domingo, 2 de agosto de 2009

Provocador, chefe de aérea diz que preços compensam desconforto

Michael O'Leary, chefe-executivo da companhia aérea europeia de baixo custo Ryanair, discutia seu novo plano para cobrar passageiros de ir ao banheiro. Em suas previsões, a maioria dos passageiros - os "visitantes discricionários do banheiro" - acabariam desistindo de usar o banheiro durante o voo. O que é bom, porque ele também quer reduzir para um o número de banheiros por avião.

E se o avião fosse acometido por alguma doença asquerosa e residual, como intoxicação alimentar? Um som abafado ressoou da cadeira em que O'Leary sentava. "Não servimos bastante comida para que todos tenham intoxicação alimentar", disse.

"Se vamos dar-lhe um reembolso de um bilhete não reembolsável porque sua avó morreu inesperadamente? Não! Vá-se embora. Não estamos interessados em suas histórias!" - Michael O'Leary

Aos 48 anos, de fala ágil e usando jeans, O'Leary é um dos mais bem-sucedidos homens de negócio da Irlanda, presidindo uma companhia aérea que prospera de forma marcante em um clima hostil para linhas aéreas (e a maioria dos outros negócios). Ele é conhecido por sua agressividade desmedida, declarações públicas ultrajantes e crença implacável de que passageiros aéreos de voos de curta distância aguentarão qualquer indignidade imaginável, desde que as passagens sejam baratas e os aviões estejam no horário.

"Logo, ele estará nos cobrando pelo oxigênio e número de braços e pernas", queixou-se o jornal The Sun em junho, quando O'Leary apresentou sua mais recente proposta - fazer com que as pessoas levassem suas próprias malas até o avião. O'Leary diverte-se com a identidade de pugilista e provocador nacional, alternando-se entre o charme e a ofensa.

Certa vez, vestiu-se de papa para anunciar a nova rota da Ryanair de Dublin a Roma. Ele já disse que pessoas gordas deveriam pagar mais por seus assentos, mas que demoraria demais pesá-las no aeroporto. E, em coletiva de imprensa para discutir a possibilidade de iniciar voos transatlânticos, ele sugeriu - para a consternação da jovem heroicamente traduzindo seus comentários para o alemão - que consumidores da classe executiva receberiam sexo oral.

O'Leary às vezes parece lançar sugestões insanas apenas para chocar. Mas, reservadamente, ele é conhecido como um negociador duro, cuja sagacidade e cotoveladas lhe garantem acordos favoráveis, como na vez em que fez uma encomenda enorme de novos aviões quando o mercado entrou em colapso com os ataques de 11 de setembro.

Seus inimigos jurados incluem sindicatos (seus funcionários não são sindicalizados), políticos que impõem taxas de aeroporto, ambientalistas, blogueiros que reclamam do mau atendimento, agentes de viagem, repórteres que esperam assento gratuito, reguladores que frustram seus planos e proprietários de aeroporto como a BAA, a quem já chamou de "estupradores careiros". Parece haver um método em tudo isso.

Os insultos "à BAA, ao governo britânico e aos demais são pensados como um sinal forte para todo mundo que negocia com a Ryanair de que ninguém vai sair impune", disse Joe Gill, diretor de pesquisa de capital da Bloxham Stockbrokers, em Dublin.

A Ryanair possui mais de 850 rotas na Europa, normalmente para aeroportos obscuros afastados das grandes cidades - "de nenhum lugar a lugar algum", zomba Stelios Haji-Ioannou, que dirige a concorrente EasyJet. O lucro líquido da Ryanair caiu 78% no ano fiscal que terminou em março, mas ainda conseguiu US$ 149 milhões em lucros. Enquanto a maioria das empresas de transporte sofre com a hemorragia de passageiros, a Ryanair espera aumentar seus passageiros de 57 milhões, em 2008, para 68 milhões neste ano.

O mistério é por que tantas pessoas estão dispostas a suportar uma companhia que, segundo a revista The Economist, "se tornou sinônimo de péssimo atendimento ao consumidor, propagandas enganosas e grosseria insultante a qualquer um ou qualquer coisa que fique no seu caminho". "Ninguém te ajuda - simples assim", disse Malcom Ginsberg, editor-chefe do boletim de viagens aerbt.co.uk, descrevendo o que acontece quando passageiros da Ryanair precisam de assistência no aeroporto.

Esse não é o ponto, disse O'Leary em entrevista recente. "Nosso atendimento ao consumidor é diferente do de todas as outras linhas aéreas, que têm essa imagem de 'queremos cair a seus pés, abuse de nós, o cliente tem sempre razão' e todo esse absurdo." Em contraste, continuou O'Leary, a Ryanair promete quatro coisas: tarifas baixas, um bom registro de voos no horário, poucos cancelamentos e poucas bagagens perdidas.

"Se quiser algo mais - vá embora! Nós vamos pagar um hotel se seu voo for cancelado?", perguntou retoricamente. "Não! Vá embora." Em um momento, ele tomava café na câmara de comércio de Londres. No outro, conduzia uma coletiva de imprensa em que, entre outras coisas, chamou o primeiro-ministro Gordon Brown de "ridículo" e "escocês pão-duro".

Durante a entrevista, entoou o refrão sobre quando a Ryanair concede reembolsos, que é nunca. "Vamos reembolsar uma passagem não-reembolsável porque a vovó morreu de repente?", perguntou. "Não! Vá embora. Não estamos interessados em sua choradeira! Qual parte de 'sem reembolsos' você não entendeu?"

Perdeu o voo porque esperou demais no guichê da Ryanair? Azar! Sua bagagem está levemente acima do peso? Jogue fora o excedente ou use-o no voo! Está tentando levar as compras do duty-free em uma sacola ao avião, quando você já tem uma bagagem de mão? Prepare-se para desembolsar US$ 40 no portão.

As tarifas da Ryanair custam em média apenas e 40, ou US$ 56. O'Leary acabou de anunciar que venderia um milhão de assentos por e 5 cada no outono europeu. A companhia compensa esse dinheiro por meio de acordos com hotéis, locadoras de veículos e outros parceiros, além de taxar tudo, do check-in no aeroporto (US$ 56) ao feito online (US$ 7).

O'Leary também é rígido a bordo de seu escritório. Recados de post-it e marca-textos estão banidos. Executivos levam suas próprias canetas. Para ilustrar seu comprometimento a esse princípio, O'Leary tirou duas canetas de seu bolso, ambas roubadas de quartos de hotel.

Ele se hospeda em hotéis econômicos. E sempre voa pela Ryanair, surpreendendo seus colegas passageiros por checar suas passagens ao portão e depois embarcar por último, onde invariavelmente se senta no meio.

O'Leary não aproveita o lounge executivo, não tem BlackBerry, nem usa e-mail, porque "não quero ser incomodado por toda sujeira, porcaria e lixo que se envia por e-mail". Ele cresceu nos arredores de Dublin e estudou em um internato jesuíta, onde seu apelido era Ducksie (esquisito), por causa da forma como andava. "A educação vinha com pequenas doses de tapas bem doídos?", perguntou. "Sim. Sofremos um grande trauma emocional? Não."

Ele começou a trabalhar na Ryanair em 1988, se tornou vice-chefe-executivo em 1994 e chefe-executivo em 1997. Sua fortuna pessoal é estimada em cerca de US$ 500 milhões. "Ele é um dos poucos sucessos domésticos da Irlanda corporativa nos últimos 40 anos cujo sucesso tem sido sustentável", disse Gill.

O'Leary vive em uma fazenda nos arredores de Dublin, cria gado e cavalos de corrida e raramente tira férias. Ele irritou o governo irlandês ao pagar milhares de dólares por uma licença de táxi para que sua Mercedes pudesse usar a faixa exclusiva, fugindo do trânsito. Em casa, O'Leary e sua mulher têm três filhos com até quatro anos. Um deles nasceu neste verão irlandês. Não há babás. "É por isso que viajo com frequência e durmo em Londres", disse, em parte brincando.

O'Leary descarta as críticas a seu atendimento ao cliente mostrando o recorde da Ryanair de responder a reclamações em sete dias. A maioria vem de pessoas exigindo reembolsos, que são mandadas embora. Os ressentidos devem reclamar via fax ou carta. Se usarem e-mail, não haverá resposta. "As pessoas dizem" - aqui O'Leary adotou um tom choroso - "'Como os Pais Fundadores escreveram na Constituição americana, nós temos o direito inalienável de portar armas e enviar nossas reclamações por e-mail.' "Não, diabos, não têm!", disse. "Então, vão embora."

Fonte: Sarah Lyall (The New York Times) via Invertia - Tradução: Amy Traduções - Foto: Paul McErlane (Bloomberg News)

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