Pesquisadores criam modelo avançado para tornar viagens aéreas mais seguras e previsíveis.
Bjorn Birnir tem pavor de que um colega de assento no avião pergunte o que ele faz da vida. Isso porque o Dr. Birnir é um dos maiores especialistas do mundo em turbulência, o movimento caótico de fluidos — como ar ou água — em meio a perturbações. Inevitavelmente, o passageiro fará a pergunta que ele sabe que virá e reluta em responder: afinal, quão perigosa é a turbulência?
Hoje, essa pergunta se torna cada vez mais frequente entre os três milhões de pessoas que chegam e partem diariamente de aeroportos americanos. Antes vista como um incômodo secundário da aviação, semelhante a comida ruim ou espaço insuficiente para as pernas, a turbulência severa vem aumentando. Pesquisadores britânicos constataram que, entre 1979 e 2020, a turbulência severa sobre o Atlântico Norte cresceu 55%, com base em dados meteorológicos históricos. (O estudo analisou apenas a turbulência em ar limpo, que ocorre longe de tempestades ou cadeias de montanhas, sendo especialmente difícil de prever)
Um modelo para entender o caos
"Pensei muitas vezes que seria maravilhoso tornar as viagens aéreas um pouco mais agradáveis", disse o Dr. Birnir, diretor do Centro de Ciências Complexas e Não Lineares da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, e presidente do departamento de matemática da instituição. Sua contribuição mais recente é um artigo publicado na revista Physical Review Research, que apresentou o que ele considera o modelo mais avançado de movimento turbulento até hoje. A ideia é ajudar engenheiros a tornar os voos mais seguros e menos estressantes.
“O design de aeronaves será beneficiado”, afirmou. “Definitivamente, veremos modelos meteorológicos melhores.”
Thomas Q. Carney, professor aposentado de tecnologia de aviação na Universidade Purdue e piloto com mais de 11.000 horas de voo, acrescenta: "Quanto melhor o modelo, mais ele captura o campo turbulento específico e, assim, melhora a previsão, que é o que o piloto vai usar."
Voar em companhias americanas continua extremamente seguro, mas acidentes recentes abalam a confiança na aviação comercial. Este mês, o Conselho Nacional de Segurança nos Transportes (NTSB) divulgou um relatório provisório sobre um voo da Delta Air Lines que feriu passageiros durante encontro com ar inesperadamente turbulento sobre o Wyoming, no final de julho. Os pilotos tentaram evitar o mau tempo, mas foram lançados por correntes imprevisíveis. (O aquecimento da atmosfera, causado pelas mudanças climáticas, também afeta pressão e velocidade do vento.)
A turbulência representa um desafio histórico para cientistas, embora pesquisas recentes tenham avançado na compreensão de seu funcionamento. Richard P. Feynman, físico vencedor do Nobel, certa vez a chamou de “o problema não resolvido mais importante da física clássica”. Isso porque a turbulência “envolve muitos elementos móveis — temperatura, pressão, vento etc.”, disse Patrick Smith, autor do site Ask the Pilot. "Os fatores que causam o ar agitado podem mudar muito rapidamente."
O sistema é inerentemente caótico, recusando-se a seguir um caminho previsível. Partículas em movimento turbulento “começam a divergir em direções diferentes”, disse Tanner D. Harms, pesquisador que estudou turbulência no Instituto de Tecnologia da Califórnia. Modelar essas direções com precisão é extremamente difícil. "A definição de caos está quase intrínseca à própria turbulência."
Perspectivas complementares
Para tentar dar sentido ao caos, Birnir trabalhou com Luiza Angheluta-Bauer, física teórica da Universidade de Oslo, para criar um modelo que combina duas formas de observação da turbulência: mecânica lagrangiana e mecânica euleriana. Especialistas afirmam que nenhuma das duas, isoladamente, explica totalmente o fenômeno.
As duas abordagens analisam aspectos diferentes de um sistema turbulento. Na lagrangiana, observa-se uma única partícula; na euleriana, um ponto fixo no espaço. Simplificando, a lagrangiana é como acompanhar uma folha que flutua rio abaixo, sujeita a redemoinhos; a euleriana é como observar uma rocha no meio do rio e estudar como a água turbulenta se move ao redor.
Modelar a turbulência lagrangiana é mais complexo, pois exige entender o comportamento de cada partícula isolada.
"Ela executa o movimento mais complexo que se possa imaginar", disse o Dr. Birnir.
Combinando essas perspectivas, os pesquisadores conseguiram criar um modelo abrangente, sem precedentes. "O resultado é inédito, não há dúvida sobre isso", afirmou Katepalli Sreenivasan, ex-reitor da Escola de Engenharia Tandon da Universidade de Nova York, reconhecendo que alguns especialistas discordam de sua avaliação.
“A turbulência totalmente desenvolvida é onde as coisas ficam simplesmente loucas”, disse J. Doyne Farmer, professor de sistemas complexos na Universidade de Oxford. “Esses vórtices se comportam de forma extremamente caótica, com muitos graus de liberdade.”
O Dr. Birnir acredita que o voo da Delta sobre o Wyoming “parece um exemplo típico de intermitência severa na turbulência euleriana”, embora não possa fazer análise definitiva sem os dados brutos. Um modelo mais detalhado poderia ter permitido aos pilotos tomar medidas preventivas, como reduzir a potência dos motores.
O Dr. Carney reconhece que parte do trabalho de Birnir e Angheluta-Bauer está além de sua compreensão e provavelmente além do alcance de qualquer piloto sem experiência em dinâmica de fluidos computacional. Mas isso não diminui sua importância. “Estou confiante de que estão contribuindo para o avanço do conhecimento”, disse.
Via Alexander Nazaryan (The New York Times) - Imagens: Getty Images


Nenhum comentário:
Postar um comentário