Em abril, um avião da United Airlines em Chicago, com destino a Londres, estava pronto para decolar, mas teve de esperar 13 passageiros que tinham saído da Costa Rica. A empresa calculou que perderiam o voo por sete minutos; em circunstâncias normais, passariam um perrengue danado para remarcar.
Mas, graças à nova ferramenta baseada na inteligência artificial (IA) chamada ConnectionSaver, a aeronave não só pôde esperá-los — e suas malas despachadas — como ainda chegar ao destino no horário previsto. O sistema também enviou torpedos aos passageiros atrasados e aos que estavam já acomodados e à espera com explicações sobre o que estava acontecendo.
A IA talvez ainda não consiga achar mais espaço na sua mala de mão, mas consegue pôr fim à disparada dos 40 portões — a corrida contra o tempo para pegar o voo de conexão antes de fecharem a porta — e a outras dores de cabeça tão comuns durante as viagens.
E não é só a United: a Alaska Airlines, a American Airlines e outras vêm trabalhando para desenvolver novas capacidades para facilitar a vida dos passageiros.
— As companhias também estão usando a tecnologia para reduzir custos e operações, incluindo economia de combustível — explicou Helane Becker, analista do setor de companhias aéreas para o banco de investimentos TD Cowen.
Embora as empresas estejam desenvolvendo programas independentes, uma inovação bem-sucedida pode muito bem se tornar acabar se tornando padrão do setor.
— A IA deve mudar praticamente todos os aspectos da experiência do passageiro, desde o rastreamento da bagagem até a personalização do entretenimento de bordo — afirmou Jitender Mohan, que trabalha com clientes das áreas de viagem e hospitalidade na consultoria de tecnologia WNS.
Economizando combustível e evitando frustração
De fato, ela já ajuda o pessoal da Alaska Airlines a planejar rotas mais eficientes desde 2021.
— É parecido com o Google Maps, só que no ar — comparou Vikram Baskaran, vice-presidente de serviços de tecnologia da informação da aérea.
Duas horas antes da decolagem, o sistema checa as condições meteorológicas, a ocorrência de fechamento de algum espaço aéreo e todos os planos de voo comerciais e particulares registrados na Administração Federal de Aviação para sugerir as rotas mais eficientes.
— A IA trabalha com um volume de informações com que nenhum cérebro humano tem condições de lidar — afirmou Pasha Saleh, diretor de desenvolvimento corporativo e piloto da Alaska.
Em 2023, cerca de 25% dos voos da companhia usaram o sistema para "enxugar" alguns minutos do tempo de voo.
— Esse aprimoramento acumulado resultou em uma economia de 41 mil minutos e quase dois milhões de litros de querosene — disse Baskaran.
Em terra firme, a American Airlines e outras estão trabalhando em um sistema movido a IA chamado Smart Gating, que manda a aeronave que acabou de pousar para o portão disponível mais próximo com o tempo mais curto de taxiamento — e, se ele estiver em uso, rapidamente define a segunda melhor alternativa. O resultado pode reduzir a espera frustrante na pista.
A American introduziu o Smart Gating no Aeroporto Internacional de Dallas Fort Worth, no Texas, em 2021; hoje já o utiliza em seis, inclusive no O'Hare de Chicago e no Internacional de Miami — e calcula que economize 17 horas por dia em taxiamento e 5,3 milhões de litros de querosene por ano.
— Usando a IA como manobrista virtual, dá para reduzir o tempo na pista em até 20%, sendo que os maiores benefícios aparecem nos maiores aeroportos — informou Mohan.
Atendimento ao cliente: mais ágil e melhor
A inteligência artificial generativa de evolução rápida — nos moldes do ChatGPT — está ajudando a comunicação entre as empresas e os passageiros. O desafio que afetou a United em 2023 resultou em um plano para o envio de mensagens mais específicas sobre os motivos de eventuais atrasos.
— O passageiro fica frustrado quando o voo atrasa e não recebe nenhuma explicação. Acontece que ir atrás dos detalhes necessários, compor um texto apropriado e enviar isso às pessoas que embarcam em cinco mil voos diários é muita coisa para os funcionários — explicou Jason Birnbaum, CIO da United.
É aí que entra a tecnologia, que processa todas essas informações e cria as mensagens de acordo com as condições. Por exemplo, os passageiros que deveriam embarcar em um voo da United em janeiro de San Francisco para Tucson, no Arizona, receberam o seguinte torpedo, além do novo horário e um pedido de desculpas: "Seu avião vai se atrasar devido a obras na pista do aeroporto de San Francisco, o que está limitando o número de saídas e chegadas de todas as empresas."
A verdade é que uma explicação mais detalhada pode acalmar o viajante mais nervoso. Jamie Larounis, analista do setor de viagens que voa o equivalente a pelo menos 240 mil quilômetros por ano, contou que recebeu um torpedo em meados do ano passado explicando que uma tempestade tinha gerado problemas na escala da tripulação, e por isso seu voo sairia atrasado de Chicago.
— Receber uma justificativa específica me deu a impressão de que a empresa tinha a situação sob controle — disse.
A IA generativa também é boa para resumir textos, fazendo com que seja uma ferramenta poderosa para a composição de e-mails. A Alaska foi uma das aéreas que começaram a utilizá-la para responder às mensagens dos clientes com mais eficiência no ano passado.
— Nosso sistema "lê" cada e-mail e resume do que se trata. Antes, íamos lendo e respondendo de acordo com a ordem de chegada, mas agora ele faz a distinção de acordo com a urgência. Por exemplo, o pedido urgente relacionado a um voo que está para chegar tem prioridade em relação à reclamação sobre outro que a pessoa já pegou. Além disso, ajuda o funcionário a resolver o que fazer ( oferecer um voucher, por exemplo) e ainda faz o rascunho inicial da resposta escrita. A pessoa é quem toma a decisão, mas já está tudo mastigado — declarou Baskaran.
Entretanto, por todos os benefícios que promete às empresas e aos passageiros, a tecnologia ainda apresenta falhas, a começar pelas informações que fornece, nem sempre precisas. Em 2022, o chatbot da Air Canada prometeu incorretamente a um passageiro que, se ele comprasse a passagem cheia para o enterro de um parente, poderia pedir indenização da diferença do valor do bilhete mais barato em caso de morte. Quando entrou com um processo no Tribunal de Pequenas Causas, a Air Canada tentou alegar que o bot era uma entidade independente e "responsável pelos próprios atos", mas a justiça a condenou a pagar cerca de US$ 800 em prejuízos e taxas.
A verdade é que, conforme a IA for se desenvolvendo e as companhias aéreas forem descobrindo mais meios de usá-la, o passageiro deverá ter mais e mais benefícios.
— Como cliente e empresário posso dizer que essa é uma das maiores revoluções tecnológicas dos últimos cinco a oito anos — concluiu Mohan.
Via Julia Weed (The New York Times) via O Globo