A região onde um avião bimotor caiu na noite de quarta-feira (24), próximo a Ubatuba (litoral norte de São Paulo) é marcada por um histórico de acidentes envolvendo aeronaves. A faixa que se estende da cidade até Angra dos Reis (RJ), passando por Paraty (RJ), teve ao menos sete quedas envolvendo aeronaves nos últimos dez anos. Os dados são do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), órgão ligado à FAB (Força Aérea Brasileira). Em seis dessas ocorrências houve 15 mortes relacionadas à queda das aeronaves.
Uma delas foi a queda do avião que levava o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Teori Zavascki. Em janeiro de 2017, ele viajava com destino à cidade de Paraty, no Rio de Janeiro, quando a aeronave em que estava caiu na água, matando todas as cinco pessoas a bordo. Em 1992, outro acidente na região teve notoriedade. O helicóptero que transportava o deputado federal Ulysses Guimarães em outubro de 1992 caiu no mar próximo a Angra dos Reis.
Até hoje não foram encontrados os corpos do então deputado e de Ana Maria Henriqueta Marsiaj Gomes, esposa do senador Severo Gomes, que também estava no voo. Também morreram na queda Mora Guimarães, esposa do deputado, e o piloto, Jorge Comemorato. Se forem considerados incidentes de menor gravidade e sem mortes, ao todo a região registra 17 ocorrências na última década.
Mau tempo
Fatores meteorológicos costumam influenciar nas operações de aviões e helicópteros na região. O aeroporto de Paraty, por exemplo, só opera sob condições visuais, ou seja, com chuva forte ou neblina, não é possível pousar no local em segurança. Para que um avião opere em condições visuais (sem que esteja voando por instrumentos) é preciso haver uma visibilidade horizontal (à frente e aos lados da aeronave) de pelo menos 5 km, e vertical de 450 metros.
O Cenipa constatou que, quando ocorreu o acidente envolvendo o ministro Teori Zavascki, a visibilidade horizontal era de apenas 1,5 km, abaixo do mínimo permitido. Isso se devia às chuvas na região no momento, que atrapalharam a visibilidade. De acordo com uma recomendação de segurança da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) emitida após o acidente, foi observado que pelo menos seis acidentes nos anos anteriores àquela queda tiveram influência de condições meteorológicas adversas.
Cadeia de problemas
Segundo o piloto Rafael Santos, um acidente ocorre devido a uma série de fatores e, naquela região, alguns fatores requerem que sejam tomadas precauções adicionais para garantir a segurança. "Ali, você tem condições meteorológicas adversas, obstáculos (como morros), nevoeiro, nuvens etc., combinado com uma certa urgência por parte das pessoas de passar ou pousar na região, o que a torna muito mais vulnerável a riscos", diz Santos.
"Também ocorre que, muitas vezes, o piloto é empurrado a fazer aquela operação ou ele é 'autoempurrado', ou seja, coloca pressão sobre si mesmo para pousar o quanto antes com medo de ser demitido ou sofrer alguma retaliação. Isso foi, provavelmente, o fator de alguns acidentes naquela região, onde alguns pilotos insistem em pousar mesmo sem as condições adequadas ", afirma o piloto.
Segundo outros pilotos ouvidos pelo UOL que pediram para não serem identificados, essa pressão realmente ocorre, tanto de maneira externa quanto interna. Isso acaba afetando a tomada de decisão de alterar a rota do voo por uma mais longa e com menos riscos, que pode acabar incomodando o passageiro ou o proprietário do avião, já que irá demorar mais ou ter mais custos.
Acidentes com o modelo
O avião que caiu nessa quarta-feira (foto ao lado) é um Piper Seneca da variante PA-34-220T fabricado em 1981. A aeronave era habilitada para realizar voos noturnos por instrumentos, e não tinha permissão para a realização de táxi-aéreo (ainda não foi determinado se isso estava ocorrendo no momento da queda). Ela está registrada em nome do copiloto, José Porfírio de Brito Júnior.
Na última década, esse modelo se envolveu em 18 quedas, que resultaram em 52 mortes. Atualmente, existem cerca de 226 aviões do modelo PA-34-220T em condições normais de voo no Brasil. O Seneca começou a ser produzido pela fabricante Piper na década de 1970, e possui diversas variantes, incluindo uma versão fabricada pela brasileira Embraer, o EMB-810. O bimotor pode levar até seis pessoas, incluindo o piloto.
Por Alexandre Saconi (UOL)
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