terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Sem voar há um mês, Itapemirim falha com clientes e não paga funcionários

Itapemirim Transportes Aéreos é notificada pela Secretaria Nacional do Consumidor
(Imagem: Foto: Itapemirim/ Divulgação)
Desde que deixou de voar em 17 de dezembro de 2021, a Itapemirim Transportes Aéreos continuou se envolvendo em polêmicas. Desde passageiros tentando reembolso ou reacomodação em outros voos até funcionários sem pagamento, a empresa caminhou para uma situação em que sua efetiva recuperação parece cada vez mais difícil.

Hoje, um mês após interromper suas operações, a companhia terá de se reestruturar para poder voltar a voar. Ela ainda convive com os riscos de falência da Viação Itapemirim, empresa de ônibus que é dona da companhia aérea.

Veja a seguir um balanço do que a empresa passou nesse primeiro mês de paralisação dos voos e sua atual situação.

Salários e benefícios atrasados


Alguns dos principais problemas enfrentados pelos funcionários da companhia aérea foram os atrasos no pagamento dos salários, benefícios e direitos trabalhistas. O plano de saúde, por exemplo, chegou a ser cortado, e diversos empregados ainda não receberam o salário de dezembro.

O Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), que representa pilotos e comissários, movimenta ações coletivas para garantir os direitos da categoria. A entidade requisitou o bloqueio de R$ 1 milhão nas contas da empresa para garantir o pagamento dos funcionários, pedido que foi acatado pela Justiça, segundo o sindicato.

A Itapemirim confirma que essas ações estão em andamento e que os processos em trâmite dependem de decisões da Justiça.

Diante da falta de perspectiva, muitos aeronautas passaram a buscar oportunidades em outras empresas. Um grupo com diversos ex-funcionários da Itapemirim foi contratado pela Azul, que abriu recentemente um processo seletivo.

Saída em massa


No começo do mês, o departamento comercial da empresa também sofreu uma baixa coletiva, marcada pela saída do seu diretor comercial, Diogenes Toloni, que havia assumido o cargo em outubro de 2021. A empresa confirmou a "saída em massa", mas apenas no setor comercial.

Entretanto, de acordo com apuração do UOL, outros departamentos também tiveram diversos pedidos de demissão. Algumas atividades, inclusive, foram paralisadas diante dos atrasos de pagamentos, segundo funcionários e ex-funcionários.

Passageiros sem reembolso


Diversos passageiros se queixam de que não conseguiram o reembolso dos valores gastos com passagens da companhia. Segundo a companhia, foram realizados 55.287 reembolsos aos clientes, além de eventuais reacomodações em outros voos.

Ao todo, a Itapemirim diz ter devolvido R$ 23,4 milhões aos seus clientes que não puderam voar.

Ainda em dezembro, a empresa firmou um acordo com o Procon de São Paulo para garantir os reembolsos dos passageiros. Questionado desde o início de janeiro pelo UOL, o órgão não respondeu se vem acompanhando o cumprimento do acordo.

Já o Procon do Rio de Janeiro instaurou um processo que pode resultar em uma multa de até R$ 10 milhões contra a empresa quando for concluído. Em nota, a companhia diz que "não tem o que temer em relação às eventuais sanções impostas, considerando sua confiança na Justiça e nos órgãos envolvidos na apuração daquilo que julgam necessário".

Aviões enviados para o exterior


Em dezembro, a empresa anunciou que iria enviar três de suas aeronaves para o exterior para passarem por manutenção. Em meio à especulação de que elas seriam devolvidas para o lessor (tipo de empresa que "aluga" o avião para a companhia aérea), a Itapemirim diz que elas estão sendo enviadas para manutenção e preservação (procedimento onde ficam conservadas por longos períodos sem voar).

Esse envio se deve, segundo a companhia, à indisponibilidade de espaço na empresas Digex e ao fim das operações da TAP Manutenção e Engenharia. Ambas as companhias realizam manutenção dos aviões no Brasil. O fim das atividades da TAP, entretanto, foi anunciado apenas na segunda semana de janeiro.

Os aviões devem decolar nos próximos dias rumo a Tucson, no estado do Arizona (EUA), onde há um deserto com melhores condições para manter os aviões preservados. A empresa afirma que todos os contratos de leasing permanecem ativos.

Renegociação bilionária


Na sexta-feira, a União rejeitou um pedido de renegociação de dívida tributária do Grupo Itapemirim, que ultrapassa os R$ 2,2 bilhões. A recusa consta de documento protocolado na semana passada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional no processo de recuperação judicial da Itapemirim.

A empresa pretende apresentar um recurso administrativo diante da recusa do pedido de extinção da dívida, por "não concordar com os argumentos fictícios utilizados" pelo órgão. A empresa ainda afirma que vem trabalhando para regularizar sua dívida tributária de maneira voluntária, por meio de parcelamento e de adesão ao Refis (Programa de Recuperação Fiscal).

Pedido de falência


No final de dezembro, o Ministério Público de São Paulo pediu que fosse decretada a falência do Grupo Itapemirim como um todo, incluindo a empresa aérea. No momento, também foi requerido o bloqueio dos bens particulares do dono do grupo, o empresário Sidnei Piva de Jesus.

A empresa se manifestou dizendo que não há provas das alegações feitas pelo Ministério Público, além do fato de que o país enfrenta uma pandemia no atual momento e que isso afeta a economia (veja a íntegra da nota da empresa no final desta reportagem)

Retorno da empresa?


Em nota, a empresa diz está preparando as aeronaves para voltar a voar em breve, não tendo ainda uma data definida, e que voltará com equipes próprias para operação. "Estão em andamento as últimas tratativas junto aos órgãos competentes para voltar a operar, oferecendo os melhores serviços", diz a empresa.

Sobre a possível venda da companhia ou do aporte de investidores, a Itapemirim confirma que há negociações em andamento, mas que os detalhes estão sob sigilo.

Nota da empresa sobre o pedido de falência feito pelo Ministério Público de São Paulo:

"Quanto ao pedido de falência da ITA - Transportes Aéreos - proposto pelo promotor de justiça, o Grupo Itapemirim esclarece:

1 - O promotor não apresenta provas das acusações que faz, visto que em toda a ação o órgão apenas suscita dúvidas quanto à lisura da administração do Grupo Itapemirim. As acusações estão calçadas apenas em noticiário veiculado sistematicamente pela mídia, sem qualquer elemento que possa ser aceito pelo ordenamento jurídico como prova;

2 - Diante dos fatos, e interessado na busca da verdade real, o Grupo Itapemirim abre suas portas às autoridades, sem restrições para tudo seja esclarecido.

3 - Os fatos que envolvem a ITA não podem ser vinculados ao processo de recuperação judicial da Itapemirim Transporte Terrestre, pois são distintos. No momento em que o Brasil atravessa enormes dificuldades sustentadas por uma pandemia que assola a Economia e ameaça acabar com os empregos que ainda existem, sendo milhares deles garantidos por este Grupo, é inconcebível que os órgãos públicos sejam usados para arruinar ainda mais a situação.

4 - Assim, o Grupo Itapemirim pondera que a ITA Transportes Aéreos não sofre os efeitos da recuperação judicial, posto que, constituída com autorização judicial, sem qualquer tipo de implicação nas empresas rodoviárias em recuperação judicial. Esclarece ainda que a suspensão provisória no setor aéreo em nada interfere na recuperação judicial, cabendo apenas o cumprimento do plano de recuperação. Por fim, o Grupo Itapemirim reitera que adimpliu mais de 3.000 (três) mil credores concursais, incrementando na economia mais de R$ 31 milhões."

Por Alexandre Saconi (UOL)

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