domingo, 15 de março de 2009

''Vou fazer pior'', disse Silva a PM após decolar

Tio de Erica, policial tentou evitar a tragédia ligando para sequestrador

O voo da morte de Kleber Barbosa da Silva, de 31 anos, e da filha Penélope, de 5 anos, foi anunciado por celular. Há 21 anos na PM de Goiás, o sargento Adão da Mota Correia, tio de Erica Correia, de 23 anos, mãe da menina, interceptou por telefone o sequestrador. O pai e a filha morreram às 18h15 de anteontem, ao cair no estacionamento do shopping mais movimentado de Goiânia, e foram sepultados ontem, em cemitério diferentes da capital.

Numa viatura, Adão conseguiu, por volta de 15 horas, o primeiro contato por celular com o sequestrador. Silva naquele momento estava com a filha no Vectra que possuía, numa estrada em direção à cidade de Luziânia. "Neste primeiro contato, eu já me assustei com a frieza dele", conta o policial. A voz era de uma pessoa tranquila. "Nunca vi coisa igual."

Meia hora depois, Silva disse, num segundo contato, que estava sobrevoando a Serrinha, setor nobre de Goiânia. "Não sabia que ele pilotava nem que era um doido, um potencial suicida", diz o tio de Erica. Adão imediatamente disse a Silva que Erica, retirada do Vectra e agredida com um extintor de incêndio horas antes, não tinha morrido e passava bem. "Você quer saber como está a sua mulher? Ela está bem, no hospital, sem risco", informou o PM, que se surpreendeu com a frase seguinte de Silva. "Então eu vou fazer uma m... pior."

Naquele momento, a cúpula da PM já acompanhava o caso. O policial, imediatamente, conseguiu um helicóptero da corporação. Com outros quatro colegas, tentou localizar o sequestrador pelos céus de Goiânia. Adão chegou a ver Silva indicar três vezes que pousaria na pista do Aeroporto Santa Genoveva, mas arremeteu o monomotor.

O Tupi chegou a passar a 2 metros da asa de um Airbus da TAM que aguardava o embarque de passageiros. "Ele estava brincando com a gente", relata Adão. "Era um louco, premeditou, planejou tudo." O espaço aéreo teve de ser fechado e Silva seguiu rumo ao Shopping Flamboyant. "Vi naquele momento que aconteceria o pior", afirma o policial. Foram 40 minutos do segundo e último contato até a queda do monomotor no centro de compras.

Adão relata ainda que não ouviu a voz de Penélope nos telefonemas. "Fica uma dor, uma sensação muito ruim", conta. "Tentei argumentar, falei de Deus, da vida, da família, da menina, mas não tinha volta. Fui profissional (nesse caso) até agora, segurei a barra, mas amanhã acho que vou explodir."

PREMEDITAÇÃO

Além do PM, o delegado Manoel Borges, da 8.ª DP de Goiânia, que investiga o caso, também considera que o sequestro e a queda foram premeditados, assim como o instrutor de voo atacado em Luziânia (mais informações na página C4). Borges acredita que Silva tomou a decisão após ser acusado de ter violentado sexualmente uma adolescente de 13 anos em Aparecida de Goiânia. A garota o denunciou no início da semana. A prisão seria pedida ontem. "Ele estava obstinado, decidido a se matar quando roubou o avião", disse o delegado.

Borges ainda aguarda o resultado de um exame toxicológico para saber se Silva consumiu algum tipo de droga, antes de deflagrar a série de ações que levaram às mortes. Ontem, o delegado ouviu parentes e amigos da família de Erica. Ele pretende ouvir a mulher na próxima semana, quando deverá concluir as investigações e pedir o arquivamento do inquérito. "Pelo que ouvi, é o caso de um jovem sem emprego e sem objetivos", disse, ainda sem levantar hipóteses sobre o que teria motivado a tragédia.

Peritos do Instituto de Criminalística (IC) de Goiânia relataram ontem que nenhuma arma foi encontrada no estacionamento do shopping. O laudo final deverá ser divulgado em 30 dias. O sequestro do avião também está sendo investigado pela Policia Federal (PF), que abriu inquérito ontem. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) instaurou processo administrativo para apurar se houve falhas na segurança do aeroclube de Brasília em Luiziânia (GO). Foi de lá que Silva roubou o Tupi de prefixo PT-VFI. Inspetores de aviação civil realizaram nesta sexta-feira análises no local e entrevistaram os responsáveis. Não há previsão para a conclusão do processo.

Em torno dessa tragédia, há também outros dois inquéritos da Polícia Civil -um pela tentativa de assassinato de Erica por Silva e outro pelo homicídio da filha, Penélope. Com a morte do autor dos crimes, o caso será encerrado e arquivado, o mesmo acontecendo com a acusação de estupro existente na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) de Aparecida de Goiânia.

Fonte: Leonencio Nossa (estadão.com.br)

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