O soldado Johnnie Stevenson passou suas últimas horas no Forte Drum sozinho. Ele ouviu Ludacris em seu iPod e então desligou o aparelho. Ele desfez sua mala e voltou a fazê-la. Será que ele tinha pasta de dentes e meias o suficiente? Será que ele pagou suas contas? Será que ele estava pronto para a guerra? Por um ano?
O capitão Adrian Bonenberger fez um passeio pelas terras do norte de Nova York para registrar uma última imagem do Rio São Lourenço. Para beber um último café no Bistrô Lyric, em Clayton. Para saborear um último momento de verdadeira paz e tranquilidade antes de ir para o Afeganistão. Por um ano.
A sargento Tamara Sullivan pegou o carregador de seu celular e se preparou para uma noite de lágrimas. Ela ligou para seus filhos na Carolina do Norte, com idades entre 1 e 3 anos, e lhes disse que logo estaria indo para o trabalho em um lugar chamado Afeganistão. Por um ano. Ela lembrou o marido de lhe enviar as pinturas dos meninos. Ela chorou, desligou, ligou de volta e chorou um pouco mais. "Eu pedi para ele me enviar aquelas pinturas", ela disse. "Eu quero ver o que meus filhos tocam, porque eu não vou ser capaz de tocá-los".
Estas são as faces da nova empreitada americana no Afeganistão. No próximo ano, o Primeiro Batalhão da 87º Infantaria da 10ª Divisão de Forte Drum, NY, irá viver, trabalhar e combater nas planícies férteis do norte do Afeganistão, parte dos 30 mil soldados adicionais que formarão a espinha dorsal do plano do presidente de Barack Obama para acabar com a guerra de nove anos.
O presidente disse na semana passada que a estratégia - que apela para a proteção de centros populados, reduzindo as baixas civis e fortalecendo a polícia e o exército afegão - irá continuar apesar da demissão do principal comandante da guerra no Afeganistão, o general Stanley A. McChrystal.
Nas províncias cada vez mais irrequietas de Kunduz e Baghlan, o batalhão 1-87 vai abrir uma nova frente e travar um tipo diferente de guerra. Sua função será a de treinar a polícia local, garantir uma estrada vital para a Ásia Central e expandir o controle do instável governo do presidente Hamid Karzai ao norte.
Os soldados irão viver com a polícia em postos de paredes de barro e conduzir patrulhas diárias a pé ao lado deles em áreas de combate. O objetivo é conseguir apoio público para a polícia - uma tarefa que não é simples, dada a sua reputação de corrupção e ineficácia.
Ao longo do próximo ano, o "The New York Times" vai visitar o batalhão para narrar a sua parte no projeto e explorar o desgaste do destacamento nos soldados, muitos deles recém-saídos da formação básica, outros em sua quinta turnê de combate em nove anos.
Se a sua missão não obtiver sucesso no relativamente estável norte, é improvável que a política funcione em qualquer outro lugar no Afeganistão.
O batalhão é a primeira grande unidade militar americana a se basear nestas províncias desde que a guerra começou e as tropas esperam ser desafiadas por forças insurgentes cada vez mais ousadas que têm realizado emboscadas em postos de polícia, vandalismo em escolas, destruição das estradas e extorsão de comerciantes com crescente regularidade.
O tenente-coronel Russell Lewis, comandante do batalhão, disse que durante a maior parte da guerra, as tropas da Organização do Tratado do Atlântico Norte não contestaram áreas controladas pelo Taleban no norte. Isso, segundo ele, está prestes a mudar.
O batalhão, que começou a seguir para o Afeganistão em março, será acompanhado no fim do verão por uma brigada da aviação com helicópteros de transporte e assalto que lhes permite realizar missões em redutos insurgentes mais distantes, o que alimenta os rumores de uma possível ofensiva no outono. "O clima vai esquentar antes de melhorar", disse Lewis.
O destacamento também vai testar o vigor emocional de soldados e suas famílias. Separados por oito fusos horários e 6.500 milhas, conectados por frágeis acessos a internet e tecnologia celular, os soldados irão aconselhar crianças, confortar pais, gerenciar casamentos e chorar a morte daqueles que ficaram em casa ao mesmo tempo em que lutam contra a solidão, o tédio e o medo no Afeganistão.
Quase todos são homens, com um pequeno grupo de mulheres em cargos não relacionados à infantaria. Muitos querem ver o combate. Outros temem a chance de conflitos
O especialista da infantaria Samuel Michalik, 24, do Tennessee, em sua primeira turnê, ofereceu uma perspectiva. "Eu acho que é justo dizer que a maioria das pessoas gostaria de ver alguma ação - elas não querem estar lá sem fazer nada", disse ele antes de seguir viagem. "Se é minha hora de morrer ou ficar ferido, então Deus vai permitir isso. Eu estou em paz com isso".
O sargento de primeira classe Brian Eisch, um pai solteiro de 35 anos de idade de Wisconsin, também em sua primeira turnê, expressou uma opinião diferente. "Se passarmos um ano lá sem abrir fogo, eu vou ficar feliz", disse o sargento. "Eu tenho dois meninos me esperando e quero voltar para casa e ser um pai também".
Fonte: James Dao (The New York Times) - Fotos: The New York Times via iG
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