domingo, 7 de junho de 2009

A dor transatlântica

Rio e Paris se unem na tragédia que atinge famílias de 32 países

LUTO - Comoção das famílias e homenagem às vítimas na Notre-Dame (centro) e na Candelária

A tragédia que cercou o voo 447 da Air France e comoveu o mundo encheu de tristeza dois cartões-postais internacionais que se complementam. Paris, a eterna Cidade Luz, que guarda algumas das mais famosas construções da humanidade, e o Rio de Janeiro, cidade que encanta por sua beleza natural. Na capital francesa, a catedral de Notre-Dame ficou lotada na quarta-feira 3 durante ato ecumênico com a presença do presidente Nicolas Sarkozy e de sua mulher, Carla Bruni, que foi acompanhado do lado de fora por milhares de franceses. No dia seguinte, foi a vez de o Rio realizar um culto religioso na Igreja da Candelária. Os dois países se aproximam na dor e na divisão de esforços para esclarecer o misterioso acidente.

O voo deixou planos e histórias inacabadas. Bianca e Carlos Eduardo Lopes de Mello, que haviam se casado na véspera, numa festa para cerca de 400 pessoas, nem puderam acordar para a nova vida. Alexandre Bjoroy, um menino britânico de 11 anos, voltava para a Inglaterra, depois de passar férias com a família no Brasil. Bjoroy era uma das sete crianças a bordo do voo que levava passageiros de 32 países.

Na Suécia, a mãe de Christine Badre Schnabl, 34 anos, está inconsolável pela perda da filha única. “Falei com ela pelo telefone, momentos antes do embarque”, disse Annika Badre. Casada com o brasileiro Fernando Bastos Schnabl, Christine era engenheira civil e trabalhava no Rio. O casal embarcou de férias para a Europa em voos diferentes para se beneficiar de programas de milhas. Ela foi pela companhia francesa, com o filho mais velho, Philipe, 5 anos, e ele, por outra empresa, com a caçula, Celine, 3 anos. Planejaram se encontrar no Aeroporto Charles de Gaulle. Proprietário de uma empresa de merchandising no Rio, Schnabl ainda não sabe quando voltará ao Brasil: “A prioridade agora é a minha filha. Ela tem só 3 anos, mas tenho certeza de que já sabe. Ela parou de perguntar pelo irmão e pela minha esposa”, disse.

A romena Violeta Bajenaru-Declerck, 33 anos, morava em Nantes, na França, e voltava de sua segunda viagem ao Brasil, começada no dia 27 de maio, apenas cinco dias depois de se casar. Professora de comércio internacional, coordenava um projeto de cooperação entre a Escola Superior da Madeira de Nantes, onde trabalhava, e a Universidade Federal do Paraná (UFPR). Já o príncipe Pedro Luís de Orleans e Bragança, 26 anos, descendente de dom Pedro II, 26 anos, havia visitado a família no Brasil. “Ainda acredito em milagres”, disse o pai, dom Antonio de Orleans e Bragança, ao deixar a igreja, no Rio. O jovem morava em Luxemburgo e trabalhava num banco de investimentos. Há perdas em diversos setores da sociedade. O maestro Silvio Barbato, ex-regente do Teatro Municipal do Rio de Janeiro e da Orquestra Filarmônica Brasileira, faria uma conexão em Paris para dar palestras sobre música russa e brasileira em Kiev, na Ucrânia.

No ato ecumênico realizado na igreja da Candelária, no Rio, o governador do Estado, Sérgio Cabral, culpou a empresa aérea e a fabricante do avião pelo desastre. “Isso não é uma tragédia natural. Não há uma explicação que não seja por uma falha técnica muito grave”, apostou. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, que perdeu seu chefe de gabinete, Marcelo Parente, na tragédia, dividia a dor com os parentes: “Hoje me sinto um dos familiares, porque perdi um amigo.”

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Por: Maira Magro

A DIFERENÇA DAS AUTORIDADES

SOLIDÁRIO - Sarkozy, com Carla Bruni, no ato ecumênico em Paris

Assim que foi informado que o voo 447 não pousou em Paris na hora prevista, o presidente Nicolas Sarkozy cobrou a abertura de investigações, manifestou sua “viva inquietação” com o fato e pediu que o ministro do Desenvolvimento, Jean-Louis Borloo, se deslocasse “imediatamente” para o Charles de Gaulle. Depois, Sarkozy foi ao aeroporto prestar condolências aos parentes das vítimas. “As perspectivas de encontrar sobreviventes são ínfimas”, disse, preparando seu país para a tragédia. A próxima atitude foi enviar ministros para acompanhar as buscas no Brasil.

A reação de Brasília foi bem mais lenta. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em viagem a El Salvador, limitou-se a cancelar um almoço de posse do presidente local. Depois de se informar com Sarkozy, decidiu mandar o vice, José Alencar, ao Rio. No dia seguinte, já na Guatemala, Lula comparou a operação de buscas ao êxito do Brasil na prospeção da camada pré-sal: “Eu penso que um país que teve condições de achar petróleo a seis mil metros de profundidade pode achar um avião a dois mil metros.”

À tarde, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, tomou o lugar dos oficiais e apressou-se em anunciar que a Força Aérea Brasileira tinha encontrado poltronas, metais, fiações e outros objetos. Perguntado sobre a chance de haver sobreviventes, vangloriou-se: “Nosso sistema de resgate não trabalha com hipóteses.” Vinte quatro horas depois, a Marinha divulgou nota mostrando que o que a FAB viu não eram destroços do avião, mas sim um estrado de madeira, sem identificação.

Por: Octávio Costa

Fonte: Revista IstoÉ - Fotos: AFP-Photo Pool Bob Edme / Márcia Foletto (Agência O Globo) / Bob Edme (AP) / Arquivo Pessoal

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