A viagem aérea desde o maior foco da epidemia de gripe suína até o Brasil começa com uma rigorosa avaliação clínica, ainda no México, mas termina sem averiguação dos passageiros recém desembarcados em território nacional.
Entre a noite de segunda-feira e a tarde de terça, Zero Hora percorreu os 8 mil quilômetros que separam a capital mexicana de Porto Alegre – e verificou a falta de monitoramento de eventuais portadores do vírus A H1N1 no aeroporto de Guarulhos e no aeroporto Salgado Filho. Para os viajantes, as nove horas de voo até São Paulo representam alívio por deixar a zona crítica da doença, mas também são motivo de tensão pelo medo de um contágio à última hora.
PARTIDA DO MÉXICO
Para deixar o epicentro da doença por meio do Aeroporto Internacional Benito Juárez, na Cidade do México, é necessário se submeter a duas avaliações. A primeira é o preenchimento de um formulário em que o viajante deve anotar se apresenta temperatura acima de 38°C, tosse e outros sintomas como dores de cabeça, musculares ou dificuldade para respirar. Esse questionário deve ser revisado e carimbado por um fiscal, antes de ser apresentado no balcão da companhia aérea.
Mesmo se não houver declaração de qualquer sintoma da gripe, é obrigatório ainda se submeter a um sensor de temperatura que mostra, em uma tela de TV, a imagem do passageiro em uma escala de cores do verde ao vermelho. Se a temperatura estiver normal, a tela exibe tons azuis e esverdeados. Se houver febre, varia entre o amarelo, o laranja e o vermelho.
Gel desinfetante agora faz parte do serviço de bordo
Superado o segundo teste, o passageiro pode fazer o check-in e se alojar na sala de embarque. Subir ao voo AM-014 da empresa Aeromexico representa também um último motivo de angústia pelo risco de contágio no interior do aeroporto ou da aeronave. Por isso, ainda na sala de embarque, quase a totalidade dos passageiros cobre o rosto com máscara.
Uma passageira comenta com um casal que acabou de conhecer:
– Acho que ocorreram muito mais mortes do que foi divulgado até agora. Tem de tomar muito cuidado.
Trata-se da brasileira Margarete Silva, 51 anos, mineira casada com um mexicano que divide o tempo entre o Brasil e o interior do México. Resolveu retornar para Minas Gerais antes do previsto a fim de escapar da epidemia:
– A situação aqui é muito séria. As pessoas têm de se precaver de todas as formas, e nem sempre fazem isso.
Quando Margarete e o casal conversam sobre como será o desembarque no Brasil e dizem esperar um controle semelhante ao experimentado no México, é anunciado o embarque. No interior da aeronave, que se encontra com menos de um terço das poltronas ocupadas, o vírus também provoca mudanças na rotina. Pelo sistema de som, a tripulação repete os sintomas indicativos da gripe suína e pede para que qualquer pessoa que apresente sinais de contaminação se apresente às autoridades. O serviço de bordo inclui um novo item: gel desinfetante para os viajantes limparem as mãos.
Para tranquilizar os passageiros, uma comissária de bordo explica que o sistema de ar-condicionado do avião conta com filtros semelhantes aos de hospitais, e parte do ar em circulação no interior do avião é constantemente renovada pela atmosfera externa. O aviso faz com que algumas pessoas abaixem as máscaras e passem as nove horas seguintes um pouco menos preocupadas com eventuais tosses e espirros ouvidos ao longo da noite.
ESCALA EM SÃO PAULO
Por volta das 10h30min, horário de Brasília, o voo AM-014 pousa no aeroporto internacional de Guarulhos, em São Paulo. O único documento entregue às autoridades brasileiras é a declaração de alfândega. Ali, o passageiro pode escolher informar o telefone, o endereço ou um e-mail – que não chegam a ser checados por um funcionário que se limita a recolher rapidamente os papéis.
Não é apresentado nenhum formulário referente às condições de saúde do passageiro, realizado qualquer exame ou contato por parte de algum profissional da área da saúde – o que poderia aumentar o controle sobre sintomas eventualmente surgidos após o embarque. Há apenas um cartaz que repete os sintomas da gripe, e avisos sonoros orientam qualquer pessoa que se sentir doente a procurar socorro médico imediato.
CHEGADA A PORTO ALEGRE
Após passar pela alfândega, os viajantes provenientes do epicentro mundial da gripe suína suspiram aliviados e jogam fora suas máscaras. No último trajeto até Porto Alegre, a tripulação do voo 3293 da TAM novamente alerta os viajantes sobre o risco da doença. Ao chegar à Capital, o egresso da epidemia é apresentado a um novo cartaz informativo, pendurado nas proximidades das esteiras de bagagens. Ao recolher as malas e deixar o setor de desembarque doméstico sem ser abordado por ninguém, pode se misturar anonimamente aos 1,4 milhão de moradores da capital gaúcha.
Fonte e foto: Marcelo Gonzatto (Zero Hora)
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