domingo, 18 de abril de 2010

Quando crescer, quero voar!

Por histórias, filmes e superpoderes, crianças entram no mundo mágico e, às vezes, escolhem a profissão

Nem sempre a escolha por uma profissão segue apenas a lógica que muitos adultos tentam impor às crianças e aos adolescentes: ganhar muito dinheiro. Fora a remuneração, muitas vezes, a definição do que "quero ser quando crescer..." vem a partir da identificação com personagens, histórias e "poderes" que nos são apresentados ainda na infância.

Como exemplo, eis os pilotos. Afinal, quem nunca ouviu, numa simples brincadeira que seja, uma criança revelar que pode voar e, assim, vestir-se de uma capa que deveria lhe dar poderes especiais? Foi justamente dessa forma que o tenente-aviador do Esquadrão Rumba, Igor Rocha, 29 anos, decidiu que voaria pelos ares do País, servindo à Aeronáutica. Quando criança, lembra, enquanto seus amigos revelavam que seriam médicos, advogados, ele simplesmente respondia: "sei voar e você não".

Aviadores do Esquadrão Rumba, em Fortaleza, o capitão James Martins, 33, e o tenente Igor Rocha, 29, afirmam que a escolha aconteceu ainda na infância, por identificação com a carreira

Conforme a psicóloga e Doutora em Educação, Veriana Colaço, professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), a escolha profissional é um processo que ocorre ao longo da vida e passa por diferentes influências. Como cita, há os vínculos com os que exercem a profissão; a representação social que a profissão tem na cultura; o modo como acreditamos ser capazes de realizar atividades; as idealizações acerca do que significa; as expectativas de futuro; as pressões familiares e sociais; e, claro, as vivências que temos nas brincadeiras e fantasias infantis.

"Desde criança, queria muito ser aviador. Era um sonho de infância. Ninguém da minha família é, mas meus pais sempre me incentivaram muito, me levavam para ver aviões. Além disso, também assistia a muitos filmes, desenhos animados", recorda Igor Rocha.

Já o capitão-aviador cearense James Martins, de 33 anos, comenta que a decisão pela carreira veio da identificação com o "ser militar". De acordo com ele, a disciplina e a organização dos militares o encantaram quando era criança. Além disso, claro, as brincadeiras sempre envolviam os aviões.

Segundo Veriana, escolher a profissão não é apenas um ato, mas a construção, um exercício de vida. "Os super-heróis neste processo têm papel importante, na medida em que são percebidos como personagens idealizados, perfeitos e modelos. Neste sentido, as ações que realizam podem também ser as ideais".

O sonho de infância de Ari Josino (acima), 60 anos, é realizado nos voos de ultraleve no clube que preside. Para o pequeno Arnaldo (abaixo), 10, a vontade é de ser piloto, quando finalmente crescer

Para a psicóloga, portanto, a carreira militar entra nesse contexto pois, no caso dos super-heróis, por serem percebidos como defensores e protetores da humanidade, podem ser relacionados com personagens e carreiras que socialmente representam a defesa das pessoas e da nação. "Assim são identificados os militares de um modo geral".

Prova disso é que, como destaca o pedagogo Fábio Soares, Coordenador das Turmas ITA/IME do Colégio Antares, a procura pela área é grande na escola. Como calcula, cerca de 60% dos alunos de 5º ano desejam entrar no Colégio Militar. No Ensino Médio, a procura é de 10% pela Escola Preparatória de Cadetes do Ar e pelo Colégio Naval.

CLUBE DE AVIAÇÃO

Sonho de ser aviador apenas no lazer

Para aqueles que a carreira militar não foi almejada ou possível, a continuidade do sonho pode ser dada, sim, nos momentos de lazer. No Estado, um exemplo de que os civis também podem voar é mantido pelo Catuleve - Clube de Aviação Desportiva. Às margens do Rio Catu, o local, que já existe há 25 anos, antes com o nome Aeroleve, reúne adultos, jovens e crianças que, mais do que aviadores, são eternos sonhadores e dão, literalmente, asas à imaginação.

Como define o presidente do clube, o industrial Ari Josino, 60 anos, a vontade de voar "é de todo mundo". Segundo ele, ao tentar explicar a paixão pelos ares que surgiu ainda na infância, uma possibilidade é que a inspiração tenha surgido a partir da observação do voo dos pássaros. "Às vezes, até sonhamos voando", compartilha Josino, comentado que acredita que todo mundo pensa, pelo menos uma vez na vida, em ser piloto.

O estudante Arnaldo César Gadelha é prova da "tese" de Josino. Com apenas 10 anos, o garoto já se decidiu pela carreira de piloto. Tanto que, como exalta seu pai, César Gadelha, o estudante não perde uma oportunidade de ir ao clube ou de ver a apresentação da "mágica" Esquadrilha da Fumaça. "Já fui ao aeroporto ver os aviões. Passei a gostar vendo televisão e por causa do meu pai. Meu irmão tem medo de voar, mas eu não", conta o menino.

Como defende Josino, "todo mundo que vê um avião fica com vontade". Alguns realizam o sonho, tornando-se profissionais. Outros encontram a realização no lazer. No entanto, independentemente da vocação, o presidente frisa que, para a prática da atividade, é preciso algo em comum com os aviadores da Aeronáutica: a disciplina. Como compara, qualquer pessoa que busque e tenha coragem de voar de ultraleve precisa seguir bem as normas e se manter bastante atento às instruções.

A opinião do especialista

Buscar o projeto de vida

ROSITA PARAGUASSÚ
Mestre em Psicologia e prof. da Unifor


A abordagem que nós professores de orientação de estágio da Unifor acreditamos concebe a orientação como um resultado, um desfecho, mesmo que por um tempo, de um processo que envolve o autoconhecimento, o conhecimento das profissões e a escolha. Pode-se dizer que toda a história de vida e valores aprendidos nas etapas do desenvolvimento, no contato com grupos humanos com os quais o participante interagiu influenciam nos processos de escolha, inclusive, de uma profissão.

Isso se dá quando o participante é adolescente e, nesta fase, encontra-se em formação de sua identidade, portanto, suscetível às influências. Quando adulto, esses aspectos estarão presentes. Outros relacionados com a vida atual aparecerão com mais força na tomada das decisões, por exemplo, na necessidade de trabalho, família etc. Em relação aos valores, força e poder, alguns buscarão atividades de trabalho que exercem o controle sobre os iguais. Porém, esses aspectos são expostos, questionados e analisados na fase do autoconhecimento.

Enfim, ponto marcante nesse trabalho de ajuda ao orientando sobre a escolha é sempre a oportunidade de ele se envolver consigo mesmo, descobrindo seus potenciais, definindo uma área de atuação no mundo do trabalho e, assim, construindo um projeto de vida que dê sentido à sua existência.

Fonte: Janine Maia (Diário do Nordeste) - Fotos: Alex Costa

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