sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Chapecoense diz à Justiça que queda de avião foi benéfica a sobrevivente

Cruz, flores e velas junto aos destroços do avião que levava a Chapecoense em solo colombiano (Imagem: Felipe Pereira)

Para se livrar do pagamento de danos morais ao lateral Alan Ruschel, sobrevivente do acidente aéreo de 2016, a Chapecoense afirmou à Justiça de Santa Catarina que a queda do avião que matou 71 pessoas foi benéfica ao atleta.

Em petição à qual a coluna teve acesso, enviada ao Judiciário no último dia 24 de janeiro, a Chape cita que "o acidente deu notoriedade ao reclamante e alavancou seus ganhos, [e] sua imagem valorizou-se e passou a ter notoriedade mundial".

Ruschel foi à Justiça contra a Chapecoense em maio do ano passado pedindo o pagamento de R$ 3.381.105,40 referente a danos morais pelo acidente, contestação do seguro recebido e verbas trabalhistas, como salários atrasados e direitos de imagem.

Um dos pedidos é sobre a indenização pelo acidente com o voo da Chapecoense, que deixou 71 pessoas mortas. O jogador contesta o valor recebido, inferior ao que foi pago às famílias de outras vítimas.

Trecho de petição judicial da Chapecoense (Imagem: Reprodução)
O clube, por seu lado, afirmou que "o reclamante não foi vítima de um acidente, pelo contrário, foi um sobrevivente, abençoado pela força divina e, dentre aqueles ligados ao futebol, o único que continua a desenvolver suas atividades identicamente ao período anterior ao mesmo".

Além disso, a Chapecoense informa que a vida de Ruschel continuou normalmente após o acidente, inclusive com o lateral tendo se casado meses após a queda do avião. Completou apontando que o jogador sempre disse "não recordar de nada".

"O conteúdo apresentado pela defesa da Chapecoense foi extremamente insensível com o ser humano que foi, sim, vítima de um acidente de trabalho, enquanto viajava a trabalho em um avião alugado pelo clube, fato público e notório. Esse tipo de argumento, da defesa, que tenta retirar a pessoa de ser vista como uma vítima do acidente, afirmando que o fato lhe deu notoriedade, é desconectado da realidade e pode gerar uma nova ação contra a Chapecoense pelo teor da defesa. Uma vez que a argumentação, em tese, fere a dignidade do jogador e pode prejudicar a sua imagem junto às demais pessoas", afirmou ao UOL o advogado trabalhista Higor Maffei Bellini.

Ruschel, 32, teve três passagens pela Chapecoense. Primeiro, em 2013. Depois, de 2016 a 2019. Por fim, voltou em 2020. Na temporada passada, ele defendeu o Cruzeiro e o América-MG.

Alan Ruschel, capitão da Chapecoense, ergue a taça da Série B do Brasileiro 2020
(Imagem: Reprodução/SporTV)
Assim, o clube conclui que "nenhum trauma a princípio ficou", avaliando que Alan nunca utilizou os serviços de psicologia e psiquiatria disponibilizados pelo clube. E, para a Chape, "não há indicativos de que alguma sequela tenha ficado".

A agremiação de Chapecó pede que, caso mesmo com essas alegações o tribunal entenda pela existência do dano moral, "que seja proporcional ao dano".

A Chape também alega que não é possível comparar os valores de Ruschel com destinado a outros atletas, como o ex-goleiro Jackson Follmann. "Este ficou com invalidez permanente, vez que teve uma perna amputada em razão do acidente", analisou o clube, que acrescentou não ter percebido redução de capacidade laborativa por parte do lateral.

Mariju Maciel, advogada de Alan Ruschel, disse à coluna que a contestação foi recebida com revolta por parte do atleta e seus representantes.

"Recebemos com tristeza, mas também com muita revolta! Alan se lembra de cada detalhe do acidente. Nunca falou por respeito às famílias. A dor que teriam ao saber de tudo. Não falou por respeito ao amor que tinha as amigos que morreram ao seu lado. Não falou porque cada lembrança, cada palavra, lhe faz reviver um trauma inexplicável. Mas jamais pensou que a chapecoense seria tão insensível", disse Mariju.

As partes realizaram uma audiência de conciliação neste mês de fevereiro, mas o clube não fez nenhuma proposta de acordo. Procurada, a Chapeconse disse que não vai se manifestar. Segundo apurou a reportagem, um dos motivos é de que houve uma troca no departamento jurídico do clube e quem assumiu ainda não teve acesso aos processos envolvendo a equipe catarinense.

Via Diego Garcia com Thiago Braga (UOL)

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