Em audiência, representantes da Gol reafirmaram que empresa cumpre a lei.
A procuradora do Ministério Público do Trabalho de São Paulo Laura Martins Maia de Andrade afirmou nesta sexta-feira (20) que há “indícios de manipulação” e possíveis irregularidades nas escalas de trabalho da companhia aérea Gol.
As escalas de trabalho da Gol causaram, no começo do mês, atrasos em diversos voos nos principais aeroportos do país. A Gol alegou que um problema no novo sistema de escalas da companhia acabou forçando os tripulantes a trabalharem a mais.
Por conta disso, as folgas dos funcionários prejudicados geraram uma reação em cadeia, que culminou nos atrasos. A empresa disse que a situação foi normalizada, mas os trabalhadores voltaram a reclamar da situação nos dias seguintes.
A procuradora conversou com jornalistas após audiência de mediação entre a Gol e os sindicatos dos aeronautas (pilotos, co-pilotos e comissários de voos) e dos aeroviários (as equipes de terra). Foi a segunda audiência. Na primeira, a empresa rejeitou firmar compromisso de manter as escalas de trabalho de sua tripulação dentro das regras sob pena de multa. Nesta sexta, os sindicatos e a empresa entregaram documentos solicitados pela procuradora.
Os representantes da Gol não falaram com os jornalistas nesta sexta. A advogada da empresa Carla Andréa Coelho disse, durante a audiência, que a empresa cumpre todas as leis trabalhistas. Em nota, a Gol informou que só se manifestaria dia 31 de agosto. "Em audiência realizada hoje na Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, em São Paulo, a Gol apresentou a documentação requerida pelo órgão. A companhia terá até 31 de agosto para se manifestar sobre temas levantados pela procuradoria."
No começo do encontro, a empresa propôs que as negociações passassem a ser feitas diretamente entre empresa e sindicatos, sem a intermediação da Procuradoria do Trabalho. Os sindicatos, no entanto, rejeitaram a proposta.
A procuradora Laura de Andrade destacou que a companhia aérea teria maquiado, em mais de uma situação, as horas voadas para que os tripulantes não ultrapassassem o limite estabelecido em lei. A empresa teria, conforme ela explicou, contado horas voadas como horas de deslocamento para assumir um voo.
“A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) pega (pune) as horas excedentes. Então, se eles voam como CAT1 é como se fossem passageiros, não como se fossem tripulação. Peguei um caso de uma pessoa que foi e voltou para Caxias do Sul seguidamente como CAT1. No total, se fosse considerar como horas de voo, ultrapassaria a jornada. Existem indícios de manipulação”, disse a procuradora.
CAT 1 ou PX é um termo técnico para quando o tripulante anda no voo como passageiro, a fim de assumir o trabalho em outra localidade. Essas horas são pagas como trabalhadas, mas não são contabilizadas como horas de voo. A regulamentação da categoria permite apenas 85 horas de voo por mês.
A reportagem do G1 teve acesso a uma escala de trabalho de um empregado referente ao mês de janeiro. Nos dias 14 e 15, a programação previa voos para o funcionário. Na escala executada, esse mesmo trabalhador voou como CAT 1 nos mesmos dias. Segundo a procuradora, essa é uma estratégia da empresa para que funcionários não estourem o limite de horas.
Audiência
Na proposta feita pela procuradora aos sindicatos e à Gol estão: elaboração das escalas de voos como indicação do total de horas trabalhadas, estipulando horas noturnas e horas especiais; obrigação de intervalo de 12 horas entre as jornadas; não escalar o mesmo tripulante para madrugadas seguidas mesmo se ele estiver fora da base domiciliar; modificar o sistema de escala 'crew line' (novo sistema, que teria causado transtornos no começo do mês) para que o trabalhador possa não aceitar as alterações; terceirização total da limpeza das aeronaves (comissários reclamam que são obrigados a limpar, o que, para a procuradora, é desvio de função); aumento de funcionários em um ou dois tripulantes quando a companhia efetuar vendas dentro dos voos.
“É muito documento. Vou analisar. Já sei muito do que tem aí, mas vou analisar os contrapontos e acredito em um acordo sem a necessidade de ajuizar uma ação”, disse Laura Andrade.
A procuradora também afirmou que a Gol precisa “humanizar as escalas”. “Tem irregularidades. [A escala] extrapola as horas de voo e, principalmente, a grande questão é que eles estão muito cansados. O 'crew line' é uma máquina e não considera a possiblidade descanso. A escala não é humanizada. Existe algo maior que a regulamentação, que é a Constituição Federal, que protege a saúde do trabalhador”, afirmou. Segundo ela, a regulamentação da categoria deveria ser revista no ponto em que não proíbe o trabalho por madrugadas seguidas quando o funcionário está fora de sua base domiciliar.
Fonte e foto: Mariana Oliveira (G1)