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Desvendar as causas de um acidente é importante para evitar que possíveis falhas sejam repetidas. No caso do voo 447, poucas coisas estão certas: às 22h30 (horário de Brasília), o piloto francês Marc Dubois, 58 anos, fez o último contato com o comando aéreo brasileiro. Relatou que a viagem corria bem. Às 23 horas, Dubois fez contato com a Air France e informou que naquele momento o avião atravessava pesadas nuvens cúmulosnimbos (leia ao lado).
Foi o último registro feito pelo comandante. As informações conhecidas a partir daí foram transmitidas pelo próprio avião, entre 23h10 e 23h14. Nesses quatro minutos, a aeronave emitiu à companhia aérea pelo sistema de comunicação Acars uma série de mensagens avisando que o piloto automático fora desativado, que havia variação de velocidade, pane elétrica e, por último, despressurização. O mistério que cerca o voo 447 reside em descobrir o que provocou tudo isso.
As primeiras respostas concretas deveriam vir da análise das caixas de voz e de dados. Mas hoje elas estão mergulhadas no fundo do oceano, emitindo um sinal para os sonares. Suas baterias duram apenas 30 dias e, se não forem encontradas nesse período, dificilmente vão ser localizadas depois. Na análise das informações existentes até agora, a hipótese mais aventada internacionalmente diz respeito a um possível congelamento nos tubos de Pitot no momento em que o Airbus entrou no meio das nuvens. São três pares de sensores instalados na parte externa da aeronave que medem, entre outras coisas, a velocidade e a altitude.
Esses equipamentos são construídos para suportar temperaturas de mais de 40 graus negativos, em condições normais. O problema é que em tempestades tropicais, com a ascensão de ar quente, é possível haver condensação. Nenhum Airbus até hoje caiu por congelamento desses sensores, mas alguns especialistas acreditam nessa possibilidade por dois motivos. Primeiro, a Air France admitiu a variação de velocidade no avião nos instantes imediatamente anteriores ao desastre - e isso pode estar ligado a um problema nos tubos de Pitot. Depois, a Airbus emitiu na noite da quinta-feira uma recomendação aos pilotos de todas as suas aeronaves, do A318 ao A380, para manter o manete na posição de aceleração durante a travessia de tempestades. Na mensagem, reconhecia que houve "inconsistência entre as diferentes medidas de velocidade" do 447.
A recomendação da Airbus parece estar relacionada à possibilidade de o piloto automático ter sido desligado durante a tempestade com conseqüente alteração da potência recomendada pelo fabricante. "Nessa condição, qualquer manobra brusca a mais de 800 quilômetros por hora pode fazer o avião desmontar no ar, a começar pela asa", disse à ISTOÉ um ex-comandante da Aeronáutica. Outra possibilidade para explicar a tragédia pode estar no alerta de pane elétrica.
A Air France divulgou no dia seguinte ao desastre que um raio poderia ter atingido o avião. Especialistas são unânimes em dizer que a descarga elétrica não deveria comprometer um A330. "Um raio não derruba avião, nem dois", diz o piloto Jorge Barros.
Como aviões caem sempre por mais de uma causa, uma conjunção do mau tempo com algum erro humano, gerado pelo que os pilotos dizem ser um excesso de automatização do Airbus, é mais uma das alternativas. "Já se questiona a dependência eletrônica do Airbus", diz o diretor de segurança de voo do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Carlos Camacho. Também piloto, dom Eudes de Orleans e Bragança, herdeiro da família real brasileira, perdeu um primo no desastre. Ele critica o fabricante. "Os Airbus são feitos para evitar o erro do piloto, mas, se o computador recebe uma informação errada, o avião fica à mercê", disse ele à ISTOÉ. "São equipamentos avançados, mas não têm o último recurso, que é o humano."
Na realidade, mais que o excesso de automatização, estaria em jogo o treinamento inadequado dos pilotos ou algumas reações equivocadas, apesar do treinamento. Mas dom Eudes levanta outra ponta, uma espécie de mistério do mistério. "Por que o piloto não desviou da tempestade?", indaga, antes de argumentar. "A Air France faz o plano de voo mais barato, para economizar combustível", diz. "Mas, na hora que o radar aponta uma tempestade e o piloto muda o plano, tem que explicar depois por que gastou mais combustível."
Fonte: Eliane Lobato, Camila Pati e Mário Simas Filho (Revista IstoÉ)
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