quinta-feira, 6 de maio de 2010

Para ser piloto da Air Race, é preciso 'voar por instinto'

"Nada se compara a voar." Vinda de um piloto que há menos de um mês mergulhou com um pequeno avião nas águas de um rio, a afirmação não deixa dúvida quanto à alta dose de adrenalina e ao fascínio que as corridas aéreas proporcionam aos competidores e ao público. Único representante da América do Sul na Red Bull Air Race, o brasileiro estreante na categoria Adilson Kindlemann confessa a frustração por estar fora da etapa carioca, disputada no próximo domingo, 9 de maio. Mas alegra-se por ter saído ileso do acidente em Perth, na Austrália. "É bom estar inteiro", brinca o piloto.

Chamada pelos organizadores de "a Fórmula 1 do ar", a Air Race ainda encanta mais pela beleza dos cenários e das acrobacias do que pela competição em si. Para produzir o espetáculo, os pilotos demonstram perícia a até 380 quilômetros por hora e suportam condições extremas dentro do cockpit. A força G - efeito do peso do próprio corpo em curvas acentuadas - é um dos maiores desafios para os competidores. No circuito da Air Race, os competidores se aproximam de 10 G - o que equivale 10 vezes a força da gravidade. Assim, uma pessoa de 80 quilos tem o peso elevado a 800 quilos. Para suportar esse esforço e manter o fluxo sanguíneo, os participantes usam um traje especial, chamado G-Race, que usa dutos e bolsões de água para pressionar o corpo e evitar que falte sangue para a cabeça, braços e tronco.

A previsão de tempo bom no sábado, quando são feitos os treinos, e no domingo, quando ocorre a disputa, é promessa de diversão no Aterro do Flamengo. Em 2007, quando a prova foi realizada na Enseada de Botafogo, mais de 1 milhão de pessoas pararam - e pararam o trânsito da Zona Sul - para acompanhar as manobras arrojadas no circuito demarcado por cones que flutuam sobre a Baía de Guanabara.

Kindlemann, na abertura oficial da edição carioca da Air Race, na tarde desta quarta-feira, em nada se parecia com alguém que sofreu um acidente a mais de 300 quilômetros por hora e teve de ser resgatado por mergulhadores do Rio Swan, na Austrália. Para voltar a competir em agosto, na Alemanha, o brasileiro terá de cumprir uma bateria de exames. "Primeiro, tenho que passar por uma série de testes, com o especialista que atende a Red Bull Air Race. Depois disso, preciso voltar a treinar. Também temos que preparar um novo avião, com toda a personalização que isso exige para as provas", explica o brasileiro, que, no Rio, é de longe o mais assediado dos competidores, ainda que não vá voar por aqui. "Na próxima etapa brasileira vai ser diferente. Vou estar competindo", garante.

No vídeo a seguir, acompanhe algumas das manobras de Kindlemann:



Não estivessem em seus macacões característicos, os astros da competição sequer seriam reconhecidos no hangar montado ao lado da pista do Aeroporto Santos Dumont. Mesmo paramentados, os homens não superam as máquinas como alvo preferencial de fotógrafos, cinegrafistas e de quem quer que passe pela área restrita à competição.

Fossem um pouco menores, daria para pensar que não são de verdade, ou são modelos reduzidos de aviões reais. É preciso que sejam leves, potentes e, necessariamente, pintados em cores gritantes. Pilotar uma máquina da Air Race é um privilégio conquistado com muitas horas de treino. Kindlemann acumula 11 000 horas na aviação comercial. Outras 700 em aviões de acrobacia. Para receber sua "Super Licença", como é chamado o certificado para ter direito a se inscrever na prova, foram necessários três anos de preparação, comprovados em uma série de testes que duram cerca de uma semana.

Tudo isso para chegar ao ponto de "voar por instinto", a despeito de toda a tecnologia e todos os equipamentos modernos que, desde Santos Dumont, o homem desenvolveu para voar com mais facilidade. “Depois que o avião decola, não olho para o painel, não dá tempo de nada. Não é como na Fórmula 1, em que o piloto tem as referências da pista. Fazemos a curva no vazio, tentando acertar e intuir a força e a direção do vento. Em uma das manobras, a Chicane, os cones estão a menos de dois segundos de distância", explica o piloto. "Se der tempo de respirar dentro do cockpit, já está bom", diverte-se.

Fonte: João Marcello Erthal (Veja.com) - Foto: Ismar Ingber

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