O início de crise no governo em função da criação da Comissão Nacional da Verdade vai parar no Congresso. Na primeira semana de fevereiro, a Frente Parlamentar de Defesa Nacional vai convocar, em três audiências seguidas, os ministros da Defesa, Nelson Jobim, da Justiça, Tarso Genro, e Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. A ideia é que eles expliquem as divergências entre as três pastas, causadas pela intenção de alterar a Lei da Anistia. A comissão abre a possibilidade de que casos de repressão durante a ditadura sejam investigados e seus autores, processados, medida que não agrada aos militares.
O anúncio da criação da Comissão Nacional da Verdade ocorreu no fim do ano passado, quando Vannuchi apresentou o Plano Nacional dos Direitos Humanos. Um dos principais pontos da comissão, que seria interministerial, reside na possibilidade de haver investigações sobre fatos ocorridos durante a ditadura. Vannuchi propôs a alteração da legislação de 1979(1), que anistiou militares e militantes da esquerda. O fato irritou os comandantes e Jobim, que ameaçaram deixar os cargos caso o plano fosse adiante com esse texto. No início do ano, Vannuchi tentou esclarecer o episódio, ressaltando que apenas pequenos grupos que participaram da repressão seriam atingidos e não as Forças Armadas.
“O governo tem no colo um grande problema”, afirma o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), presidente da Frente Parlamentar de Defesa Nacional. Segundo ele, é necessário convocar todos os ministros para esclarecer o assunto. “Ninguém é capaz de prever até onde irá a crise, e nem mesmo de dizer do que se trata a Comissão Nacional da Verdade”, acrescenta o parlamentar, ressaltando que o governo pode ter obstáculos para aprovar a criação da comissão no Congresso. Jungmann também pediu explicações sobre a proposta à Casa Civil e à Presidência da República.
Dois lados
Na terça-feira (5/1), os militares da reserva manifestaram apoio a Jobim e aos chefes das três Forças Armadas. Em nota, os clubes Naval, Militar e da Aeronáutica — que reúnem os oficiais reformados — protestam contra a Comissão Nacional da Verdade. Segundo o presidente do Clube Militar, general Gilberto Figueiredo, alguns dos itens propostos pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos para a comissão estavam fora do que havia sido acordado. “Negociaram uma coisa e apareceu outra”, afirma o general. “Não pretendemos proteger torturadores, o que queremos é que a lei seja cumprida. Se quiserem investigar, que investiguem os dois lados”, acrescentou Figueiredo.
O mesmo tom usado pelo general é empregado na nota, que chama de revanchismo a intenção de alterar a Lei da Anistia. “Se quiserem de forma efetiva e justa reviver a verdade desse passado, terão que examinar não só os atos praticados pelos militares da época, mas também os dos militantes que protagonizaram cenas cruéis de terrorismo, sequestros, assassinatos, assaltos, crimes hoje classificados como hediondos e dos quais alguns dos autores se vangloriam”, diz o comunicado. “Ao segundo grupo (militantes de esquerda) têm sido oferecidas compensações morais, políticas e financeiras. Contra os primeiros (militares), predominam preconceitos e sentimentos políticos de vingança não disfarçada.”
1 - Ampla e geral
A lei da anistia (nº 6.683) foi promulgada pelo presidente João Figueiredo, o último do regime militar. O principal artigo é o seguinte: “É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos, eleitorais ou conexos, aos que tiveram direitos políticos suspensos e aos servidores públicos, militares, dirigentes e representantes sindicais punidos com fundamento em atos institucionais e complementares”.
Para saber mais
Polícias vigiadas
Além das propostas polêmicas, como a investigação de crimes cometidos na ditadura com a criação da Comissão Nacional da Verdade, o Plano Nacional dos Direitos Humanos tem outros pontos importantes listados entre as 500 ações voltadas contra violações no Brasil. Entre eles está a divulgação trimestral da relação de pessoas mortas pelas polícias Federal e Rodoviária Federal e Força Nacional de Segurança, corporações da área de segurança da União. O governo quer que todos os interrogatórios realizados sejam filmados, como ocorre em alguns países.
As propostas também incluem a possibilidade de o governo apoiar projetos que regulamentam a taxação de grandes fortunas e a união civil entre pessoas do mesmo sexo. O governo, segundo as diretrizes do plano, pretende, ainda, incentivar a criação de institutos de pesquisas e ouvidorias nas polícias estaduais. Muitas das medidas têm que passar pelo Congresso, principalmente quando se trata de projetos de lei.
Fonte: Edson Luiz (Correio Braziliense)
O anúncio da criação da Comissão Nacional da Verdade ocorreu no fim do ano passado, quando Vannuchi apresentou o Plano Nacional dos Direitos Humanos. Um dos principais pontos da comissão, que seria interministerial, reside na possibilidade de haver investigações sobre fatos ocorridos durante a ditadura. Vannuchi propôs a alteração da legislação de 1979(1), que anistiou militares e militantes da esquerda. O fato irritou os comandantes e Jobim, que ameaçaram deixar os cargos caso o plano fosse adiante com esse texto. No início do ano, Vannuchi tentou esclarecer o episódio, ressaltando que apenas pequenos grupos que participaram da repressão seriam atingidos e não as Forças Armadas.
“O governo tem no colo um grande problema”, afirma o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), presidente da Frente Parlamentar de Defesa Nacional. Segundo ele, é necessário convocar todos os ministros para esclarecer o assunto. “Ninguém é capaz de prever até onde irá a crise, e nem mesmo de dizer do que se trata a Comissão Nacional da Verdade”, acrescenta o parlamentar, ressaltando que o governo pode ter obstáculos para aprovar a criação da comissão no Congresso. Jungmann também pediu explicações sobre a proposta à Casa Civil e à Presidência da República.
Dois lados
Na terça-feira (5/1), os militares da reserva manifestaram apoio a Jobim e aos chefes das três Forças Armadas. Em nota, os clubes Naval, Militar e da Aeronáutica — que reúnem os oficiais reformados — protestam contra a Comissão Nacional da Verdade. Segundo o presidente do Clube Militar, general Gilberto Figueiredo, alguns dos itens propostos pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos para a comissão estavam fora do que havia sido acordado. “Negociaram uma coisa e apareceu outra”, afirma o general. “Não pretendemos proteger torturadores, o que queremos é que a lei seja cumprida. Se quiserem investigar, que investiguem os dois lados”, acrescentou Figueiredo.
O mesmo tom usado pelo general é empregado na nota, que chama de revanchismo a intenção de alterar a Lei da Anistia. “Se quiserem de forma efetiva e justa reviver a verdade desse passado, terão que examinar não só os atos praticados pelos militares da época, mas também os dos militantes que protagonizaram cenas cruéis de terrorismo, sequestros, assassinatos, assaltos, crimes hoje classificados como hediondos e dos quais alguns dos autores se vangloriam”, diz o comunicado. “Ao segundo grupo (militantes de esquerda) têm sido oferecidas compensações morais, políticas e financeiras. Contra os primeiros (militares), predominam preconceitos e sentimentos políticos de vingança não disfarçada.”
1 - Ampla e geral
A lei da anistia (nº 6.683) foi promulgada pelo presidente João Figueiredo, o último do regime militar. O principal artigo é o seguinte: “É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos, eleitorais ou conexos, aos que tiveram direitos políticos suspensos e aos servidores públicos, militares, dirigentes e representantes sindicais punidos com fundamento em atos institucionais e complementares”.
Para saber mais
Polícias vigiadas
Além das propostas polêmicas, como a investigação de crimes cometidos na ditadura com a criação da Comissão Nacional da Verdade, o Plano Nacional dos Direitos Humanos tem outros pontos importantes listados entre as 500 ações voltadas contra violações no Brasil. Entre eles está a divulgação trimestral da relação de pessoas mortas pelas polícias Federal e Rodoviária Federal e Força Nacional de Segurança, corporações da área de segurança da União. O governo quer que todos os interrogatórios realizados sejam filmados, como ocorre em alguns países.
As propostas também incluem a possibilidade de o governo apoiar projetos que regulamentam a taxação de grandes fortunas e a união civil entre pessoas do mesmo sexo. O governo, segundo as diretrizes do plano, pretende, ainda, incentivar a criação de institutos de pesquisas e ouvidorias nas polícias estaduais. Muitas das medidas têm que passar pelo Congresso, principalmente quando se trata de projetos de lei.
Fonte: Edson Luiz (Correio Braziliense)
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