Documentos obtidos pelo RJ1 mostram possíveis falhas em procedimentos que provocaram a morte do paraquedista do Exército Pedro Lucas Ferreira Chaves, de 19 anos.
O caso aconteceu em junho de 2020, durante o salto de treinamento da Brigada de Infantaria Paraquedista, no Campo dos Afonsos, Zona Oeste do Rio. O equipamento usado pelo militar ficou preso no avião e ele acabou caindo.
O inquérito que apurou as causas do acidente foi concluído sem que ninguém fosse considerado culpado (leia detalhes mais abaixo).
O que mostram as imagens:
- Pedro Lucas Chaves, de 19 anos, é o terceiro na fila. Ele usa o capacete número 227. Ao fundo, sentado, está o tenente Caleb Souto, que atuava como operador de interfone. Ele recebia as instruções do piloto do avião;
- No mesmo vídeo, um outro militar surge e analisa os equipamentos. Ele é o auxiliar de mestre de salto, sargento Alex Ribeiro. Ele checa os ganchos, que estão presos no cabo de aço, mas não nota a chamada fita de ligação solta da cintura do soldado Chaves;
- O militar que está atrás dele é quem percebe o problema e recoloca a fita no lugar;
- O sargento Alex reaparece e nota que a fita não fica presa na farda do soldado. Ele recoloca o acessório e sai;
- Em outro vídeo, os militares já aparecem em posição para o salto;
- A fita de ligação usada pelo soldado Chaves está solta e caída no chão. Segundos depois, um soldado pisa na fita. Os militares começam a pular do avião;
- No momento em Pedro Lucas Chaves salta, o militar que estava atrás dele continua pisando na fita. Pouco tempo depois, o jovem aparece pendurado;
- O paraquedas não abre;
- Chaves fica preso na aeronave por, pelo menos, três minutos;
- Durante o incidente, cinco militares aparecem no vídeo. O tenente Caleb tenta engatar um outro paraquedas. Já o sargento Alex aparece dando assistência ao salvamento. Logo em seguida, o soldado se desprende e cai;
- Na imagem do chão, feita por um cinegrafista amador, é possível ver o momento em que Chaves aparece caindo;
- O paraquedas reserva chega a ser acionado, mas não abre;
- Quem fez as imagens se desespera e grita: "Meu Deus".
O soldado Chaves foi levado para o Hospital Central do Exército no Rio de Janeiro, mas não resistiu aos ferimentos.
Investigação
O Exército abriu um inquérito policial militar para apurar as causas da morte do soldado. As investigações duraram cerca de dois meses até que fossem concluídas.
Neste período, testemunhas foram ouvidas e perícias foram feitas. E a conclusão é que não houve indícios de prática de crime militar.
Todos os outros militares que estavam no avião foram inocentados e o caso foi arquivado. Mas os documentos obtidos pelo RJ1 apontam falhas de procedimentos.
Num trecho do inquérito, o documento diz que o auxiliar de mestre de salto, ao visualizar qualquer situação que possa ameaçar a integridade dos militares ou pôr em risco a aeronave, deve tentar sanar a pane encontrada. E em caso de não obter sucesso, deve imediatamente retirar o saltador do salto.
Em outra parte, o inquérito revela que o auxiliar de mestre de salto visualizou a distensão da fita de ligação de 20 pés do soldado Chaves, segurou a fita e, assim como havia feito com o estagiário 225, tentou prender no equipamento do soldado Chaves. O documento mostra que o sargento Alex Ribeiro deveria ter retirado o paraquedista do salto. Mas a regra não foi obedecida.
O inquérito aponta ainda para um outro procedimento errado, envolvendo o operador de interfone, tenente Caleb Souto. O sargento Alex prestava assistência ao saltador, enquanto o tenente fazia um procedimento de costura das fitas da equipe de saltadores.
Tal procedimento caracteriza uma troca de função dos dois militares: o auxiliar de mestre de salto prestando assistência ao saltador e operador de interfone realizando o salvamento propriamente dito, quando deveria ser o contrário.
O que diz o Exército
A Seção de Comunicação Social do Comando Militar do Leste informou que foi instaurado um Inquérito Policial Militar para apurar todas as circunstâncias do acidente. Segundo o CML, o inquérito seguiu para apreciação do Ministério Público Militar, que decidiu pelo arquivamento do processo.
Família sofre com saudade
"Infelizmente, acabo vendo como existência do corporativismo. Cadê a justiça? Meu filho pagou com a vida dele. Meu filho não errou em momento nenhum. Isso está muito nítido, muito claro em todas as imagens", disse Alynne Soares Mello, mãe do soldado Chaves.
Alynne relembra que na época da morte do filho, um representante do Exército fez algumas promessas.
"Falaram que meu filho receberia um seguro de vida de R$ 4,5 mil, que ele seria promovido a terceiro sargento post mortem. Foi indeferido o processo porque eu não comprovei a dependência financeira do Pedro Lucas. Aí você que, pela vida de uma pessoa, eles pagaram R$ 4,5 mil para a família. Isso é bem absurdo, ao meu ver", disse a mãe.
No dia do velório do militar, o presidente Jair Bolsonaro esteve presente.
"Ele meu deu um abraço e eu disse para ele: 'o senhor ora a Deus para que meu filho esteja num bom lugar, porque eu deixei meu filho aqui vivo e vocês estão me entregando meu filho morto'", afirmou a mãe.
Ficar sem a presença de Pedro Lucas na casa da família tem sido muito difícil para quem estava acostumado a conviver com um jovem sonhador, cheio de energia e bem humorado. Hoje, ele é lembrado com carinho em fotos espalhadas pela sala da casa.
A mãe, os avós, os irmãos e os tios homenageiam o jovem usando camisas com estampa do Exército. Imagens relacionadas ao soldado e ao paraquedismo militar se transformaram em tatuagens.
"Quem errou não foi punido. Não existiu punição. O meu filho perdeu a vida, a gente perdeu alguém muito especial e, infelizmente, a justiça não foi feita ainda", disse a mãe de Pedro Lucas.
Via G1 / RJ1 / Folha de S.Paulo
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