Apesar de não haver resolução sobre validade de carteira de identidade, algumas companhias aéreas estão pedindo que o RG do passageiro tenha até dez anos de emissão, mesmo em vôos domésticos.
Foi o que aconteceu com o historiador Ricardo Faria, que saiu de Belo Horizonte em direção a Itacaré, Bahia, há três semanas. Sua carteira de identidade foi emitida em 1973 e, apesar de a foto estar antiga, ela é identificável e está em bom estado de conservação.
"Quando fui fazer o check-in, peguei minha identidade, e o funcionário da Webjet falou "Você não tem outro documento, não? Porque a Anac não está aceitando com essa validade'. Realmente a minha é antiga, mas o documento não tem prazo de validade", argumenta.
Ele conseguiu embarcar porque possuía carteira de motorista, renovável a cada cinco anos. "Se não tivesse, eles iam me barrar", acredita Ricardo.
Questionada, a Webjet disse que a "informação não procede" e que a companhia "não impede passageiros de embarcarem por apresentarem documentos de identificação emitidos há muito tempo".
Uma agente de viagens de Brasília, que preferiu não se identificar, disse que todas as operadoras de turismo com que ela trabalha enviam um documento, que deve ser assinado pelo passageiro, dando ciência de que o RG tem até dez anos de expedição. "Mas não fala lá "de acordo com a resolução tal, o decreto tal', nunca achei quem regulamente isso", diz.
O que rege procedimentos de embarque é a instrução IAC 107-1002, da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) feita em 2002. Mas a instrução nem sequer comenta sobre a qualidade do documento, tampouco especifica prazo de emissão. Diz apenas, em seu item 3, que o passageiro deve apresentar "Carteira de Identidade (RG), expedida pela Secretaria de Segurança Pública dos Estados ou Distrito Federal". A partir de janeiro, essa regra foi flexibilizada, permitindo cópia autenticada em vez do original, em vôos domésticos.
O guia de direitos e deveres do passageiro, no site da Anac, recomenda apenas que o documento esteja em bom estado de conservação e com foto que identifique o passageiro.
Os desencontros entre o que é informado na hora do check-in e as posições oficiais não param por aí. Funcionários do atendimento ao consumidor da Gol informaram que há uma orientação para que o documento tenha até dez anos de expedição. Já o serviço de relacionamento com o cliente, da mesma empresa, diz que "todos os documentos são aceitos em original ou cópia autenticada, mesmo que com prazo de validade vencido".
A TAM e a Varig reproduziram o guia da Anac, que diz que o importante é que o documento esteja legível e a foto identifique o passageiro.
Vôos internacionais
Mesmo em vôos para o exterior a desinformação causa transtorno para o passageiro. A agente de viagens de Brasília relata uma experiência: quando o marido foi para o Chile, em setembro de 2007, conseguiu embarcar, sem problemas, com uma identidade expedida em 1994 - 13 anos antes, portanto.
O Consulado Geral do Chile em São Paulo diz que há uma norma chilena exigindo que a identidade tenha até dez anos.
Um acordo firmado entre países do Mercosul, em 1996, permite que os cidadãos de países membros embarquem sem necessidade de passaporte ou visto, apenas com RG.
Mas também decidiu que os passageiros que vão para a Argentina devem ter identidade com até dez anos, segundo informações do Itamaraty.
Apesar disso, a Embaixada Argentina no Brasil diz que "oficialmente não tem nenhum prazo estabelecido" e o Consulado Geral do Brasil em Buenos diz, em e-mail, que "não existe validade para a carteira de identidade desde que a mesma permita à autoridade migratória identificar perfeitamente quem vai entrar". No mesmo e-mail, diz que "quando a fotografia gere dúvidas sobre a identificação poderá ser pedido outro documento".
Foi o que tentou fazer a mineira Luciana Menezes ao ser impedida de embarcar para Buenos Aires por um funcionário da TAM, há um mês.
Mas, ao mostrar a carteira de motorista, o funcionário respondeu que "tinha que ser a identidade", segundo Luciana. "O cara do check-in falou que [o RG] tem que ter no máximo oito anos. Falou que a Polícia Federal não permite", explica.
Ela estava com os pais - que tinham o passaporte - e o marido, que estava com um RG expedido um mês antes. Como era uma "viagem de comemoração", planejada com antecedência, os três decidiram ficar no Brasil enquanto a ida de Luciana não fosse liberada. Resultado: perderam uma diária de hotel (mais de US$ 300/casal) e tiveram que pagar uma multa da TAM para trocar o dia da passagem (US$ 50/pessoa), totalizando um prejuízo de mais de US$ 800 (mais de R$ 1.300).
Poderia ter custado mais: "Se eu não tivesse conseguido tirar a identidade no mesmo dia, eu não embarcaria e perderia todas as diárias", diz Luciana.
Segundo ela, o pivô da confusão - sua carteira de identidade - tinha sido emitida 12 anos antes, ou quando ela tinha 20 anos de idade, e sua aparência não mudou quase nada nesse período. "E a minha identidade sempre ficou guardada, nunca deixei na carteira, então ela não tinha nenhuma dobra, estava em perfeito estado", diz.
A assessoria de comunicação do Ministério das Relações Exteriores diz que informa os passageiros sobre a norma do Mercosul pelos "mecanismos ao nosso alcance", como o site do Itamaraty. Comentando o caso de Luciana, diz que "é até melhor [ser barrada no check-in] porque pode resolver o problema aqui; evita o constrangimento de ir e voltar".
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Fonte: Folha Online