Para Luís Carlos Affonso, a empresa conseguiu manter o cronograma de lançamentos e, assim, deve conquistar 15% do mercado até 2015
No auge da crise econômica, os presidentes das três grandes montadoras americanas, Ford, Chrysler e General Motors, viajaram de Detroit, onde estão instaladas, para Washington, sede do governo federal, para pedir um empréstimo de US$ 15 bilhões que tiraria as três empresas da falência. Ao invés de embarcar em um avião de carreira, eles preferiram gastar dezenas de milhares de dólares para viajar confortavelmente em seus jatos particulares – o que gerou uma série de críticas da opinião publica. O episódio se transformou no símbolo da gastança excessiva das empresas americanas e ajudou a afundar ainda mais a aviação executiva na maior crise da sua história.
Passados dois anos, o mercado começa a dar os primeiros sinais de recuperação. Segundo a Associação de Fabricantes de Aviões Executivos (Gama, na sigla em inglês), o faturamento do setor chegou a US$ 9,4 bilhões no segundo trimestre de 2010, aumento de 0,2% em relação ao mesmo período do ano anterior.
“Estamos saindo da crise antes do que imaginávamos”, disse ao iG Luís Carlos Affonso (foto acima), vice-presidente da divisão de aviação executiva da Embraer. Para aproveitar a recuperação, a fabricante brasileira vai apresentar o Legacy 650 na Labace, a feira de aviação executiva que começa nesta quinta-feira em São Paulo, e está preparando o lançamento de dois novos modelos da família Legacy. “A Embraer vai sair fortalecida da crise”.
Acompanhe os principais trechos da entrevista realizada na sede da Embraer em São José dos Campos, no interior de São Paulo:
iG: Alguns analistas dizem que a crise no mercado de aviação executiva foi a maior da história. Por que o setor foi tão afetado?
Luís Carlos Affonso: Nos anos anteriores à crise, a aviação executiva vinha se expandindo muito fortemente. Foi o período de maior expansão mundial da aviação executiva, inclusive em outros mercados, como em países emergentes. A crise fez com que, não apenas na aviação executiva, mas em todos os setores da economia, os clientes parassem de fazer novas aquisições. Houve um congelamento de negócios enquanto o mercado buscava entender a dimensão da crise.
iG: Os jatos executivos entraram no corte do que as empresas consideravam supérfluo?Affonso: Não considero a aviação executiva supérflua. O avião executivo é, na verdade, uma ferramenta de produtividade. Hoje as empresas globais ou se expandindo regionalmente precisam dele para fazer negócio de maneira eficiente. Existe ainda essa áurea de luxo e de excesso, mas essa não é uma realidade. O Brasil é um exemplo. Os jatos da família Phenon fazem muito sucesso em função da grande expansão da economia do País e o crescimento regional das empresas. É impossível administrar um negócio com expansão geográfica de forma eficiente sem um avião executivo. Veja quantas cidades são servidas pela aviação regular no Brasil. Muito poucas, e com muitas conexões para chegar até elas. Com a aviação executiva é possível transformar uma viagem de três, quatro dias numa viagem de um dia. Isso não tem valor.
iG: Ao contrário de outras fabricantes, a Embraer cresceu durante a crise. O que explica isso?
Affonso: Tivemos que fazer ajustes, mas mantivemos as nossas estratégias de longo prazo. Os aviões que estavam em desenvolvimento não foram cancelados, como alguns dos nossos concorrentes fizeram. Isso nos ajudou a ganhar mercado com a chegada de novos produtos. Em unidades, passamos de 3,3% para 14,1% de market share. Em vendas em dólares, subimos de 4,1% para 6,4%. A boa notícia é que, segundo nossa previsão original, neste ano o mercado encolheria de novo em relação a 2009. Acabaram de divulgar as entregas de aviões no primeiro semestre e, aparentemente, o mercado vai ficar estável. Estamos saindo da crise antes do que imaginávamos.
iG: Que lições foram aprendidas com a crise na aviação executiva?
Affonso: Acho que os anos que antecederam a crise foram anos de exuberância exagerada. Não só no mercado imobiliário e outros setores da economia, mas na aviação executiva. Imaginou-se que o mercado poderia crescer numa taxa irreal. Começaram a surgir especuladores, clientes que compravam posições na linha de montagem para vender com ágio mais à frente. Isso gerou a dinâmica de uma bolha, o negócio cresceu acima do razoável. O que vivemos depois foi uma correção. Acho que a lição é de cautela por parte de todos os atores desse mercado. O otimismo exagerado pré-crise foi irreal e o pessimismo pós-crise também. Nos próximos dez anos, o mercado será maior do que foi nos últimos dez anos.
iG: O Phenom 100 ajudou a puxar as entregas da Embraer no primeiro semestre deste ano. O avião é a vedete da empresa?
Affonso: O Phenon 100 tem sido um grande sucesso. Já entregamos 150 unidades, 40 no Brasil. Temos uma carteira de pedidos grande pela frente, em torno de 550 unidades. Para uma meta de produzir 120 unidades ao ano, temos quatro anos de produção. Essa lista ajudou muito a Embraer na crise. Mesmo durante o período de vendas fraco e até alguns cancelamentos, tivemos alguns clientes que vieram buscar seus aviões aqui.
iG: Como a Embraer está preparada para o reaquecimento do mercado?Affonso: Por não termos alterado nossas estratégias durante a crise, acredito que estamos bem posicionados. No primeiro semestre de 2008 lançamos o Legacy 450, o Legacy 500 e o Lineage 1000. Naquele momento, estávamos desenvolvendo o Phenom 100 e o 300 e pensando no Legacy 650. No começo de 2008, apenas um dos nossos sete aviões estava sendo entregue. Em 2011, quando o mercado estiver crescendo de novo, apenas dois dos nossos sete aviões estarão em desenvolvimento. Teremos um portfólio grande de produtos novos, modernos, eficientes e com boa relação custo benefício.
Detalhe da turbina do Phenom 300
Fonte: Gustavo Poloni (iG) - Fotos: Divulgação