O recente desvio do avião da Ryanair pela Bielorrússia faz parte das táticas dos serviços de inteligência de vários países, mas constitui uma violação das convenções de tráfego aéreo, disse à Lusa um especialista em direito internacional.
"Este tipo de táticas vem no manual dos serviços de inteligência. Não é nada de novo e tem revelado eficácia em várias situações", explicou Brian Taylor, professor de direito internacional na Universidade de Sussex, no Reino Unido.
A companhia aérea irlandesa Ryanair informou no domingo que a tripulação do avião em que viajava Roman Protasevich, jornalista crítico do regime bielorrusso, recebeu um aviso de ameaça à segurança a bordo antes de o aparelho ser desviado para Minsk, onde o opositor acabou detido, juntamente com a sua namorada, a cidadão russa Sofia Sapega.
Para Taylor, este tipo de ação tira proveito da vulnerabilidade de potenciais alvos por parte dos serviços que os tentam capturar, já que a sua presença num avião os deixa desprotegidos e incapazes de qualquer defesa, física ou jurídica.
Este especialista lembrou o episódio de 2013, quando o avião onde viajava o então Presidente da Bolívia, Evo Morales, foi forçado a aterrar em Viena, depois de os pilotos terem pedido uma paragem de emergência devido a falha de combustível.
De acordo com o Governo da Bolívia, o avião foi levado até Viena depois de terem sido recusados apelos da tripulação para aterragem em França, Espanha, Itália e Portugal, alegadamente por causa de suspeitas da presença no aparelho de Edward Snowden -- o consultor de informática que revelou dados classificados da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA), quando trabalhava para a CIA.
Este episódio obrigou a França a pedir de imediato desculpas à Bolívia pelo incidente, Espanha pediu desculpas formais duas semanas depois e Itália e Portugal enviaram esclarecimentos oficiais sobre o assunto.
Na parada em Viena, o avião foi revistado pelas autoridades, por causa de uma fuga de informação, que se revelou falsa, sobre a presença de Snowden, que era procurado pela justiça dos EUA.
"Nessa altura, a União Europeia não fez um protesto formal como agora apresentou perante a Bielorrússia, mas há muitas similitudes entre estes dois episódios. Em ambos os casos, as autoridades utilizaram um avião em voo para procurar deter um alvo em movimento", disse Brian Taylor.
Para este especialista, em qualquer um destes episódios, há uma violação das convenções de tráfego aéreo, nomeadamente da Convenção de Chicago, de 1944, que considera este tipo de ação "pirataria", à luz do seu Anexo 2.
De acordo com esta convenção, cada país tem soberania sobre o seu espaço aéreo, mas está proibido de usar a aviação civil para colocar em risco a segurança pública, qualquer que seja o pretexto.
"Não tenho qualquer dúvida de que houve uma grave infração do Direito Internacional. De resto, quando da assinatura da convenção de Chicago, houve países que procuraram introduzir cláusulas que permitissem situações de exceção para a definição de segurança, para acomodar este tipo de ação dos serviços de inteligência", explicou Taylor.
Este professor da Universidade de Sussex salienta ainda o facto de o episódio do avião da Ryanair colocar uma complexa teia de variáveis de Direito Internacional, já que o aparelho é de uma companhia irlandesa, o avião está registado com matrícula polaca e viajava entre a Grécia e a Lituânia, sobre os céus da Bielorrússia.
"Este caso precisa de uma solução política. Uma qualquer tentativa de solução em tribunal seria um tremendo quebra-cabeças...", concluiu Brian Taylor.
Via Notícias ao Minuto (Portugal)
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