explica a doutora.

“Eu fico preocupada, mas eu tenho encantamento, quando lembro que lá está o meu filho, fico com a boca cheia. E lá eu não considero só ele o meu filho. Todos são os meus filhos, porque eu digo para o Gil: ‘vocês são uma família’”, afirma Maria Olinda.

“Eu sempre falei para ela: ‘é o que eu gosto. Eu amo aviação, os pilotos amam o que fazem’. É uma satisfação estar lá em cima, longe dos problemas da vida cotidiana. É outro mundo. E, com certeza, se o piloto morreu voando, ele estava feliz. Disso, eu não tenho dúvida”, ressalta o capitão Lima e Silva.

“Eu tenho certeza de que todas elas ficam rezando permanentemente por nós, mas isso dá força também para a gente”, aponta o tenente-coronel-aviador José Agnaldo de Moura.

E para o Dia das Mães, depois de tanta aflição, o que ele gostaria de dizer para a mãe dele? “Mãe, eu faço o que eu gosto, o que eu amo, e a senhora ajudou muito para que eu chegasse aqui. A senhora ajudou muito para que eu chegasse aqui, a senhora junto com meu pai, e pode ter certeza que a gente vai continuar trabalhando sempre com felicidade e alegria. Eu te amo”, declara o tenente-coronel.

E quando a gente imagina que os pilotos não têm mais nada para inventar, eles aprontaram uma novidade para homenagear as mães: eles formam um coração no céu.

Fonte: Beatriz Castro (Globo Repórter)

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