segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Anac vai deliberar sobre regras para compartilhamento de avião e helicóptero


A tão aguardada regulamentação para o compartilhamento de aeronaves privadas no Brasil é vista como uma janela de oportunidade para novos negócios ao por fim a diversas inseguranças jurídicas, afirmaram especialistas e representantes do setor ao Valor. O tema está na pauta da reunião deliberativa da diretoria colegiada da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) desta terça-feira. A estimativa é de um desfecho positivo ao mercado, embora existam algumas dúvidas.

A agência de aviação civil dos Estados Unidos (FAA) já regulamentou o compartilhamento de aeronaves em 2003 e serve de inspiração para o modelo analisado na Anac. O Brasil debate esse tema desde 2015. A discussão segue-se a outras ações da Anac para impulsionar negócios no setor aéreo, como a liberação de assentos de forma avulsa no táxi-aéreo no ano passado.

Segundo o presidente da Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag), Flávio Pires, a tendência de compartilhar bens, como carros e casas de praia, já é uma realidade no mercado de aviação há mais de 15 anos.

“Um empresário com muito dinheiro compra o avião sozinho e não se preocupa com isso. Mas temos muitas pessoas no Brasil que poderiam entrar no mercado no modelo de compartilhamento se as regras fossem mais claras. Atualmente, só quem tem mais disposição ao risco aceita entrar”, disse, destacando que há espaço ainda para o desenvolvimento de mercados para compra e venda de cotas de aeronaves.

Há diversas formas de se compartilhar uma aeronave no Brasil, como a transferência do ativo para uma empresa que será dividida entre os sócios ou via cooperativas ou condomínios. O problema, segundo Pires, é que tudo é acertado via contrato e muitas incertezas surgem diante da falta de regras definidas pelos reguladores — a responsabilização por acidentes, por exemplo, é um ponto importante.

Os modelos atuais vão continuar existindo. O que a Anac tenta fazer é criar uma nova espécie de propriedade compartilhada na figura de um programa, com um administrador (uma empresa que vai organizar os voos a serem feitos pelos sócios) e pelo menos duas aeronaves.

O estudo da Anac tentou ainda evitar qualquer tipo de sobreposição a outros negócios, como o de táxi-aéreo. Desta forma, cada avião poderá ser dividido no máximo em 16 cotas e os helicópteros, em 32. O objetivo é evitar que a cota fique tão barata a ponto de representar concorrência a outros modelos de negócios.

Na proposta da Anac também caberá ao administrador contratar e treinar os pilotos e tripulantes, estabelecer diretrizes de segurança e cuidar da manutenção das aeronaves.

As mudanças a serem chanceladas pela diretoria da Anac vão abrir espaço para o compartilhamento ao estabelecer a Subparte K no Regulamento Brasileiros da Aviação Civil (RBAC) 91, que engloba o transporte aéreo privado.

O tema já esteve em consulta pública por duas vezes, em 2015 e 2019. A relatoria é do diretor da Anac Tiago Pereira.

Após aprovadas, as novas regras devem ser encaminhadas em alguns dias para publicação no Diário Oficial da União – haverá um prazo, ainda não determinado, para a entrada em vigor das mudanças.

“A regulamentação desse modelo de propriedade privada no Brasil é muito importante para trazer segurança jurídica ao mercado e permitir o seu crescimento tendo em vista que esse modelo de negócio, ao olharmos mercados como Europa e Estados Unidos, tem potencial expressivo”, disse Ricardo Fenelon, ex-diretor da Anac e fundador do escritório Fenelon Advogados.

Adriana Simões, sócia da área de Aviação do escritório Mattos Filho, explicou que somente os cotistas vão poder se beneficiar do avião, sendo vetado o transporte público ou de bens. Convidados podem voar, desde que nada seja cobrado. Simões observa ainda que o modelo de compartilhamento tem potencial, mas algumas dúvidas ainda estão no ar: “Por exemplo, quando o administrador for certificado para realizar transporte aéreo público (como o serviço de táxi aéreo), ele vai poder usar a aeronave do programa quando ela estiver livre?”, questionou.

Outras dúvidas englobam a atribuição de responsabilidade entre o administrador e os cotistas em casos como acidentes. Na visão da Abag, entretanto, a tendência é que a responsabilização recaia sobre a figura do administrador da aeronave.

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