sexta-feira, 8 de março de 2024

8 de março: Dia Internacional da Mulher: As primeiras mulheres piloto do Brasil

Falta de apoio da família, restrições legais, desigualdade de condições em relação aos homens. Nada disso impediu que quatro mulheres brasileiras se tornassem pilotas, a partir dos anos 1920, conquistando muito mais do que os céus.


Poucos anos haviam se passado desde o histórico voo do 14-Bis, de Santos Dumont, em 1906, e as mulheres já marcavam presença nesse universo. Voar, afinal, é algo que fascina, independentemente de idade ou gênero. 

Mesmo diante de uma desigualdade de direitos civis, um grupo de mulheres lutou para ser incluído no setor aeronáutico, já nos anos 1920, conquistando o sonho de voar. Thereza di Marzo, Anésia Pinheiro Machado, Ada Leda Rogato e Joana Martins Castilho D’Alessandro foram essenciais para a transformação de um cenário que, antes, era exclusivamente masculino.

Em reconhecimento à ousadia e coragem dessas mulheres, que desafiaram padrões da época, o Instituto Embraer organizou, em 2016, a exposição virtual “Mulheres na Aviação”. A partir dela, o Journal of Wonder mostra o perfil de quatro aviadoras que mudaram o cenário da aviação no país:

Thereza di Marzo: a família não apoiou



Thereza di Marzo foi a primeira brasileira a receber o brevê – documento que dá permissão para pilotar aviões – da Fédération Aéronautique Internationale (Federação Aeronáutica Internacional, em português). Nascida em São Paulo, em 1903, ela logo desenvolveu a paixão por aviação.

A decisão de se tornar pilota, no entanto, não agradou sua família – principalmente o pai. Ainda assim, determinada, foi a pé até o Aeródromo Brasil para se inscrever em um curso de voo, o qual pagou ao rifar uma vitrola. As aulas eram ministradas pelos irmãos e veteranos de guerra João e Enrico Robba, mas, por viajarem demais, seu instrutor principal tornou-se o alemão Fritz Roesler.


As aulas de pilotagem começaram em 1921 e, já em 1922, Thereza voou sozinha pela primeira vez. Um mês depois, se habilitou no AeroClube Brasil e tornou-se uma pioneira ao receber um diploma de piloto-aviador internacional. Ela realizou o primeiro reide (excursão longa) para Santos, voos panorâmicos para passageiros, a construção de um hangar e outras conquistas.

Em 1926, no entanto, interrompeu a carreira ao se casar com o instrutor Fritz. “Depois que nos casamos, ele cortou-me as asas. Disse que bastava um aviador na família”, afirmou Thereza. O Código Civil de 1916 previa que mulheres casadas precisavam de autorização para realizar algumas atividades, e a emancipação feminina aconteceu apenas em 1962.

Sua carreira, apesar de curta, lhe rendeu mais de 300 horas de voo, além das não computadas. Ela faleceu em 1986, depois de receber inúmeras medalhas, homenagens e títulos.

Anésia Machado: voos altos, dos Andes a Nova York



Feminista e revolucionária, as conquistas de Anésia Pinheiro Machado vão muito além da aviação. Ela nasceu em 1904 e, aos 17 anos, já começou a pilotar aeronaves. Com apenas um dia de diferença da colega Thereza di Marzo, em 1922, ela se tornou a segunda mulher a receber o brevê no Brasil.

Anésia foi pioneira ao realizar um voo interestadual, o que lhe rendeu cumprimentos de Santos Dumont. Para comemorar os 100 anos da Independência do Brasil, ela pilotou de São Paulo até o Rio de Janeiro, viagem que demorou quatro dias – voava 1 hora e 30 minutos por dia, porque precisava parar para abastecer e fazer manutenção da aeronave.

Por um período de tempo, até 1939, foi proibida de voar por ter sobrevoado o navio Minas Gerais, jogando flores e um bilhete dizendo “E se fosse uma bomba?”. Ao retomar as atividades, continuou com suas conquistas. Recebeu licença para ser pilota privado e para voar em aeronave comercial, e foi habilitada como instrutora de voo, pilota por instrumentos e, nos Estados Unidos, instrutora de simulador de voo.


Anésia foi reconhecida também por um grande feito histórico, em 1951. Com um monomotor, voou de Nova York para o Rio de Janeiro. Em seguida, atravessou a Cordilheira dos Andes, indo de Santiago, no Chile, até a cidade de Mendoza, no interior da Argentina. Três anos depois, na Conferência de Istambul, na Turquia, a Federação Aeronáutica Internacional (FAI) a proclamou como Decana Mundial da Aviação Feminina por ter o brevê mais antigo do mundo ainda em atividade.

Antes de falecer, em 1999, ela convenceu as autoridades ligadas à exploração espacial, nos Estados Unidos, a batizar uma das crateras da lua com o nome de Santos Dumont.

Ada Leda Rogato: atravessou a Amazônia apenas usando uma bússola



Ler os jornais mudou o destino de Ada Leda Rogato. Antes funcionária pública, ao acompanhar as notícias sobre aviação, decidiu se arriscar na carreira como pilota – que deu muito certo. Ela foi pioneira em obter licença como paraquedista na América do Sul; a primeira mulher a pilotar planadores; e a terceira a receber um brevê aeronáutico, em 1935, depois de Thereza e Anésia.

Ada, que sempre voava sozinha, impressionava com seu espírito aventureiro e corajoso. Durante a Segunda Guerra Mundial, fez mais de 200 voos voluntários de patrulhamento pelo litoral paulista; em 1950, atravessou os Andes 11 vezes; em 1951, voou mais de 50 mil quilômetros até o Alasca; pousou em baixa potência no aeroporto de La Paz, Bolívia, considerado o mais alto do mundo na época (4061 metros acima do nível do mar); e cruzou a região amazônica utilizando apenas uma bússola.

A condição do ar influencia diretamente o funcionamento de uma aeronave. O ar mais denso alimenta os motores do avião, gerando sua máxima potência. Grandes altitudes deixam o ar mais rarefeito, causando uma menor queima de combustível e, portanto, menor potência. Em pousos, como a velocidade do avião é a mais baixa possível, é necessário haver sustentação (quanto mais densidade de ar, mais sustentação) suficiente para ocorrer frenagem com segurança.

Ada Rogato recebe a 1ª Licensa feminina como piloto de planador, em 1934,
no Clube Paulista de Planadores - Campo de Cumbica
Não foram poucas conquistas. Ada também foi convidada pelas autoridades para ajudar no combate à praga da broca-do-café, tornando-se pioneira no polvilhamento aéreo. Ela foi a primeira mulher a receber a Comenda Nacional de Mérito Aeronáutico e o título da Força Aérea Brasileira de Piloto Honoris Causa.

Em seus últimos anos de vida, dedicou-se ao Museu de Aeronáutica de São Paulo, que funcionava no Parque Ibirapuera, na capital. Ada recebeu diversas homenagens antes e depois de sua morte, em 1986.

Joana D’Alessandro: acrobacias aéreas



Dentre as quatro pilotas mencionadas nesta reportagem, Joana Martins Castilho D’Alessandro foi a única que recebeu apoio da família para alcançar o sonho de voar. Seus pais acreditavam que suas conquistas incentivariam outras mulheres no Brasil. Conhecida também como Joaninha ou a “Águia de Taubaté”, recebeu diversas homenagens pelo país, principalmente em Taubaté, cidade paulista onde morou.

Nascida em 1924, ela voou pela primeira vez aos 13 anos. Um ano depois, obteve o posto de aviadora acrobata mais jovem do mundo, sendo até citada pelo Guinness World Records (Guinness dos Recordes Mundiais, em português). Aos 15 e 16 anos, venceu dois campeonatos de acrobacias aéreas.

Seu nome ganhou destaque na mídia pela voz de Assis Chateaubriand, um dos comunicadores mais influentes do país entre 1940 e 1950. Joana também recebeu brevê das mãos do presidente Getúlio Vargas, que lhe prometeu 100 horas de voo – e nunca foram pagas. Ela, no entanto, não precisava de auxílio, já que podia contar com seus pais para se tornar uma pilota de renome.


Vídeo: "Elas CAIRAM do avião e SOBREVIVERAM"


#SentaQueLaVemHistoria de hoje é sobre duas mulheres que, em um intervalo de pouco mais de um mês, caíram do avião em alta altitude e sobreviveram.

Voo de Buenos Aires para Madri é desviado e pousa em Natal após espanhol passar mal; aeroporto não tinha médico e passageiro morreu

Pouso de emergência aconteceu por volta das 19h no terminal potiguar. Avião seguiu para Espanha após atendimento.

Voo de Buenos Aires para Madri é desviado e pousa em Natal após espanhol passar mal;
aeroporto não tinha médico e passageiro morreu (Foto: Reprodução)
Um avião que decolou de Buenos Aires, na Argentina, e seguia para Madri, na Espanha (voo UX42), desviou a rota e pousou no Aeroporto de Natal na noite desta quinta-feira (8), durante uma emergência em saúde com um dos passageiros. O passageiro - um espanhol de 72 anos - morreu.

O voo era realizado pelo Boeing 787-9 Dreamliner, prefixo EC-NFM, da Air Europa, e seguiu com viagem à Espanha após a ocorrência.

Em nota, a Zurich Airport Brasil, administradora do terminal, disse que o avião informou emergência médica de passageiro em voo e solicitou pouso em Natal. O pouso ocorreu por volta de 19h.


Segundo o coordenador do Samu Natal, Cláudio Macêdo, o serviço de saúde do Aeroporto não contava com um médico, nesta quinta-feira (7) e, por isso, o terminal acionou o Samu RN. Porém, o serviço estava com as UTIs móveis ocupadas em outros atendimentos e pediu auxílio do Samu Natal.

"O aeroporto tem que ter uma unidade de suporte avançado lá, dentro da unidade, mas não tinha médico ontem. A UTI do SAMU Natal chegou a ir até a entrada do aeroporto mas as pessoas que estavam disseram que o paciente já estava em óbito há mais de vinte minutos", afirmou o coordenador.

A Zurich informou que conta com uma ambulância, que estava posicionada no pátio no momento do pouso. "Tão logo ocorreu o pouso a equipe de socorro do aeroporto realizou o protocolo de atendimento indicado para estes casos, buscando reanimar o passageiro. Mas não houve êxito", informou.

Voo que seguia de Buenos Aires para Madri pousa em Natal durante emergência médica
(Imagem: Flight Radar/Reprodução)
O g1 pediu informações a Air Europa sobre a emergência médica, mas a companhia aérea se limitou a dizer que "em conformidade com as normas e legislação, não pode fornecer dados pessoais dos passageiros"

A Secretaria de Saúde Pública do Rio Grande do Norte confirmou que o corpo do passageiro foi levado para o Serviço de Verificação de Óbitos localizado em Natal. A identidade, no entanto, não foi informada.

Essa não é a primeira vez que o Aeroporto de Natal recebe um avião alternado por causa de uma emergência médica. Em outubro do ano passado, um avião da Latam – um Boeing 777 – que seguia de São Paulo para Frankfurt, na Alemanha, pousou aqui após uma passageira passar mal.

Meses antes, em junho, o terminal da capital recebeu um Boeing 747, conhecido como Rainha dos Céus, também por uma emergência médica. Um passageiro teria passado mal e necessitado de atendimento médico de urgência.

Além dos casos de necessidades médicas, outros voos foram desviados por outros motivos neste ano. Em janeiro, um avião da Azul Linhas Aéreas que saiu daqui para Belo Horizonte precisou retornar após o piloto declarar emergência. De acordo com as informações, pode ter ocorrido um problema de despressurização da cabine, que obrigou a descida da aeronave para 10 mil pés.

Já em fevereiro, um avião da TAP Air Portugal que seguia de Lisboa para Fortaleza foi desviado para Natal devido ao mau tempo na capital cearense. Na ocasião os passageiros precisaram desembarcar e a aeronave ficou em solo potiguar por quase dois dias.

Via Igor Jácome, g1 RN, flightradar24.com, glaucialima.com e Site Desastres Aéreos

Aconteceu em 8 de março de 2017: A queda do voo Ameristar Charters 9363 - O Menor de Dois Males


No dia 8 de março de 2017, um jato fretado que transportava o time masculino de basquete da Universidade de Michigan estava acelerando para decolar no Aeroporto Willow Run, em Ypsilanti, em Michigan, nos Estados Unidos, quando os pilotos chegaram à terrível conclusão de que o avião não poderia decolar. Com apenas alguns segundos para agir e 116 vidas em jogo, o capitão tomou a decisão mais importante de sua carreira: abortou a decolagem, embora já fosse tarde demais para fazê-lo com segurança. Segundos depois, o MD-83 derrapou no final da pista, atravessou uma estrada e uma vala e parou em um campo. Embora o avião tenha sido destruído, todos a bordo escaparam do acidente – um resultado milagroso, dado o que havia acontecido com seu avião. 

Os investigadores descobririam que um mau funcionamento dos elevadores deixou o avião incapaz de subir e que o projeto do sistema de controle do elevador do MD-83 evitou que a tripulação percebesse até que já fosse tarde demais para abortar com segurança. As descobertas levaram a mudanças urgentes na forma como os aviões da série MD-80 são inspecionados, o que deveria ter resolvido o problema para sempre - apenas para o NTSB se encontrar, quatro anos depois, no local da queda de outro MD-83, olhando para outro elevador preso e se perguntando: como isso poderia ter acontecido de novo?

Abaixo do mundo familiar das companhias aéreas regulares, existe um vasto mundo secundário composto por pequenas companhias aéreas charter sob demanda. Elas tendem a operar aviões mais antigos com cores genéricas em aeroportos de menor prestígio, mas se você precisar levar um grande grupo de pessoas do ponto A ao ponto B, seria difícil encontrar uma opção mais conveniente. 

Uma dessas empresas é a Ameristar Air Cargo, que apesar do nome também realiza voos não regulares de passageiros sob a marca Ameristar Charters. Em 2017, a companhia aérea operou oito aviões, nenhum deles novo: dois Boeing 737-200 de primeira geração, quatro antiquados McDonnell Douglas DC-9 - entre menos de 30 ainda em serviço comercial em todo o mundo - e dois exemplares do McDonnell Douglas MD-83, uma versão ampliada e modernizada do DC-9 que remonta à década de 1980.

MD-83 prefixo N786TW, a aeronave envolvida no acidente (Adam Moreira)
Foi um desses MD-83, o McDonnell Douglas MD-83, registrado como N786TW, que a Ameristar Jet Charter, forneceu como parte de um contrato de fretamento com a Universidade de Michigan, uma grande universidade pública localizada em Ann Arbor, 50 quilômetros a oeste de Detroit. 

O time masculino de basquete Wolverines da Universidade de Michigan estava programado para jogar fora de casa em 9 de março em Washington, DC contra a Universidade de Illinois Urbana-Champaign como parte do Big Ten Championship regional, e o MD-83 era perfeito para transportar a comitiva do time de mais de 100 jogadores, treinadores, famílias de treinadores, líderes de torcida e membros da banda.

Aeroporto Willow Run em 2006 (Mark Pasqualino)
Em antecipação ao voo de 8 de março para DC, a Ameristar transportou o MD-83 de Lincoln, Nebraska, em 6 de março, e o estacionou no aeroporto Willow Run em Ypsilanti, em Michigan, a leste de Ann Arbor. 

O Aeroporto de Willow Run já foi o local da fábrica da Consolidated Aircraft que produziu o B-24 Liberator durante a Segunda Guerra Mundial e foi brevemente o principal aeroporto comercial de Detroit, mas não tem mais serviços regulares de passageiros. 

Em vez disso, o aeroporto tornou-se um centro de operações de carga, servindo como base para a Kalitta Air e a National Airlines, duas das maiores transportadoras de carga de segunda linha da América. Ele também recebe alguns voos fretados de passageiros - entre eles o voo 9363 da Ameristar Charters, o voo dos Michigan Wolverines para Washington, DC

A rota do voo 9363
Enquanto o avião estava parado no pátio de Willow Run entre 6 e 8 de março, uma forte tempestade de vento surgiu em Michigan, trazendo rajadas poderosas para a área metropolitana de Detroit e além. As previsões alertavam para ventos sustentados de 32 nós (60 km/h) com rajadas de 48 nós (89 km/h), continuando durante o horário programado de partida do voo 9363. Foi esta tempestade de vento que desencadeou uma cadeia de eventos que conduziria às portas do desastre.

De acordo com as regulamentações federais, os aviões da categoria transporte devem ser capazes de suportar rajadas de vento laterais de até 65 nós de qualquer direção enquanto estacionados, sem sofrer danos nas superfícies de controle. Aviões pequenos conseguem isso usando travas de rajadas, que prendem as superfícies de controle no lugar para evitar que balancem com o vento. Em aeronaves maiores, os bloqueios contra rajadas são geralmente desnecessários, porque as próprias superfícies de controle são muito pesadas para que uma rajada abaixo de 65 nós as mova com força suficiente para causar danos. 

O MD-83, como outras aeronaves de seu tamanho, não possui nem precisa de travas de rajada. Se os pilotos esperam ventos superiores a 65 nós, eles podem estacionar voltados diretamente para o vento para proteger as superfícies de controle, e o avião será inspecionado posteriormente, mas a previsão em Willow Run não indicava rajadas tão fortes, então houve não há nenhuma razão óbvia para fazê-lo.

(NTSB)
O MD-83 N786TW estava de fato estacionado perpendicularmente ao vento em um pátio de estacionamento aberto na direção do vento de um grande hangar. Mais tarde, as simulações revelariam que este arranjo específico criou condições únicas que não haviam sido previstas pelo limite de rajada de 65 nós. 

Na manhã de 8 de março, uma rajada de 55 nós vinda do oeste varreu o hangar, girando em rotores e redemoinhos em seu rastro. Nesta área de fluxo de ar perturbado, o vento pode realmente acelerar em distâncias curtas, atingindo 58 nós com uma componente vertical severa – um tipo de força muito diferente das rajadas laterais definidas nos requisitos de certificação. E o N786TW estava perfeitamente posicionado de forma que esses redemoinhos atingissem o avião no auge de sua potência. 

Quando a rajada de 55 nós, a mais forte em 48 horas, passou sobre o hangar, um poderoso rotor passou sobre a cauda do MD-83, levantando o elevador direito e, em seguida, empurrando-o para baixo até parar menos de três segundos depois.

(NTSB)
Para entender o efeito deste tratamento, é útil fazer um curso intensivo sobre o design do sistema de controle de pitch do MD-83. O MD-83 possui elevadores flutuantes – em outras palavras, os elevadores em si não são acionados por nenhum meio hidráulico ou mecânico. Em vez disso, as entradas do piloto movem diretamente as guias de controle nas bordas de fuga dos elevadores. 

Conforme mostrado no diagrama acima, quando a aba de controle desce, as forças aerodinâmicas empurram o elevador para cima, o que faz com que o nariz do avião suba; por outro lado, mover as abas de controle para cima empurrará os profundores para baixo e abaixará o nariz. O piloto é ainda auxiliado por abas engrenadas, localizadas fora das abas de controle, que funcionam de forma semelhante, exceto que são acionadas em sentido inverso pelos elevadores. 

Portanto, à medida que as abas de controle se movem para baixo, os elevadores começam a se mover para cima e, então, por sua vez, as abas engrenadas se movem para baixo, aumentando a pressão aerodinâmica ascendente no elevador. Desta forma, o sistema aproveita as forças aerodinâmicas para reduzir a pressão que um piloto deve aplicar na coluna de controle para ajustar a inclinação do avião. Os aviões modernos normalmente usam atuadores hidráulicos para fazer isso, mas o método de guia de controle era comum na década de 1960, quando a aeronave pai do MD-83, o Douglas DC-9, foi originalmente projetada.

A localização da guia de engrenagem e um diagrama de suas ligações (NTSB)
Os eventos deste caso específico concentram-se especificamente na guia voltada. Cada guia de engrenagem se move para cima ou para baixo através da retração ou extensão de uma haste que corre dentro do elevador. 

A haste de pressão é articulada a uma manivela de atuação fixada na base do elevador, e a manivela de atuação é articulada ao elo de guia engrenado, que por sua vez é articulado à estrutura da aeronave. 

Durante a operação normal, o elo e a manivela de atuação sempre formam um ângulo que abre para trás. À medida que o elevador gira para baixo, o tamanho deste ângulo aumenta, mas nunca atingirá 180 graus.

(NTSB)
No entanto, quando a poderosa rajada de vento vertical atingiu o N786TW enquanto ele estava estacionado em Willow Run, a força exercida no elevador direito foi tão grande que ele desceu além de sua parada mecânica. O ângulo entre o elo da aba engrenada e a manivela de atuação aumentou além de 180 graus, entrando no que é conhecido como condição de sobrecentro. 

Conforme mostrado no diagrama acima, o ângulo entre as duas ligações agora abria para frente em vez de para trás. Normalmente, mover o elevador de volta para cima fará com que esse ângulo diminua, e isso permanece verdadeiro mesmo com as ligações acima do centro.

Mas quando o ângulo se abre para frente, não há espaço para o ângulo fechar mais do que alguns graus porque o elo da aba engrenada entrará em seu alojamento. Isso tornou a articulação supercentrada efetivamente irreversível, travando o profundor direito na posição totalmente voltada para baixo.

Outro ângulo dos ventos simulados que afetaram a aeronave (NTSB)
Sem saber dos danos ao avião, a tripulação do voo 9363 chegou ao aeroporto Willow Run pouco depois das 11h. No comando estava o capitão Mark Radloff, de 54 anos, um piloto veterano com mais de 15.000 horas, cerca de metade delas no DC-9. Ele havia sido recentemente contratado como capitão do MD-83 pela Ameristar e ainda estava em fase de supervisão.

Como tal, ele foi acompanhado não por um primeiro oficial, mas pelo capitão Andreas Gruseus, piloto-chefe do MD-83 da Ameristar e um aviador verificador certificado. Embora Radloff tivesse mais experiência total de voo, Gruseus, de 41 anos, o superou e seria responsável por monitorar seu desempenho.

Quando Radloff e Gruseus começaram suas verificações pré-voo, a tempestade de vento continuou a aumentar. Pouco antes do meio-dia, fortes rajadas cortaram a energia de mais de 800 mil clientes na área de Detroit, incluindo a torre de controle e a estação meteorológica de Willow Run.

A torre de controle foi evacuada e durante o resto da tarde Willow Run entrou em um estado conhecido como “ATC zero”, onde os serviços normais de ATC estavam indisponíveis. Com esses serviços desativados, o Capitão Gruseus teve que usar seu celular para obter informações meteorológicas e autorizações do ATC.

Assim que todos os 110 passageiros e seis tripulantes estivessem a bordo, todas as malas carregadas, todas as verificações pré-voo concluídas e todas as contingências devidamente informadas, o voo 9363 estava pronto para decolar. Poucos minutos antes das 15h, o MD-83 taxiou para longe do estacionamento e seguiu para a pista 23L para decolagem. Embora os ventos fortes ainda assolassem o aeroporto, as rajadas estavam dentro do limite de vento cruzado do avião.

Como é procedimento padrão, os pilotos calcularam suas velocidades de decolagem antes da partida. Dado o seu peso e o comprimento da pista, calcularam que a sua velocidade de decisão, ou V1, seria de 139 nós. Acima dessa velocidade, estariam comprometidos com a decolagem; não haveria espaço suficiente para parar na pista se algo desse errado. Eles também calcularam uma velocidade de rotação nominal de 142 nós, mas os pilotos concordaram em girar para a decolagem a uma velocidade ligeiramente superior de 147 nós, a fim de obter uma melhor margem de erro caso encontrassem turbulência severa.

Nestes dados de voo, observe o que acontece quando o capitão puxa o manche para decolar (NTSB)
Às 14h51, o voo 9363 iniciou sua decolagem. No início, tudo parecia normal. 

“Oitenta nós”, gritou Gruseus.

"Verificado."

“V-um”, disse Gruseus. 

Eles agora estavam viajando rápido demais para parar com segurança na pista, comprometendo-os com a decolagem. Seis segundos depois, ele anunciou: “Rodar”.

O capitão Radloff puxou os controles para levantar o avião do chão. Normalmente demorava cerca de três segundos para o avião responder, mas três segundos se passaram e nada aconteceu. Ele se afastou ainda mais – ainda nada. Ele não tinha como saber que o elevador certo, preso na posição totalmente voltada para baixo, estava empurrando seu avião para a pista com mais força do que ele poderia esperar superar.

"Ei o que está acontecendo?" ele exclamou, esforçando-se contra o jugo. Os controles pareciam estar em concreto.

O voo 9363 estava agora em uma posição extremamente difícil. O avião já havia passado do ponto em que a decolagem poderia ser abortada com segurança e ainda acelerava. Mas o nariz simplesmente não subia. Radloff teve apenas alguns segundos para tomar uma decisão, caso contrário um acidente catastrófico se tornaria inevitável.

Três segundos depois de sua primeira exclamação de alarme, ele mordeu a bala. "Abortar !" ele anunciou, pisando no freio e acionando os reversores. Restaram apenas 550 metros de pista; era óbvio que eles não iriam parar a tempo.

“Não, não acima – merda”, gritou o capitão Gruseus. “Porra, não aborte acima da V1 desse jeito!” 

Ele instintivamente pegou os controles para continuar a decolagem, mas reconsiderou uma fração de segundo depois. Embora abortar a decolagem acima de V1 fosse contra todos os aspectos de seu treinamento, esse mesmo treinamento também sustentava que a decisão de abortar cabia exclusivamente ao piloto em comando, o que ele não cabia. 

E quando percebeu o que Radloff estava fazendo, já era tarde demais para reverter o curso. Em poucos instantes, ele também pisou no freio, tentando desesperadamente desacelerar o avião em alta velocidade.

“Não estava voando!” Radloff exclamou.

O avião disparou em direção ao final da pista e depois além dela. Gruseus soltou um palavrão. Na cabine, ouviu-se um comissário de bordo gritando: 

“Cabeça baixa, fique abaixada!”

Ainda viajando a 100 nós, mas desacelerando rapidamente, o avião atravessou a área gramada, passou por cima da cerca do perímetro do aeroporto, atingiu um aterro elevado, perdeu o trem de pouso, atravessou uma estrada e parou em uma vala.


Embora o avião tenha sido batido e seu trem de pouso tenha sido arrancado, a cabine permaneceu intacta e todos os 116 passageiros e tripulantes sobreviveram à viagem selvagem completamente ilesos. 

O capitão Gruseus imediatamente acessou o sistema de alto-falantes e gritou: “Evacuar, evacuar, evacuar”, e os comissários de bordo abriram rapidamente as portas de saída.

A trajetória do voo 9363 depois que ele saiu da pista (NTSB)
Os passageiros correram para o campo soprado pelo vento e se aglomeraram na grama, olhando em estado de choque para o avião que deveria transportá-los para Washington. Um jogador de basquete comparou-o a uma baleia encalhada, parecendo indefesa e deslocada, sentada de bruços à beira de uma estrada.

Na cabine, os pilotos puxaram as alavancas de corte de combustível de emergência e desligaram os motores. Olhando para o capitão Gruseus, o capitão Radloff disse, abalado e perplexo: “Não estava voando, não estava - eu estava com ele até aqui, não estava voando”. 

Ele fez uma pausa de trinta segundos e depois disse novamente: “Não estava girando, eu estava com ele até aqui. Droga!" Era como se uma força invisível tivesse mantido seu avião na pista – e ele certamente não ficaria tranquilo até descobrir o que era.

O avião parou em uma vala, onde felizmente atingiu em velocidade muito baixa (NTSB)
No final, todas as 116 pessoas a bordo escaparam com apenas um ferimento leve, uma laceração sofrida durante a evacuação. 

O avião foi descartado, mas fez seu trabalho, mantendo seus passageiros seguros até o fim. Embora não sem apreensão, os Michigan Wolverines conseguiram embarcar em outro avião para voar para DC menos de 24 horas depois.

Enquanto isso, investigadores do Conselho Nacional de Segurança nos Transportes foram até Willow Run, com a intenção de encontrar a causa do quase desastre. Ao chegar ao local, não demorou muito para perceberem que algo estava seriamente errado com o avião. 

Danos na articulação direita da aba do elevador encontrada após o acidente (NTSB)
Seu elevador direito estava na posição totalmente voltada para baixo e, quando os investigadores subiram em uma escada e tentaram movê-lo, ele se recusou a se mover. Isso não deveria acontecer: como o elevador flutua livremente, uma pessoa deve ser capaz de empurrá-lo para cima e para baixo com facilidade. 

E quando olharam para dentro, encontraram danos chocantes: o elo da aba engrenada e a manivela de atuação estavam centrados demais, e o próprio elo da aba engrenada havia dobrado catastroficamente para um lado enquanto a pressão aerodinâmica no elevador tentava empurrar a articulação supercentrada fechada durante a rolagem de decolagem .

A parte inferior do nariz sofreu alguns dos danos mais graves (NTSB)
Um exame detalhado dos elevadores não revelou nenhum dano pré-existente que pudesse ter levado a esse mau funcionamento bizarro. No entanto, havia outro culpado óbvio: o vento. O único problema foi que o MD-83 foi projetado para suportar rajadas de até 65 nós enquanto estacionado sem danificar os elevadores, e a rajada mais alta registrada em Willow Run desde a chegada do avião foi de apenas 55 nós.

Em um esforço para compreender as forças às quais o elevador estava realmente sujeito, os investigadores usaram drones para criar um modelo 3D detalhado do hangar e seus arredores, colocaram um modelo MD-83 no local preciso onde o N786TW estava estacionado e introduziram rajadas semelhantes às registradas no aeroporto nas 48 horas anteriores ao acidente. O que eles descobriram foi que o hangar interrompeu o fluxo de ar de forma a criar rotores poderosos que viajavam na direção do vento até o avião.

Tendo calculado a força dos rotores localizados resultantes de uma rajada de 55 nós sobre o hangar, o NTSB montou um experimento para determinar se essas mudanças de ventos verticais poderiam ter causado os danos observados no elevador direito do N786TW. 

Ao equipar um elevador MD-83 com pesos de diferentes tamanhos, levantá-lo e depois deixá-lo cair, eles determinaram que as forças verticais em um rotor localizado resultantes de uma rajada com velocidade de cerca de 58 nós eram suficientes para fazer com que o elevador para deslocar-se além de seu batente descendente e mover a articulação da guia de engrenagem acima do centro. 

As descobertas derrubaram a base sobre a qual o sistema de controle do elevador do MD-83 foi certificado, mostrando que mesmo rajadas abaixo do limite de 65 nós, sob certas condições, poderiam danificar seriamente o avião.

O trem de pouso principal dobrou para trás quando o avião atingiu a estrada (NTSB)
A outra questão mais importante enfrentada pelos investigadores era se os danos deveriam ter sido detectados antes do voo 9363 iniciar sua decolagem. Observou-se que esta não foi a primeira vez que algo assim aconteceu: em 1999, um DC-9 invadiu a pista na decolagem de Munique, na Alemanha, depois que seus elevadores ficaram presos na posição de nariz para baixo. Investigadores alemães descobriram que o avião foi exposto a rajadas que excederam o limite de 65 nós que foi certificado para suportar, causando os danos. 

Após este incidente, a Boeing, que assumiu todos os antigos certificados de tipo McDonnell Douglas em 1997, atualizou os procedimentos operacionais DC-9 e MD-83 para exigir uma inspeção dos elevadores sempre que houver suspeita de que o avião tenha experimentado rajadas de vento acima de 65 nós. No entanto, neste caso os ventos nunca ultrapassaram este valor - e mesmo que o tivessem feito, a Ameristar Charters provavelmente não saberia disso. 

Embora os procedimentos da empresa incorporassem a exigência de inspeção, ninguém tinha autoridade para monitorar os ventos que afetavam os aviões estacionados: os pilotos não podiam ser solicitados a monitorar o tempo enquanto estavam fora de serviço e os despachantes desconheciam totalmente o assunto. Portanto, era difícil ver como e quando a Ameristar ordenaria uma inspeção dos elevadores quanto a danos provocados pelo vento em qualquer cenário.

Os investigadores do NTSB examinam a cauda. O tailcone foi removido pela tripulação por dentro como saída de emergência adicional, embora nenhum passageiro o tenha utilizado (NTSB)
Sem meios eficazes de avaliar a possibilidade de danos causados ​​pelo vento, a única linha de defesa restante era a tripulação. Enquanto o avião ainda estava no pátio, o capitão Gruseus conduziu uma inspeção padrão, mas não viu nada de incomum. 

Os investigadores notaram que os elevadores ficavam a dez metros do chão, então não havia como verificá-los fisicamente e, além disso, eles pareciam normais mesmo quando danificados. Os links das abas engrenadas não são visíveis do lado de fora, e o fato de o profundor direito estar com o nariz totalmente para baixo não teria sido alarmante, porque os elevadores flutuantes livres podem ser empurrados para qualquer posição, incluindo o nariz totalmente para baixo, por uma brisa nominal.

Posteriormente, o Capitão Gruseus conduziu as verificações de controle necessárias antes da decolagem e não notou nada fora do comum. A razão era simples: mover a coluna de controle apenas move as abas de controle, não os elevadores. Quando o avião está em repouso, mover as abas de controle não tem nenhum efeito sobre os elevadores, então Gruseus foi capaz de mover sua coluna de controle em toda a sua amplitude de movimento sem detectar o elevador emperrado. 

Na verdade, o elevador emperrado só poderia ser detectado quando as forças aerodinâmicas entrassem em ação – algo que só aconteceria quando o avião já estivesse acelerando na pista. O NTSB foi forçado a chegar a uma conclusão incrível: que não havia como os pilotos terem detectado o problema até tentarem girar para a decolagem.

As equipes de socorro do aeroporto retiram o combustível dos tanques laterais
para que o avião possa ser movido (NTSB)
O Capitão Mark Radloff foi assim confrontado com uma situação quase sem precedentes: já tendo acelerado bem para além da V1, de repente percebeu que o seu avião não iria decolar. Nesse ponto, ele enfrentou uma escolha: continuar tentando forçá-lo no ar e correr o risco de falhar, saindo da pista bem além da velocidade de decolagem, ou tentar parar e garantir uma ultrapassagem em velocidade mais baixa? 

Com apenas alguns segundos para decidir, Radloff escolheu a última opção. O NTSB concluiria que se ele tivesse tentado continuar a decolagem, o voo 9363 teria saído da pista a uma velocidade muito maior, com resultados potencialmente mortais.

No momento em que a decolagem rejeitada foi iniciada, 12 segundos haviam se passado desde V1, e o avião estava viajando a 163 nós no solo, restando apenas 550 metros de pista. Se Radloff tivesse rejeitado a decolagem apenas três segundos antes, eles teriam parado na calçada. 

Mas três segundos antes de seu aviso de “abortar”, ele ainda não havia segurado a coluna de controle por tempo suficiente para detectar que o avião não estava respondendo. Como tal, não teve como evitar o acidente e foi forçado a escolher o menor dos dois males – a opção que resultou no acidente menos grave.

A porta R1, vista aqui, não foi utilizada porque sua corrediça não abriu (NTSB)
Embora nenhum dos pilotos tenha sido treinado sobre o que fazer em tal situação, a orientação da Boeing afirma de fato que um piloto pode abortar uma decolagem após passar pela V1 se tiver certeza de que o avião não voará. 

No entanto, ensinar explicitamente os pilotos sobre esta exceção não é praticado na indústria porque, historicamente, a maioria dos casos em que os pilotos abortaram após a V1 acabou por não ser necessário. 

Muitos desses acidentes levaram a fatalidades que poderiam ter sido evitadas se os pilotos tivessem tratado o V1 como um limite rígido. Como tal, é preferível que nos casos extremamente raros em que seja realmente necessário rejeitar a descolagem após V1, o piloto faça esse julgamento independentemente de qualquer treino. O voo 9363 é a prova de que esta expectativa é fundamentada.

Isso foi o mais próximo que os jornalistas conseguiram chegar do local (AP)
No seu relatório final, o NTSB elogiou ambos os pilotos pelo seu julgamento rápido e eficaz e pelo trabalho em equipe numa emergência crítica. “Raramente todas as salvaguardas em vigor para garantir que um avião esteja em condições de aeronavegabilidade antes da partida falham em detectar que um avião era incapaz de voar”, escreveram eles .

“Talvez ainda mais notável foi que uma tripulação de voo seria colocada em uma situação em que a incapacidade do avião de voar não seria descoberta até que ele tivesse acelerado além de V1 durante uma corrida de decolagem.” 

O NTSB também exaltou o julgamento do Capitão Gruseus ao permitir que Radloff abortasse, apesar de seu instinto inicial de exercer seus privilégios como aviador verificador, intervindo. Se ele tivesse tentado impedir Radloff de abortar após a V1, o resultado, escreveram os investigadores, “poderia ter sido catastrófico”. Em vez disso, avaliou a situação em apenas alguns segundos, decidiu confiar no julgamento de Radloff e ajudou-o na decisão que já havia sido tomada. Esse julgamento sob pressão quase certamente salvou vidas.

Antes e depois das melhorias na área de segurança do final da pista (NTSB)
O NTSB também ficou satisfeito ao observar que as reformas que recomendou após crises anteriores desempenharam um papel no resultado seguro. Em resposta às recomendações do NTSB, a Administração Federal de Aviação lançou uma campanha em 1999 para garantir que todos os aeroportos tivessem áreas de segurança no final da pista que atendessem a novos e rigorosos requisitos em termos de comprimento e eliminação de obstáculos. 

A pista 23L em Willow Run estava entre as pistas modificadas: entre 2006 e 2009, a FAA supervisionou a extensão da área de ultrapassagem desta pista preenchendo uma ravina de 10 metros de profundidade, removendo estruturas não frágeis e deslocando a estrada perimetral e seu aterro associado a 60 metros da cabeceira da pista. 


Coletivamente, essas mudanças garantiram que o voo 9363 não colidisse com nenhum obstáculo até que já tivesse desacelerado substancialmente, evitando danos graves à aeronave que poderiam ter causado ferimentos ou mortes.

Após o acidente, a Boeing emitiu uma série de boletins de serviço informando aos operadores sobre o tipo de dano encontrado no avião acidentado, explicando novos critérios e técnicas para inspecionar danos causados ​​pelo vento e mostrando como modificar a estrutura do elevador para evitar que a articulação da aba engrenada se rompa. ficando bloqueado no centro. 

A Ameristar Charters também modificou seus procedimentos para responsabilizar os seguidores de voo pelo monitoramento das condições de vento que afetam os aviões estacionados e reduziu a velocidade mínima do vento necessária para desencadear inspeções (e o NTSB recomendou que outros operadores da série MD-80 fizessem o mesmo).

As consequências da queda do MD-87 em 2021 em Houston (CNN)
A história do voo 9363 teria terminado aí, se não fosse por uma reviravolta bizarra que ocorreu mais de quatro anos após o acidente. Em 19 de outubro de 2021, um MD-87 de propriedade privada transportando 21 passageiros e tripulantes a caminho de um jogo de beisebol em Boston invadiu a pista na decolagem do Aeroporto Executivo de Houston em Houston, no Texas, atingindo cercas, árvores, postes de energia e um estrada antes de explodir em chamas. 

Embora o fogo tenha consumido rapidamente a aeronave, todos a bordo conseguiram escapar com apenas dois ferimentos leves. Os investigadores do NTSB ficaram surpresos ao descobrir que este avião apresentava exatamente o mesmo tipo de dano em seus elevadores que haviam observado no voo 9363. 

Além disso, o avião ficou estacionado no Aeroporto Executivo de Houston por até dez meses sem voar, período durante o qual poderia ter sido exposto a todos os tipos de condições climáticas. Alguém estava prestando atenção ao vento? 

E depois de tanto tempo em terra, por que o avião não foi devidamente inspecionado antes de transportar passageiros? Os investigadores provavelmente estão pesquisando essas questões enquanto falamos.

Os investigadores examinam a cauda do MD-87 em Houston (NTSB)
Determinar por que o MD-87 caiu em Houston e se as lições do voo 9363 deveriam ter evitado isso será fundamental para a segurança futura deste tipo de aeronave. Embora a maioria dos aviões da série MD-80 tenham sido retirados do serviço comercial, os que permanecem são cada vez mais utilizados por operadores fretados de terceiro nível e proprietários privados, aumentando o tempo que os aviões passam em terra entre os voos. 

Manter-se atualizado sobre as condições climáticas durante essas longas escalas deve ser fundamental. Até agora, dois acidentes não resultaram em mortes ou ferimentos graves, mas a terceira vez – caso os operadores do MD-80 deixem isso acontecer – pode não ter um resultado tão feliz. O NTSB está, sem dúvida, trabalhando duro para garantir que nunca teremos que descobrir.

Os Michigan Wolverines embarcam em sua aeronave substituta na manhã seguinte
ao acidente (Michigan Men’s Basketball on Twitter)
A queda do voo 9363 da Ameristar Charters foi o resultado de uma sequência de eventos que ninguém havia previsto e que contornou quase todos os recursos de segurança integrados ao sistema. E no final todos foram embora, não pelo que não deu errado, mas pelo que deu certo. 

Uma tripulação com um sentido inato de pilotagem tomou a melhor decisão possível sob imensa pressão, e o desenho deliberado do ambiente da pista garantiu que o resultado fosse o mais suave possível. Sem qualquer um desses fatores, as pessoas poderiam ter morrido.

Muita coisa deu certo para os passageiros também. Depois de sobreviver ao acidente de avião, o Michigan Wolverines venceu o Big Ten Championship, apesar de ter começado o torneio como o oitavo cabeça-de-chave. 

O acidente nunca os abandonou, mesmo em quadra: os Wolverines fizeram sua primeira partida com camisas de treino, pois todos os seus pertences ainda estavam a bordo do avião em Willow Run. E ao transportarem triunfalmente o seu troféu para Ann Arbor, certamente agradeceram aos pilotos do voo 9363, que desempenharam um papel fundamental na obtenção da sua vitória, embora o seu avião nunca tenha decolado.

Por Jorge Tadeu (Site Desastres Aéreos) com Admiral Cloudberg, ASN e Wikipédia

Vídeo: Malaysia MH370, o Documentário da Netflix e minha teoria


Vídeo: Mayday Desastres Aéreos - O misterioso desaparecimento do voo Malaysia Airlines 370

Via Jorge Luis Sant'Ana

Aconteceu em 8 de março de 2014: O mistério do desparecimento do voo MH370 da Malaysia Airlines


“Boa noite, Malaysian três sete zero.”

Nove anos se passaram desde esta última transmissão fatídica, tão carregada com a sombra escura da premonição, que marcou a passagem do MH370 para o reino da lenda. Exatamente um minuto e quarenta e três segundos depois, uma dramática e misteriosa sequência de eventos começaria a se desenrolar, o capítulo inicial de uma história que transfixou o mundo.

À 1h20 do dia 8 de março de 2014, o voo 370 da Malaysia Airlines desapareceu do radar sobre o Mar da China Meridional e embarcou em uma viagem enigmática para o canto mais remoto do Oceano Índico. 

Autoridades confusas se esforçaram para encontrar o local do acidente, sem saber que o avião ainda estava no ar, indo mais fundo em mares desconhecidos na margem do mundo. Mesmo depois que seu verdadeiro caminho foi traçado, as respostas se mostraram indescritíveis. 

Como foi possível algo tão grande quanto um Boeing 777 simplesmente desaparecer sem deixar vestígios? E a pergunta de um milhão de dólares: por quê? 

Até hoje, ainda não temos todas as peças do quebra-cabeça. Mas, ao longo dos anos, surgiram evidências suficientes para pintar uma imagem perturbadora de um voo que só poderia ser considerado uma obra-prima da aeronáutica voltada para fins nefastos. 

De fato, o destino do 777 não é tão misterioso quanto o discurso público faz parecer - pelo contrário, quando todas as evidências são consideradas, apenas uma teoria faz sentido. Esta é a história do que realmente aconteceu com o MH370.

Esquerda: Primeiro Oficial Fariq Hamid; Direita: Capitão Zaharie Ahmed Shah. Observe que a maioria dos malaios usa um nome próprio e um patronímico, sem sobrenome; apenas o nome dado é usado para se referir a uma pessoa. Portanto, “Fariq” e “Zaharie” são usados ​​para se referir aos pilotos ao longo deste artigo (Fotos via CNN)
Em 8 de março de 2014, o primeiro oficial Fariq Hamid estava a caminho do estrelato. O jovem de 27 anos havia sido recentemente promovido a primeiro oficial no Boeing 777 da Malaysia Airlines e estava quase terminando seu treinamento de linha. Ele estava noivo de um colega piloto que conheceu na escola de aviação. Fotos postadas nas redes sociais o mostraram posando na cabine com os comissários de bordo, um sorriso brilhante estampado no rosto. Apenas mais uma viagem - o voo 370 da Malaysia Airlines para Pequim - e ele estaria totalmente qualificado para pilotar o enorme jato de fuselagem larga, uma grande honra em um país onde a companhia aérea ainda não havia perdido sua associação com o orgulho nacional.

Seu instrutor de linha para o voo noturno de Kuala Lumpur, na Malásia, para Pequim, na China, seria Zaharie Ahmed Shah, de 53 anos. Casado e com dois filhos adultos, ele já vivia o sonho de Fariq há anos. Ele tinha mais de 18.000 horas de experiência de voo, das quais mais de 8.600 foram no Boeing 777, tornando-o um dos pilotos triplo sete mais experientes da Malaysia Airlines. Fariq, com apenas 39 horas no tipo, estaria entre os menos.

O Boeing 777 prefixo 9M-MRO que desapareceu (Foto: Laurent Errera)
No portão de Kuala Lumpur, enquanto Zaharie supervisionava o reabastecimento do avião, 227 passageiros embarcaram e ocuparam seus assentos. Eles vieram de 14 países diferentes, mas a maioria - 153 deles - era da China, e mais da metade do restante eram malaios. Doze tripulantes malaios, incluindo dez comissários de bordo e os dois pilotos, elevaram o número total de pessoas a bordo para 239.

Tudo parecia normal quando o voo 370 da Malaysia Airlines taxiou para a pista e decolou às 00h42, horário local. O voo subiu sem incidentes para sua altitude de cruzeiro de 35.000 pés, fazendo todas as chamadas de rádio de rotina, mais algumas extras, já que o capitão Zaharie relatou duas vezes que eles estavam nivelados em 35.000 quando não havia necessidade de fazê-lo. Mas isso não era motivo para alarme.

À 1h19, com o voo se aproximando do limite do espaço aéreo da Malásia, o centro de controle de área em Kuala Lumpur iniciou uma transferência de controle para seus colegas na cidade de Ho Chi Minh, no Vietnã. “Malaio três sete zero, entre em contato com Ho Chi Minh um dois zero decimal nove. Boa noite”, disse o controlador.

“Boa noite, Malaysian três sete zero”, respondeu o capitão Zaharie.

Mas o MH370 nunca contatou Ho Chi Minh em 120.9. À 01:20, um minuto e 43 segundos após a última chamada de rádio, quando o avião passou pelo ponto de referência IGARI no Mar da China Meridional, alguém ou algo desligou seu transponder. Nas telas de radar dos controladores, o alvo do MH370 desapareceu na escuridão, apagado como uma vela ao vento.

O segmento de voo inicial até o ponto em que o avião desapareceu do radar (Imagem: Google)
Inicialmente, ninguém percebeu o súbito desaparecimento do avião. Depois de entregar o voo ao controle de Ho Chi Minh, o controlador malaio desviou o olhar de sua tela e, quando olhou para trás, o avião havia sumido. Ele assumiu que havia voado para fora do alcance do radar e voltou às suas funções sem pensar duas vezes.

No Vietnã, os controladores esperavam que o avião os contatasse, mas isso não aconteceu, e eles também não conseguiram localizá-lo no radar. Os controladores na cidade de Ho Chi Minh começaram a tentar levantar o avião pelo rádio, sem sucesso. Por 18 minutos, eles enviaram uma série de ligações cada vez mais desesperadas: o MH370 poderia responder? Algum avião na área poderia entrar em contato com o MH370? A única resposta foi o silêncio.

De acordo com as regras mutuamente acordadas, os controladores vietnamitas deveriam ter ligado para Kuala Lumpur cinco minutos depois de não conseguirem estabelecer contato com o avião. No evento, 19 minutos se passaram antes que essa ligação fosse feita. Um controlador em Kuala Lumpur perguntou: “Malaysian three seven zero, you read?” Nenhuma resposta.

Enquanto os dois centros de controle continuavam tentando levantar o avião, os controladores de Kuala Lumpur contataram o centro de operações da Malaysia Airlines, que inexplicavelmente disse a eles que o avião estava em curso e sobrevoando o Camboja - apesar do fato de que seu plano de voo não exigia que ele passar pelo espaço aéreo do Camboja, e os controladores em Phnom Penh já haviam informado que não viram sinal do avião.

Embora as operações da Malaysia Airlines tenham se enganado ao colocar o avião no espaço aéreo do Camboja, eles realmente acreditaram que ele ainda estava no ar, seguindo normalmente para seu destino. Eles estavam rastreando o avião no site do Flight Explorer, que, como eles só perceberiam horas depois, simplesmente continuava a exibir o caminho projetado de uma aeronave se seu transponder parasse de transmitir informações de posição. Mas essa suposição incorreta foi reforçada às 02h39, quando a Malaysia Airlines tentou fazer uma ligação via satélite para o avião e a unidade de dados de satélite do avião reconheceu a transmissão. Embora ninguém atendesse e nenhum dado fosse transferido, isso mostrava que o avião ainda estava no ar. Talvez eles simplesmente tivessem algum tipo de falha de comunicação?

Por volta dessa época, o problema começou a escalar a cadeia de comando da Malaysia Airlines. Às 03h00, depois de verificar o sistema de rastreamento interno da empresa e não encontrar nenhum sinal do MH370, o diretor de crise da Malaysia Airlines declarou emergência em código vermelho. Não foi até 30 minutos depois que alguém finalmente disse ao departamento de operações que o Flight Explorer não estava mostrando a posição real do avião, apenas uma posição projetada. Mas, apesar das crescentes evidências de que o MH370 realmente estava desaparecido, os centros de controle e a Malaysia Airlines passaram mais duas horas tentando entrar em contato com o avião, antes de finalmente informar os serviços de emergência sobre a situação às 05:30. Às 06h30, quando o voo não conseguiu pousar em Pequim no horário programado, a Malásia finalmente lançou uma operação de busca e resgate em grande escala,

Apesar da crescente percepção de que o avião provavelmente havia caído, às 07h14 a Malaysia Airlines tentou uma última vez fazer uma ligação via satélite para o MH370. Surpreendentemente, a chamada mais uma vez foi conectada com sucesso, mas ninguém atendeu. À medida que a busca no Mar da China Meridional começou, não ficou claro se o significado desse fato foi devidamente apreciado.

Às 07h24, as autoridades malaias anunciaram ao mundo que o voo MH370 estava desaparecido, visto pela última vez no cruzamento do radar IGARI. Não houve pedido de socorro. A princípio, foi considerado um acidente de avião normal. Detritos flutuantes seriam encontrados em horas ou dias, e o corpo principal dos destroços algum tempo depois. Os países vizinhos, assim como a China e os Estados Unidos, enviaram um contingente cada vez maior de navios e aviões para vasculhar a área ao redor do IGARI, mas com o passar das horas nenhum deles conseguiu encontrar qualquer sinal do avião.

Foi apenas na noite de 8 de março que o departamento de engenharia da Malaysia Airlines, que monitora as comunicações por satélite, forneceu ao CEO uma atualização surpreendente. Embora o avião tenha parado de enviar dados à 01h21, ele continuou a reconhecer as transmissões do satélite por mais sete horas. Isso sugeria uma possibilidade sem precedentes: o avião não caiu no mar da China Meridional; em vez disso, continuou voando durante a noite e pela manhã. No momento em que a busca pelos destroços começou, o avião ainda poderia estar no ar!

Sem saber como interpretar essa informação, a Malaysia Airlines decidiu esperar até que algum tipo de evidência corroborativa pudesse ser encontrada. Não demoraria muito para que eles conseguissem exatamente o que procuravam.

Em 9 de março, os militares da Malásia fizeram um anúncio surpreendente: depois que o avião desapareceu do radar civil, ele continuou a rastrear o voo no radar primário por mais duas horas. Ao contrário do “radar secundário” usado pelos controladores de tráfego aéreo, as estações de radar militares usam o “radar primário”, que detecta aeronaves refletindo sinais de rádio em vez de se comunicar por meio do transponder do avião. Depois que o transponder do MH370 escureceu, o radar militar da Malásia rastreou um objeto originário da última posição conhecida do MH370. O objeto iniciou uma curva fechada à esquerda logo após IGARI, rolando em uma direção sudoeste que o levou de volta à península malaia. Ele contornou a fronteira entre a Malásia e a Tailândia, cruzou o espaço aéreo da Malásia, em seguida, fez uma ampla curva à direita ao redor da ilha de Penang antes de pegar a Rota Aérea N571 publicada no Estreito de Malaca, obedientemente passando por todos os pontos de referência esperados até passar fora do alcance. A trajetória de voo era tão bizarra que ninguém sabia ao certo o que fazer com ela.

O caminho do MH370 depois de voltar para a Península Malaia (Gráfico via Andrew Haneen)
As autoridades malaias inicialmente não tinham 100% de certeza de que o objeto era de fato o MH370, mas as chances eram altas o suficiente para que uma segunda busca fosse ordenada no Estreito de Malaca, além da busca em andamento no Mar da China Meridional. Em 12 de março, essa busca foi expandida para o mar de Andaman, a noroeste, mas, apesar de uma enorme armada internacional de navios militares e civis vasculhando o mar do nascer ao pôr do sol, seu enorme esforço não revelou nenhum sinal do avião.

Enquanto isso, as autoridades malaias decidiram tentar extrair mais informações dos dados de satélite que sugeriam que o avião continuou voando por sete horas. As comunicações via satélite automáticas de rotina foram feitas aproximadamente a cada hora, exceto no período inicial do voo entre 01h21 e 02h25, quando algum tipo de interrupção de energia na unidade de dados do satélite do avião impediu o contato do satélite. Depois disso, a cada hora ou mais, uma estação terrestre em Perth enviava uma consulta (ou “aperto de mão”) ao avião por meio de um satélite geoestacionário localizado sobre o Oceano Índico. O objetivo não era transmitir informações, mas simplesmente verificar se o avião ainda estava lá. Todos esses “apertos de mão” foram reconhecidos pelo avião até o último às 08h19.

O satélite em questão era operado por uma empresa britânica chamada Inmarsat. Nos dias que se seguiram ao acidente, os engenheiros da Inmarsat criaram uma maneira engenhosa de extrair algumas informações sobre a posição do avião a partir desses apertos de mão rotineiros. A premissa básica era que medindo o tempo que o sinal levava para ir do satélite ao avião e vice-versa, seria possível derivar a distância entre o avião e o satélite naquele momento específico. Cada um dos sete apertos de mão revelou, portanto, não a posição exata do avião, mas um anel de localizações possíveis, todas equidistantes do satélite. Os dados mostraram que, durante os primeiros apertos de mão, o avião estava se aproximando do satélite e depois começou a se afastar. Levando em consideração a carga de combustível do avião, os especialistas foram capazes de descartar todos os pontos nos anéis a oeste de cerca de 70 graus leste, porque estavam fora de alcance. Isso deixou dois corredores largos por onde o MH370 poderia ter viajado, mantendo a correlação tempo-distância derivada dos dados de satélite: um curvando-se para o noroeste, cruzando a Índia e entrando na Ásia Central; e outro que se curvava para o sul, profundamente no sul do Oceano Índico.

Os arcos gêmeos onde o voo deve ter terminado, revelados por dados de satélite (Arte: Reuters)
Em cada um desses possíveis corredores, o avião passou por todos os sete “arcos”, os segmentos dos anéis originais que estavam dentro do alcance do avião. O MH370 alcançou o sétimo arco às 08h19, mas 15 minutos depois não reconheceu um handshake de satélite, indicando que havia perdido energia ou caído em algum momento entre 08:19 e 08:34. Isso significava que o local de descanso final do avião provavelmente estava relativamente próximo ao sétimo arco. As autoridades da Malásia anunciaram a revelação dos dados do satélite em 15 de março, momento em que as buscas de superfície ainda em andamento no Mar da China Meridional e no Estreito de Malaca foram canceladas.

Na semana seguinte, o corredor norte foi descartado, pois nenhum dos países ao longo desse corredor havia detectado aviões não identificados cruzando seu espaço aéreo. Ninguém também tinha visto o avião cair ou pousar na Ásia Central. Isso significava que o MH370 devia ter virado para o sul, para o Oceano Índico. Em 24 de março, o CEO da Malaysia Airlines disse ao mundo que o avião certamente havia sobrevoado o corredor sul e que essa área do oceano era “um local remoto, longe de qualquer local de pouso possível”. Ele então acrescentou: “Temos que assumir, sem sombra de dúvida, que o MH370 foi perdido e nenhum dos que estavam a bordo sobreviveu”. Para as famílias dos passageiros e tripulantes, suas palavras caíram como um golpe de martelo. Seus entes queridos foram dados como mortos.

Locais dos sete anéis originais revelados pelas transmissões de satélite (Via ATSB)
A notícia de que o avião virou para o sul e voou para o sul do Oceano Índico por cinco horas depois de deixar o alcance do radar surpreendeu o mundo. O que diabos estava acontecendo a bordo do MH370? Por que alguém voaria em tal rota de voo? Mas, para encontrar a resposta, os investigadores precisariam primeiro encontrar o avião.

Em 24 de março, Malásia, China e Austrália concordaram em iniciar uma busca de superfície em uma vasta área do Oceano Índico perto do sétimo arco, onde se acredita que o avião tenha caído. Mas a essa altura duas semanas se passaram desde o acidente e, com base na experiência de buscas marítimas anteriores, era improvável que eles conseguissem encontrar qualquer detrito flutuante - as correntes oceânicas o teriam dispersado muito para serem rastreados. Embora algumas imagens de satélite mostrem possíveis objetos se afastando do sétimo arco, uma massiva busca aérea e de superfície cobrindo mais de um milhão de quilômetros quadrados não conseguiu encontrar nenhum sinal do avião.

Enquanto isso, o Australian Transport Safety Board (ATSB), em cooperação com as autoridades da Malásia e da China, organizou uma missão para encontrar os sinais das caixas-pretas do avião. Cada um dos dois gravadores de voo do 777 tem um farol localizador de emergência alimentado por bateria que começa a transmitir (ou “pingar”) quando imerso na água. Ao rebocar detectores especializados atrás de um navio, é possível captar esses sinais e encontrar o avião. Após uma análise das rotas de voo mais prováveis, o ATSB escolheu um setor do sétimo arco onde acreditava que o avião provavelmente havia caído e começou a procurar os sinais nessa área. Eles não teriam muito tempo: os pingers só tinham garantia de 30 dias antes de ficar sem bateria, e certamente não durariam mais do que 40.

Em poucos dias, um navio australiano em busca do sinal obteve quatro acertos separados quase na frequência certa, muito próximos um do outro. Certo de que estavam no caminho certo, o ATSB anunciou uma busca subaquática na área onde os pingers foram ouvidos. Um submersível automatizado equipado com sonar de varredura lateral foi implantado para vasculhar o fundo do mar. O otimismo parecia estar aumentando; certamente o avião logo seria encontrado.

Um mapa abrangente de todas as buscas marítimas. A busca inicial pelas caixas pretas é
mostrada na inserção (Gráfico via Andrew Haneen)
No entanto, ao longo de várias semanas, o submersível atravessou toda a área de busca sem encontrar os destroços. Foi uma grande decepção: os supostos sinais das caixas-pretas deviam ser falsos. Só muito mais tarde foi descoberto que os sinais provavelmente vinham do próprio equipamento de varredura fazendo ping.

A essa altura, as baterias dos gravadores de voo já haviam acabado há muito tempo. A única solução agora era começar a escanear metodicamente uma vasta área do fundo do mar ao longo do sétimo arco. Mas antes de definir uma área de busca, o ATSB teve que responder a duas perguntas: a que distância ao longo do sétimo arco eles deveriam procurar e a que distância dele em ambas as direções?

Nenhuma dessas perguntas tinha soluções fáceis. Foi possível reduzir a faixa leste-oeste ao longo do arco fazendo algumas suposições sobre a provável velocidade e altitude da aeronave, que fez uso de um parâmetro dos dados do satélite chamado “compensação de frequência de rajada”. Devido ao efeito doppler, a frequência de uma emissão parecerá mais baixa se a fonte estiver se afastando do receptor e mais alta se a fonte estiver se movendo em direção ao receptor. A diferença entre a frequência nominal e a frequência real é chamada de offset de frequência de rajada. Os engenheiros da Inmarsat foram capazes de usar o deslocamento da frequência de rajada para determinar o grau em que o avião se aproximava ou se afastava do satélite em cada aperto de mão. Essa análise resultou em uma distribuição gaussiana de possíveis trajetórias de voo consistentes com esses dados e terminando no sétimo arco. No geral, os resultados sugeriram que o avião estava no piloto automático e em cruzeiro sem grandes mudanças de direção nas últimas cinco horas de voo. Mas, embora esses dados tenham sido úteis, eles foram fundamentalmente limitados pela falta de conhecimento de onde no mar de Andaman o MH370 inicialmente virou para o sul, já que essa virada ocorreu depois que o avião deixou o alcance do radar da Malásia e da Indonésia.

Uma distribuição de possíveis trajetórias de voo calculadas pelo ATSB em outubro de 2014 (ATSB)
Quanto a quão longe do arco procurar, a questão dependia de quão longe o avião poderia ter voado após o último aperto de mão. Aqui, algumas análises mais altamente técnicas das transmissões tiveram que ser realizadas.

O sétimo arco foi realmente estabelecido não por um aperto de mão, mas por dois apertos de mão espaçados por oito segundos. O primeiro desses apertos de mão partiu do avião, não do satélite, o que só poderia significar que houve uma interrupção temporária no fornecimento de energia à unidade de dados do satélite do 777, fazendo com que tentasse restabelecer contato com o satélite. Esse mesmo fenômeno também havia sido observado no primeiro aperto de mão, às 02h25, após outra aparente interrupção de energia. Embora a origem da interrupção de energia anterior não fosse clara, havia uma razão óbvia para a posterior: o avião quase certamente ficou sem combustível. Isso teria resultado em uma perda de energia elétrica, pois os motores pararam de girar. A energia poderia então ter sido restaurada brevemente para o equipamento de comunicação se houvesse combustível residual suficiente para iniciar a unidade de energia auxiliar, o gerador de reserva na cauda. O APU poderia ser iniciado manualmente, mas também iniciaria automaticamente após um minuto sem energia elétrica se um piloto não interviesse.

O sétimo arco poderia, portanto, ser estabelecido como o ponto provável de exaustão de combustível, limitando inerentemente a distância que o avião poderia ter percorrido além disso. A outra parte da questão era a rapidez com que o avião caiu depois de ficar sem combustível. A resposta dependia se alguém estava ou não pilotando o avião. Caso contrário, os cálculos da Boeing mostraram que o 777 provavelmente entraria em um mergulho em espiral, descendo a uma velocidade bastante alta e atingindo a água a 20 milhas náuticas do ponto de exaustão de combustível. Por outro lado, se um piloto otimizasse o planeio, ele poderia ter voado até 100 milhas náuticas. Na ausência de qualquer evidência para qualquer um dos cenários, o ATSB optou por presumir que o avião espiralou próximo ao sétimo arco porque não havia recebido financiamento suficiente para estender a largura da área de busca para 100 milhas náuticas.

Em rosa e lilás, a largura real da área de pesquisa. Em cinza, a área que o ATSB
teria pesquisado se tivesse dinheiro e tempo infinitos (ATSB)
A busca subaquática ao longo do sétimo arco começou em 6 de outubro de 2014 e continuou até o ano seguinte. Em abril de 2015, com 60% da área de busca coberta, Austrália, Malásia e China concordaram em dobrar a área de busca de 60.000 para 120.000 quilômetros quadrados. A massiva operação de busca revelou alguns objetos interessantes, incluindo alguns naufrágios do século XIX (só podemos imaginar o terror que se abateu sobre suas tripulações, perdidas no mar nos confins do Oceano Índico, sabendo que nunca seriam encontradas). Mas não encontrou nenhum sinal do MH370.

Em janeiro de 2017, depois de vasculhar todos os 120.000 quilômetros quadrados sem encontrar o avião, os três países concordaram em suspender as buscas. A Malásia anunciou que só reiniciaria a busca se "novas evidências confiáveis" da localização do MH370 pudessem ser fornecidas. Os aficionados do MH370 ficaram desapontados; parentes das vítimas ficaram arrasados. Muitos parentes se reuniram para protestar contra a decisão, exortando a Malásia a “procurar”.

Embora as buscas tenham sido suspensas, a investigação continuou. Além dos investigadores do governo, uma grande quantidade de pesquisas valiosas também foi feita pelo Independent Group, um grupo de especialistas em aviação e cientistas que dedicaram incontáveis ​​horas de trabalho para investigar o MH370. Eles seriam a fonte de muito do que foi revelado desde o fim da busca.

Fugro Discovery, o navio que conduziu a maior parte da busca ATSB original (Foto: Michel Floch)
Um aficionado independente do MH370 era Blaine Gibson, um americano que vivia um estilo de vida nômade e se interessava pelo inexplicável. Ele foi um dos primeiros a defender a ideia de que os detritos do voo MH370 acabariam indo parar em algum lugar e que poderiam ser examinados em busca de pistas.

Logo descobriu-se que ele estava certo. Em 2015, enquanto a busca ainda estava em andamento, os limpadores de praia locais descobriram um pedaço de um avião na ilha francesa da Reunião, a leste de Madagascar. As autoridades francesas identificaram o item como um flaperon do Boeing 777 – um painel que funciona tanto como flap quanto como aileron – e determinaram conclusivamente que veio do MH370, com base nos números de série impressos no metal. A borda posterior do flaperon havia sido arrancada e estava coberta de cracas, mas fora isso estava notavelmente intacta. O verdadeiro significado da descoberta não poderia ser exagerado: finalmente, havia evidências físicas de que o MH370 realmente caiu em algum lugar no Oceano Índico. Para as famílias das vítimas, foi como saber que elas morreram novamente.

As autoridades da Ilha da Reunião recuperam um flaperon do MH370 (Foto: Reuters)
Após a descoberta do flaperon, Blaine Gibson começou a vasculhar as costas de vários países do sudeste da África em busca de mais detritos. Acontece que encontrá-lo foi surpreendentemente fácil: nos meses seguintes, ele encontrou regularmente pedaços de destroços de aviões em Madagascar e Moçambique. Em janeiro de 2021, cerca de 33 pedaços de destroços encontrados nas praias foram, com vários graus de certeza, ligados ao MH370. Destes, mais de um terço foram encontrados por Blaine Gibson.

A descoberta dos destroços abriu dois novos caminhos de investigação: análise estrutural, para tentar determinar como o avião atingiu a água; e análise de deriva reversa - um método usado para determinar, com base nas correntes oceânicas, de onde os detritos se originaram e onde acabaram. Ambas as áreas produziriam um tesouro de informações às vezes conflitantes.

Enquanto isso, o ímpeto para uma nova busca começou a crescer no ano seguinte à suspensão da busca original em janeiro de 2017. Armada com novos modelos de deriva reversa, a empresa privada de busca e salvamento Ocean Infinity propôs um acordo ao governo da Malásia: vasculhar uma área imediatamente ao norte da área de busca ATSB e, se não conseguisse encontrar o avião, a Malásia não pagaria um centavo. Em janeiro de 2018, a Malásia aceitou a oferta “sem encontrar, sem taxa” e, em poucos dias, o Seabed Constructor da Ocean Infinity estava a caminho do sul do Oceano Índico.

A área da busca no oceano infinito, comparada com a busca ATSB e a zona de busca ideal (BBC)
O Seabed Constructor tinha um ás na manga que faltava ao ATSB: uma frota de oito veículos submarinos autônomos equipados com scanners de sonar de última geração operariam simultaneamente, cobrindo o solo com uma ordem de grandeza mais rápida do que nunca. Os executivos da Ocean Infinity expressaram grande confiança de que encontrariam o avião, apesar do difícil terreno submarino.

Por mais de cinco meses, o Seabed Constructor e sua frota de submarinos autônomos vasculharam os desfiladeiros e montanhas que ladeavam o fundo do oceano, movendo-se para o norte ao longo do sétimo arco. Mais uma vez, eles encontraram vários itens interessantes, mas nenhum deles era do voo MH370. Em junho de 2018, tendo percorrido toda a área de busca proposta sem encontrar o avião, a Ocean Infinity foi forçada a desistir. A empresa gastou milhões em capital na busca, mas não obteve nada em troca.

Desde que a busca do Ocean Infinity terminou, nenhuma nova busca foi lançada, e o local de descanso final do MH370 permanece desconhecido até hoje. Mas, apesar do fracasso em encontrar o avião, sabe-se mais sobre o que aconteceu com o MH370 do que o público em geral tende a acreditar.

Desde o início, havia apenas algumas explicações possíveis para o motivo pelo qual o avião voou em sua bizarra rota de voo para o sul do Oceano Índico. Uma delas foi que um incêndio de alguma forma derrubou os sistemas de comunicação e navegação, mas deixou os pilotos com algum grau de controle. Outra foi que houve algum tipo de descompressão e - sofrendo de hipóxia - a tripulação começou a agir de forma irracional até que finalmente caiu inconsciente ou morreu. Uma terceira teoria sustentava que os sequestradores haviam assumido o controle do avião com a intenção de levá-lo para algum lugar, mas algo deu errado que matou os pilotos e/ou os passageiros. E, finalmente, havia a teoria mais popular de todas: que um dos pilotos assumiu o controle do avião e voou deliberadamente para o sul do Oceano Índico em um terrível ato de assassinato em massa/suicídio.

Arte de rua em memória das vítimas do voo MH370, criada quando ainda havia dúvidas
se o avião havia realmente caído (Foto: Ted Alijibe)
O problema de fazer qualquer uma dessas teorias funcionar era o grande número de eventos independentes que elas precisavam explicar. Todas as informações a seguir tiveram que ser contabilizadas.

Primeiro, a teoria precisaria explicar como todas as comunicações automatizadas e equipamentos de transmissão, como o transponder, ACARS e ADS-B, desligaram em um período muito curto, mas não o fizeram completamente simultaneamente. Também precisaria explicar por que os pilotos não fizeram nenhum tipo de pedido de socorro.

Em segundo lugar, qualquer explicação precisaria levar em conta o fato de que a volta à esquerda em direção à península malaia só poderia ter sido feita manualmente por um piloto. Investigadores da Malásia tentaram recriar a curva em um simulador e descobriram que, para completá-la em 130 segundos, como fazia o MH370, o piloto automático precisava ser desligado. Mesmo usando o ângulo de inclinação mais estreito permitido, o piloto automático só conseguiu completar a curva em 180 segundos ou mais. Ao voar manualmente, os investigadores conseguiram fazer a curva em apenas 148 segundos, embora nenhum tenha conseguido fazê-lo tão rapidamente quanto o MH370. Mesmo fazendo a curva em 148 segundos, o avião estava sendo empurrado para perto de seu limite: ângulos de inclinação de até 35 graus tiveram que ser usados, o que no ar rarefeito a 35.000 pés é incrivelmente perigoso. No simulador, a manobra disparou avisos de ângulo de inclinação e o aviso de estol do stick shaker quando o avião ameaçou perder a sustentação e cair do céu. Assim, apenas um piloto habilidoso poderia ter realizado a curva inicial.

Terceiro, descobriu-se que o celular do primeiro oficial estava ao alcance de uma torre de celular quando o avião passou perto de Penang, mas ninguém a bordo tentou fazer uma ligação. De modo mais geral, não há evidências de que alguém a bordo tenha feito qualquer tentativa de contato com alguém fora do avião ou de outra forma interferisse em sua trajetória de voo à medida que se afastava cada vez mais de seu curso correto.

Em quarto lugar, seria necessária uma explicação do motivo pelo qual houve uma interrupção de energia na unidade de comunicação por satélite, apenas para que ela voltasse a ficar online às 02h25.

E quinto, qualquer teoria precisaria explicar por que o avião aparentemente pegou uma via aérea publicada depois de passar por Penang, então a seguiu até que estivesse fora do alcance do radar antes de virar para o sul no Oceano Índico, indo em direção a uma área sem locais de pouso. Também precisaria explicar por que a trajetória de voo permaneceu quase perfeitamente reta desse ponto em diante.

A arte na areia feita logo após o desaparecimento exorta os transeuntes a orar pelo MH370 (Foto: CBS News)
É tecnicamente possível, embora bastante difícil, explicar tudo isso com algum tipo de cenário acidental. Em seu livro The Hunt for MH370, Ean Higgins fornece uma sequência teoricamente possível de eventos originários de um incêndio em um aquecedor de janela no cockpit, que rapidamente destrói todo o equipamento de comunicação. Após a explosão, os pilotos colocaram suas máscaras de oxigênio para se protegerem da fumaça. O primeiro oficial Fariq inicia uma volta rápida em direção à terra para um pouso de emergência, enquanto Zaharie desliga o barramento CA esquerdo para cortar a energia do aquecedor da janela (que também desliga o equipamento SATCOM). Pouco depois, Zaharie acidentalmente puxa o tubo da máscara de oxigênio para fora da garrafa de oxigênio enquanto alcança o extintor de incêndio, causando uma liberação repentina de oxigênio que acelera rapidamente o fogo até consumir a cabine, matando o primeiro oficial Fariq. O calor do fogo racha o para-brisa, que finalmente se quebra, causando uma rápida descompressão que por sua vez apaga o fogo. O capitão Zaharie, carregando uma garrafa de oxigênio suplementar da cozinha, retorna ao cockpit para descobrir que a maioria dos controles foi destruída, incluindo os controles manuais de voo, o autothrottle e todas as comunicações. Com Zaharie incapaz de fazer o avião descer, os passageiros logo ficam sem oxigênio e morrem antes de chegar a Penang; enquanto isso, Zaharie descobre que tudo o que pode fazer é usar o piloto automático para mudar de rumo. Ele liga novamente o barramento CA esquerdo para tentar restaurar a energia do equipamento de comunicação, mas não funciona. Sem como pousar o avião ou pedir ajuda, e com todos os outros a bordo mortos, ele decide enviar o avião para o Oceano Índico para não atingir ninguém no solo quando ficar sem combustível e cair.

No mesmo livro, Higgins também descreve um cenário envolvendo uma descompressão explosiva. Pouco depois de passar pelo IGARI, um buraco se abre na fuselagem e todo o ar sai correndo. O capitão Zaharie está no banheiro no momento e não consegue alcançar uma máscara de oxigênio, o que o leva a morrer de hipóxia. A máscara de oxigênio de Fariq também não está funcionando corretamente - ela fornece oxigênio suficiente para mantê-lo vivo, mas não o suficiente para manter seu cérebro funcionando em um nível adequado. Embora ele volte para a Malásia para um pouso de emergência, ele toma uma série de decisões irracionais movidas à hipóxia, como não descer ou fazer um pedido de socorro. Ao tentar usar o transponder para emitir um código de socorro, ele acidentalmente o desliga, junto com todos os outros equipamentos de comunicação. Porque Fariq não desceu, os passageiros ficam sem oxigênio e morrem antes de chegar a Penang. Fariq inicialmente segue para Penang, depois vira para o norte, tentando seguir para Langkawi, onde realizou treinamento de piloto. Ao chegar ao Mar de Andaman, ele tenta dar meia-volta, mas fica sem oxigênio e morre, deixando o avião continuar no piloto automático no sul do Oceano Índico até ficar sem combustível.

Blaine Gibson, à direita, com um possível pedaço do MH370 (Foto: Blaine Gibson)
O problema com ambas as teorias é que elas dependem de uma longa série de eventos independentemente improváveis, todos coincidentes. Por exemplo, em um cenário de incêndio, não apenas o aquecedor do vidro esquerdo deve explodir (algo que nunca aconteceu), mas também destruir uma longa lista de sistemas específicos, deixando intacta a capacidade de mudar de direção e também sem derrubar o avião. Da mesma forma, no cenário de descompressão ainda mais instável, grande peso deve ser colocado no piloto que toma uma série de decisões irracionais muito específicas enquanto está em estado hipóxico, sem que esse estado hipóxico seja suficiente para matá-lo até mais de duas horas após o início do a emergência. Para complicar ainda mais essas duas teorias, há uma completa falta de evidências: o 777 não tem histórico de nenhum desses tipos de falhas, e o avião em questão não apresentava problemas mecânicos pendentes. Os investigadores da Malásia investigaram se a carga poderia ter iniciado um incêndio, observando que consistia principalmente de frutas maduras de mangostão junto com um pequeno número de baterias de lítio. Extensas tentativas dos investigadores de fazer o suco de mangostão reagir com as baterias e provocar um incêndio não tiveram sucesso. Também não foi produzida uma teoria abrangente envolvendo um incêndio de carga que possa explicar todos os elementos necessários - apenas um incêndio na cabine com um padrão de propagação muito específico pode satisfazer a maioria das premissas básicas. Extensas tentativas dos investigadores de fazer o suco de mangostão reagir com as baterias e provocar um incêndio não tiveram sucesso. Também não foi produzida uma teoria abrangente envolvendo um incêndio de carga que possa explicar todos os elementos necessários - apenas um incêndio na cabine com um padrão de propagação muito específico pode satisfazer a maioria das premissas básicas. Extensas tentativas dos investigadores de fazer o suco de mangostão reagir com as baterias e provocar um incêndio não tiveram sucesso. Também não foi produzida uma teoria abrangente envolvendo um incêndio de carga que possa explicar todos os elementos necessários - apenas um incêndio na cabine com um padrão de propagação muito específico pode satisfazer a maioria das premissas básicas.

Pelas razões listadas acima, a maioria dos especialistas acredita que o MH370 foi vítima de algum tipo de ação deliberada. Existem três possíveis suspeitos: o capitão Zaharie, o primeiro oficial Fariq ou um dos passageiros. No entanto, o primeiro oficial Fariq, um jovem piloto inexperiente com um futuro brilhante, uma personalidade alegre e um casamento próximo pode ser descartado com muita facilidade.

A polícia da Malásia realizou verificações de antecedentes de todos os 227 passageiros e encontrou apenas dois que eram suspeitos. Dois iranianos embarcaram no voo com passaportes roubados, mas uma investigação mais aprofundada revelou que eles não tinham ligações com nenhum grupo terrorista e estavam apenas usando os passaportes roubados para tentar buscar asilo na Europa. Absolutamente nada desagradável sobre eles poderia ser encontrado. Além disso, era difícil explicar como um passageiro poderia ter entrado na cabine sem que os pilotos fizessem qualquer tipo de pedido de socorro, nem estava claro como ou por que eles teriam efetuado a série de mudanças de configuração e direção que ocorreram durante o voo. E, além disso, nenhum grupo terrorista assumiu a responsabilidade pelo sequestro do voo MH370.

Isso deixou o capitão Zaharie como o único suspeito viável. Aqui também, as investigações aparentemente falharam. O relatório do acidente na Malásia, publicado em 2018, o descreveu como um piloto impecável, sem problemas em sua vida pessoal e nenhuma motivação óbvia para fazer desaparecer um avião cheio de pessoas. Mas isso era realmente toda a verdade? Na verdade, as evidências mostram que Zaharie é uma pessoa muito mais complicada do que as autoridades da Malásia o retrataram.

Capitão Zaharie Ahmed Shah, visto em uma captura de tela de seu canal no YouTube
A evidência mais amplamente divulgada ligando Zaharie ao desaparecimento foi um curso que ele traçou em seu simulador de voo doméstico cerca de um mês antes do acidente. Zaharie tinha vários hobbies, incluindo parapente e aeromodelismo, mas também passava muito tempo em casa em seu computador, jogando jogos de simulador de voo. Às vezes, ele carregava vídeos de si mesmo tocando em seu canal do YouTube, onde se mostra afável e experiente, embora um pouco desajeitado socialmente.

Em 2014, um relatório vazado da polícia da Malásia revelou que entre as sessões de simulador de voo salvas de Zaharie havia uma rota muito estranha que subia o Estreito de Malaca, virava para o sul depois de passar por Sumatra e depois voava direto para o sul do Oceano Índico antes de terminar nas proximidades. do sétimo arco. A pista não apenas se assemelhava à rota de voo real do MH370, mas também continha vários outros detalhes intrigantes. Por exemplo, a faixa não era realmente uma faixa - em vez disso, era uma série de breves clipes com duração não superior a alguns segundos cada, indicando que Zaharie a havia programado com antecedência e depois pulado por vários pontos sem realmente tocar o voo de horas inteiras. Além disso, embora os relatórios iniciais indicassem que a faixa havia sido salva intencionalmente pelo usuário, análises posteriores mostraram que ele foi mantido apenas nos arquivos do sistema e certamente não deveria ser encontrado. Isso foi um teste? Parece estranho demais para ser uma coincidência.

Em amarelo, a trajetória de voo real do avião. Em vermelho, a trajetória de voo encontrada
no simulador de Zaharie (Arte via New York Magazine)
A vida social de Zaharie também não era tão tranquila quanto as autoridades malaias a retratavam. Uma combinação do relatório policial vazado e entrevistas com pessoas que o conheciam revelou que ele havia se separado de sua esposa informalmente e estava morando sozinho na casa da família. Ele aparentemente se sentia sozinho e triste por muito tempo antes do desaparecimento. Ele admitiu a amigos que às vezes passava o tempo livre andando por quartos vazios, esperando o próximo voo. Outros disseram que ele parecia estar sofrendo de depressão clínica. Ele estava perseguindo obsessivamente um par de jovens modelos nas redes sociais. Ele teria dormido regularmente com os comissários de bordo, e sua esposa supostamente sabia. Ele também disse ter tido várias amantes, incluindo uma que era casada. A mulher em questão negou que o caso deles fosse de natureza sexual e relatou que eles pararam de se ver meses antes do desaparecimento do avião. No entanto, ela também disse aos entrevistadores que havia trocado várias mensagens de WhatsApp com Zaharie apenas alguns dias antes do acidente. O que havia neles ela se recusou a dizer, citando o medo de que fossem mal interpretados.

Zaharie era conhecido por deixar comentários estranhos nas páginas de perfil de
jovens modelos da Malásia (Imagem via The Daily Mail)
Zaharie também estava profundamente envolvido na política da Malásia e era um grande apoiador do líder da oposição Anwar Ibrahim. Em uma estranha coincidência, poucas horas antes do desaparecimento do MH370, Ibrahim foi condenado à prisão por acusações de sodomia que foram amplamente consideradas politicamente motivadas. Embora isso tenha sido um golpe para Zaharie, provavelmente não teve nada a ver com o que aconteceu: se ele foi o responsável, certamente começou a planejar o desaparecimento bem antes de a sentença ser proferida. Ele também não deixou nenhum manifesto ou outra declaração de intenções, o que tornou improvável que ele tenha sequestrado o avião como forma de protesto político.

Como esses aspectos da vida de Zaharie poderiam tê-lo levado a cometer um ato indescritível de assassinato em massa é difícil de entender. Mas embora se diga que ele é uma pessoa afetuosa e emocionalmente sensível que ama a vida, talvez algo obscuro espreite dentro dele, algo que ele reprimiu tão completamente que ninguém mais sabia que estava lá. Diz-se que as pessoas que parecem mais felizes às vezes também estão na agonia mais profunda, lutando contra demônios que nunca revelam nem mesmo para seus amigos mais próximos. Talvez, enquanto caminhava pelos cômodos vazios de sua casa vazia esperando pelo próximo voo, ele se perguntasse o que tudo aquilo significava. Qual era o ponto? Para onde estava indo sua vida? Se ele estava destinado a desaparecer na irrelevância, talvez tentar fazer um avião desaparecer sem deixar vestígios parecesse um quebra-cabeça intelectual estimulante.

Muito poucas pessoas que exibem esses tipos de características matam centenas de pessoas. Mas também é verdade que em muitos casos nunca se estabelece um motivo. Por exemplo, em outubro de 2017, Stephen Paddock, de 64 anos, abriu fogo em um show em Las Vegas de um ponto privilegiado no hotel Mandalay Bay, matando 60 pessoas e ferindo mais de 800 antes de apontar sua arma para si mesmo. Apesar de uma investigação exaustiva, o FBI nunca conseguiu determinar por que ele fez isso. Às vezes, as respostas simplesmente não estão lá para serem encontradas.

Zaharie e sua filha Aishah, possivelmente vários anos antes do acidente (Foto: The Mirror)
Talvez a razão mais convincente para acreditar que Zaharie sequestrou seu próprio avião seja sua simplicidade. É a única explicação que não depende de uma série de eventos independentemente improváveis: dado o desejo de fazê-lo, todo o resto se encaixa como parte razoável do plano. Na verdade, desde o momento da falha do transponder até os locais específicos das curvas até a rota de voo para o sul do Oceano Índico, seria mais difícil encontrar uma maneira melhor de fazer um avião desaparecer. Por que acreditar que isso é uma coincidência quando poderia muito bem ter sido o objetivo desde o início? Além disso, quem estava pilotando o avião tinha amplo conhecimento de sistemas e excelente habilidade de voo manual. Quem mais a bordo tinha essas habilidades além de Zaharie? Na verdade, é de longe a resposta mais fácil.

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São 01h20 do dia 8 de março de 2014. A bordo do MH370, Zaharie acaba de se despedir do ATC de Kuala Lumpur. Ele ainda não fez contato com Ho Chi Minh. É neste momento que ele inicia seu plano cuidadosamente construído. “Ei”, diz ele ao primeiro oficial Fariq, “as meninas querem falar com você sobre algo na cabine.”

Fariq, que dificilmente questionaria os motivos de seu capitão e instrutor altamente experiente, obedece.

Segundos depois, o capitão Zaharie tranca a porta da cabine e desliga sistematicamente todos os sistemas que possam ser usados ​​para rastrear o avião. O transponder, ACARS e ADS-B ficam inativos. Ele também desliga o barramento CA principal, só para ter certeza de que conseguiu tudo. As luzes internas escurecem; na cabine, ouvem-se algumas exclamações de surpresa. O MH370 desaparece do radar, mas Zaharie cronometrou sua aquisição para que nenhum dos centros de controle perceba imediatamente, ganhando tempo extra para ele.

Antes que Fariq possa tentar voltar para a cabine, Zaharie estende a mão e aciona o interruptor de pressurização, cortando a sangria de ar para a cabine. O avião começa a despressurizar rapidamente; Zaharie coloca sua máscara de oxigênio, assim como os passageiros.

Fariq e os comissários de bordo correm para pegar seus próprios suprimentos de oxigênio de emergência, mas é difícil encontrá-los na escuridão. Antes que eles possam fazer isso, Zaharie inicia uma curva acentuada e dramática para a esquerda. Alarmes soam no cockpit: “BANK ANGLE! BANK ANGLE!” 

O agitador de manche começa a chacoalhar, alertando sobre uma estol iminente, mas Zaharie usa sua incrível habilidade de pilotagem para levar o avião ao seu limite absoluto. Na cabine, passageiros e tripulantes são jogados violentamente para baixo e para a direita. Fariq, com falta de ar, é jogado contra uma antepara, incapaz de alcançar o oxigênio suplementar. Zaharie sabe que, quando terminar sua angustiante volta de dois minutos, quem não conseguir colocar uma máscara de oxigênio estará morto. Com Fariq ficando inconsciente rapidamente, a pessoa mais capaz de interromper seu plano diabólico já está fora de cena.

Após 130 segundos, o Zaharie segue em direção ao sudoeste, visando a fronteira entre a Malásia e a Tailândia. Ao trilhar a linha entre os dois países, ele espera que ambos vejam o avião não identificado como um problema do outro país. (Na verdade, foi o que aconteceu: os controladores militares tailandeses viram o avião, mas presumiram que a Malásia o estava controlando; os controladores militares malaios, por outro lado, provavelmente não estavam prestando atenção.) A essa altura, as máscaras de oxigênio dos passageiros - projetadas para durar apenas 12 minutos ou mais - secou e os passageiros estão todos inconscientes ou mortos.

Depois de voar ao longo da fronteira por tempo suficiente para ter certeza de que ninguém está usando jatos para interceptá-lo, Zaharie cruza o espaço aéreo da Malásia e segue para Penang, onde fica sua cidade natal. Fazendo uma ampla curva à direita ao redor da ilha, ele dá a si mesmo uma última visão do lugar que cresceu e talvez ainda ame. O telefone de Fariq faz contato com uma torre de celular, e talvez outros telefones também, mas ninguém além de Zaharie está vivo para fazer uma ligação.

Zaharie agora bloqueia a Rota Aérea N571 no Estreito de Malaca, exatamente como havia praticado no simulador. É um estratagema inteligente - para qualquer um que esteja observando no radar primário, o MH370 parece idêntico a muitos outros aviões que se dirigem calmamente para a via aérea em direção à Índia.

Depois de verificar se todos os outros a bordo estão mortos, Zaharie liga o barramento AC e repressuriza o avião. Sem o conhecimento dele, a unidade de comunicação via satélite começa a reconhecer o satélite novamente. Este é seu único erro - mas é perdoável, já que quase nenhum piloto de linha aérea sabia sobre esse recurso do sistema antes do desaparecimento do MH370. Se não fosse por essa pequena omissão, é improvável que alguém tivesse descoberto para onde o avião foi depois que saiu do alcance do radar.

Assim que tem certeza de que está fora do alcance da cobertura de radar da Malásia e da Indonésia, Zaharie realiza seu golpe de misericórdia final: a curva à esquerda no Oceano Índico. Até hoje ainda não sabemos exatamente onde ele fez isso. Ele entra em um rumo ao sul no piloto automático e o deixa lá - seu trabalho está feito. Antes do voo, ele calculou que tinha combustível suficiente para chegar a uma área do sul do Oceano Índico onde o terreno do fundo do mar dificultaria a localização do avião. Mas este é apenas um plano de contingência, caso as autoridades de alguma forma consigam rastreá-lo após sua volta final. A essa altura, talvez Zaharie esteja ouvindo as frequências do controle de tráfego aéreo no rádio HF, rindo das tentativas desesperadas das autoridades malaias de contatá-lo. Ele fez isso; ele fugiu.

De fato, se foi isso que aconteceu, o MH370 foi uma obra-prima de voo direcionada a um ato de extrema depravação. Não há dúvida de que Zaharie era fisicamente capaz de fazer isso. Ele era muito inteligente, tinha conhecimento enciclopédico de todas as áreas da aviação e havia acumulado mais experiência no 777 do que quase qualquer outra pessoa na Malásia. E tudo o que sabemos sobre a fuga aponta para a conclusão de que o criminoso não queria ser encontrado. Embora as teorias de acidentes acidentais devam construir uma série elaborada de coincidências para explicar por que as estrelas alinhadas para fazer o avião aparentemente desaparecer sem deixar vestígios, se considerarmos que essa é a intenção do perpetrador, apenas uma suposição é necessária.

Sem os destroços, é claro que as pistas permanecerão apenas circunstanciais. Mas inúmeros assassinos foram condenados à morte com muito menos evidências. E é verdade que o motivo permanece indefinido.Mas Sherlock Holmes estava certo: uma vez eliminado o impossível, o que restar, por mais improvável que seja, deve ser a verdade.

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Quais pedaços do voo MH370 foram identificados até agora? (Arte via CNN)
Depois de tudo isso, uma pergunta continua a nos assombrar: onde fica o MH370? Até hoje o avião não foi encontrado. Quanto a onde procurar, há dois campos principais: aqueles que acreditam que o avião caiu descontroladamente no mar em um mergulho em alta velocidade e aqueles que acreditam que Zaharie deslizou o avião para uma vala controlada. A teoria que alguém subscreve influencia muito onde se pensa que a busca pelo avião deve se concentrar.

A busca ATSB e a busca Ocean Infinity foram ambas baseadas na suposição de que o avião estava descontrolado no final. Em apoio a esta conclusão havia uma série de itens de evidência. Por um lado, havia a possibilidade de que os dois apertos de mão finais revelassem uma descida em alta velocidade. O deslocamento da frequência de explosão desses dois apertos de mão foi tal que não poderia ser explicado apenas pela velocidade de avanço do avião - algo mais deve ter influenciado isso. Esse “algo mais” poderia ter sido a velocidade vertical. Os especialistas estimaram que, com base na compensação de frequência, no momento do primeiro aperto de mão às 08:19, o avião pode estar descendo a uma velocidade de pelo menos 2.900 pés por minuto – bastante normal para um avião sem motores. Mas oito segundos depois, no momento do aperto de mão final, isso aumentou para pelo menos 13.800 pés por minuto, bem além das taxas usadas em qualquer descida de emergência normal. No entanto, os engenheiros também não puderam descartar que parte ou mesmo a maior parte desse deslocamento de frequência fosse devido ao oscilador de cristal dentro do transmissor se aquecendo novamente após a interrupção de energia.

Apoiando ainda mais a noção de uma descida descontrolada, houve uma série de estudos de deriva reversa que tentaram rastrear os fragmentos de detritos amplamente dispersos de volta a um ponto de origem comum. Embora a derivação de deriva reversa seja uma arte relativamente nova e não especialmente confiável, muitos esforços foram feitos nos estudos e, ao longo dos anos, seus resultados apontaram consistentemente para um local de colisão próximo ao sétimo arco. Os próprios destroços também mostraram algumas evidências de um impacto de alta energia, já que algumas peças vieram de dentro da cabine e foram seriamente mutiladas, incluindo a moldura de uma tela de TV no encosto do banco e parte da porta de um armário. Juntas, essas evidências foram suficientes para justificar os locais da busca ATSB original e da busca Ocean Infinity, respectivamente.

Trechos de um relatório de junho de 2014 fornecem informações sobre as motivações
do ATSB para escolher a área de pesquisa que fez (Via ATSB)
Mas, à medida que a busca do ATSB chegava ao fim sem encontrar o avião, a opinião popular entre especialistas independentes começou a mudar. Se o avião não estava na área de busca, certamente isso significava que o ATSB deveria considerar a possibilidade de um piloto deslizar o avião para fora dela? Começaram a surgir acusações de que o ATSB nunca teve provas suficientes para justificar a escolha da teoria do “mergulho mortal” em vez da teoria do planeio controlado, e que havia feito essa escolha para evitar ter que pedir mais dinheiro ou para evitar ofender a Malásia fazendo um determinação independente de que um dos pilotos havia derrubado o avião deliberadamente. A ATSB reagiu defensivamente, tentando dar o mínimo de informação possível aos jornalistas. Vários funcionários do ATSB fizeram papel de bobos tentando evitar dizer que um piloto derrubou o avião de propósito. Claro, a provável possibilidade de Zaharie ter derrubado o avião propositalmente não era mutuamente exclusiva com a afirmação de que o avião acabou em um mergulho mortal - ele poderia facilmente ter se matado antes que o avião ficasse sem combustível, ou simplesmente deixá-lo cair por conta própria enquanto ele observava. Mas, a essa altura, ficou claro que as autoridades malaias haviam rejeitado a teoria completamente, e reconhecer a possibilidade de o piloto ter deslizado o avião até o fim implicaria contradizer publicamente os malaios, que lideravam a investigação.

Outra visão do flaperon encontrado em Reunião. Observe os danos na borda de fuga (Foto: NBC News)
Os especialistas apresentaram uma série de evidências que apoiariam a ideia de que o avião foi planado até o fim. Vários dos principais investigadores de acidentes aéreos, juntamente com a equipe francesa que inicialmente examinou o flaperon, relataram que os danos no bordo de fuga seriam consistentes com o impacto do avião na água em uma atitude nivelada com os flaps estendidos para a posição de pouso. O fato de o flaperon (assim como várias outras peças) estar relativamente intacto também sugere que a energia do impacto não pode ter sido especialmente grande. Havia dúvidas suficientes sobre as velocidades verticais e os estudos de deriva reversa para descartá-los como não confiáveis. Alguns argumentaram que se o avião tivesse se fragmentado totalmente no impacto, em vez de se partir em alguns pedaços grandes, mais pedaços teriam sido encontrados (embora esta não fosse uma análise científica, já que não sabemos realmente quantas peças “deveriam” ser encontradas dados diferentes níveis de fragmentação). E dadas as notórias condições de vento no Oceano Índico Meridional, era bastante provável que o avião se tivesse partido em vários pedaços mesmo numa amaragem controlada, explicando as peças do interior da cabine. Especialistas como o jornalista Ean Higgins e o investigador de acidentes aéreos Larry Vance escreveram livros inteiros defendendo a teoria do planeio controlado. Mas a melhor evidência para a teoria sempre foi o fato de que buscas baseadas na teoria do “mergulho mortal” já haviam sido tentadas, e mesmo assim o avião ainda estava desaparecido.

Apesar dos novos estudos detalhados da teoria do planeio controlado, a Malásia não considerou nada disso como a “nova evidência confiável” de que precisava para reiniciar a busca. Na verdade, as autoridades malaias pareciam estar cansadas do MH370 e estavam mais interessadas em resolver o problema do que em descobrir a verdade. Quando publicaram seu relatório final sobre o acidente em 2018, foi uma decepção - quase não havia nada nele que já não fosse conhecido. Além disso, não chegou a uma conclusão sobre a causa do acidente. Ele reconheceu que as três voltas devem ter sido intencionais e reconheceu que não havia passageiros que pudessem estar por trás de uma tentativa de sequestro. Ele reconheceu que não encontrou nenhuma evidência de problemas mecânicos com o avião, mesmo não relacionados ao acidente. Ele reconheceu que os sistemas de comunicação quase certamente foram desligados de propósito. E reconheceu que apenas um piloto habilidoso poderia ter feito o retorno inicial. Mas, em vez de concluir que a única explicação viável era que Zaharie havia derrubado o avião deliberadamente, o relatório terminou dizendo que os investigadores não conseguiram determinar a causa do acidente. Todo o relatório parecia estar chegando à conclusão de que Zaharie havia feito isso, mas acabou não dizendo nada. O problema era que a Malásia não podia admitir que um de seus melhores pilotos voando para sua companhia aérea estatal havia levado deliberadamente outras 238 pessoas para a morte. Em termos de imagem pública do país, a Malásia preferiu que o acidente permanecesse um mistério. 

O Relatório de Investigação de Segurança de 495 páginas da equipe de investigação da Malásia,
 que apesar de seu tamanho conseguiu dizer relativamente pouco (Foto: The Sunday Times)
O relatório oficial também fez o possível para encobrir uma série de falhas que contribuíram para que o avião não fosse encontrado. Além da longa demora em informar as autoridades - causada por erros nos centros de controle de Kuala Lumpur e Ho Chi Minh City, bem como na Malaysia Airlines - as críticas deveriam ter sido feitas aos militares malaios. Por que não interceptaram a aeronave não identificada que cruzava o norte do país? Os militares alegaram que era porque o avião não era uma ameaça. Mas como eles poderiam saber disso, a menos que o tivessem identificado como MH370, em vez de uma incursão estrangeira? E se o tivessem identificado como MH370, por que eles não contaram a ninguém até dias depois do acidente? A explicação mais provável era que os militares simplesmente não estavam monitorando seu próprio radar no momento em que o avião voou pelo espaço aéreo da Malásia. Mas admitir isso exporia uma enorme vulnerabilidade de segurança ao revelar que os militares da Malásia são perigosamente incompetentes. Provavelmente por razões de segurança nacional, o relatório oficial não tinha nada a dizer sobre isso.

Parte de um spoiler recuperado do MH370 em agosto de 2020 (Foto via Don Thompson)
Evidentemente, o relatório “final” não foi de forma alguma final, e tanto especialistas quanto amadores continuam a procurar o MH370. Mais estudos surgem a cada ano e, embora a teoria do planeio controlado permaneça popular, recentemente a teoria do mergulho mortal começou a ganhar terreno. Em 2021, duas novas análises mecânicas do flaperon e de um spoiler (recuperado em agosto de 2020) concluíram que ambas as superfícies de controle provavelmente se separaram durante o voo devido à vibração estrutural depois que o avião excedeu sua velocidade máxima. A razão pela qual eles estavam tão intactos, enquanto a maioria das outras partes não estava, pode ter sido porque eles não atingiram a água com o resto do avião. Simultaneamente, análises de deriva novas e mais avançadas continuam a sugerir que os detritos têm um ponto de origem comum perto do sétimo arco. Os estudos de deriva concordam cada vez mais que o avião deveria estar em uma área relativamente pequena, entre 33 e 35 graus ao sul e 92 a 94 graus a leste – exatamente onde muitas pessoas pensavam que deveria estar desde o início. A maior parte desta área foi coberta pelas buscas ATSB e Ocean Infinity, mas não totalmente. Além disso, conforme o tempo passa e a tecnologia melhora, fica cada vez mais claro que sempre houve outra possibilidade de por que as buscas não encontraram o avião perto do sétimo arco: que ele estava lá o tempo todo e eles simplesmente não conseguiram vê-lo. Avanços na tecnologia de escaneamento por sonar, particularmente de olho em missões em terrenos acidentados como aquele perto do sétimo arco, podem em breve justificar uma segunda olhada em áreas que já foram pesquisadas, principalmente se os estudos continuarem apontando para o mesmo intervalo de locais.

Dados de uma análise de deriva de 2021 (Via Richard Godfrey)
Mesmo sem encontrar o avião, várias lições foram tiradas do desaparecimento do MH370. Muitas das respostas ao desaparecimento centraram-se no fato de que, no século 21, os aviões comerciais não deveriam simplesmente desaparecer. No interesse de saber onde cada avião está o tempo todo, a Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO) começou a exigir que todos os aviões fabricados após 1º de janeiro de 2021 incluam dispositivos de rastreamento autônomos que transmitem sua localização uma vez por minuto. Para dar maior cobertura de aviões fabricados antes dessa data, a Inmarsat (que fornece retransmissões de satélite para quase todos os aviões comerciais) mudou a frequência de seus apertos de mão de uma vez por hora para uma vez a cada 15 minutos. A Agência Europeia para a Segurança da Aviação começou a exigir que os “pingers” nos gravadores de voo das aeronaves durem pelo menos 90 dias, em vez de 30. A ICAO também alterou suas diretrizes para exigir que os projetos de aviões aprovados após 2020 incluam gravadores de voz da cabine que gravem 25 horas de conversas (em vez do padrão atual de dois) e que os gravadores de dados de voo transmitem dados para um local no solo ou são projetados para flutuar na superfície após um acidente. (Como todos os regulamentos da ICAO, estes só entram em vigor se forem adotados pelos estados membros, o que pode levar algum tempo.) e que os gravadores de dados de voo transmitem dados para um local no solo ou são projetados para flutuar até a superfície após um acidente. 

Um tema comum entre os memoriais e celebrações às vítimas era o refrão de que o avião ainda estava em algum lugar, esperando para pousar, preso em uma espécie de limbo eterno (Foto: The Hindustan Times)
Então, o MH370 um dia será encontrado? A maioria dos especialistas diz que a resposta é um enfático sim. As opiniões divergem sobre o prazo, mas o acordo de que alguém o encontrará é quase unânime. É da natureza humana querer resolver os maiores mistérios do nosso tempo, e o local de descanso final do MH370 está no topo da lista. Provavelmente, alguém com muito dinheiro ou conexões com o governo decidirá montar uma busca particular, como a missão bem-sucedida de Robert Ballard para encontrar o RMS Titanic .em 1985. Alguns acham que será em breve, com base em análises confiáveis ​​que preveem a localização quase exata do avião. Outros, como Larry Vance, acreditam que o piloto poderia ter deslizado o avião para qualquer lugar após o último aperto de mão, resultando em uma área de busca impraticável para a tecnologia atual. Mas um dia, insiste, será inventada uma tecnologia que nos permitirá encontrá-lo.

Se um dia encontrarmos o MH370, não é garantido que os destroços renderão muito valor. Ninguém tem certeza se os dados das caixas pretas ainda podem ser extraídos depois de tantos anos debaixo d'água. O famoso investigador do NTSB, John Goglia, acha que os dados serão preservados por muitos anos ainda pelos baixos níveis de oxigênio nas profundezas onde o MH370 provavelmente está; outros acham que os dados provavelmente já se foram. E mesmo que os dados da caixa preta sejam recuperáveis, não há garantia de que haverá algo útil neles. O CVR pode não revelar nada além de duas horas de silêncio enquanto o avião voa no piloto automático sobre o Oceano Índico. Também é possível que, ao desligar todos os sistemas de comunicação, Zaharie também tenha desativado os gravadores de voo, e os dados gravados terminarão abruptamente às 01:21 quando o avião passar por IGARI. Mas a possibilidade de que as caixas pretas contenham as respostas para todas as nossas perguntas sobre o MH370 sempre nos obrigará a continuar a busca. Talvez Zaharie até tenha deixado algum tipo de lembrança no CVR, uma espécie de sutil “parabéns, mistério resolvido”, como a estranha e profética trajetória de voo que ele deixou em seu simulador de voo doméstico. Até que seja encontrado, continuaremos a nos perguntar.

A arte de rua que retrata o MH370 evoca um quebra-cabeça inacabado (Foto: NPR)
Olhando para trás, às vezes ainda é difícil acreditar que tudo isso realmente aconteceu. Ainda é difícil entender como um Boeing 777 pode simplesmente desaparecer. Às vezes parece que nosso mundo é estruturado demais para uma história tão bizarra, como se tivéssemos inventado tudo em um sonho febril coletivo. Para as famílias dos passageiros do MH370, é assim que se sentem todos os dias. A dor de não saber é infinitamente maior que a dor da perda. Todas as noites, eles vão dormir se perguntando: como foram os últimos momentos de seus entes queridos? Eles sofreram? Onde eles estão agora? Até que eles saibam, é difícil até mesmo começar a sofrer.

A falta de sentido da tragédia apenas agrava essa dor. Alguns membros da família se recusam a culpar Zaharie - sua família passou pelo mesmo trauma que eles, e acusá-lo de assassinato ocorre muito perto de casa. Para muitos, é mais fácil conviver com a ideia de que foi um trágico acidente. Mas a verdade, infelizmente, é muito mais sombria. Exceto por uma nova revelação importante, parece quase certo que Zaharie Ahmed Shah assumiu o controle de um Boeing 777 cheio de passageiros e deliberadamente tentou fazê-lo desaparecer. Talvez nunca saibamos por que ele fez isso. Talvez ele quisesse se matar enquanto ainda permitia que sua família recebesse o pagamento do seguro de vida. Talvez ele visse o desaparecimento de um avião como um desafio, um teste de sua coragem intelectual e física. Mas, no final, talvez o “porquê” não importe — afinal, o que pode ser dito sobre a mente inescrutável de um louco, um homem tão modesto e ainda assim capaz de um ato de destruição tão incompreensível? Nenhuma quantidade de questionamento trará de volta aquelas 239 almas que voaram para a escuridão uivante, para nunca mais voltar.

Edição de texto e imagens por Jorge Tadeu (Site Desastres Aéreos

Com informações da analista de desastres aéreos Admiral Cloudberg.