Os recentes atrasos e cancelamentos nos voos da Gol teriam sido ocasionados por falhas no sistema de escala. De acordo com funcionários da companhia, a carga de trabalho aumentou de maneira preocupante, colocando em risco até a segurança dos voos. Para o pesquisador da área de transportes do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós Graduação em Engenharia (Coppe/UFRJ) Elton Fernandes, após o colapso da Varig, em 2007, muitos profissionais brasileiros migraram para o mercado estrangeiro, gerando um déficit no País.
Os riscos à segurança ocasionados pelo cansaço não são um problema específico do Brasil. Pilotos americanos relatam incidentes após 14 horas de voo, e tripulantes de companhias do Oriente Médio afirmam que enfrentam uma carga horária até 55 horas maior do que a estabelecida pela legislação brasileira.
A lei nº 7.183, de 1984, que regulamenta a profissão do aeronauta, estabelece que a jornada de trabalho, contada entre a hora da apresentação do tripulante e encerrada 30 minutos após a parada final dos motores, não pode exceder 11 horas diárias, 85 mensais, 230 trimestrais ou 850 anuais para tripulações simples.
De acordo com os funcionários da Gol, o sistema de escalas comprado da empresa da companhia aérea Lufthansa, implantado em julho, não estava de acordo com a legislação brasileira. Os tripulantes reclamaram de excesso de horas de voos, trocas frequentes de diárias de escalas e acúmulo de funções. Uma comissária de bordo da empresa diz que eles passaram a ser responsáveis pela limpeza das aeronaves após as viagens. Em nota divulgada na terça-feira, a Gol afirmou que o seu quadro de 5 mil tripulantes tem a carga horária de trabalho de acordo com a legislação vigente do setor.
O diretor de Segurança de Voo do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Carlos Camacho, afirma que, após a adoção do novo sistema de escalas da Gol, o Crew Link, o número de denúncias contra a segurança ou contra a legislação trabalhista subiu 400%. "A média era de 85 denúncias por mês, no entanto, no mês de julho, em virtude de uma mudança nos regimes de escalas, esse número subiu para 345. Deste total, 95% eram referentes às práticas adotadas pela Gol".
A Gol alegou à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que houve falha no software, no entanto, a fabricante do programa disse que obedeceu os parâmetros estabelecidos pela companhia aérea e que a Gol não relatou problemas.
Para Camacho, as excessivas horas de voo representam um risco de segurança, principalmente para aqueles que trabalham no período noturno - entre 23h e 6h. "Ao enfrentar seguidas escalas nesses horários, a segurança é colocada em risco. Os hotéis brasileiros não estão preparados para receber um trabalhador que dorme de dia. Após 18 horas sem sono, a pessoa apresenta os mesmos sintomas de alguém que ingeriu duas ou três doses de whisky", disse Camacho.
Déficit de profissionais
De acordo com o pesquisador do Coppe/UFRJ, as queixas dos tripulantes podem ser um reflexo da falta de profissionais no mercado de trabalho. "Os pilotos ou vêm da aeronáutica, ou passam por uma formação que é cara e longa. Com o colapso da Varig, muitos profissionais foram atraídos por ofertas na Ásia e no Oriente Médio. Muita gente foi embora, até mesmo, porque os brasileiros têm se adaptado muito bem ao exterior", disse.
Para ele, até então, as empresas negociavam com esses profissionais de forma muito "confortável", mas com o aumento da demanda no mercado brasileiro, e também no resto do mundo, esse quadro pode ter se revertido. "Sei que o Oriente Médio não tem tradição em formar esses profissionais", disse, afirmando que a Emirates Airlines tem cooptado profissionais no Brasil.
Carga menor que no Exterior
Apesar das reclamações dos aeronautas da Gol, o limite máximo de 85 horas de voo por mês, nos casos de aviões a jato, ainda é menor do que o enfrentado pelos colegas que atuam no exterior. Nos Emirados Árabes, por exemplo, esse teto varia entre 120 e 140 horas por mês, segundo afirma o comissário da Emirate Airlines, que vive em Dubai, Daubert Voltz.
De acordo com outra comissária de voo da empresa árabe, Henriette Rainho, no Brasil, os colegas brasileiros são pressionados pelas empresas para ultrapassar os limites que voo para evitar cancelamentos. "O mesmo acontece com manutenção da aeronave, o que acaba sendo uma falta grave. Eles fazem voos mais curtos, mas com vários pousos e decolagens por dia", disse.
De acordo com ela, o Brasil tem fama de ser mais flexível com os funcionários na troca de escalas, e as empresas são conhecidas por "atuar por baixo dos panos" no que diz respeito à legislação. "A própria empresa aciona um funcionário em dia de folga ou coloca tripulantes que deveriam estar de reserva (substitutos) em alguma tripulação pra trabalhar, debaixo dos panos", disse. No entanto, para ela, algumas dessas mudanças são em benefício da própria tripulação. "Se o último trecho de um voo é Rio - São Paulo, um tripulante carioca pode ficar no Rio e ser substituído por alguém que vai assumir, como extra, em São Paulo."
Fadiga é um problema mundial
A fadiga é um problema recorrente na aviação internacional. A Nasa, responsável nos EUA pelo espaço e aeronáutica, possui o Sistema de Relatórios de Segurança, que reúne relatos anônimos de pilotos sobre e incidentes provocados pelo cansaço após horas de voo.
De acordo com o último relatório publicado em janeiro deste ano, pilotos descrevem os efeitos do cansaço, após muitas horas de voo e frequentes mudanças de turnos. São incidentes de erro na determinação de rota, e outros procedimentos, além de vários outros relatos de excessivas horas de voo, descanso precário, e mudanças em escalas.
De acordo com o relato de um dos pilotos, após quase 20 horas acordado, e trabalhando por 14 horas, ele notou os efeitos do cansaço ao protagonizar pequenos erros, na hora do pouso, que culminaram com a aeronave saindo da pista.
"A empresa continua a operar com o mínimo de funcionários, em turnos alternados para cobrir múltiplos turnos. Muitos pilotos reclamam que a fadiga compromete a segurança, mas a companhia segue ignorando, e alega que os pilotos estão apenas cansados", disse.
Fonte: Daniel Favero (Terra)
Os riscos à segurança ocasionados pelo cansaço não são um problema específico do Brasil. Pilotos americanos relatam incidentes após 14 horas de voo, e tripulantes de companhias do Oriente Médio afirmam que enfrentam uma carga horária até 55 horas maior do que a estabelecida pela legislação brasileira.
A lei nº 7.183, de 1984, que regulamenta a profissão do aeronauta, estabelece que a jornada de trabalho, contada entre a hora da apresentação do tripulante e encerrada 30 minutos após a parada final dos motores, não pode exceder 11 horas diárias, 85 mensais, 230 trimestrais ou 850 anuais para tripulações simples.
De acordo com os funcionários da Gol, o sistema de escalas comprado da empresa da companhia aérea Lufthansa, implantado em julho, não estava de acordo com a legislação brasileira. Os tripulantes reclamaram de excesso de horas de voos, trocas frequentes de diárias de escalas e acúmulo de funções. Uma comissária de bordo da empresa diz que eles passaram a ser responsáveis pela limpeza das aeronaves após as viagens. Em nota divulgada na terça-feira, a Gol afirmou que o seu quadro de 5 mil tripulantes tem a carga horária de trabalho de acordo com a legislação vigente do setor.
O diretor de Segurança de Voo do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Carlos Camacho, afirma que, após a adoção do novo sistema de escalas da Gol, o Crew Link, o número de denúncias contra a segurança ou contra a legislação trabalhista subiu 400%. "A média era de 85 denúncias por mês, no entanto, no mês de julho, em virtude de uma mudança nos regimes de escalas, esse número subiu para 345. Deste total, 95% eram referentes às práticas adotadas pela Gol".
A Gol alegou à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que houve falha no software, no entanto, a fabricante do programa disse que obedeceu os parâmetros estabelecidos pela companhia aérea e que a Gol não relatou problemas.
Para Camacho, as excessivas horas de voo representam um risco de segurança, principalmente para aqueles que trabalham no período noturno - entre 23h e 6h. "Ao enfrentar seguidas escalas nesses horários, a segurança é colocada em risco. Os hotéis brasileiros não estão preparados para receber um trabalhador que dorme de dia. Após 18 horas sem sono, a pessoa apresenta os mesmos sintomas de alguém que ingeriu duas ou três doses de whisky", disse Camacho.
Déficit de profissionais
De acordo com o pesquisador do Coppe/UFRJ, as queixas dos tripulantes podem ser um reflexo da falta de profissionais no mercado de trabalho. "Os pilotos ou vêm da aeronáutica, ou passam por uma formação que é cara e longa. Com o colapso da Varig, muitos profissionais foram atraídos por ofertas na Ásia e no Oriente Médio. Muita gente foi embora, até mesmo, porque os brasileiros têm se adaptado muito bem ao exterior", disse.
Para ele, até então, as empresas negociavam com esses profissionais de forma muito "confortável", mas com o aumento da demanda no mercado brasileiro, e também no resto do mundo, esse quadro pode ter se revertido. "Sei que o Oriente Médio não tem tradição em formar esses profissionais", disse, afirmando que a Emirates Airlines tem cooptado profissionais no Brasil.
Carga menor que no Exterior
Apesar das reclamações dos aeronautas da Gol, o limite máximo de 85 horas de voo por mês, nos casos de aviões a jato, ainda é menor do que o enfrentado pelos colegas que atuam no exterior. Nos Emirados Árabes, por exemplo, esse teto varia entre 120 e 140 horas por mês, segundo afirma o comissário da Emirate Airlines, que vive em Dubai, Daubert Voltz.
De acordo com outra comissária de voo da empresa árabe, Henriette Rainho, no Brasil, os colegas brasileiros são pressionados pelas empresas para ultrapassar os limites que voo para evitar cancelamentos. "O mesmo acontece com manutenção da aeronave, o que acaba sendo uma falta grave. Eles fazem voos mais curtos, mas com vários pousos e decolagens por dia", disse.
De acordo com ela, o Brasil tem fama de ser mais flexível com os funcionários na troca de escalas, e as empresas são conhecidas por "atuar por baixo dos panos" no que diz respeito à legislação. "A própria empresa aciona um funcionário em dia de folga ou coloca tripulantes que deveriam estar de reserva (substitutos) em alguma tripulação pra trabalhar, debaixo dos panos", disse. No entanto, para ela, algumas dessas mudanças são em benefício da própria tripulação. "Se o último trecho de um voo é Rio - São Paulo, um tripulante carioca pode ficar no Rio e ser substituído por alguém que vai assumir, como extra, em São Paulo."
Fadiga é um problema mundial
A fadiga é um problema recorrente na aviação internacional. A Nasa, responsável nos EUA pelo espaço e aeronáutica, possui o Sistema de Relatórios de Segurança, que reúne relatos anônimos de pilotos sobre e incidentes provocados pelo cansaço após horas de voo.
De acordo com o último relatório publicado em janeiro deste ano, pilotos descrevem os efeitos do cansaço, após muitas horas de voo e frequentes mudanças de turnos. São incidentes de erro na determinação de rota, e outros procedimentos, além de vários outros relatos de excessivas horas de voo, descanso precário, e mudanças em escalas.
De acordo com o relato de um dos pilotos, após quase 20 horas acordado, e trabalhando por 14 horas, ele notou os efeitos do cansaço ao protagonizar pequenos erros, na hora do pouso, que culminaram com a aeronave saindo da pista.
"A empresa continua a operar com o mínimo de funcionários, em turnos alternados para cobrir múltiplos turnos. Muitos pilotos reclamam que a fadiga compromete a segurança, mas a companhia segue ignorando, e alega que os pilotos estão apenas cansados", disse.
Fonte: Daniel Favero (Terra)
Um comentário:
Não existe falta de pilotos ou comissários no Brasil, tudo isso é pura conversa mole das empresas que não querem contratar e ficam exigindo carga de trabalho a seus funcionários acima da media. Pilotos desempregados eu conheço aos montes. Eu sou um deles...
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