domingo, 10 de agosto de 2025

Por que os pilotos anunciam 'tripulação, 10 mil pés' durante os voos?

Cabine do Airbus A220-100, modelo de avião exibido no Farnborough Airshow, evento
de exposição de aeronaves na Inglaterra (Imagem: Daniel Leal-Olivas/AFP Foto)
Quem costuma voar já deve ter ouvido o aviso "tripulação, 10 mil pés" no sistema de som do avião. Essa mensagem, geralmente, é ouvida quando uma aeronave passa por essa marca, de cerca de 3.050 metros de altura, e é fundamental para a segurança do voo.

Conversas permanecem proibidas


Esse anúncio, como quase tudo na aviação, tem a ver com segurança. Se for durante a aproximação para o pouso, isso significa que, a partir daquele momento, os tripulantes não deverão acionar os pilotos a não ser que seja uma situação realmente necessária, e eles não deverão se concentrar em mais nada além da operação do avião.

A regra é chamada de "cabine estéril", porque busca tirar qualquer distração que possa interferir na operação da aeronave. É, em resumo, uma regra que proíbe qualquer tipo de conversa ou ação que não esteja relacionada com aquela etapa de voo.

Ao mesmo tempo, após a decolagem, é acima dessa marca que o sinal de afivelar os cintos é apagado caso não haja risco de turbulência. Além disso, os comissários costumam servir as refeições apenas após passar dos 10 mil pés, já que, abaixo disso, é considerado um momento crítico da operação.

Fase crítica dos voos


A Administração Federal de Aviação dos EUA (FAA), órgão similar à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), estabelece que, nas fases críticas dos voos, os pilotos não podem ficar de conversa entre si ou com os comissários. Não é o caso de troca de informações relacionadas à operação de voo, mas conversas não essenciais.

As fases críticas, ou seja, como há maior concentração dos pilotos, são justamente aquelas em que a aeronave está abaixo de 10 mil pés, ou seja, cerca de 3.050 metros de altitude. É o caso do táxi no solo, decolagem, pouso e a proximidade para o destino.

Nessas etapas, também é proibido comer, ler (exceto manuais ou outros materiais relacionados ao voo), além de realizar qualquer atividade que distraia os pilotos da execução adequada de suas tarefas. Essas regras não se aplicam se o avião estiver em voo de cruzeiro, que, geralmente, é realizado acima da altitude de 10 mil pés.

Há, inclusive, uma lista que deve ser seguida quando se passa essa marca, seja na decolagem, seja no pouso. Uma série de itens da aeronave devem ser verificados nesse momento, como se as luzes suspensas aos passageiros para afivelarem os cintos estão acesas ou apagadas (dependendo da necessidade), se as luzes de pouso estão ligadas,

De onde vem?


A regra foi criada nos EUA em 1981. À época, dados de sistemas de relatório de segurança mostraram que parte dos acidentes e incidentes envolvidos aviões estavam relacionados a distrações em fases críticas dos voos.

Com isso, se localizou que, desde o acionamento dos motores até se cruzar os 10 mil pés, e, dessa mesma marca até o desligamento dos motores após o pouso, apenas comunicações relacionadas aos voos deveriam ocorrer nas cabines de comando. Essas regras foram batizadas de regra da cabine estéril.

É óbvio que conversar entre si não é algo proibido aos pilotos. É até interessante que haja uma comunicação para se entressarem, já que participam juntos nos aviões por algumas horas, geralmente, mas a regra estabelece os momentos em que isso deve ser evitado.

Os comissários também têm autorização para quebrar essa "regra do silêncio" em situações específicas. Em caso de fumaça a bordo ou uma porta com problema, por exemplo, podem ser comunicadas o quanto antes para que os pilotos adotem as medidas que acharem mais adequadas para a segurança do voo.

Acidente foi grande motivador


O acidente que pode ser considerado o grande motivador da adoção da regra da cabine estéril foi a queda do voo 212 da Eastern Air Lines. O acidente ocorreu em 1974 nos EUA.

A aeronave se aproximava para pousar, quando colidiu com o solo a mais de 5 km de distância do aeroporto. Ao todo, 72 das 82 pessoas a bordo morreram.

A meteorologia era desfavorável naquele dia. Havia intensas nuvens, o que dificultava a visualização da pista.

Aproximadamente, faltando 2min30s para o impacto, os pilotos começaram a conversar sobre coisas não essenciais para o voo. Os temas oscilaram entre política e carros usados, e ambos demonstraram atenção com alguns argumentos discutidos, o que demonstrava falta de atenção no que era fundamental para a segurança.

De acordo com a investigação, ficou comprovado que os pilotos não tinham a real consciência de onde estavam naqueles momentos finais. O avião colidiu com algumas árvores e, depois, caiu em uma plantação logo à frente, mas distante do aeroporto.

Via Alexandre Saconi (Todos a Bordo/UOL)

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