A presença de cadáveres em aviões comerciais é mais comum do que muitos imaginam (Imagem: Getty Images) |
Você já parou para pensar que, ao pegar um avião, existe a chance de você estar viajando com uma pessoa morta?
Caso a resposta seja não, saiba que este tipo de situação acontece em diversos voos comerciais pelo Brasil (e é muito mais comum do que você pode imaginar).
Pense no seguinte cenário: alguém morre em Fortaleza durante uma viagem de férias e seu corpo precisa ser levado para São Paulo, onde será enterrado. É bem provável que este transporte seja realizado no porão do avião, no mesmo voo no qual estão viajando centenas de passageiros.
Mas, como é de se esperar, não se trata de uma operação logística qualquer. Pelo contrário: trata-se de um processo que, em voos nacionais, deve seguir uma série procedimentos muito rígidos (em voos internacionais, a operação pode ser diferente, de acordo com as leis de cada país).
Nesta imagem, se vê como o caixão é levado para dentro da aeronave (Imagem: Divulgação/Latam Cargo) |
A Latam Cargo, por exemplo, que é a divisão de transporte de cargas da companhia aérea Latam Airlines, afirma transportar, em média, caixões com os restos mortais de 135 pessoas por mês (quase sempre dentro dos aviões comerciais da empresa).
Geralmente, o familiar ou outro responsável deve reservar o transporte do corpo junto ao call center da companhia com no mínimo seis horas de antecedência ao voo desejado. Depois, deve providenciar para que os restos mortais cheguem até os cuidados da companhia no aeroporto, junto com documentos como certidão de óbito e a carteira de identidade do falecido.
"Caso o óbito tenha ocorrido no hospital, o corpo chega da mesma forma que é entregue ao cemitério, ou seja, através de um agente funerário devidamente credenciado nos órgãos reguladores do país. Em alguns terminais de cargas, os caixões [também chamados, neste tipo de operação logística, de urnas] ficam em áreas isoladas", informa a Latam Cargo. "E o corpo deve passar por um processo de embalsamamento para evitar vazamentos inesperados".
Devidamente lacrado, esquife sobe em esteira para o interior da aeronave (Imagem: Divulgação/Latam Cargo) |
E a empresa exige que o caixão esteja enquadrado em uma série especificações: a espessura da urna não deve ser inferior a 30 milímetros e deve ser impermeável. Seu revestimento interno deve ser de zinco e deve possuir em seu interior material absorvente (para o caso de o corpo expelir fluídos durante a viagem). E, além disso, após a colocação dos restos mortais, o caixão deve estar hermeticamente fechado durante o traslado, mediante a vedação por material plástico ou por metal fundido.
A Latam Cargo não informa quanto custa o traslado de restos mortais, mas afirma "que o valor do transporte de um esquife pode variar por conta das dimensões e peso da urna e do trecho do voo".
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por sua vez, informa que só realiza "o controle sanitário do translado de restos mortais humanos em áreas de portos, aeroportos e fronteiras em casos de emergência em saúde pública ou situações que possam significar algum risco à saúde da população, a critério da Gerência Geral de Portos, Aeroportos, Fronteiras e Recintos Alfandegados".
Discrição
Toda esta operação, logicamente, é mantida longe dos olhos dos viajantes. "O corpo é levado em carro fechado até a aeronave para que os passageiros não vejam a entrada do corpo", informa a Latam Cargo. "Depois, uma equipe de profissionais coloca a urna cuidadosamente na esteira. Normalmente, o esquife embarca antes de qualquer carga e antes dos passageiros".
O caixão é isolado por redes no porão da aeronave (Imagem: Divulgação/Latam Cargo) |
Depois de ser acomodado no porão do avião, o caixão é isolado das bagagens com redes. E, na chegada ao seu destino, o esquife deve ser retirado por um agente funerário e ser entregue no lugar especificado pela família ou outros tipos de pessoas responsáveis.
E é uma logística que, como toda situação que envolve morte, pode estar cercada de contornos extremamente dramáticos.
Entrevistado pelo UOL, um comissário de bordo de uma grande companhia aérea brasileira (que não quis se identificar) contou que, certa vez, avistou uma jovem passageira chorando copiosamente durante um voo entre o Nordeste e São Paulo.
Ele foi até a mulher perguntar se ela precisava de algo: durante a conversa, ficou sabendo que ela estava no Nordeste em lua de mel com seu marido e que ele havia morrido no meio da viagem (e seu corpo estava naquele mesmo voo, sendo levado por ela para ser enterrado em São Paulo).
"Somos treinados para acalmar passageiros que passem por crises emocionais durante o voo, mas esta foi uma das situações mais difíceis de toda minha carreira", diz ele.
Por Marcel Vincenti (UOL)
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