Aviões de garimpeiros tomam conta de região ao lado do posto de saúde indígena fechado (Imagem: Condisi Yanomami) |
Instalado na Terra Indígena Yanomami há mais de 30 anos, o garimpo ilegal se modernizou e enriqueceu ao longo do tempo. Investigadores afirmam que a atividade, antes precária e dependente do transporte pelos rios, conta hoje com altos investimentos e ocorre principalmente por via aérea.
Em apenas três missões de fiscalização, de agosto a dezembro de 2021, uma força-tarefa de órgãos federais apreendeu 91 aeronaves, entre aviões e helicópteros, mas apenas 9 voadeiras, barcos de pequeno porte de uso comum na Amazônia.
Para o Ministério Público Federal, que apura os crimes na região, essa mudança logística impôs um novo desafio às autoridades. Segundo o órgão, monitorar o trânsito de embarcações pelos rios não tem mais a eficácia de antes.
Em entrevista coletiva na última terça (24), o MPF afirmou que uma base de fiscalização foi montada em 2019 às margens do Mucajaí, um dos três grandes rios que cortam o território Yanomami. Os resultados, contudo, ficaram abaixo do esperado.
"Imaginávamos que a base iria resolver o problema ali, mas o garimpo muda e passa a utilizar a logística aérea, o que resultou em pouca resolução da base", disse o Procurador Alisson Marugal, do MPF-RR.
O uso de aeronaves, por si só, não é uma novidade. Em 1989, anos depois da explosão do garimpo no território Yanomami, o MPF já pedia a interdição das pistas de pouso clandestinas no local. A estimativa, à época, era que havia mais de cem estruturas desse tipo espalhadas pelo estado.
Segundo o MPF, o que mudou em tempos recentes foi a sofisticação dessa rede. Um único suspeito, que chegou a ser preso no ano passado, é dono de nove helicópteros e um avião. A investigação mira os proprietários das aeronaves e os fornecedores de combustível, em geral comprado na Venezuela.
"Focamos agora nos transportadores e nessa logística, que é caríssima. Sem esses fornecedores da logística, a engrenagem não iria rodar com essa força e complexidade", declarou o Procurador Matheus de Andrade Bueno, do MPF-RR.
Pista de pouso clandestina para abastecer o garimpo em Paapiú, em território Yanomami, fotografada em 12 de dezembro de 1989 (Imagem: Charles Vincent/ISA) |
Outra dificuldade das investigações, segundo o MPF é a descentralização do crime. O relatório "Yanomami sob ataque", lançado em abril do ano passado pela Hutukara Associação Yanomami, aponta que pelo menos 110 comunidades indígenas são impactadas pelos garimpos, que têm vários chefes espalhados pelo território.
"Temos 20 mil pessoas atuando lá, e é impossível investigar e processar todas. Temos lideranças pulverizadas e compartilhadas. Cada comunidade pode ter um garimpo, que pode ser ligado a outro ou não. É algo bem complexo e difícil de ser monitorado", diz o procurador Matheus Bueno.
(Imagem: Arte/UOL) |
Para o procurador, o caminho para resolver o problema de forma definitiva é manter operações permanentes no território indígena. A última ação federal para fiscalizar o local, porém, foi em dezembro de 2021. De acordo com o MPF, 2022 foi "o ano do caos na terra Yanomami".
Como o garimpo utiliza a via aérea, o combate também precisa ser. É muito difícil monitorar à distância, considerando a extensão territorial. Precisamos aproveitar o momento também e melhorar controles regulatórios. Hoje, circular ouro é muito fácil", disse o Procurador Matheus Bueno, do MPF-RR.
Garimpo no rio Uraricoera, Terra Indígena Yanomami, em janeiro de 2022 (Imagem: Relatório Yanomami sob ataque) |
Embora sejam menos usados para o transporte dos garimpeiros, os rios da região seguem sendo afetados. O relatório "Yanomami sob ataque" aponta que mais de 500 km de cursos d'água foram impactados pelo garimpo, especialmente devido à contaminação por mercúrio.
Os principais foram os seguintes:
- Rio Mucajaí - 180 km impactados (30 km na cabeceira e 150 km no médio curso)
- Rio Uraricoera - 150 km impactados
- Rio Catrimani - 65 km
O desmatamento ligado ao garimpo também cresceu nos últimos anos. Com base em dados do instituto Mapbiomas, que monitora a perda de vegetação por meio de imagens de satélite, o relatório Yanomami sob ataque identificou um aumento de 172% na destruição do território Yanomami entre 2018 e 2021:
- 2018 - 1.200 hectares
- 2019 - 1.750 hectares
- 2020 - 2.234 hectares
- 2021 - 3.272 hectares
Via Carlos Madeiro e Rafael Neves (UOL)
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