Vice-prefeito de Pont-Saint-Esprit, Jean-Pierre Colombet não descansa enquanto não descobrir a verdade
Pelas ruas da cidade - que hoje tem 10 mil habitantes, mas na época tinha 4,5 mil -, é praticamente impossível encontrar quem queira comentar as novas revelações ou relembrar o acontecimento. "É uma bobagem" e "não tem mais o que falar sobre isso" são as frases mais comuns, culminando com alguns "nos deixem em paz". Conseguir a identificação dos poucos que aceitam comentar, então, é tarefa ainda mais árdua: as testemunhas que falaram à imprensa e deram nome e sobrenome acabaram sendo vítimas do assédio telefônico de dezenas de outros jornalistas do mundo todo, que leram sobre o caso na imprensa.
Para um aposentado que aceitou falar sob a condição do anonimato, a explicação para o tabu está no fato de que os moradores respeitam as famílias das vítimas e querem que o caso enfim se encerre. "Imagine que o seu pai ou o seu irmão ficou conhecido em toda uma região por ter saído nu na rua, imitando um cachorro. Ou então que a sua mãe ficou seis meses internada num hospital psiquiátrico porque via fogo por tudo", analisa. "Acho que, independente das razões que provocaram aquele horror, é preciso deixar a cidade se recuperar de uma vez por todas, deixar os mortos repousarem e o restante das pessoas seguir a vida em paz."
Já Jean-Pierre Colombet, vice-prefeito do vilarejo e que tinha 10 anos na época dos fatos, acha que a cidade quer tirar o rótulo que o "caso do pão maldito" deixou sobre seus habitantes. "Por anos e anos, a cidade ficou conhecida por só ter loucos, e nós não somos loucos. A fama pegou e até hoje é difícil de se desvincular dela", explica o vice-prefeito, um verdadeiro obstinado pelo assunto que coleciona pastas com reportagens e documentos sobre o caso. "Pont-Saint-Esprit sofreu muito com tudo aquilo. Nós nunca tínhamos visto mais do que um cortejo fúnebre por mês. E em uma semana, foram sete. Um verdadeiro trauma."
Além de querer apagar as más recordações, os moradores ainda são totalmente reticentes quanto à versão do escritor Hank Albarelli Jr., autor do livro que culpabiliza o serviço secreto americano pelo "caso do pão maldito". "A CIA? Em Pont-Saint-Esprit? Totalmente absurdo! Quem é um americano para vir dizer o que aconteceu aqui?", questiona o mecânico Paul Pagès, 84 anos, que junto com Colombet, é um dos poucos que ainda fala abertamente sobre o assunto. "Ele pode vir aqui e mostrar quantos documentos quiser. Mas o que serão esses documentos depois de tantos anos e tantas fantasias em torno desta história? Acho muito difícil ele conseguir convencer alguém daqui", diz Pagès, que como todo o francês, em princípio é contra o que quer que seja.
Ao contrário de Pagès, a dentista aposentada Madeleine Eynard, 87 anos, prefere primeiro ouvir os detalhes da nova versão antes de julgar o trabalho do autor do livro A Terrible Mistake, em que Albarelli Jr. Detalha como teria sido a operação com o LSD. "Tudo é possível, e naquela época vivíamos no meio de conspirações e experiências secretas para todo o lado. Estou louca para ler o livro, mas só vou poder se sair uma edição em francês", diz a ex-dentista.
Jovens souberam do caso por filme
Entre a nova geração, nascida bem depois do intrigante caso, ninguém demonstra muito interesse pela polêmica. "Moro aqui há 10 anos e só fiquei sabendo quando vieram gravar um filme sobre essa história, no ano passado. Os mais velhos não gostam de comentar sobre isso e nunca tinham me contado nada", afirma a estudante Samia Harrouchi, 15 anos.
Apesar de conhecerem poucos detalhes da história, Samia e as amigas Chloé Fournier e Leila Ouerhani, nascidas em Pont-Saint-Esprit, acham quase impossível que a CIA - "aquela dos filmes?", questionam - tenham um dia tido interesse pela cidade. "É uma história muito mirabolante para ser verdade. Aqui não tem nada de especial, por que escolheriam justo uma cidade no meio do nada?", brinca Chloé.
Fonte e fotos: Lúcia Müzell/Especial para Terra
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