Ministro da Defesa poderá rever critérios que levaram FAB a escolher avião sueco
Jobim deve dar mais peso a pontos de interesse do Planalto, que prefere o caça francês, para alterar documento da AeronáuticaELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIAO ministro da Defesa, Nelson Jobim, apresentará ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva seu próprio relatório sobre a renovação da frota da Força Aérea Brasileira, podendo rever o critério de pontuação dos seis itens avaliados tecnicamente para cada avião e que, confrontados, deram o primeiro lugar ao sueco Gripen NG, fabricado pela empresa Saab. "É importante ver se a pontuação [do relatório da FAB] bate com a posição da gente, que é baseada na Estratégia Nacional de Defesa e dá prioridade à transferência de tecnologia", disse Jobim à Folha.
A Aeronáutica manteve o ranking antecipado pela Folha na última terça-feira para a compra dos 36 caças por até R$ 10 bilhões: o Gripen NG em primeiro lugar, o F-18 da Boeing norte-americana, em segundo, e o Rafale, da Dassault francesa, em terceiro. O francês é o preferido de Jobim e de Lula, que defendem negócio com a França porque o país é seu "parceiro estratégico", com o qual assinou grande acordo militar em 2009.
Jobim, porém, irá analisar todas as informações e a confrontação de dados e poderá fazer a reavaliação do sistema de pesos e notas para cada critério antes de levar uma posição da Defesa a Lula, a quem cabe a decisão final da compra. Como hipótese: a Aeronáutica pontua mais a questão operacional (20%) e menos a contrapartida comercial (15%), e Jobim não descarta, em tese, inverter esse peso.
No limite, uma mexida assim pode até mesmo resultar numa mudança no ranking. Ninguém no governo admite abertamente a possibilidade, apesar da preferência pelos Rafale. A Aeronáutica formalizou entre anteontem e ontem a entrega do seu relatório final a Jobim -que, entretanto, já o conhecia desde o final do ano passado, quando foi ratificado pelo comando da Força Aérea.
O trabalho foi dividido em três partes: uma peça "master" com 390 páginas, um "sumário" com 117 (incluindo sete com a definição de abreviaturas) e uma apresentação em Power Point com as explicações sobre a metodologia e comparando as vantagens e desvantagens dos finalistas.
Todo o material foi enviado em um pen drive para Jobim, que está em férias, passou por Brasília nesta semana e só retorna à Defesa na próxima segunda-feira, mesmo dia em que Lula voltará a dar expediente.
Jobim pretende estudar o conteúdo do relatório, preparar uma coluna de dúvidas (pontos que não entender) e outra com questionamentos (sobre dados com os quais não concorda) e depois se reunir com o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito.
"Vou analisar tudo, tirar dúvidas, avaliar o sistema de cálculos e levar as minhas conclusões para o presidente Lula. A decisão depende dele, e vou levar o máximo de análise que possa ajudá-lo nessa decisão", disse o ministro.
Ao contrário da Aeronáutica, que quer decidir a questão o mais rapidamente possível para evitar a contaminação do ano eleitoral, Jobim disse que não tem pressa. Ele acha que a reunião com Lula pode acontecer na semana que vem, mas alerta que, antes de qualquer anúncio oficial, ainda será necessário ouvir o Conselho de Defesa Nacional para ratificar a decisão do presidente.
O conselho é apenas consultivo. Mas participam dele os presidentes da Câmara, Michel Temer, e do Senado, José Sarney, e há o temor em setores do governo de que um deles, senão ambos, possa insistir em pedir vista do processo, o que seria difícil de negar politicamente. Além disso, seria uma forma de levar o assunto para debate no Congresso, o que poderia acabar arrastando o desfecho da compra durante meses.
O relatório da FAB foi feito pela Copac (Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate), presidida pelo brigadeiro Dirceu Tondolo Noro, um oficial aviador com MBA em projeto pela Fundação Getulio Vargas. Reuniu cerca de 30 mil páginas, em quase um ano de trabalho, com viagens internacionais, consultas e confronto de dados.
São seis os critérios analisados pela Aeronáutica: técnica (garantias e adequação à necessidade brasileira); operacional (logística, armamento e capacidade de carregamento de armas); transferência de tecnologia (em que níveis); "offset" (contrapartida da empresa vencedora em investimentos tecnológicos); comercial (preços e condições de pagamento) e gerenciamento do programa (pelos próximos 30 anos).
Foi do confronto desses critérios, com um peso decisivo dado ao fator preço, que o Gripen NG acabou escolhido. O avião, que tem um protótipo demonstrador voando há mais de um ano, é um desenvolvimento de duas gerações anteriores do mesmo caça.
Assim, o pacote ficou mais atrativo para a Aeronáutica por compartilhar métodos de produção. Além disso, mais leve e monomotor, tem custo de operação mais baixo.
Fonte: jornal Folha de S.Paulo