domingo, 4 de fevereiro de 2024

Aconteceu em 4 de fevereiro de 1970: Queda do voo Aerolíneas Argentinas 707 deixa 37 vítimas fatais


O Voo Aerolíneas Argentinas 707 era uma linha aérea internacional que ligava Assunção, no Paraguai, a Buenos Aires na Argentina, através de escalas em diversas cidades argentinas. 

No dia 4 de fevereiro de 1970, um Avro 748 que cobria essa linha aérea caiu nas proximidades de Loma Alta, Argentina, após enfrentar condições de tempo severas. O acidente causaria a morte de todos os seus 37 ocupantes.

Jornal do Brasil, 6 de fevereiro de 1970

Aeronave


O Avro 748 seria desenvolvido no final dos anos 1950 para substituir os Douglas DC-3 até então utilizados em centenas de companhias aéreas do mundo.

A Aerolíneas Argentinas havia estudado diversas opções para substituir sua frota de DC-3 que estava ficando envelhecida. No final dos anos 1950, a empresa chegou a firmar um contrato com a Fairchild, que previa a aquisição de 10 Fairchild F-27. 

Após uma troca na direção da companhia aérea, a aquisição seria desfeita. A Aerolíneas decidiu adquirir 9 aeronaves britânicas Avro 748 (com opção de compra de mais cinco), sendo a primeira companhia estrangeira a firmar contrato de aquisição dessa aeronave. A Avro vinha enfrentando dificuldades técnicas com o novo modelo 748. Essas dificuldades atrasariam a entrega das aeronaves à empresa argentina. A Aerolíneas Argentinas receberia seu primeiro Avro em 18 de janeiro de 1962. 


A aeronave acidentada foi a primeira recebida pelas Aerolíneas Argentinas, o Avro 748-105 Srs. 1, prefixo LV-HGW, que seria batizado 'Ciudad de Bahía Blanca' (foto acima). 

O Avro 748 prestaria serviços na empresa argentina até 1977, quando as duas últimas aeronaves restantes do lote inicial de 12 seriam vendidas a empresa britânica Dan Air. Os Avro 748 seriam batizados pelas Aerolíneas com o nome de cidades sul americanas.

Acidente


Decolando do aeroporto Aeroporto Internacional Silvio Pettirossi em Assunção, o Avro 748 prefixo LV-HGW daria início ao Voo Aerolíneas Argentinas 707, levando a bordo 33 passageiros e quatro tripulantes. 

A tripulação era composta por Rodolfo Canu (piloto), Carlos Bellocq (copiloto), Jorge Filipelli (assistente de bordo) e Cecilia Coriasco (assistente de bordo). 

Após chegar em sua primeira escala em Formosa, a aeronave foi reabastecida e decolou às 23h45 min (GMT) para a segunda escala em Corrientes. Nesse trecho havia mau tempo, castigando o Avro 748 que voava a 3500 m de altitude. 

Após entrar em uma Cumulonimbus, a aeronave perderia o controle, mergulhando a 45º rumo ao solo a uma velocidade de cerca de 400 km/h. 

O choque com o solo desintegraria imediatamente a aeronave e não deixaria sobreviventes, espalhando seus destroços num raio de dezenas de metros.


Os investigadores presentes no local encontraram uma paisagem desolada, o bosque de palmeiras daquela área havia sido quase destruído pelo monstro metálico que caiu no chão. “Deduziu-se que devido à dispersão de detritos e marcas no solo” a aeronave atingiu o solo em alta velocidade, cortando assim diversas palmeiras em seu caminho. 

Em seguida, ele se desintegraria com um impacto violento no solo “com os restos disformes espalhados em forma de leque até uma distância de 250 metros”, segundo o PrevAc. O impacto foi tão forte que produziu uma vala de quase dois metros de profundidade onde o nariz da aeronave se enterrou no solo.

As primeiras notícias sobre o desaparecimento de Avro apareceram no jornal Clarín, onde foi anunciado: “Eles temem pelo destino de um avião da Aerolíneas Argentinas”. No dia 4 de fevereiro de 1970, todo o país, e mais ainda a região Nordeste, ficou paralisado pelo mistério, embora muitos já previssem o terrível destino da aeronave. Nas primeiras horas da manhã soube-se que o Avro tinha sofrido um acidente e que até sabiam onde estava graças a testemunhas que viviam na zona. 


Os jornalistas não tinham a localização exata do desastre naquele momento, então se aproximaram do Aeroporto de Resistência, mas sem conseguir muita ajuda ali, havia uma aura confusa de sigilo sobre o assunto. Coincidiu que uma família da área do desastre prestava informações às autoridades, estas afirmavam saber o local do acidente e graças a essa informação os jornalistas correram em direção ao desconhecido “palmar”.

Chegar lá não foi fácil. O local era inóspito, invadido por estuários, pastagens e lagoas, carecia de estradas pelo que os jornalistas tiveram que recorrer à ajuda dos cariocas para encontrar o tão cobiçado palmeiral. Eles sabiam que estavam perto quando ouviram o barulho dos motores dos serviços de emergência, incluindo aviões e helicópteros sobrevoando a área.

Após a viagem, os jornalistas encontraram o avião em uma área chamada pelos moradores de "El Bajo" na Colônia Tacuarí, área de estuários, barrancos, riachos, restingas, palmeirais e com o rio Paraná como ameaça constante para área, já que costumava inundar. Entraram no caos, o que viram deixou-os “sem palavras” como descreve um jornalista do jornal Norte: “O espetáculo tirou-nos a fala e até toda a firmeza dos nossos corpos”. 


Entre os restos da fuselagem do avião, vegetação carbonizada, papéis, malas abertas, roupas e até contas, os cadáveres estavam espalhados pela área, galhos pendurados nas árvores e torsos carbonizados ainda fumegavam ao sol. Ninguém fez nada, ninguém se atreveu a fazer nada. Os corpos sem vida misturavam-se com a lividez absoluta do ambiente, eram figuras protagonistas daquela pintura de pesadelo onde a sucata e a matéria orgânica pareciam fazer parte de um todo.

A vala formada pelo impacto do nariz do avião naquele momento estava cheia de água da tempestade da noite anterior; alguns corpos puderam ser reconhecidos flutuando na lama. Os jornalistas relatam em suas crônicas que a cada passo que davam tinham que ter cuidado para não pisar em cadáveres ou restos mortais, era quase impossível não fazê-lo. A magnitude da catástrofe foi tal que até foram encontrados corpos acima dos palmeirais, membros espalhados em torno do impacto, crânios despedaçados a vários metros dos seus restos mortais, mãos e pés arrancados das extremidades com força brutal.

Os jornalistas notaram a quantidade de papéis espalhados pela área, entre livros, cadernos de alistamento onde podiam ser lidos os primeiros nomes das vítimas e moedas argentinas, paraguaias e brasileiras. Um cronista escreveu o que viu enquanto percorria a região: “sapatos e roupas de mulher, sapatos de homem, peças de roupa penduradas em galhos, e por toda parte os infinitos fragmentos de carne humana, cigarros meio queimados que ninguém mais fumaria, tecidos , carteiras, notas de moedas paraguaia e argentina, produtos de higiene pessoal e algo fora do comum: uma caixa contendo discos, com uma gravação de Roberto Carlos em primeiro plano.

Para este caso, a versão das testemunhas foi de extrema importância, sem sobreviventes do acidente e sem caixa preta da aeronave, era fundamental saber o que viram aqueles que por acaso olharam naquela noite desastrosa para ver a tempestade . Um dos depoimentos que ganhou maior importância na mídia local foi o de um morador próximo da Colônia Tacuarí que afirmou que: “Houve uma explosão e o avião pegou fogo”. 

Começaram as especulações da imprensa: "Falha no motor? Relâmpago? Erro humano? O que aconteceu naquela noite tempestuosa com o voo 707?" Os especialistas imediatamente culparam a tempestade, as fortes rajadas fizeram com que o piloto perdesse o controle da aeronave, obrigando-o a voar baixo e atingir as palmeiras. Nada era conhecido ao certo.

Várias testemunhas afirmaram que o clarão resultante do impacto pôde ser visto até 2 quilómetros de distância e que o fumo subiu 4 metros acima das copas das palmeiras.

Na mídia local foi dito que a tentativa de resgate dos corpos foi constrangedora, os veículos não chegaram ao palmeiral, houve atrasos e engarrafamentos, a incerteza era absoluta. Embora se tenha sabido que o avião acidentado foi encontrado às 9h, as equipes de resgate partiram ao meio-dia e os poucos que chegaram o fizeram por volta das 4h. Quando questionados por jornalistas e familiares sobre o óbvio atraso, as autoridades responderam que não havia pressa, não esperavam sobreviventes.

Para retirar os corpos do local, participaram do resgate voos médicos do Paraguai e até a colaboração de um certo Tenente Coley dos Estados Unidos, mas o trabalho foi excessivamente lento e os cadáveres começavam a se decompor. Dada a dificuldade de movimentação dos restos mortais, as equipes de resgate se concentraram em resgatar os documentos do local, desde contas até malas.

O desespero dos familiares era tamanho que os repórteres de Corrientes contaram como um parente chamado Corigliano daquela província, que havia perdido a esposa no vôo 707, pretendia alugar um barco para cruzar o Paraná e encontrar ele mesmo o corpo de sua esposa. Dissuadiram-no de fazê-lo, as correntes do Paraná estavam violentas naquele dia e tentaram confortá-lo dizendo-lhe que em breve teria sua esposa para lhe dar o enterro correspondente. Foi apenas uma mentira para acalmá-lo.


Os dias foram passando e os cronistas revisitaram o local, o que encontraram os deixou paralisados. À medida que avançavam pelo matagal, notaram aves de rapina voando em círculos sobre o local do acidente. O cheiro nauseante já era insuportável. Prevenindo o pior, os jornalistas descobriram que os corpos ainda estavam no mesmo lugar e que serviam de alimento para corvos e outros vermes. 

Um morador diria aos cronistas: “Levanto cedo e venho aqui espantar os corvos”. Entretanto, o resgate dos corpos continuou a ser adiado e a dor dos familiares, por não poderem enterrar os seus entes queridos, estendeu-se para além do tolerável. O processo de transporte das vítimas foi lento e a maioria foi realizada em helicópteros, os corpos foram transferidos para o necrotério do Hospital Perrando.

Investigações


Durante as investigações, seria comprovado que a aeronave caiu após enfrentar condições climáticas adversas (previamente conhecidas pela tripulação através de boletins climáticos) que acabariam por induzir o piloto a realizar manobras arriscadas para manter a aeronave voando até perder o controle da mesma. A seguir transcrevemos o relatório de Prevenção de Acidentes Aéreos na Argentina publicado em seu site:


Nunca seriam esclarecidos os motivos que levariam a tripulação a manter a rota original, que passaria sob a tempestade, ao invés de adotar rota diferente.

Por Jorge Tadeu (Site Desastres Aéreos) com baaa-acro.com, ASN, Wikipédia e bajolalupasite.wordpress.com

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