Segundo a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), só em 2022 foram quase dois casos por dia, 92,43% a mais que 2019, antes da pandemia de Covid.
O Brasil registrou uma confusão por dia envolvendo passageiros indisciplinados em aviões, em média, nos últimos quatro anos, de acordo com levantamento da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) obtido com exclusividade pelo g1.
Na quinta-feira (2), uma briga entre passageiros de um voo que saía de Salvador, na Bahia, com destino a São Paulo viralizou nas redes sociais. Ao g1, a Gol informou que a cena ocorreu antes da decolagem do voo G3 1659. As pessoas envolvidas foram desembarcadas e não seguiram viagem.
A briga na aeronave começou após uma mulher colocar o filho na poltrona de outra pessoa, segundo um comissário de bordo da companhia. Outros passageiros filmaram parte do caso. No vídeo, um grupo de mulheres grita, dando tapas e puxando o cabelo umas das outras. (veja o vídeo aqui)
Episódios como o registrado acima são grande preocupação para o setor aéreo, devido ao impacto em cadeia que podem gerar. "Um avião que atrasa pra sair de Salvador chega atrasado no Rio, que chega atrasado em São Paulo, que depois chega atrasado em Porto Alegre, porque é um trilho que ele cumpre", explica o presidente da Abear, Eduardo Sanovicz.
Casos diários
O levantamento feito pela Abear com suas associadas, que representam cerca de 70% do mercado aéreo brasileiro, aponta que de 2019 a 2022 foram 1.545 casos no total. Com 585 casos, o ano de 2022 teve 92,43% confusões a mais que 2019, antes da pandemia de Covid.
Os casos são classificados em três categorias, de acordo com a gravidade:
- Categoria 1: o comportamento afeta a segurança, higiene ou a boa ordem nos processos de check-in e embarque ou gera transtornos menores a bordo do avião, mas que podem ser controlados por um funcionário. Não há intervenção da polícia;
- Categoria 2: afeta a segurança, higiene ou a boa ordem nos processos de check-in e embarque. Segundo a Abear, a atitude é considerada “desafiante”. Requer apoio do supervisor de aeroporto ou de segurança para conter o passageiro. No avião, ele não acata as instruções;
- Categoria 3: afeta consideravelmente a segurança, higiene ou a ordem de outros passageiros. O comportamento é agressivo, incluindo agressão física ou ameaças.
"Uma boa experiência de voo, onde todos viajam no horário, com segurança, com um ambiente agradável, só é possível se a gente tiver os instrumentos necessários para coibir rapidamente atitudes como essas", afirma Sanovicz.
De 2021 a 2022 houve um aumento de 34.79% no número de casos, de 434 para 585. Veja abaixo as ocorrências por categoria:
Em 2021, a maioria das ocorrências dentro do avião foi em solo (36%). Em pleno voo, foram 35%. No ano seguinte, o número de confusões antes do voo permaneceu em alta, representando 42% do total.
Os indicadores da Abear apontam que em todo 2021 aproximadamente 7% dos casos apresentaram alguma agressão física por parte do passageiro indisciplinado - 13% delas em pleno voo.
Em 2022, 9% das situações tiveram agressões leves ou mais violentas. O número de casos com o avião no ar saltou para 36%.
"Por mais que nós tenhamos uma preocupação constante de treinamento dos nossos comissários, de um trabalho permanente de conscientização e comunicação, é importantíssimo que pelo menos a regulamentação sobre os casos mais graves saia muito rápido", diz o presidente da Abear.
'Fenômeno social'
Ariadne Natal, socióloga e pesquisadora do Peace Research Institute Frankfurt (PRIF), analisou vídeos do caso da Bahia e de um idoso que alegou sujeira na poltrona no Recife, no fim de janeiro.
Segundo ela, por diversas razões podem ocorrer atrasos em viagens, mal-entendidos na convivência humana ou prestação de serviço, mas o problema está em como a pessoa contorna o inesperado.
“De uma perspectiva psicológica, vê-se que há uma dificuldade grande de lidar com a frustração, com a quebra da expectativa, e a resposta a isso nestes casos é desproporcional e agressiva. Estamos falando de um espaço [avião] que exige um mínimo flexibilidade e civilidade, visto que é um local que, embora muitas vezes desconfortável, precisa ser compartilhado entre pessoas desconhecidas.”
Segundo ela, o aumento de casos no último ano pode apontar um fenômeno social. “Parece um assunto individual, mas quando vemos os casos se repetindo com frequência, começamos a visualizar padrão que mostra os contornos de um fenômeno que é social”, explica.
“A reação desmedida e violenta às situações que seriam contornáveis com um simples diálogo são sintomáticas e indicam uma falta de civilidade e de urbanidade, características que são fundamentais para a vida em sociedade. Ao se sentirem prejudicadas ou lesadas, estas pessoas se sentem no direito de fazer o mesmo ou até pior com os demais. Então, vemos essas reações completamente desproporcionais e que criam constrangimento e para toda a coletividade.”
Outros casos
No fim de janeiro, domingo (22), um idoso foi retirado pela Polícia Federal de um avião que estava prestes a decolar no Aeroporto Internacional do Recife. Ele se exaltou ao reclamar que a poltrona em que foi colocado na aeronave da companhia aérea estava suja (veja o vídeo aqui).
Como o passageiro discutia com a tripulação, o comandante pediu a retirada dele do voo, que deveria ter saído do Recife às 12h50 em direção ao Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Por causa da discussão, a aeronave decolou com quase uma hora de atraso, às 13h40.
Em depoimento aos policiais federais, ele contou que se exaltou porque estava passando por uma situação de estresse por causa de problemas pessoais e familiares.
Em julho do ano passado, um voo da companhia Delta Air Lines que ia de São Paulo para Nova York teve que fazer um pouso não programado. O motivo: um passageiro que agrediu uma comissária e outra pessoa a bordo (veja o vídeo aqui).
A briga começou na madrugada, depois da decolagem do aeroporto em Guarulhos. O homem foi imobilizado. Pelos alto-falantes, o comandante do voo anunciou que faria um pouso não programado em San Juan, no Porto Rico.
De Várzea Grande, na região metropolitana de Cuiabá, com destino ao aeroporto de Guarulhos em setembro de 2022, o ano com maior quantidade de casos, um homem precisou ser imobilizado durante o voo (veja o vídeo aqui).
Segundo um passageiro que registrou a confusão, o homem perturbou outros passageiros, teve um ataque de fúria no banheiro e precisou ficar algemado.
Via g1
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