Cartas de Estocolmo
Uma das coisas de que eu mais gosto, quando viajo de avião, é ler a revista de bordo. As pessoas que as produzem devem ser realmente muito capazes. Os artigos são geralmente de qualidade, chamam a atenção do leitor e “encurtam” a viagem. Sou daquelas saudosas da Ícaro, lembram? Para quem não é daquele tempo, a Ícaro era a revista de bordo da Varig. Alguma vez, sugeri até que enviassem a revista aos portadores de cartão de viajante frequente, mesmo quando eles não viajassem...
Aqui na Suécia, também os trens têm revistas de bordo, o que contribui para torná-los ainda mais atrativos, pelo menos em viagens curtas.
Mas, o assunto desta Carta de Estocolmo é uma propaganda que encontrei na revista de bordo da Ryan Air, em uma recente viagem à Inglaterra (eu não falei que algum dia iria conhecer Londres?).
Trata-se da propaganda do aeroporto de Västerås, “o aeroporto amistoso”.
Västerås é uma cidadezinha de cerca de cem mil habitantes, a uns 100 km a oeste de Estocolmo. É uma das cidades mais antigas da Suécia. Data dos tempos dos vikings. Já foi das cidades mais importantes do país e, até, sede de diocese, lá pelos idos de 1200.
Hoje em dia, é uma cidade industrial e universitária. Tem um aeroporto, para pouso e decolagem de alguns voos da Ryan Air que servem Estocolmo. Na região da capital, há dois outros aeroportos, o de Arlanda (ao norte da cidade) e o de Skavsta (ao sul).
Mas, voltando a Västerås, a cidade é uma gracinha. Aliás, como quase toda e qualquer cidade sueca, pequena ou grande. São, todas elas, arrumadinhas, limpas, organizadas. Alguns diriam previsíveis, “um tédio”. Mas eu não acho. O que aqui é “comum”, para nós é de uma beleza indescritível. A maior parte das cidades suecas vale uma visita.
Mas daí a anunciar alces, lobos e linces...? Tenha dó!
A propaganda, certamente dirigida aos visitantes de verão, diz que a área do aeroporto de Stockholm-Västerås congrega três mundos diferentes: vida selvagem, nas florestas profundas; o centro de Estocolmo; e o mar, no Arquipélago. Além de gozar de 21 horas de luz por dia, com a beleza das nórdicas “noites brancas”.
O texto lembra, também, que a moeda sueca – a coroa - nunca esteve tão barata em décadas. A propaganda fala ainda das belezas de Estocolmo e das mais de 30 mil ilhas do Arquipélago.
E continua: “Você pode ter certeza de que vai encontrar um alce, o rei da floresta; e se você for uma pessoa de sorte, vai ver também o lobo selvagem e o lince.”
Ia passando os olhos pelo texto e não podia acreditar na descrição. A propaganda não era da cidade de Västerås; mas mesmo assim. As fotografias que ilustram a publicidade são, com certeza, de Estocolmo e do Arquipélago; e de um alce gigante, certamente flagrado em alguma floresta do norte do País, onde eles abundam.
Vivo há dez anos na Suécia. Já viajei bastante pelo País afora. Nunca tive a sorte de ver um lobo ou um lince em liberdade. Não vou dizer que nunca vi um alce. Alguma vez, passando de carro, vi um ou dois animais perto da estrada. Mas não se pode chamar aquilo de “um encontro com o rei da floresta”.
Sempre usei a palavra “corretos” para descrever os suecos em geral. Mas depois de ler a propaganda do Aeroporto de Västerås, começo a achar que, no mínimo, tenho também que usar, pelo menos às vezes, o vocábulo “otimistas”.
Sempre me encabulo quando vejo propagandas assim, enganosas, meio mentirosinhas. No Chile, há uma expressão para explicar isso, “vergüenza ajena”. Fico mesmo com vergonha! Pergunto-me o que as pessoas não são capazes de dizer, só para vender um produto.
De qualquer forma, desejo-lhe boa sorte quando vier à Suécia. Não se esqueça de visitar Västerås... E nem precisa se preocupar com o lobo!
Por: Sandra Paulsen, casada, mãe de dois filhos, baiana de Itabuna. Fez mestrado em Economia na UnB. Morou em Santiago do Chile nos anos 90. Vive há quase uma década em Estocolmo, onde concluiu doutorado em Economia Ambiental. Escreve no Blog do Noblat sempre às segundas e sextas.
Fonte: Blog do Noblat
Uma das coisas de que eu mais gosto, quando viajo de avião, é ler a revista de bordo. As pessoas que as produzem devem ser realmente muito capazes. Os artigos são geralmente de qualidade, chamam a atenção do leitor e “encurtam” a viagem. Sou daquelas saudosas da Ícaro, lembram? Para quem não é daquele tempo, a Ícaro era a revista de bordo da Varig. Alguma vez, sugeri até que enviassem a revista aos portadores de cartão de viajante frequente, mesmo quando eles não viajassem...
Aqui na Suécia, também os trens têm revistas de bordo, o que contribui para torná-los ainda mais atrativos, pelo menos em viagens curtas.
Mas, o assunto desta Carta de Estocolmo é uma propaganda que encontrei na revista de bordo da Ryan Air, em uma recente viagem à Inglaterra (eu não falei que algum dia iria conhecer Londres?).
Trata-se da propaganda do aeroporto de Västerås, “o aeroporto amistoso”.
Västerås é uma cidadezinha de cerca de cem mil habitantes, a uns 100 km a oeste de Estocolmo. É uma das cidades mais antigas da Suécia. Data dos tempos dos vikings. Já foi das cidades mais importantes do país e, até, sede de diocese, lá pelos idos de 1200.
Hoje em dia, é uma cidade industrial e universitária. Tem um aeroporto, para pouso e decolagem de alguns voos da Ryan Air que servem Estocolmo. Na região da capital, há dois outros aeroportos, o de Arlanda (ao norte da cidade) e o de Skavsta (ao sul).
Mas, voltando a Västerås, a cidade é uma gracinha. Aliás, como quase toda e qualquer cidade sueca, pequena ou grande. São, todas elas, arrumadinhas, limpas, organizadas. Alguns diriam previsíveis, “um tédio”. Mas eu não acho. O que aqui é “comum”, para nós é de uma beleza indescritível. A maior parte das cidades suecas vale uma visita.
Mas daí a anunciar alces, lobos e linces...? Tenha dó!
A propaganda, certamente dirigida aos visitantes de verão, diz que a área do aeroporto de Stockholm-Västerås congrega três mundos diferentes: vida selvagem, nas florestas profundas; o centro de Estocolmo; e o mar, no Arquipélago. Além de gozar de 21 horas de luz por dia, com a beleza das nórdicas “noites brancas”.
O texto lembra, também, que a moeda sueca – a coroa - nunca esteve tão barata em décadas. A propaganda fala ainda das belezas de Estocolmo e das mais de 30 mil ilhas do Arquipélago.
E continua: “Você pode ter certeza de que vai encontrar um alce, o rei da floresta; e se você for uma pessoa de sorte, vai ver também o lobo selvagem e o lince.”
Ia passando os olhos pelo texto e não podia acreditar na descrição. A propaganda não era da cidade de Västerås; mas mesmo assim. As fotografias que ilustram a publicidade são, com certeza, de Estocolmo e do Arquipélago; e de um alce gigante, certamente flagrado em alguma floresta do norte do País, onde eles abundam.
Vivo há dez anos na Suécia. Já viajei bastante pelo País afora. Nunca tive a sorte de ver um lobo ou um lince em liberdade. Não vou dizer que nunca vi um alce. Alguma vez, passando de carro, vi um ou dois animais perto da estrada. Mas não se pode chamar aquilo de “um encontro com o rei da floresta”.
Sempre usei a palavra “corretos” para descrever os suecos em geral. Mas depois de ler a propaganda do Aeroporto de Västerås, começo a achar que, no mínimo, tenho também que usar, pelo menos às vezes, o vocábulo “otimistas”.
Sempre me encabulo quando vejo propagandas assim, enganosas, meio mentirosinhas. No Chile, há uma expressão para explicar isso, “vergüenza ajena”. Fico mesmo com vergonha! Pergunto-me o que as pessoas não são capazes de dizer, só para vender um produto.
De qualquer forma, desejo-lhe boa sorte quando vier à Suécia. Não se esqueça de visitar Västerås... E nem precisa se preocupar com o lobo!
Por: Sandra Paulsen, casada, mãe de dois filhos, baiana de Itabuna. Fez mestrado em Economia na UnB. Morou em Santiago do Chile nos anos 90. Vive há quase uma década em Estocolmo, onde concluiu doutorado em Economia Ambiental. Escreve no Blog do Noblat sempre às segundas e sextas.
Fonte: Blog do Noblat
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