Ex-diretora da Anac presta depoimento em comissão do Senado.
Principal alvo das acusações de Denise é a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
No Congresso Nacional, a ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Denise Abreu, reafirmou nesta quarta-feira (11) claramente e de forma enfática as denúncias de que teria sofrido pressão do governo no processo de venda da Varig.
“A pergunta é: houve ou não houve pressão? Já relatei as reuniões. Teve ingerência, sim, com os questionamentos no que diz respeito a mim porque estava requisitando Imposto de Renda, origem de capital. Se consubstanciava numa forma de estar determinando o caminho que a agência reguladora deve seguir”, disse.
“O que é pressão? Vamos ficar naquele jogo de palavras - dossiê e banco de dados, pressão ou não. Recebo como uma forma de pressionar uma agência reguladora a tomar uma decisão”, completou a ex-diretora.
Denise Abreu se referia ao caso do vazamento de dados do Sistema de Suprimento de Fundos (Suprim) com os gastos com cartões corporativos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e da ex-primeira-dama Ruth Cardoso por um servidor da Casa Civil. O governo mantém que fazia uma banco de dados, enquanto a oposição no Congresso afirma que as informações foramaram um dossiê.
Ordem direta
Após mais de seis horas de depoimento à Comissão de Serviços e Infra-Estrutura do Senado ela disse, mais uma vez, que não recebeu ordem direta de ninguém.
“Não recebi ordem, ninguém disse: faça isso ou faça aquilo, até porque não tenho perfil para receber ordem, muito menos uma agência reguladora, que é órgão de estado”, disse a ex-diretora.
Denise Abreu respondia a uma pergunta do senador Álvaro Dias (PSDB-PR). Ele se referia a reportagem publicada no G1 nesta quarta, em que ela negara ter recebido ordem direta da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Suspeitas
Mais cedo, Denise Abreu levantou suspeitas sobre o parecer da Anac que, em 23 de junho de 2006, aprovou a venda da VarigLog para a Volo do Brasil, negociação que ocorreu em janeiro de 2006.
Ela relatou que saiu da reunião, no Ministério da Defesa, em que o parecer da agência foi aprovado para, segundo ela, “não interferir” no caso. Ela contou que foi chamada de volta por volta das 23h. “Tomei a cautela de sair. Disse para o Milton [Zuanazzi, presidente da Anac à época]: quando tudo estiver pronto você me chama de volta porque não quero interferir nesse parecer, será um desgaste a mais. Eu já tinha imaginando que todo o meu trabalho teria sido jogado no lixo, que eu não entendia mais nada de direito”, declarou.
No foco das denúncias que fez contra a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a ex-diretora dissera, em entrevista, que houve pressão da Casa Civil para que a agência reguladora dispensasse a análise da declaração do Imposto de Renda e a verificação da origem do dinheiro dos sócios e a participação de cada um.
A pressão, segundo ela, seria para que fosse aceita a venda da VarigLog, e posteriormente da Varig, para o fundo norte-americano Matlin Patterson e três sócios brasileiros. “O parecer [de junho] derrubava toda a argumentação do próprio procurador-geral da Anac que, em abril, determinava que era preciso averiguar a entrada de capital estrangeiro e o imposto de renda”, declarou.
Na explanação, Denise Abreu ressaltou que a verificação era indispensável, calcando-se em sua experiência sobre o tema. “Não há como verificar o limite de capital estrangeiro definido em legislação nacional sem apurar a entrada do capital. É impossível. Por interpretação da legislação, as medidas administrativas teriam que ser essas”, afirmou.
PressãoDenise Abreu voltou a falar sobre as pressões que teria sofrido durante todo o processo de transferência acionária da empresa. Ela citou um parecer da Procuradoria da Fazenda Nacional referendando que não haveria “sucessão tributária de nenhuma ordem”, ou seja, que as dívidas da companhia não seriam passadas aos compradores.
Denise Abreu mencionou, em sua fala, o nome do advogado Roberto Teixeira, amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - citado em suas denúncias anteriores à imprensa - e da filha dele, Valeska Teixeira.
“Havia uma pressão exercida sobre a área de segurança operacional para que toda documentação apresentada pelo escritório Teixeira Martins fosse agilizada. Como se a Anac não tivesse nada para fazer”, afirmou.
A ex-diretora acrescentou que o escritório de advocacia de Roberto Teixeira chegou a retirar uma ação na Justiça que contestava as exigências para que houvesse agilidade na votação sobre a transferência acionária.
Bode expiatórioA ex-diretora da Anac disse que foi transformada em "bode expiatório" para mascarar problemas no sistema aéreo brasileiro.
"Fui transformada em bode expiatório para blindar problemas gravíssimos que existiam no sistema", disse, ressaltando que estava refutando qualquer tentativa de reavivar os momentos em que, segundo ela, teria sido responsabilizada pela crise.
Na audiência pública, a ex-diretora disse que o governo arquitetou a saída da diretoria da agência reguladora. "Demorei a compreender as verdadeiras razões que levaram o governo a arquitetar a renúncia de todos os diretores da Anac. Primeiro tentaram me convencer que seria uma trama da Aeronáutica. Creio que não é verdade", declarou Denise, ressaltando que sempre teve relacionamento respeitoso com a Aeronáutica. Ela fez um elogio público ao comandante da Aeronáutica, Juniti Saito.
A ex-diretora também afirmou que demorou nove meses para tomar a decisão de falar sobre o caso. E faz várias menções aos familiares. "Gestei nove meses a decisão de falar e me preparei para trazer à tona as informações sobre o caso VarigLog", afirmou, ressaltando que acompanhou, durante esse período, problemas de saúde dos pais.
Dossiê falso
Em sua explanação inicial, Denise Abreu refutou as acusações de que teria contas no exterior. Disse que é falso o dossiê que teria sido elaborado em agosto de 2007 e chegou à casa da mãe dela em novembro, dois meses e meio após a renúncia dela.
A ex-diretora confirmou ter procurado parlamentares para relatar o caso. "Sempre estive decidida a falar sobre o tumulto do caso VarigLog. Procurei sim o senadores Sérgio Guerra e Tasso Jereissati. Esse dossiê era falso, relatava a existência de contas bancárias no Uruguai com remessa de dinheiro a Luxemburgo e a existência de dois cartões de crédito. Jamais tive essas contas nem esses cartões".
Fonte: G1 - Foto: Reprodução