Um dia de trabalho da equipe de resgate aéreo da PRF-Curitiba,uma das maiores do país em volume de salvamentos
Anoitecia quando os quatro tripulantes do Patrulheiro-3 foram acionados para a última ocorrência do dia. Sob os primeiros pingos da chuva iminente, o comandante avisa que restam poucos minutos de voo em condições seguras. Para voar com segurança o H03 deve operar durante o dia. “Está chovendo e ficando escuro, o local de pouso não é adequado, estamos em condições ruins para o vôo”, avisa o piloto. A aeronave decola do hangar 25 do aeroporto do Bacacheri rumo a São José dos Pinhais, a vítima em estado grave aguarda na porta do hospital.
Aeronave saindo do hangar, mais um dia de trabalho começandoA equipe de resgate devia transportar o paciente até o heliporto do Barigui e de lá ela seria levada para uma UTI, em Curitiba. Pouco antes de embarcar a vítima sofre uma parada cardíaca. No heliponto do hospital , o piloto aguarda a reanimação. Já não é mais possível esperar. O médico não pode embarcar na aeronave uma vítima com o coração parado. O piloto decola e a tripulação retorna para a base com a segurança de quem fez tudo que pode e estava ao seu alcance para salvar uma vida. Chegando à base o medico avisa que o pessoal do hospital conseguiu reanimar o homem.
A Divisão de Operações Aéreas (DOA) da Polícia Rodoviária Federal (PRF), em Curitiba, conta com um helicóptero Bell 407 equipado com uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A tripulação é composta pelo piloto, um operador, um socorrista da PRF e um médico do Sistema Integrado de Atendimento ao Trauma (SIATE). O trabalho da equipe começa todos os dias às 8h da manhã e segue até os últimos raios de sol. Desde janeiro de 2007, quando a divisão fez seus primeiros voos no Paraná, até esta terça-feira (10), foram atendidas 808 vítimas, em diversas situações e locais, muitos de difícil acesso.
Com uma média de quase dois atendimentos por dia de trabalho, a DOA de Curitiba é o grupo de resgate aéreo que mais atende vítimas no país. A decisão de acionar a aeronave parte dos médicos que fazem a triagem das ocorrências em terra. O atendimento vai além das rodovias federais, e no caso de Curitiba , supre também a demanda por resgate aéreo nos atendimentos do Corpo de Bombeiros. Acidentes de trânsito, feridos por arma de fogo e afogamentos, num raio médio de 100 km da base de operações, geram a maioria dos acionamentos.
Primeiro paciente do dia. Menino de três anos, vindo de Paranaguá para o HC da capital com meningiteO londrinense Gleicon da Rosa, que mora há seis anos em Curitiba, corre pelo hangar em direção à aeronave. Já dentro do macacão de vôo, o médico recebe a informação pelo rádio. A vítima foi atropelada no bairro Tatuquara e é uma moça de 17 anos. Antes de sair do local ela precisa ser atendida por um médico e depois deve ser transportada até o hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul. “A grande maioria das vítimas são levadas para lá ou para o Hospital São José, em São Jose dos Pinhias, são os únicos com heliporto na região metropolitana da capital. Os maiores hospitais da cidade ainda estão planejando a construção de helipontos, e enquanto isso ou levamos para os dois com heliporto ou optamos por pousar em áreas improvisadas próximo aos hospitais, tudo de acordo com a situação”, conta o dr. Gleicon.
Dr. Gleicon acompanha vítima dentro da ambulância após pouso da aeronaveA decolagem aconteceu as 17h00. O piloto Zafenate Paneia de Lima, 35 anos e 16 de PRF, conta com seus olhos e os do seu operador para manobrar a aeronave. Segundo o comandante o mais fácil é voar. “As comunicações, a segurança da equipe e a localização do melhor ponto de pouso, em meio à pressão da emergência, criam dificuldades, mas ao mesmo tempo motivam todos”, afirma o comandante que veio da Bahia e fez parte da primeira turma de pilotos de helicóptero da PRF criada em 1998, em Brasília.
Às 17h06 o gaúcho de Santa Maria, Tiago Marchesan, operador da equipe, avista a ambulância do SIATE próxima a um campo. Dois minutos depois, já no solo, ele tenta controlar uma multidão de crianças curiosas que se aproximam do perigoso rotor de cauda do helicóptero. “O trabalho do piloto é conduzir a aeronave, o operador é seu braço direito, responsável por toda a segurança nos pousos e decolagens. Levantar as coordenadas do local da ocorrência, até a desobstrução da área de pouso fazem parte do meu trabalho”, revela Marchesan.
O 'fiel' Marchesan de olho no rotor de cauda, crianças se aproximam do perigoA vítima fica pronta para o transporte às 17h16. A maca corta a multidão com dificuldade e chega até o helicóptero. “A população as vezes atrapalha. Não deixam a equipe trabalhar no local e passam informações distorcidas sobre a vítima para a central reguladora. Relatar a informação correta e manter-los afastados são atitudes que facilitariam nosso atendimento e ajudariam a quem precisa realmente”, disse o dr. Gleicon. As 17h23, a aeronave decola.
Denise cuida de garota atropelada no trajeto ao helicópteroA socorrista da PRF Denise Ayako Tsunemi segura o respirador para a vítima imobilizada. Durante o translado ela monitora os sinais vitais da moça. Calma, Denise escutava Elton John sorridente antes da ocorrência, mas dentro da aeronave ela luta pela vida em suas mãos. “O tempo faz a gente se acostumar com a crueldade das situações. A vítima já está em choque, nós temos que ficar tranquilos para tomar os cuidados certos”.
Pouso no Hospital Angelina Caron em Campina Grande do SulPoucas horas antes Denise havia higienizado com álcool 70 o helicóptero, depois do transporte de um menino de três anos de Paranaguá para o Hospital das Clínicas em Curitiba. A criança estava infectada com meningite num grau bem avançado. Preocupada com a saúde da equipe, Denise deixou a aeronave pronta para um novo voo rapidamente.
O entrosamento entre a equipe tem que ser constante. Os PRFs não tem um sistema hierárquico como a PM e a Policia Civil. Todos são policiais de igual graduação, mas com responsabilidades diferentes. “Poucas ocorrências não são atendidas por causa do mau tempo. A equipe opera sob tempo ruim com sucesso, isso porque se preocupam uns com os outros. Das seis aeronaves que fazem resgate aéreo no Brasil pela PRF, temos aqui uma das equipes que mais faz resgates e isso também se deve a boa relação entre os tripulantes”, disse o Comandante Jairo Schmidtt, que coordena a DOA Curitiba. Ele tem horas de vôo por várias localidades do país nos 10 anos de piloto, inclusive na enchente de dezembro de 2008 em Santa Catarina, seu estado natal.
Dr. Gleicon, socorrista Denise e operador Marchesan
O pouso no hospital Angelina Caron é feito às 17h36. Marchesan ajuda Denise e o dr. Gleicon a retirar a maca da aeronave. Eles têm pressa. Uma ambulância vai até o helicóptero e seis minutos depois a vítima esta dentro da UTI. O médico da aeronave repassa informações para a equipe médica que assume a vítima. A moça sofreu uma forte pancada na cabeça que formou um coagulo no cérebro.
As 12h desta quarta-feira (11) ela estava sendo submetida a uma cirurgia. Segundo informações do hospital, sem o resgate imediato, ela não teria sobrevivido aos ferimentos. Do momento da decolagem da base até a entrada da garota na UTI do hospital a equipe de resgate aéreo levou 42 minutos e meio.
Com um padrão de atendimento de primeiro mundo, o serviço que o DOA presta à população é um bom exemplo de como os impostos podem ser empregados em benefício direto do povo. Por um custo de menos de R$ 10 mil reais por hora de vôo, ao governo federal, centenas de pessoas foram salvas. Com esse recurso são pagos o combustível, manutenção, e o preparo da equipe de prontidão.
Marchesan guardando a aeronave com o sol já posto
Os resultados são visíveis e falantes. Vidas que não seriam salvas caso o socorro demorasse, podem ter uma chance que embarca na pressa e na dedicação destes profissionais.
Clique aqui e veja galeria de fotos.
Fonte: Jadson André (Jornale) - Fotos Lineu Filho